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3 VISÃO GERAL SOBRE A PARTICIPAÇÃO DA ONU NO PERÍODO DE

3.1 UMA VISÃO GERAL SOBRE A PARTICIPAÇÃO DA ONU NO PÓS-GENOCÍDIO

3.2.2 Reconstrução de comunidades

Uma das consequências do genocídio de Ruanda, foi a destruição das cidades, incluindo vários números de casas próprias cujos moradores foram vítimas dos crimes, ou conseguiram refugiar-se. De qualquer maneira, no período após o conflito Ruanda não possuía estrutura o suficiente para reestabelecer sua população remanescente e os refugiados que retornavam ao país, portanto o governo ruandês em conjunto com as agências da ONU tomaram algumas medidas para resolver os problemas de moradia e realocações.

Visto que seria um desafio superar as dificuldades de realocação da população, o governo começou a pensar em alternativas e mudanças a serem feitas no país, diante dos

40 Thanks to the significant efforts made over the last decade by the Government of Rwanda and its partners to expand access to education throughout the country, Rwanda is one of the top-performing countries in sub- Saharan Africa in education, having achieved Millennium Development Goal (MDG) 2 for access to Universal Primary Education, with a net enrolment rate of 97 per cent

problemas que este assunto em especifico trazia para o Estado. Com isso no ano de 1996 o governo implementou a nova National Human Settlement Policy, onde apresentava o projeto de construir residências, formar novos vilarejos e acomodar aqueles que perderam suas propriedades durante o genocídio.

Para a reconstrução das moradias, foi de extrema importância para o governo de Ruanda receber ajuda internacional, através do incentivo externo a ONU administrava e supervisionava as inúmeras atividades que estavam sendo desenvolvidas no Estado.

De acordo com o representante do United Nations Development Programme (1997, p. 8, tradução nossa)41

O atual programa de construção de abrigo é importante, não só em si, mas também como um símbolo tangível da assistência internacional, que é importante tanto para o governo como para os doadores. As construções físicas das habitações tornam-se referência visível da eficácia da assistência internacional

No ano de 1996, foi então criado o programa conhecido como Imidugudu, cujo conceito era oferecer várias vantagens a população, provendo a elas um lugar para morar dispondo de condições sociais e serviços econômicos. Cabia ao governo receber dois grupos de pessoas (o povo local e os refugiados), reconstruir as casas que haviam sido destruídas, e assim estabelecer um conjunto de moradias onde a população fosse assegurada com as condições necessárias para viver (IRIN, 2004).

As construções começaram com a ajuda das agências da ONU, como por exemplo UNICEF, ACNUR e PNUD, embora essas últimas apresentavam conceitos diferentes quanto à construção das comunidades.

A ACNUR focava na imediata construção de casas, enquanto o PNUD favorecia a criação de projetos que envolvessem a infraestrutura e serviços, assim como os planos para desenvolvimento econômico.

O mapa elaborado pelo PNUD ilustra a construção de 100 casas que compõem uma comunidade, conforme abaixo:

Ilustração 3 – Mapa das 100 casas construídas

41 The current shelter construction programme is important, not only in itself but also as a tangible symbol of international assistance which is important both for the Government and for donors. The physical construction of housing will become a visible benchmark of the effectiveness of international assistance

Fonte: UNITED NATIONS DEVELOPMENT PLAN (1998)

Com isso no ano de 1997 ambas agências estabeleceram uma unidade para tratar deste assunto. A Joint Reintegration Programming Unit (JRPU) procurava as intenções similares de ambos e assim coordenaria seus esforços e recursos (HUMAN RIGHTS WATCH, 2017).

De acordo com Human Rights Watch (2017, tradução nossa) 42

Nos quatro anos, a política "imidugudu" modificou drasticamente o aspecto da paisagem rural. O país agora está coberto de grupos de pequenas casas, de todos os tamanhos, forma ou tipo de materiais; E o ACNUR contribuiu fortemente para esta mudança, fornecendo os materiais e construindo 98.447 casas em 252 locais de assentamento e em locais espalhados por todo o território de Ruanda

Uma das principais características do programa imidugudu era que este era arquitetado em áreas rurais do país, pois era mais prático e benéfico estimular o desenvolvimento rural e assim investir em condições sociais e econômicas, com isso os futuros moradores teriam mais segurança e auxílio.

