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Raquel Recuero (2012) assinala que são as trocas entre pessoas que se conhecem, que não se conhecem ou que se conhecerão, dentro das comunidades virtuais, que constroem o que veio a ser chamado de rede social, na internet. Uma rede social também pode ser definida, de maneira clássica, como ”um campo social em que se praticam relações e intercâmbios de diferentes tipos entre indivíduos” (LOMNITZ, 2009, p. 211):

As características dos sites de rede social, nesse contexto, acabam gerando uma nova forma conversacional, mais pública, mais coletiva, que chamaremos de conversação em rede. Essas características e sua apropriação são capazes de delinear redes, trazer informações sobre sentimentos coletivos, tendências, interesses e intenções de grandes grupos de pessoas. São essas conversas públicas e coletivas que hoje influenciam a cultura, constroem fenômenos e espalham informações e memes24, debatem e organizam protestos, criticam e

acompanham ações políticas e públicas. É nessa conversação em rede que nossa cultura está sendo interpretada e reconstruída (RECUERO, 2012, p. 18).

Por se desenvolverem no âmbito virtual, essas redes sociais não instituem territórios físicos, mas sim, territórios simbólicos, baseados em interesses comuns entre seus membros. André Lemos (2002), em contraposição aos críticos que sustentam que elas atuam como vetores de alienação e desagregação, afirma que as

24 Expressão que descreve um conceito de imagens e vídeos relacionados ao humor, geralmente irônico, que se

redes podem ser, ao contrário, máquinas de formação comunitária, justamente pela grande capacidade de aglutinação dos usuários, com base em interesses específicos:

No contexto de comunicação telemática, planetária e multimodal, a rede pode agregar pessoas independentemente de localidade geográfica e não revelando, de imediato, referências físicas, econômicas ou religiosas. Com o ciberespaço, as pessoas podem formar coletivos mesmo vivendo em cidades e culturas bem diferentes. Criam-se assim territorialidades simbólicas. Neste sentido, as comunidades formadas a partir das redes telemáticas mostram como as novas tecnologias podem atuar, não apenas como vetores de alienação e de desagregação, mas também, como máquinas de comunhão, de compartilhamento de ideias e sentimentos, de formação comunitária (LEMOS, 2002, p. 150).

À medida em que os dispositivos tecnológicos se aperfeiçoam e se tornam acessíveis a um número maior de pessoas em nível global, bem como a estrutura da internet melhora e conecta mais usuários, expande-se a teia que liga os nós do ciberespaço e os intercâmbios de fluxos da rede.

Castells (1999) compara essa infraestrutura tecnológica às ferrovias que definiam as regras econômicas, e aos mercados nacionais que determinavam a economia industrial e as regras institucionais de cidadania que formavam as cidades, nas origens mercantis do capitalismo e da democracia representativa.

Na tradição da pesquisa sociológica, ressalta Castells, as comunidades “baseavam-se no compartilhamento de valores e organização social” e as redes eram montadas “pelas escolhas e estratégias de atores sociais, sejam indivíduos, famílias ou grupos sociais” (2003, p. 107). A grande transformação atual ocorre quando as comunidades espaciais são substituídas pelas redes virtuais como bases da sociabilidade:

Muitos dos hábitos que recentemente se tornaram permeados pelas plataformas de mídia social costumavam ser manifestações informais e efêmeras da vida social. Falar com amigos, trocar fofocas, mostrar fotos de férias, anotações de garotas, cuidar do bem-estar de um amigo, ou assistir ao vídeo doméstico de um vizinho costumavam ser atos casuais e evanescentes, comumente compartilhados apenas com pessoas selecionadas. Uma mudança importante é que, através das mídias sociais, esses atos de fala casuais se transformaram em ritos formalizados, que, uma vez inseridos na economia maior de públicos mais amplos, assumem um valor diferente. [...] As

plataformas de mídia social têm indubitavelmente alterado a natureza da comunicação pública e privada (DIJCK, 2013, p. 7, tradução minha)25.

