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Redes Interurbanas e Urbanas de transportes coletivos

4. Mobilidade e Transportes

4.2 Redes Interurbanas e Urbanas de transportes coletivos

Tendo em conta o tráfego automóvel e os problemas de poluição e ruído associados, a opção por transportes públicos é uma alternativa mais vantajosa, quer ao nível económico quer ambiental, já que um MegaJoule, em termos comparativos de gastos energéticos, pode transportar um passageiro durante 2,5 km de comboio ou metro, 0,8 km num autocarro mas, apenas 0,4 km num automóvel (Figura 9), consumindo apenas 0,3 MJ/pass.km em comboio ou metro, 1,1 de autocarro e 2,3 de automóvel (Figura 10).

Figura 9: Distância percorrida por passageiro com a energia de 1 MJ Fonte: Seabra et al., 2011c

Figura 10: Consumo de energia de WTW MJ/pass.Km Fonte: Seabra et al., 2011c

Da análise destes dados, constata-se ainda que entre os meios de transporte coletivo, o transporte ferroviário é o meio de transporte ambientalmente mais favorável para o transporte urbano. E continua a sê-lo no transporte interurbano já que apresenta baixos consumos, pode transportar mais passageiros e é movido em grande parte a partir de energia elétrica, que pode ser obtida por diversas

45 fontes de energia, incluindo energias renováveis, o que lhe confere maior independência energética e menores consumos energéticos e emissões de GEE. É também mais vantajoso em termos de tráfego, segurança e fiabilidade, senão vejamos os recentes exemplos, a nível internacional, do efeito das cinzas vulcânicas na interrupção do tráfego aéreo ou da greve provocada pelos transportadores, que provocou a rutura do stock de combustíveis em muitas bombas de gasolina a nível nacional.

Ao nível da cidade, os sistemas de metro ligeiro (Light Rail Transit) constituem o modo de transporte básico em cidades médias europeias com populações entre 300 000 a 2 milhões de habitantes (Diamant et al., 1976). Também Vuchic (1981) refere que estes sistemas são apropriados em cidades de 200 000 a 300 000 habitantes.

A aposta no meio de transporte ferroviário contribui para a intermodalidade e para uma mobilidade mais sustentável. Por todas essas razões, a União Europeia decidiu dar-lhe prioridade como é sublinhado nos documentos acima referidos, entre eles o livro branco, em que é referida a criação de uma rede multimodal com prioridade ao transporte ferroviário. Este objetivo já tinha sido evidenciado no Livro Branco em 2006, referindo que diferentes meios de transporte usados individualmente e em articulação com outros contribuem para um uso mais eficiente da rede de transportes, sublinhando já a ideia de que deveria ser dada prioridade ao transporte ferroviário. No documento "Um futuro sustentável para os transportes", a Comissão Europeia defende ainda que os custos externos dos transportes, decorrentes dos efeitos do tráfego, consumo de energia, emissão de poluentes, etc., devem ser internalizados no custo real dos transportes, de forma a dotar o utilizador da consciência do custo real, induzindo-o a valorizar e reduzir o consumo dos mesmos (CCE, 2009). Essa alteração faria também com que a competitividade entre meios de transporte fosse mais justa, dando assim a perceção do transporte ferroviário como uma alternativa mais vantajosa.

Atualmente, na UE o transporte ferroviário representa apenas 11% do transporte de mercadorias terrestre e 6% do transporte de passageiros. Para aumentar essa percentagem há que tornar o transporte ferroviário mais competitivo, em termos de rapidez, flexibilidade e custo e para isso é necessário colmatar algumas falhas em termos de qualidade, em particular a fiabilidade (CCE, 2010).

46 Em Portugal a rede ferroviária sofreu nos últimos anos um grave declínio, resultado do favorecimento de rede rodoviária e do abandono e desativação de alguns troços da rede ferroviária nacional. É um dos países europeus com maior densidade de rede de autoestradas e menor densidade de rede ferroviária (Figuras 11 e 12) (MOPTC, 2006).

Figura 11: Comparação da densidade da rede ferroviária e rodoviária em 2003 (m/km2)

Fonte: MOPTC, 2006

Figura 12:Comparação da densidade da rede ferroviária e rodoviária em 2003 (m/103hab)

Fonte: MOPTC, 2006

Há ainda alguns problemas que têm que ser resolvidos para a melhoria da rede ferroviária nacional de modo a atrair mais passageiros. Esses problemas passam pela limitação da velocidade de circulação em alguns troços, deficiente acessibilidade e infraestruturas desatualizadas. Todos estes fatores, aliados à falta de intermodalidade com outros meios de transporte fazem com que o modo ferroviário não esteja a ser explorado no máximo das suas potencialidades.

Para que os transportes coletivos representem uma alternativa real e mais atrativa em relação ao automóvel, terão que servir pólos de grande atividade, como por exemplo universidades, hospitais e zonas comerciais, respondendo em tempo útil às necessidades específicas de cada local, como sejam os horários de serviço, a frequência e a lotação, tendo em conta a complementaridade entre meios de transporte (intermodalidade), fornecendo várias opções aos utilizadores que se desloquem a pé, de bicicleta, autocarro, etc. e articulando da melhor forma os vários modos entre si.

Para uma oferta de transportes coletivos de qualidade tem que existir uma hierarquização e articulação multimodal de complementaridade entre os diferentes meios de transporte coletivo e os diferentes operadores. Importa por isso definir os diferentes níveis de hierarquização dos transportes (Coelho e Marques, 2005):

A rede de transportes de 1º nível tem por objetivo a ligação às redes de fluxos suburbanos (inclui o meio de transporte fluvial, ferroviário e rodoviário suburbano) e às redes ferroviárias e aeroportuárias nacionais e internacionais. Como tal, têm que prestar um

47 serviço de qualidade que garanta tempos de espera inferiores a 6 minutos, velocidades comerciais elevadas, iguais ou superiores a 23 km/h, níveis de fiabilidade5 e regularidade6 muito elevados (99% e 95% respetivamente), com atrasos inferiores a 3 minutos, distâncias médias entre paragens de 600 a 700 metros num corredor integral e amplitude de horário das 6:00 à 01:00h.

