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Reconhecimento, redistribuição e justiça: uma Teoria Crítica do capitalismo

O conceito de reconhecimento tornou-se um dos mais importantes motivos de crítica às sociedades capitalistas, alcançando proeminência semelhante àquela do conceito de redistribuição. Desde o final da década de 1960, quando diferentes teóricos identificam o surgimento de movimentos sociais contestatórios que deixam de lado a temática classista tradicional, centrada na igualdade material e nas garantias geradas por uma sociedade na qual o emprego e as funções exercidas no mundo trabalho são determinantes para a identidade dos indivíduos, o vocabulário dos protestos passa a remeter não apenas à crítica da exploração capitalista, mas também a novos objetivos, dentro dos quais ideias relacionadas à identidade cultural, à individualidade e à diferença ganham relevância. Este movimento, que coincidiu com o início do que alguns autores como André Gorz e Claus Offe chamaram de crise da sociedade do trabalho, marcou não apenas a relativização das tradicionais demandas econômico-salariais dos movimentos contestatórios, mas também colocou a teoria sociológica frente ao desafio representado pela emergência de movimentos descentralizados com demandas e objetivos variados, pois, na medida em que transformavam a imagem das lutas sociais por meio da pluralização de seus objetivos, estes novos movimentos sociais traziam um elemento de complexidade às sociedades em questão, alterando fundamentalmente a relação até então estabelecida pelo Estado de Bem-Estar Social com os grupos oprimidos. Esta diferenciação das lutas sociais, porém, levou a uma necessidade de reavaliação de suas formas e também das motivações dos conflitos nas sociedades modernas. Neste sentido, o fato de que as sociedades que emergem após a crise do mundo da trabalho são marcadamente pluralizadas acaba por colocar em questão, segundo Gorz e Offe, a própria visão da modernidade surgida no século XIX segundo a qual o trabalho seria o grande integrador social. Desta forma, novas teorias da integração que pudessem ocupar o vácuo deixado pela superação histórica das teorias fundantes da sociologia deveriam vir à tona. Contudo, justamente o fato da pluralização da sociedade moderna pareceu contribuir para a dificuldade destas formulações, uma vez que uma tensão entre a incorporação da diferença ou a determinação da humanidade comum dos membros de uma comunidade foi o tema central desta nova fase, segundo Iris Marion Young.

Esta discussão sobre qual o melhor meio para garantir a incorporação da diferença sem ferir os preceitos universais da modernidade é o que motiva Nancy Fraser e Axel Honneth a debaterem as ideias de redistribuição e reconhecimento. Seu debate, contudo, vai além da busca por soluções àquela tensão em pelo menos dois pontos: por um lado, ambos os autores procuram articular suas

visões sobre os conceitos de redistribuição e reconhecimento ao vocabulário dos movimentos de protestos de modo a contextualizar a discussão teórica e situá-la socialmente; por outro lado, na construção de modelos explicativos sobre como entendem a sociedade presente, eles não se limitam às áreas específicas de que tratam seus modelos, a economia e a sociologia, mas buscam avançar para a formulação de teorias normativas que sejam interdisciplinares, críticas do real e apontem para horizontes emancipatórios a partir de seus diagnósticos. Com o primeiro destes dois pontos, a aproximação com a forma como são expressas as demandas dos envolvidos em lutas sociais, Fraser e Honneth percebem que a causa da emergência dos movimentos pluralizados também foi deslocada, deixando de remeter preferencialmente à exploração econômica e abrindo espaço à constatação de que indivíduos vivem situações de injustiça. Isto leva-os a identificar nos clamores por justiça o elemento central dos protestos nas sociedades ocidentais capitalistas do final do século XX, de modo que a este conceito, o de justiça, é reservado por eles um espaço central no debate sobre as ideias de redistribuição e reconhecimento. Quanto ao segundo ponto, o retorno às teorias gerais, ambos assumem de forma clara sua filiação a uma tradição de análise social comprometida não apenas com a pesquisa imanente sobre seu tempo, mas também com a procura por alternativas que ampliem as possibilidades de emancipação, a Teoria Crítica da sociedade, seja em sua vertente fundada por Karl Marx ou, mais especificamente, em sua vertente fundada por Max Horkheimer. Assim, o debate entre Fraser e Honneth parte da interlocução com dois grandes campos teóricos que são opostos: de um lado a teoria da justiça, associada à tradição do liberalismo igualitário e de outro a Teoria Crítica, inspirada diretamente pela obra de Marx. O primeiro dos desafios colocados a Fraser e Honneth, então, é determinar como esta dupla interlocução é possível, algo que só pode ser feito por meio de uma explicação dos pressupostos do debate e do modo como ele se relaciona com cada um daqueles dois campos teóricos. Este é o tema da primeira seção deste capítulo (I).