42 In four years, the "imidugudu" policy has modified drastically the aspect of the rural landscape. The country is now covered with groups of tiny houses, all alike, whether in size, shape, or type of materials; and UNHCR has heavily contributed to this change by providing the materials or building 98,447 houses in 252 settlement sites and in scattered locations all over Rwanda.

Era fundamental que este programa oferecesse apoio nas áreas de educação, saúde e condições sanitárias, em adição seriam promovidas novas estradas e outras redes de comunicação, e tambem acesso a mercados e a extensão agrícola. O programa então estabelecido em áreas rurais, trazia mais suporte aos refugiados e sobreviventes do genocídio, em sua maioria mulheres e crianças, já que estas preferiam estar em comunidades nas quais o senso de suporte e confiança seria mútuo (IRIN, 2004).

No ano de 1999 a ONU enviou um representante oficial com o objetivo de verificar como o projeto estava sendo efetuado, já que este ainda causava certo alvoroço entre a comunidade internacional que contribuía financeiramente com o imidugudu e se preocupava com a preservação dos direitos humanos e acreditava que se não fosse um projeto bem pesquisado e elaborado, estaria indo contra alguns direitos dos cidadãos ruandeses.

Foram alvos da visita as seguintes comunidades: Karambi, Rutara e Gihinga. A ideia era que o representante oficial pudesse tirar suas próprias conclusões após analisar as comunidades pessoalmente e assim intermediar os debates recorrentes dos doadores (UNITED NATIONS, 1999).

O vilarejo de Karambi foi o projeto piloto para as 19 comunidades planejadas na região de Gisenyi, nele foram construídas cerca de 260 casas/abrigos em terrenos agrícolas onde a comunidade tem acesso a água corrente e também aproximadamente 200 latrinas. Uma vantagem de Karambi é que este fica a apenas 10 minutos de uma escola primária e um centro de saúde para a população. Os habitantes também estão muito próximos aos campos, então a produção agrícola é incentivada. Não há relatos sobre tensões étnicas nessa comunidade, até por que a grande maioria de seus habitantes foram vítimas do genocídio que perderam suas antigas casas ou que estavam em condições vulneráveis (UNITED NATIONS, 1999).

Apesar de parecer que tudo estava funcionando de acordo com os planos, o representante oficial relata alguns problemas enfrentados devido a falta de recursos.

Segundo “Situation on Human Rights” (1999. p.20, tradução nossa)43

Todas as 254 casas ainda são feitas de folhas de plástico temporárias e apenas 5 estão sendo construídas com tijolos. O centro de saúde pode estar perto, mas não tem camas e quase nenhum remédio. Os colonos de Karambi são visitantes regulares do centro de nutrição, porque muitos de seus bebês estão seriamente abaixo do peso. A produção agrícola é certamente baixa, porque os colonos não possuem sementes e fertilizantes, e a maioria são mulheres solteiras.

43 All 254 houses are still made of temporary plastic sheeting and only 5 are being built with brick. The health centre may be close, but it has no beds and almost no medicine. Karambi’s settlers are regular visitors to the nutrition centre because many of their infants are seriously underweight. Agricultural production is certainly low, because settlers lack seeds and fertilizer, and most are single women.

O segundo vilarejo Rutara localiza-se na região de kibungo, e é importante para esta pesquisa pois sua construção foi desenvolvida pelo PNUD. Existia após o genocídio apenas 3 casas no local, e após implementado os planos para a reconstrução de vilas, o programa da ONU conseguiu aumentar para 100 o número de casas existentes. Sua população foi composta de famílias que retornavam ao país e também por vítimas do genocídio que não tinham lugar para morar.

Assim como Karambi, o vilarejo de Rutara estava próximo de uma escola e a um centro de saúde, e também tinha acesso aos campos e aos comércios locais. Um dos problemas vitais dessa comunidade era a falta de água corrente, apesar de possuírem uma bomba, esta só era utilizada pelos colonos, de modo que a água potável teria de ser comprada nos mercados (UNITED NATIONS, 1999).