A rede de transportes de 2º nível efetua as ligações entre as linhas de 1º nível e bairros que não sejam abrangidos pela rede de 1º nível, bem como equipamentos coletivos de hierarquia superior, ou seja, capazes de atrair 5000 utilizadores/dia. Estes transportes coletivos de 2º nível devem ter uma maior resposta nos períodos de maior procura, entre as 7:00-10:00 e entre as 16:30-20:30 com um período de 10 minutos entre serviços e 20 minutos em períodos de menor afluência, velocidades comerciais médias a elevadas iguais ou superiores a 19 km/h, níveis de fiabilidade e regularidade elevados (95 e 90% respetivamente), e devem ser colocados em corredores únicos ou com baixo nível de congestionamento, com uma distância média entre paragens de 450 a 550 metros.

A rede de transportes de 3º nível responde às necessidades de ligação entre os bairros e dentro deles e também faz a ligação com estações da rede de 1º nível. Esta rede consiste numa malha mais apertada que pretende responder às necessidades específicas ao nível da mobilidade dentro do bairro, como por exemplo a ida ao centro de saúde ou à escola. O tempo ideal entre serviços deve ser até 15 minutos, nos períodos de maior procura, entre as 7:00-10:00 e as 16:30-20:30, e 20 a 30 minutos nos períodos menos procurados. As velocidades médias comerciais razoáveis devem ser à volta dos 15 km/h e os níveis de fiabilidade superiores a 95% e de regularidade superiores a 85%. A distância entre paragens deve situar-se entre os 350 a 450 metros para aumentar o nível de eficiência e poder responder adequadamente às necessidades dos habitantes.

Os transportes coletivos têm que transmitir confiança aos utilizadores, para isso é necessário que exista por sua vez um grande leque de hipóteses: boas ligações, conforto, rapidez e fiabilidade que os faça escolher essa escala de importância em detrimento de outra. Desta forma seria possível

5

Fiabilidade – existência de serviços (Coelho e Marques, 2005), ou seja é o rácio entre o nº de comboios previstos e o nº de comboios realizados (MOPTC, 2006).

6

Regularidade – cumprimento de horários até 3 minutos de atraso (Coelho e Marques, 2005), ou seja, é o rácio entre o nº de comboios com atraso inferior a X minutos e o total de comboios realizados (MOPTC, 2006).

48 reduzir os níveis de tráfego motorizado e consequentemente as emissões de GEE atuais, havendo mais-valias quer ao nível ambiental, qualidade de vida (social) e redução dos custos associados às emissões de GEE (económicos).

No Livro Verde para os Transportes (1995) foram apontados os critérios que caracterizam um sistema de transportes coletivos de qualidade, conforme quadro abaixo.

Quadro 7: Lista de critérios de qualidade da “Rede de cidadãos”

Acessibilidade do sistema necessidades das pessoas com mobilidade reduzida conceção do material circulante

conceção das estações, incluindo intermodalidade ligação dos pólos de atração aos transportes públicos ligação das zonas rurais e periféricas

Acessibilidade em termos de preços níveis das tarifas

serviços socialmente necessários (tarifas especiais)

Segurança normas de segurança

qualidade da iluminação qualificação do pessoal

número de elementos do pessoal em serviço/sistema de vigilância

Comodidade duração das deslocações

fiabilidade frequência higiene conforto informação bilhética integrada flexibilidade

Impacto ambiental emissões

ruído infrastrutura

Fonte:CCE, 1995

Tal como demonstrado, inclusivamente através de políticas europeias e nacionais, uma rede de transportes coletivos de qualidade, que seja mais eficiente e que responda às necessidades dos utilizadores pode contribuir para a diminuição do tráfego motorizado, e consequentemente, para uma mobilidade mais eficiente em termos energéticos, justificando a escolha das seguintes diretrizes:

49 Diretriz 8 : Transportes interurbanos ferroviários (comboio convencional)

Como indicadores para esta diretriz foram escolhidos os níveis de fiabilidade e regularidade (99% e 95% respetivamente).

Diretriz 9 : Rede de transporte coletivo ferroviário de qualidade em cidades e/ou redes de cidades com mais de 300 000 habitantes.

A viabilidade económica e financeira de sistemas ferroviários ligeiros determina que sejam essencialmente implantados em cidades e/ou redes de cidades com população superior a 300 000 habitantes.

Diretriz 10: Rede urbana de transporte coletivo rodoviário de qualidade

Os indicadores escolhidos para as diretrizes 9 e 10 são a frequência do serviço (intervalos entre passagem em minutos), velocidade média comercial, idade média da frota e a distância média entre paragens. Tendo por valores recomendados, os valores definidos na rede de transporte de 1ºnível, ou seja, um tempo de espera inferior a 6 minutos, velocidades médias comerciais de 23 km/h, e uma distância entre paragens de 600 a 700 metros (Coelho e Marques, 2005). Quanto à idade média recomendada, na ausência de valores recomendados por bibliografia específica acerca do tema, optou-se por assumir estas idades por uma questão de razoabilidade, no caso do transporte coletivo ferroviário assumiu-se uma idade média recomendada de 10 anos e no caso do transporte coletivo rodoviário assumiu-se uma idade média recomendada entre 6 a 7 anos.