Contudo, ao longo desta explicação percebe-se que, mesmo que a teoria da justiça e a Teoria Crítica não sejam hierarquizadas enquanto interlocutores, o debate entre Fraser e Honneth remete a ambas de modo diferentes, reservando à ultima um papel metodológico e normativo, enquanto com a primeira existem discussões no nível da investigação sobre as demandas feitas pelos grupos de protesto, o que a aproxima do momento imanente do debate. Neste sentido, o passo seguinte deste capítulo é investigar os pressupostos e fundamentos da ideia de justiça (II). Nesta investigação serão apresentadas em linhas gerais as ideias de autores que contribuíram de modo decisivo para a formulação de uma ideia moderna de justiça, como Jean-Jacques Rousseau, Adam Smith e Immanuel Kant. Estes são, aliás, os autores dos quais se vale o autor da concepção de justiça que tanto Fraser quanto Honneth tomam como a mais influente no momento em que escrevem seus trabalhos e com a qual se batem, John Rawls, cuja teoria distributiva da justiça é objeto de estudo da

terceira seção do capítulo, juntamente com a crítica a ele realizada por autores que consideram que a ideia de justiça não é suficientemente distributivista (III). Por fim, na última parte, uma nova crítica é direcionada à teoria da justiça, mas desta vez a todas as suas formulações distributivistas (IV). Neste caso, toma-se a teoria de Iris Young como o ponto de apoio para a afirmação de que existem bens que não podem fazer parte do escopo do distributivismo, bens que remetem à esfera da cultura ou à formação da individualidade. A ideia de que o reconhecimento baseia-se em um paradigma diferente daquele da justiça distributiva mas ainda assim deveria ser objeto desta, por meio de uma alteração de seus fundamentos, é o que move Young a propor a alteração do paradigma da justiça de um modelo centrado na distribuição e oposto à exploração para um modelo centrado na pluralidade e oposto à opressão e à dominação.

Realizados estes quatro movimentos dentro deste capítulo, espera-se que não apenas o pano de fundo do debate entre Fraser e Honneth seja apresentado, como também os motivos pelos quais os modelos teóricos de cada um destes autores merecem ser tratados em capítulos separados, que é o fato de que seus modelos, ainda que incorporem elementos expostos neste primeiro percurso, apresentam formulações originais o bastante para não serem considerados apenas alternativas, por mais radicais que fossem, aos paradigmas tradicionais da justiça.

I – Pressupostos e interlocuções do debate: Teoria Crítica e teoria da justiça

O ponto de partida do debate entre Nancy Fraser e Axel Honneth é a constatação, por ambos, de que o conceito de reconhecimento adquiriu grande importância nos debates políticos contemporâneos sem que, com isso, sua relação com outro conceito central da filosofia política do pós-guerra, o de redistribuição, tenha sido teorizada apropriadamente. Enquanto o primeiro destes termos mostra-se central para a tentativa de conceituar as lutas por identidade e diferença, o segundo foi o articulador das filosofias liberais-igualitárias do ápice da era Fordista, quando o foco principal das teorias sociais eram as demandas dos trabalhadores e dos pobres; se a noção de reconhecimento é usada para expressar a dimensão moral de diversos conflitos contemporâneos que ampliam o escopo das relações de trabalho ou de combate à pobreza, a ideia de redistribuição diz respeito antes a conflitos por recursos cobrados de um Estado nacional através de apelos a normas universalistas; além disso, o reconhecimento liga-se às condições de autonomia dos sujeitos, ao passo que a redistribuição remete às ideias de igualdade e participação. O que há de relevante na crescente importância conquistada pela noção de reconhecimento é que, a exemplo do que ocorrera com a noção de justiça distributiva que sustenta o conceito de redistribuição, as demandas por

