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3 A FAMÍLIA

3.1.4 REDE SOCIAL E RELAÇÕES FRATERNAS

A identidade da pessoa é construída por meio das relações estabelecidas com a rede social, aqui entendida de uma forma mais ampla, complexa, difícil de delimitar. Nela se dá o apoio social, emocional e financeiro, o compartilhamento de valores, a troca e a regulação social, sendo importante para a saúde física e emocional da pessoa. As redes sociais permitem ir além dos atributos individuais e possibilita analisar os limites estruturais das ações. Ser validado pela rede a qual se pertence contribui para o desenvolvimento da pessoa, mas que, muitas vezes, a rede se organiza em torno de uma “situação/problema”, na tentativa de superá-lo (FEIJÓ, 2011; MENDES, 2010; MARAMOTO, 2008; SLUZKI, 2003)

As relações sociais se baseiam em trocas. Ao interagirmos com o outro ele dá significado às nossas experiências, construindo e reconstruindo nossa identidade tornando-nos reais. As relações familiares e as relações sociais se modificam reciprocamente, variando em diferentes momentos da vida, especialmente nas transições desenvolvimentais como juventude - idade adulta (MARAMOTO, 2008; SLUZKI, 2003; ANDRADE, VAITSMAN, 2002). O estabelecimento de uma rede social de apoio à família é uma maneira de evitar a carência afetiva, que segundo Cecconello e Koller (2000) traz prejuízos maiores que a miséria econômica.

A rede social pessoal configura-se como a soma de todas as relações que o indivíduo percebe como significativas e “constitui uma das chaves centrais da experiência individual de identidade, bem-estar, competência e agenciamento ou autoria, incluindo os hábitos de cuidado da saúde e a capacidade de adaptação em uma crise” (SLUZKI, 2003, p.41). Sendo assim, o apoio da rede social, quando esta é forte, estável e sensível, promove o bem estar, favorece a autoestima, a interação com o outro e o empoderamento, além de auxiliar em momentos de crise, agindo frequentemente em

direção à sua superação. É sabido que redes de tamanho médio são mais efetivas que as pequenas ou grandes, pois, nas pequenas, os membros evitam o contato com o intuito de evitar a sobrecarga e, nas grandes, há o risco da não-efetividade, por suporem que alguém já está cuidado do “problema” (MARAMOTO, 2008; SLUZKI, 2003; ANDRADE, VAITSMAN, 2002).

Em países desenvolvidos, como Estados Unidos e Canadá, a rede social é considerada forte quando formada em 50% por familiares, e nas minorias étnicas ou entre os imigrantes, esta porcentagem pode chegar a 70%. As redes sociais se tornam importantes por propiciar auxílio às famílias carentes, necessitando ser mais intensificadas no caso de deficiência. A presença da deficiência física produz impacto na relação entre a pessoa e a família imediata, pois os cuidados que esta necessita geram um esgotamento nos membros que compõem aquela rede, e há, portanto, redução do contato e da reciprocidade. Há evidências de que uma rede pessoal social estável, sensível, ativa e confiável gera saúde por atuar como agente de ajuda, de encaminhamento (MARAMOTO, 2008; SLUZKI, 2003; ANDRADE, VAITSMAN, 2002) Embora tenha ocorrido mudanças no contexto familiar na pós-modernidade, com a maior autonomia feminina e sua entrada no mercado de trabalho, o meio social ainda é organizado pelo princípio da divisão do trabalho pelo gênero, originando uma segregação de tarefas. É sabido que, no dia-a-dia, é a mulher quem assume os cuidados de saúde quando há um componente da família doente ou com deficiência. Tal fato pode ser comprovado por Almeida (2011a) na sua dissertação de mestrado intitulada “Costurando as redes de cuidadores de crianças com Paralisia Cerebral” onde, após estudar as redes de cinco mulheres mães de crianças com diagnóstico de Paralisia Cerebral grave, constatou que mães e irmãs ocupam lugar privilegiado na rede, oferecendo suporte emocional, sendo guia cognitivo e de conselhos, bem como oferecendo ajuda material e de serviços.

Outra pesquisa que englobou redes sociais e deficiência foi realizada por Freitas (2014), em Salvador, Bahia, onde a autora se propôs a estudar quatro pessoas com deficiência física (tetraplegia), todos adultos jovens e seus principais cuidadores. Ficou constatado que as redes sociais de indivíduos tetraplégicos se tornam

pequenas, porém com laços fortes, sendo que suas funções estão mais relacionadas com o cuidado com a saúde e o apoio emocional. Ao estudar os cuidadores principais, esta autora encontrou as figuras da mãe, esposa, tia e irmã ocupando lugar privilegiado, assumindo com naturalidade o cuidado, sendo que a rede de apoio emocional destas cuidadoras era composta apenas por mulheres.

A competência social é uma característica individual que capacita a pessoa a adaptar-se a uma situação desfavorável, por leva-la a interagir com a família e outras pessoas próximas significativas e, consequentemente, apresentarem estratégias eficazes de enfrentamento. As relações de amizade em situações de estresse, funcionam como uma rede de apoio social e podem ser identificadas como essenciais para o desenvolvimento das crianças, por promoverem recursos emocionais e instrumentais para o enfrentamento das adversidades e adaptação em situações de estresse (CECCONELLO; KOLLER, 2000).

Quando a intenção é contribuir para uma dinâmica favorável familiar, e também com o desenvolvimento do irmão da criança com deficiência física, é importante conhecer esta inter-relação entre o indivíduo, a família e a comunidade, visto que a presença de uma pessoa com deficiência na família altera a quantidade e a qualidade dessas interações, o que pode afetar a rede social pessoal do seu irmão não deficiente, se este adquirir comportamentos que a evitem, por meio de quebras relacionais, onde antes poderia ter havido acolhimento (MENDES, 2010; FRANÇA, 2000).

Nossos papéis sociais recebem influências intergeracionais, do ambiente, dos nossos relacionamentos, das nossas crenças, das condições socioculturais. (FEIJÓ, 2011) A disponibilidade de apoio social da família, seu tamanho, juntamente com a idade dos irmãos, pode exercer um efeito indireto na forma como os irmãos com desenvolvimento típico reagem à presença e se relacionam com o irmão com deficiência física. Em famílias desprovidas economicamente é frequente o cuidado da pessoa com deficiência ficar sob a responsabilidade do seu irmão não deficiente, independentemente do gênero, da idade ou da sua posição na prole. O suporte emocional e social é dado frequentemente aos irmãos mais jovens com desenvolvimento típico pela sua própria família, seus amigos da rua e pela escola,

enquanto que os mais velhos tem seu suporte oferecido frequentemente pela relação estabelecida com o(a) namorado(a) (CAVICCHIOLI, 2005).