Gihinga, a terceira comunidade visitada é de longe a mais problemática. Contendo

150 casas construídas por meio de doações do governo Holandês e administradas pelo PNUD, essa comunidade se consolidou numa porção de terra que antigamente pertencia a apenas um morador (que ainda reside na vila), porém localiza-se a pelo menos 5 km do centro de saúde mais próximo, e está ainda mais longe dos mercados locais. Os problemas com o fornecimento de água são intermitentes, e para completar Gihinga possui relatos de coerção entre seus habitantes (UNITED NATIONS, 1999).

Diante destas visitas, algumas recomendações foram feitas por parte da ONU, entre elas estava o oferecimento de recursos e melhor aproveitamento dos campos, para que os moradores pudessem desenvolver plantio suficiente para seu sustento e para o comércio futuro. Outra sugestão foi que os projetos de vilagização, como as comunidades imigudugu, passassem por mais debates públicos.

É por ultimo segundo o relatório “Situation Human Rights” (1999, p.21, tradução nossa)44

Representante Especial encoraja fortemente o Governo a estabelecer um programa conjunto com seus parceiros para melhorar os serviços nas aldeias existentes. Em termos de novas aldeias, os locais piloto poderiam ser estabelecidos em todo o país, com a localização deixada para os conselhos de desenvolvimento recém-eleitos. Os serviços devem ser instalados antes que os colonos sejam procurados. Os resultados

44 The Special Representative strongly encourages the Government to establish a joint programme with its partners to improve services in existing villages. In terms of new villages, pilot sites could be established throughout the country, with the location left to the newly-elected development councils. Services should be installed before settlers are sought. Findings of technical studies should be fully exploited for the improvement or establishment of such services and projects

dos estudos técnicos devem ser plenamente explorados para a melhoria ou o estabelecimento de tais serviços e projetos.

Sobre o gerenciamento do PNUD, mais de um milhão de pessoas foram realocadas nas comunidades imidugudu, apesar disso, aqueles que forneciam doações para o desenvolvimento do programa ainda apresentavam ideias controvérsias, estes criticavam a falta de participação da população em planejamentos como o tamanho das casas e seu projeto externo (IRIN, 2004).

De acordo com Irin (2004, tradução nossa) 45

As casas construídas sob a iniciativa de Imidugudu apresentaram várias desvantagens, sendo as mais pronunciadas que foram construídas apressadamente na fase de emergência do país [...] a fase de emergência exigiu a reinstalação urgente de milhares de repatriados e pessoas deslocadas. Isso levou ao desenvolvimento de muitos locais por inúmeras organizações sem aderência a padrões de construção claramente definidos.

[..] Por exemplo, sob Imidugudu, o tamanho da terra disponível por lar é inferior a um hectare e o espaço para atividades agrícolas é de cerca de meio hectare.

Em teoria o programa Imidugudu só estaria trazendo melhorias para a sociedade, porém durante os anos algumas pessoas relataram que se sentiam desconfortáveis com a ideia de que o país estaria impondo-os a viver em determinadas comunidades, outras afirmavam que como as casas foram fornecidas pelo governo, nunca se sentiram como seus verdadeiros donos, e com isso não demonstravam cuidado com suas habitações. Pensamentos como estes dificultaram a progressão do programa, que embora tenha durado muitos anos, continuava apresentando dificuldades para se desenvolver em questões como o acesso a educação, à água potável e a outras instalações (IRIN, 2004).

Segundo o ministro da infraestrutura Ntawukuliryayo (2004, tradução nossa)46

“Apesar de algumas deficiências na implementação desta política, o governo ainda acredita firmemente que Imidugudu representa a única alternativa viável para a equação da população de terras de Ruanda no futuro previsível”. O governo continua seu objetivo de acomodar os ruandeses tanto nas comunidades imidugudu, quanto nos centros urbanos, onde, sobre

45 Homes built under the Imidugudu initiative had several disadvantages, the most pronounced of these being that they were built hastily within the country's emergency phase […]the emergency phase called for the urgent resettlement of thousands of the returnees and displaced persons. This led to the development of many sites by numerous organisations without adherence to clearly defined building standards.

For example, under Imidugudu, the size of the land available per household is less than one hectare and the space for agricultural activities is about half an hectare.

46 Despite some shortcomings in implementing this policy, the government still firmly believes that Imidugudu represents the only feasible alternative to Rwanda's land population equation for the foreseeable future,

mudanças na política de moradia, assegura que serão construídos e administrados pelos distritos novos planos de desenvolvimento.

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