justiça expressas por diferentes grupos sociais articulam-se através daquele conceito. Ou seja, assim como a redistribuição, o reconhecimento passa a ser uma formulação de uma noção mais ampla de justiça social. Como, porém, a segunda constatação de Fraser e Honneth é a de que, a despeito da crescente relevância das questões relativas ao reconhecimento, as questões distributivas não foram resolvidas, ambos concordam que “nem reconhecimento nem redistribuição podem ser negligenciados na constelação presente”3. Isso significa que, para eles, ambas as problemáticas

devem ser tratadas de maneira aprofundada e conjunta, evitando a conduta tradicional de reduzir as demandas ligadas ao reconhecimento a problemas econômicos. Por isso, concordam que um entendimento adequado da justiça social deve abranger, no mínimo, as preocupações relativas às lutas por reconhecimento e às lutas por redistribuição.

Neste ponto, entretanto, os caminhos de Honneth e Fraser se separam: enquanto ele acredita que uma teoria substantiva do reconhecimento seja capaz de enfrentar os problemas colocados por ambos os lados do debate, ela defende que a união destes conceitos em uma estrutura conjunta é a melhor opção para a teorização do capitalismo contemporâneo. Assim, Fraser diz que “É minha tese geral de que a justiça hoje requer tanto redistribuição quanto reconhecimento”4; Honneth, por outro

lado, está “convencido de que os termos do reconhecimento devem representar esta estrutura unificada”5.

No caso de Fraser, a ideia é ressaltar os aspectos emancipatórios de ambos os tipos de lutas sociais e, por meio deste movimento, enfrentar a questão da justiça social em duas dimensões: quanto à sua formulação teórica, Fraser acredita que a unificação destes dois campos pode propiciar a formulação de um conceito bi-dimensional de justiça capaz de acomodar demandas defensáveis por igualdade social e por reconhecimento da diferença; quanto à dimensão prática, ela preocupa-se com a formalização de políticas que possam orientar de modo programático a integração de demandas por redistribuição e reconhecimento6.

Já para Honneth, a separação proposta por Fraser entre dois domínios a serem abarcados pela noção de justiça social, o domínio material e o domínio cultural, poderia ser relevada pela tentativa de orientar a compreensão teórica por uma estrutura categorial capaz de estabelecer ligações entre as demandas dos movimentos sociais e os sentimentos generalizados de injustiça e, 3 Nancy Fraser and Axel Honneth, Redistribution or recognition?: a political-philosophical exchange, London/New

York, 2003. p. 2. “Neither recognition nor redistribution can be overlooked in the present constellation”. As passagens em outra língua que aparecem traduzidas são todas de minha responsabilidade.

4Nancy Fraser, “Social justice in the age of identity politics: Redistribution, recognition and participation”, in: Nancy

Fraser and Axel Honneth, Redistribution or recognition?: a political-philosophical exchange, London/New York, 2003a. Pág. 9.

5Axel Honneth, “Die Pointe der Anerkennung. Eine Entgegnung auf die Entgegnung”, 2003b, in Nancy Fraser and Axel

Honneth, Redistribution or recognition?: a political-philosophical exchange, London/New York, 2003c. Pág. 113.

através desta relação, revelar o conteúdo normativo destas demandas. Em sua visão, a categoria capaz de realizar esta mediação entre sentimentos e demandas com propriedade é o reconhecimento7.

