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Redes de vigilância epidemiológica da Doença dos Legionários

Índice de tabelas

1.3 Epidemiologia da Doença dos Legionários

1.3.2 Redes de vigilância epidemiológica da Doença dos Legionários

A vigilância epidemiológica da DL tem como objetivo determinar a frequência, as tendências e as principais características epidemiológicas da doença, de modo a identificar e controlar precocemente surtos (205, 221, 235).

Ao longo dos anos têm sido implementados esquemas de vigilância na maioria dos países europeus, EUA, Austrália, Nova Zelândia, Singapura, Israel, Japão e Canada (235). Estas redes de vigilância têm como missão validar a informação recebida, caracterizar o caso, investigar se existem outros casos relacionados, identificar clusters, pesquisar o reservatório ambiental da bactéria que terá dado origem ao caso em estudo (fonte de infeção) e, se for um equipamento de utilização coletiva, implementar as medidas de controlo consideradas necessárias para interromper a disseminação (28, 221, 230).

Considera-se um cluster quando são detetados dois ou mais casos de DL associados à mesma fonte de infeção, tendo o início da sintomatologia ocorrido num período inferior ou igual a dois anos (62).

Maria de Jesus Chasqueira

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Nos EUA, de 2000 a 2011, a vigilância da DL foi efetuada de forma passiva, baseando-se na notificação de casos ao Sistema Nacional de Vigilância de Doenças Notificáveis (NNDSS), por prestadores de cuidados de saúde, laboratórios ou cidadãos. Para complementar este sistema na deteção de surtos e efetuar a vigilância dos casos relacionados com viagens foi criado o Sistema Complementar de Vigilância da Doença dos Legionários (SLDSS). Em 2011, o programa de Infeções Emergentes do CDC implementou um sistema ativo de vigilância, o Active Bacterial Core Surveillance (ABC). Foram instituídos 10 locais de captação de dados em regiões consideradas representativas da população do país, baseando-se o sistema na procura ativa dos casos de DL junto dos laboratórios, sendo a informação recolhida por pessoas treinadas. Embora o sistema só abranja uma fração da população dos EUA, as taxas de notificação obtidas foram semelhantes às identificadas pelo NNDSS, sugerindo que o ABC é representativo e os resultados obtidos podem ser generalizados a toda a população do país. Para além disso, como a informação é recolhida de uma forma padronizada e sistemática, é possível uma avaliação mais concreta do impacto da doença e assim, ajustar o esforço de prevenção da DL (33, 66).

Na Europa, a OMS iniciou em 1981 uma série de reuniões com especialistas de Legionella, nas áreas da microbiologia e da epidemiologia, oriundos de 12 países, com o objetivo de implementar uma rede europeia de vigilância da DL. Na sequência destas reuniões em 1986 foi criado o EWGLI (substituído em 2010 pelo ESGLI, grupo de trabalho do ESCMID) e um ano mais tarde, para realizar a vigilância da DL associada a viagens, foi instituída a EWGLINet. O EWGLI, inicialmente financiado pela OMS foi coordenado, até 1992, pelo Laboratório Nacional de Bacteriologia de Estocolmo. No entanto, após divergências sobre a eficácia do programa de vigilância implementado, a coordenação foi transferida para Londres, ficando o EWGLI na dependência da HPA e com financiamento da CE. O protocolo de vigilância foi então alterado, tendo-se adaptado um novo modelo de notificação e informatizado o processo. A CE, em 1998, criou uma rede comunitária de vigilância epidemiológica e controlo das doenças de declaração obrigatória. Esta decisão concedeu um estatuto legal ao EWGLINET, passando as notificações a ser obrigatórias entre os estados membros da CE que aprovaram as diretrizes sobre prevenção, deteção e notificação dos casos de DL associados a viagens, propostas pelo EWGLI (159), que foi o caso de Portugal.

O sistema de vigilância instituído revelou-se eficaz e, por isso, quando se procedeu à junção de todos os sistemas de vigilância da Europa, este foi o último a ser transferido para o ECDC. A partir de 2010, o esquema de vigilância da DL passou a ser coordenado pelo ECDC, sendo agora a rede designada por ELDSNet

(http://ecdc.europa.eu/en/healthtopics/legionnaires_disease/ELDSNet/Pages/index.aspx).

Na vigilância dos casos de DL associados a viagens, quando um caso de infeção é detetado num turista, o país visitado é notificado, tendo 2 semanas para preencher o primeiro formulário confirmando que foi efetuada uma avaliação do risco junto das unidades referenciadas no

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inquérito epidemiológico e que foram iniciadas medidas de controlo. Após 4 semanas, deverá ser remetido ao ELDSNet outro formulário discriminando os resultados obtidos e quais as medidas de prevenção realizadas no decurso da investigação. Quando este procedimento é corretamente efetuado o processo é encerrado. No entanto, em caso de incumprimento, o nome da entidade hoteleira envolvida na transmissão da infeção é publicitado na página do ECDC (http://ecdc.europa.eu/en/healthtopics/legionnaires_disease/Pages/accommodation-site-list.aspx) e avisados os operadores turísticos. Ao longo dos anos, este procedimento condicionou positivamente as unidades hoteleiras a tomarem medidas de controlo e de prevenção para evitarem a colonização dos seus sistemas AVAC e de distribuição de água quente. Atualmente, as reservas online vieram alterar esta dinâmica, pelo que a rede terá que implementar outras opções para relançar a vigilância da DL.

