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Diante de um cenário de indefinição, resultante das disputas de classes sociais em seus diversos níveis, entram em cena para arbitrar os conflitos as normas jurídicas.

Nesses casos, elas servirão como meio para regular e disciplinar litígios que possam ser apaziguados pela prescrição legal. Todas as reivindicações associativas ou oriundas de movimentos sociais agora contam com um tipo de “mobilização do direito”, uma maneira de o Poder Público, fundamentado em normas jurídicas, distribuir acesso ao direito reivindicado entre os grupos. O ordenamento jurídico brasileiro consagra a ação política como um exercício do direito dos cidadãos através da democracia, como instrumento de denúncia social, diante da insatisfação por parte de segmentos sociais, quando for constatado um desequilíbrio social que deva ser ao menos mitigado, senão resolvido. Porém, o embate com o gestor público só pode ocorrer dentro do rito legal e mediante mobilização da sociedade (MACIEL, 2011).

Ainda segundo Maciel (2011), quando o assunto é o acesso ao direito mediante ações diretas de atores sociais, é importante entender que todo o repertório dessas mobilizações será objeto de pesquisas científicas. O primeiro questionamento que surge é: quais condicionantes são a base para a formação dessas mobilizações? A oportunidade política pode ser uma porta de entrada para as mesmas. Em segunda análise, caso a oportunidade política seja essa entrada, os movimentos sociais, para

serem atendidos em suas demandas junto ao poder público, utilizarão todo o seu poder de repertório de atuação não pertencente à esfera institucional pública, como greves, boicotes, até mesmo lobbys e o acionamento do poder judiciário. Em terceiro lugar, os movimentos necessitam criar uma agenda de reivindicações, com a produção de um plano de atuação construído mediante o discurso de seus membros.

Para Losekann (2013), todo anseio ou necessidades sociais que unem um determinado grupo social em torno de seus valores ou pautas reivindicatórias só serão exitosos caso o grupo demonstre seu poder e habilidade de persuasão mobilizadora quando se trata de mobilização de direito. Dentro das mobilizações envolvendo os interesses ambientais, de modo a introduzir na pauta das ações do Poder Público ao menos a mitigação dos danos ambientais, aparece a mobilização legal, a qual é um mecanismo de defesa dos interesses ambientais em desfavor dos objetivos do grande capital em suas atividades sem nenhum compromisso com a sustentabilidade.

Entretanto, quando as negociações dos litigantes chegam ao fim sem uma definição favorável para uma ou ambas as partes, é preciso que os envolvidos recorram ao Ministério Público (MP), mediante Ação Civil Pública (ACP), para acionar o poder judiciário. Mesmo que a referida ação não chegue ao juízo competente, o MP possui um instrumento legal denominado Termo de Ajuste de Conduta (TAC), que compromete as partes envolvidas a obedeceram o que foi acordado, dando fim ao litígio, sob a “ameaça” de encaminhamento das partes ao judiciário caso o termo não seja fielmente cumprido.

Conforme Losekann (2013), os interesses sociais são difusos em uma sociedade. Há disputa entre praticamente todas as camadas sociais, das menos favorecidas até as maiores elites. Contudo, para que seus membros possam reivindicar suas demandas, necessariamente dependerão de canais de acesso às arenas de discussão para poderem debater, permitindo uma maior participação social.

Neste quadro apresentado há a ausência intervencionista estatal, proporcionando uma diversidade institucional. Para as associações, principalmente as de caráter ambiental, esses canais de acesso possibilitam uma mobilização legal, encontrando na ACP um instrumento no exercício prático para trabalhar várias formas de performance dentro de uma efetiva atuação coletiva.

A legislação proporcionou que o judiciário assumisse um papel importante na sociedade, na medida que esta entende que qualquer decisão do Poder Público, em última análise, poderá ser revertida na justiça. Portanto, magistrados, promotores e

outros agentes são aliados importantes na promoção da justiça ambiental. Dentre algumas formas de acesso ao poder público, nada se aproxima do poder de impacto de mudança da ordem social, que possui a representação política. Os entes federados no Brasil, com suas respectivas instâncias de poder, são alvo constante das ações de mobilização social das diversas associações, que trabalham de modo a pressionar os agentes políticos em exercício de mandato a atenderem as diversas demandas de suas bases representativas, o que permite serem ouvidos nas deliberações da gestão em vigor (LOSEKANN, 2013).

As pesquisas a respeito dos movimentos sociais ganharam um enriquecimento a partir das análises sobre a mobilização legal com início nos anos 90, não desconsiderando as várias vertentes dos movimentos sociais. O ordenamento jurídico utilizado como instrumento de aplicação da norma pelo judiciário foi fruto de um profundo debate, onde foram ouvidos vários segmentos da sociedade civil, mediante seus setores, representados por diversas associações dentro da arena legislativa. A lei passou a ser a “bússola” norteadora de atuação no território (LOSEKANN;

BISSOLI, 2017).

Na perspectiva da ação coletiva, no acesso através da judicialização do processo, cabe o entendimento em relação a duas vertentes, uma instrumental e outra simbólica, idealizando, por um lado, meios para obter êxito em litígios. Os litigantes sociais podem problematizar suas pautas com a finalidade de recorrerem ao MP ou ao judiciário. Quando se trata de uma vertente instrumental, os movimentos se utilizam dos meios tangíveis e concretos disponíveis, como a fundamentação legal para agirem, e a vertente simbólica, que atua na área da subjetividade, dos valores de moralidade que norteiam as crenças dos movimentos (MACIEL, 2011).