A despeito destas diferenças quanto ao caminho adotado por cada um dos autores, eles voltam a concordar em dois importantes pontos organizadores do debate. Primeiro, a divisão específica de disciplinas como a filosofia moral, a sociologia e a teoria política deve ser superada. Neste sentido, ambos aspiram à “teorização da sociedade capitalista como uma “totalidade”” 8. Em

segundo lugar, na medida em que ambos identificam-se com a tradição da Teoria Crítica da sociedade, esta reunião das disciplinas em uma teoria normativa deve servir a um adequado entendimento da sociedade presente, sendo a concepção sobre a sociedade capitalista a categoria fundamental de ambos os seus modelos9. Desta forma, mais que a relação entre os conceitos de

redistribuição e reconhecimento, a questão central colocada por Fraser e Honneth com seu debate refere-se a como compreender a sociedade presente:

O capitalismo, como existe hoje, deve ser compreendido como um sistema social que diferencia uma ordem social que não é diretamente regulada por padrões institucionalizados de valor cultural de outras ordens sociais que o são? Ou a ordem econômica capitalista deve ser entendida antes como a consequência de um modo de valoração cultural que está ligado, desde o princípio mesmo, com formas assimétricas de reconhecimento?10

Ou seja, a disputa entre estes autores gira em torno da compreensão da base organizativa da sociedade capitalista, se esta é uma sociedade em que esferas de regulação cultural e não cultural seguem lógicas de valorização e institucionalização que são ou não autônomas. E, uma vez que a regulação de demandas associadas ao reconhecimento, a sua valorização e sua institucionalização, são objetos de sentimentos e demandas de grupos sociais que através destas demandas buscam expressar concepções de justiça, o debate entre Fraser e Honneth gira também em torno de uma teorização adequada das implicações normativas dos conceitos de redistribuição e reconhecimento. O resultado destas duas preocupações é que, ao mesmo tempo em que se propõem a realizar uma análise imanente da sociedade presente, eles não abrem mão da tarefa de procurar nesta análise crítica os elementos que apontam para a superação das desigualdades reveladas. E esta relação entre imanência e transcendência é, afinal, a essência da Teoria Crítica como entendida desde sua fundação na década de 1930 pelos pesquisadores do Instituto de Pesquisa Social (Institut für Sozialforschung – IfS) de Frankfurt am Main. Estes pesquisadores, liderados por Max Horkheimer

7Honneth, 2003b: 113.

8Fraser and Honneth, 2003, p. 4. 9Fraser and Honneth, 2003, p. 4. 10Fraser and Honneth, 2003, p. 5.

propunham-se a trabalhar de modo interdisciplinar, reunindo conhecimentos de economia política, sociologia, psicologia, crítica cultural e filosofia em uma mesma teoria que se diferenciaria da teoria feita de modo tradicional, que encontrava sua expressão à época no positivismo cartesiano e na fenomenologia, pela sua auto-compreensão: segundo a formulação de Horkheimer no artigo “Teoria tradicional e Teoria Crítica”, esta última, a Teoria Crítica, entende a si mesma como um momento presente na realidade que analisa, buscando, por isso mesmo, encontrar nesta própria realidade elementos que apontem para a sua superação11. Essa fórmula de buscar a emancipação a partir das

condições do presente ficou conhecida como uma relação de imanência e transcendência. Ao mesmo tempo em que se caracteriza por esta investigação aprofundada do real e com uma orientação para a emancipação, a Teoria Crítica caracteriza-se pela renovação permanente de seu núcleo teórico em função da construção de novos diagnósticos de tempo12, de modo que, neste

movimento, a preocupação de autores de gerações posteriores à de Horkheimer, como é o caso de Honneth e Fraser, dirige-se também aos destinatários do discurso crítico contemporâneo13.

Assim, enquanto Horkheimer diagnosticou a perda de esperança no proletariado14, Fraser e

Honneth observam nas demandas por justiça social um destes elementos capazes de indicar comportamentos críticos. No entanto, demandas historicamente diferenciadas por justiça social não seriam, segundo o modelo de Horkheimer, suficientes para que a Teoria Crítica encontrasse os elementos indicativos dos momentos de crítica imanente. Para ele, a associação entre teoria e as ideias de uma determinada classe ou de um grupo social não passa de uma forma tradicional e especializada de ciência que apenas descreve aquilo que esta classe ou grupo expressa. Ao contrário das teorias que apoiam de modo acrítico as posições das classes ou grupos menos favorecidos simplesmente porque estes são quem mais sofre com a opressão, a Teoria Crítica busca nestas lutas os elementos de crítica do presente que apontam para a superação das relações de dominação e para a emancipação, ou seja, sua relação com as demandas sociais é antes de complementação do que de apoio, uma vez que se trata de identificar no real aquele movimento em direção à superação da dominação que é realizado cientificamente pela Teoria Crítica por meio da crítica imanente da teoria tradicional. Daí que, ao invés da separação entre a ciência e o contexto no qual ela é feita, a Teoria Crítica sustenta-se na consciência de que é parte de um processo histórico. No caso de sua relação com o movimento histórico de emancipação, ela não pode limitar-se a descrever demandas 11 Max Horkheimer, “Traditionelle und kritische Theorie” in Zeitschrift für Sozialforschung. Jahrgang 6 (1937).