De entre os países que implementaram um sistema de vigilância para a DL, a Inglaterra e o País de Gales são os que possuem a base de dados mais antiga do mundo. Em 1980, vários laboratórios públicos e hospitalares concordaram reportar ao centro de vigilância das doenças comunicáveis (CDSC), coordenado pelo PHE, de forma voluntária e numa base semanal, todos os casos de infeção por Legionella detetados (157). Atualmente, o centro de vigilância e controlo de doenças infeciosas (CIDSC) emite mensalmente no site (https://www.gov.uk/government/publications/legionnaires-disease-monthly-surveillance- reports-2016) um relatório com o número de casos de DL notificados nos dois países.

Em França, o país da Europa que mais casos de DL reporta ao ELDSNet, a notificação obrigatória iniciou-se em 1987. Os casos são reportados às agências regionais de saúde (ARS), entidades responsáveis pela realização do inquérito epidemiológico, sendo a monitorização a nível nacional efetuada pela autoridade nacional de saúde (InVS) após envio dos dados coligidos pelas ARS. Este esquema foi reforçado em 1997, em colaboração com o Centro Nacional de Referência para Legionella - Lyon, com a emissão de informações para os clínicos, de orientações para a prevenção e controlo da doença e alteração do formulário de notificação (27, 28).

Em Espanha, outro país com um histórico elevado de casos de DL, a doença passou a ser de declaração obrigatória em 1996 (240). Neste país, a vigilância epidemiológica centra-se na Rede Nacional de Vigilância, complementando-se com dados provenientes de outros sistemas e fontes de informação como o Centro Nacional de Microbiologia do Instituto de Saúde Carlos III.

Nas comunidades autónomas, as autoridades de saúde pública são responsáveis pela notificação dos casos, numa base semanal, ao Centro Nacional de Epidemiologia. Por sua vez esta entidade é responsável pela notificação ao Centro Coordenador de Alertas e Emergências de Saúde, do Ministério da Saúde, e ao ELDSnet. A vigilância foi reforçada em 2003, pelo Real Decreto

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865/2003, de 4 de Julho, que estabelece os critérios de saúde e higiene para a prevenção e controle da DL (241).

Em Portugal, a DL é de notificação clinica obrigatória (DDO) desde 1999 (Portaria nº 1071/98, de 31 de Dezembro). No entanto, dado que o número de casos reportados era diminuto, em 2004 foi introduzida a obrigatoriedade da notificação laboratorial. O Programa de Vigilância Epidemiológica Integrada da Doença dos Legionários (PVig Ep In da DL), criado pela circular normativa n.º 5/DEP de 22/04/2004, é coordenado pela DGS e engloba na vigilância epidemiológica, para além das estruturas anteriormente envolvidas (clínicos, autoridades de saúde e DGS), todos os serviços de patologia clínica, públicos e privados, assim como o INSA, o laboratório de microbiologia do HSC (que mudou para o Hospital Egas Moniz em 2010) e o departamento de microbiologia da FCM-UNL (atualmente NMS|FCM-UNL) (62).

Com este reforço de vigilância pretendeu-se aumentar o número de casos notificados, e colmatar as falhas de informação das DDO com os dados obtidos pelo PVig Ep In da DL. Foi ainda estabelecido pela circular normativa nº 6/DT de 22/04/2004 que após a notificação de um caso de DL é obrigatório completar, em tempo útil, o inquérito epidemiológico e o estudo ambiental (63).

Em Portugal, a vigilância epidemiológica das doenças transmissíveis e outros riscos em saúde pública foi reforçada pela Lei n.º 81/2009, de 21 de agosto e pelo Despacho da DGS n.º 5855/2014, de 5 de maio, respetivamente, com a instituição de um Sistema de Vigilância em Saúde Pública e com a obrigatoriedade de notificar através da aplicação informática de suporte ao SINAVE (Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica). Este sistema eletrónico de notificação está disponível on-line (https://sinave.min-saude.pt) e envolve todas as autoridades de saúde e outras entidades dos sectores público, privado e social. A notificação eletrónica passou a ser obrigatória a partir de janeiro de 2015, para todos os médicos (Despacho n.º 5855/2014 de 21 de abril, DGS) e partir de 1 de janeiro de 2017 para todos os laboratórios (Portaria nº 22/2016 de 10 de fevereiro, DGS).