Essas redes permitem que os usuários adotem perfis – páginas pessoais – e, a partir deles, conectem-se a amigos, familiares ou desconhecidos para compartilhar conteúdos e manter comunicações diretas e indiretas. Lucia Santaella diz que elas “acabam por funcionar como plataformas sociais, dada a facilidade de intercomunicação dos usuários” (2013, p. 42). Elias Goulart, numa visão otimista, acredita que

[...] essas ferramentas, e outras que poderão vir a existir, têm seu significado estabelecido não apenas porque são a melhor tecnologia, mais rápida ou elegante, mas também porque potencializam o que temos de melhor, ou seja, a própria humanidade. Elas servem para partilharmos nossos desejos, valores, crenças, pensamentos, dúvidas e necessidades, e permitem que colaboremos uns com os outros na ajuda recíproca ou na busca pelo alcance de objetivos comuns (GOULART, 2014, p. 17).

De todo modo, a interação engendrada pelas redes sociais digitais “marca uma nova possibilidade de relacionamentos” (GONÇALVES; SILVA, 2014, p. 86) porque reduz distâncias e propicia maior horizontalidade nas relações sociais:

Fenômeno desse tempo, as redes sociais digitais têm impactado a sociedade nas mais diversas formas de interação, seja entre amigos, familiares, instituições, empresas, seja criando novos hábitos e rotinas das pessoas e do planejamento de comunicação e marketing das empresas. Pelo fato de terem surgido como um meio de comunicação de baixo custo e acessível por parte da população, diversas marcas começaram a investir nesse ambiente. Por outro lado, o cidadão encontrou ali um espaço para garantir sua voz e passou a participar ativamente como aquele que não só recebe, mas também influencia na criação, na produção, no compartilhamento e na divulgação de conteúdos (GONÇALVES; SILVA, 2014, p. 88).

Isso porque, ao criar um perfil, “as pessoas passam a responder e a atuar como se esse perfil fosse uma extensão sua, uma presença extra daquilo que constitui sua

25 Many of the habits that have recently become permeated by social media platforms used to be informal and

ephemeral manifestations of social life. Talking to friends, exchanging gossip, showing holiday pictures, scribbling notes, cheking on a friend’s well-being, or watching a neighbor’s home video used to be casual, evanescent (speech) acts, commonly shared only with selected individuals. A major change is that through social media, these casual speech acts have turned into formalized inscriptions, which, once embedded in the larger economy of wider publics, take on a different value. [...] Social media platforms have unquestionably altered the nature of private and public communication.

identidade” (SANTAELLA, 2013, p. 43). A construção da presença no ambiente digital acontece por atos performáticos e representações do eu (RECUERO, 2012). Por meio do perfil, o usuário se mostra, se manifesta, produz e compartilha informações:

Subjetividades são, assim, transformadas de um estado de passividade, isolamento e silêncio para uma forma de subjetividade ativa. A participação nessas redes reforça também a criação de uma identidade digital, inclusive estimula a possibilidade de assumir várias identidades ou papeis para o exercício da fantasia, imaginação e de novos tipos de narrativas ou ficções. É normal que os usuários passem a conviver com a presença digital das pessoas com base nesses contextos (SANTAELLA, 2013, p. 43).

As conexões entre os perfis acontecem pela fala26 entre os atores que, na

conversação em rede, podem estabelecer laços rapidamente, sem qualquer contato prévio, e desfazê-los com a mesma facilidade. Rheingold reconhece que tais laços são fracos em sua maior parte, mas entende, por outro lado, que sem essa rede “de relações mais superficiais, a vida seria mais difícil e menos divertida de muitas maneiras” (2000, p. 361, tradução minha)27.

Para o autor, a importância dos laços característicos das redes sociais virtuais é que eles “multiplicam o capital social das pessoas, o conhecimento útil, a capacidade de fazer as coisas” (2000, p. 361, tradução minha)28.