München: Deutschen Taschenbuch Verlag, 1980, pp. 245-294. (Edição brasileira: “Teoria tradicional e Teoria Crítica"

in Benjamin, Walter, Horkheimer, Max, Adorno, Theodor W., Habermas, Jürgen. Textos escolhidas. São Paulo: Abril

cultural, 1983 (Os pensadores). Aqui, p. 270-1 na edição alemã e 137 na brasileira.

12 Marcos Nobre, Teoria Crítica. São Paulo: Jorge Zahar, 2004, p. 23.

13 Josué Pereira da Silva, Trabalho, cidadania e reconhecimento. São Paulo: Annablume, 2008, p. 35. 14 Horkheimer, 1983, p. 134; 1980 [1937], p 267.

por justiça, comportamentos críticos ou a “formular sentimentos e representações próprias de uma classe” porque isso não cumpre o papel de crítica imanente. Horkheimer diz sobre este ponto que:

A simples descrição da autoconsciência burguesa não é suficiente para mostrar a verdade sobre sua classe. Tampouco a sistematização dos conteúdos da consciência do proletariado fornece uma verdadeira imagem do seu modo de ser e dos seus interesses. Ela seria uma teoria tradicional caracterizada por uma problemática peculiar, e não a face

intelectual do processo de emancipação do proletariado.15

Com esta afirmação de que a Teoria Crítica é uma face de um processo que não segue as regras ditadas por ela – ou por qualquer outra teoria – ficam marcados, então, pelo menos dois pontos. O primeiro é que não se trata de oferecer uma concepção teórica aos oprimidos ou de seguir representações destes oprimidos sobre sua libertação; trata-se, antes, de, intelectualmente, participar da realização do processo de libertação da sociedade de sua condição presente, o que equivale a dizer que, analogamente à luta das classes e grupos oprimidos pela descoberta dos caminhos para sua libertação efetiva, a Teoria Crítica deve preocupar-se com a descoberta dos caminhos que permitam a realização intelectual das promessas da razão. O segundo ponto marcado pela caracterização da Teoria Crítica como uma face do processo de emancipação é que, justamente porque ela preocupa-se com a descoberta daquelas tendências emancipatórias, ela caminha conjuntamente ao movimento histórico, seja como participante seja como manifestação das limitações de que sofre a situação real da sociedade. Isto quer dizer que a busca pelos elementos de crítica só pode acontecer nas condições que lhe são peculiares. Desta maneira, a caracterização oferecida por Horkheimer para a Teoria Crítica, “a face intelectual do processo de emancipação”, pode ser vista como uma síntese de sua tarefa de acessar os elementos emancipatórios através de uma crítica do presente que identifique nas lutas dos oprimidos, sejam eles quem forem, exatamente aqueles elementos com os quais esta crítica possa identificar-se do ponto de vista da realização de uma sociedade racional. Nesta formulação estão presentes, pois, as ideias de crítica, norma e utopia, que sustentam a tipologia explicativa de Seyla Benhabib sobre quais seriam os fundamentos da Teoria Crítica. Do mesmo modo, indica que os problemas com os quais lida esta teoria não se limitam nem à associação com as lutas sociais de seu contexto histórico e nem com a orientação de normas práticas para a vida social: sua problemática é, novamente, a relação entre as condições presentes e as possibilidades de emancipação.

Para Fraser e Honneth, então, reivindicar a herança de uma tal tradição demanda mais do que apenas identificar a melhor forma de caracterização da sociedade capitalista contemporânea. A constatação de que ““Reconhecimento” tornou-se uma palavra chave de nosso tempo”16 também

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