É importante ressaltar que ambas as vertentes têm a capacidade de problematizar causas sociais, quando a ausência de justiça possa gerar desigualdades, levando os atores que se sentem lesados a promover ações socias com consequências judiciais e, até mesmo, políticas. Existe um leque de estratégias muito abrangente pelos quais militam as associações sociais. Nestas estratégias encontram-se aquelas cujas mobilizações estabelecem suas ações dentro dos limites da lei. Estas encontram um maior poder de penetração na gestão pública, pois os administradores públicos entendem que há um maior diálogo e tolerância por parte desses atores, os quais atuam como um filtro politizado das demandas sociais,

consequentemente tendo uma maior escuta por parte dos gestores públicos (MACIEL, 2011).

Para entender o conceito de repertórios de ação, é preciso saber que o mesmo foi cunhado a partir da leitura de Charley Tilly, sendo compreendido como a variedade do “arsenal” disponível dos movimentos sociais, com a capacidade e habilidade que os mesmos utilizaram no decorrer de sua história. Dessa forma, os agentes de seus respectivos grupos sociais forjaram as bases de suas atuações coletivas. Portanto, o embate político é a explicação da existência de chave (demanda social), que aciona a máquina (atores) dos movimentos sociais, justificando a sua existência e negando toda e qualquer ausência de racionalidade em suas ações em quaisquer níveis (SOUSA; PEREIRA, 2022, p. 35-36).

Quadro de síntese – Mobilizações sociais

Mobilização

Significa arregimentar voluntários para uma finalidade de interpretação e sentimentos compartilhados, atendendo três condicionantes: (I) existência de propósito que corresponda às expectativas e percepções do grupo; (II) existência de agentes qualificados atuando como multiplicadores; (III) coletivização das ações.

Antiqueira;

Picanço; Bertoni (2021)

Mobilização

Mobilização social teria como resultado uma efetiva participação em uma determinada ação na gestão pública.

Essa participação social conceitualmente é um termo explorado nas mais variadas disciplinas e que agrega múltiplas perspectivas. Abrange desde ferramentas metodológicas até filosofias políticas, sendo utilizado para se referir a uma variedade de escalas de interação social e política e invocado para dar apoio a posições políticas e éticas diversas. Como resultado, verifica-se ampla gama de abordagens e significados, que devem ser claramente delimitados de modo a qualificar a discussão.

Os autores afirmam que a maioria delas, no entanto, possui, como denominador comum, o próprio sentido etimológico da palavra (do latim participatio, participacionis, participatum) - fazer parte, o que, dotado de significado político, equivale a fazer parte do processo decisório. Frequentemente, no entanto, são utilizadas expressões muito semelhantes, mas que encerram diferenças fundamentais. Até que ponto, por exemplo, os termos “fazer parte”, “tomar parte” e “ter parte”

são dotados do mesmo sentido? É possível fazer parte de um grupo sem tomar parte nas decisões? Para muitos pesquisadores, a segunda expressão representa o nível mais intenso de participação e consiste na diferença primordial entre um cidadão inerte e o cidadão engajado, entre a participação passiva e participação ativa.

Calandino;

Scárdua; Koblitz (2018)

Ativismo

Quando há uma mobilização para uma ação social.

Entretanto, a partir de 1990, iniciava-se um processo de organização de uma agenda mais abrangente e com um caráter dinâmico e relacional.

Bringel (2012)

Ativismo

O ativismo social atinge um espectro extremamente diversificado de ações: desde aspirações reivindicatórias, consideradas “paroquiais”, pois não aprofundam as indagações e a análise sobre a sociedade vigente, que somente exemplificam uma reação perante a ausência de um problema específico, até embates muito ambiciosos e complexos, que terminam indagando a maior parte das fundações da sociedade, seja destacando seus aspectos econômicos, políticos e culturais. Lembrando que o ativismo se classifica em uma categoria consequentemente mais abrangente, envolvendo diversas maneiras de organização, mobilização e atuação dos moradores das cidades (não necessariamente somente os pobres).

Souza; Rodrigues (2004)

Redes Repertórios

Conforme a estrutura de oportunidades políticas condiciona, em determinadas conjunturas históricas, estratégias de mobilização que permitem dar suporte prático à ação coletiva. Por intermédio desses suportes, os movimentos sociais mobilizam “repertórios de ação”

compostos de formas de ação política não institucionalizadas – protestos públicos, greves, boicotes – e institucionalizadas, como lobbies e o uso das normas e procedimentos judiciais.

Iniciando desse repertório conceitual, apresenta um modelo multidimensional de análise da mobilização do direito. Do ponto de vista político-institucional, a utilização do direito e do judiciário é contingente, pois condicionada pela compreensão dos agentes das estruturas de oportunidades políticas no interior das quais a ação coletiva surge e se desenvolve.

Maciel (2011)

Redes Repertórios

Qualquer ação coletiva advém de “repertórios”

compreendidos como “as maneiras através das quais as pessoas agem juntas em busca de interesses compartilhados”. Esses repertórios são limitados (e inovados) por condicionantes vinculados ao contexto cultural e estrutural, produzindo restrições políticas para a ação social. Dessa maneira, se destacam as “estratégias”

e “vínculo” latentes nas reivindicações do ambientalismo brasileiro, a ação judicial.

Losekann (2013)

Associativismo

As associações e os movimentos sociais têm um amplo leque de atuação, os quais defendem seus próprios interesses: configurando-se como os representantes de uma comunidade pertencente a um determinado território.

Lutam por causas feministas, raciais, dos menos favorecidos, considerados excluídos sociais, trabalham com filantropia, causas ambientais, representam associações sindicais, dentre outras.

Lüchmann;

Schaefer;

Nicoletti (2017)

3 O CASO ANALISADO: ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL PARQUE E

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