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Reestruturação produtiva, inovações tecnológicas e novas configurações do trabalho

1 O TRABALHO NO SETOR SAÚDE

1.3 Transformações recentes do trabalho no setor saúde

1.3.1 Reestruturação produtiva, inovações tecnológicas e novas configurações do trabalho

O cenário econômico internacional que passou a vigorar a partir dos anos 1970, caracterizado pela combinação de crises, transformações da base tecnológica e internacionalização do capital e, portanto, por um elevado nível de instabilidade, abriu espaço para o questionamento dos padrões de regulação e para a promoção do discurso de racionalização produtiva por parte das empresas. As atividades econômicas passaram a ser guiadas pela tríade flexibilidade-competitividade-qualidade e a desregulamentação dos mercados de bens, serviços e principalmente do trabalho apresentava-se como o caminho para a redução de custos, promoção da eficiência e adaptação do sistema produtivo ao processo de globalização em curso (DEDECCA, 1997; MARTINS, MOLINARO, 2013).

Proni e Pochmann (2006), com base no conceito de “modernização conservadora” proposto por Tavares (1992), reforçam que a combinação dos processos de liberalização econômica e reestruturação produtiva produz um efeito paradoxal e perverso. De um lado, mantem-se a dinâmica das inovações tecnológicas e o antigo padrão de consumo e, de outro, incentivam-se as reformas econômicas e a geração de riquezas financeiras, descoladas da esfera produtiva. E, como consequência, rompe-se o padrão das políticas sociais e de emprego e renda, típicas dos Estados de Bem-Estar Social.

Para Souza (2010), as transformações operadas no processo produtivo e nas relações de trabalho no período recente são consequência da necessidade de manutenção da valorização do capital. Sob a nova lógica de acumulação, a produtividade e o lucro são maximizados a partir da intensificação da exploração da força de trabalho e da promoção da desregulamentação das relações trabalhistas.

A superexploração dos trabalhadores é propiciada e intensificada pelas inovações tecnológicas, as quais, para muitos autores, também são responsáveis pela redução do número geral de empregos, principalmente nos setores de baixa qualificação. Apesar de não existir um consenso a respeito do impacto das novas tecnologias sobre o mercado de trabalho, diversos estudiosos acreditam que um possível “círculo virtuoso” kaldoriano presente na era fordista (transformações estruturais, “novas rendas”, incorporação de ganhos de produtividade aos salários, realização de novos investimentos e abertura de novos postos de trabalho) não teria mais espaço nas economias modernas (EATWELL, 1996; VIVARELLI, 2007).

A desestruturação das relações trabalhistas, por sua vez, manifesta-se no novo formato de organização do trabalho baseado em um padrão flexível e orientado para atender as demandas e as exigências do mercado. Esse trabalho flexível caracteriza-se por mudanças nos contratos de trabalho, nas jornadas e nas remunerações e pelo avanço da terceirização, com a contratação pelas grandes indústrias de micro e pequenas empresas (ANTUNES, 2011).

As alterações dos contratos de trabalho se referem à proliferação das “formas particulares de emprego”, que se afastam do perfil padrão (trabalho em tempo integral, de duração indeterminada, com um empregador único). Em relação às jornadas, verifica-se ampliação do recurso a horários excepcionais de trabalho, com diversificação e variabilidade máxima das escalas de trabalho, visando elevar a rentabilidade do capital e a eficácia dos serviços, e minimizar as irregularidades das atividades. Sobre as remunerações, nota-se diminuição do peso do salário nas rendas nacionais, eliminação dos ajustes automáticos dos salários de acordo com os índices de inflação, descentralização das esferas de negociações salariais, desenvolvimento de várias formas de remuneração sem o caráter jurídico de salário (participação nos lucros, distribuição de ações etc.), desoneração dos encargos sociais e avanço da remuneração variável. Importa destacar também as mudanças dos sistemas normativos nacionais, que passaram a ser menos coercitivos e mais diversificados. Tem-se, de um lado, a separação entre a lei e a negociação coletiva e, de outro, a divisão de competências entre os diferentes níveis da negociação coletiva (FREYSSINET, 2009).

O novo padrão de trabalho flexível traz à tona outra questão importante que diz respeito à tendência de precarização do trabalho na contemporaneidade. Para Rodgers (1989), a noção de trabalho precário envolve a combinação de vários elementos como instabilidade, ausência de proteção, insegurança e vulnerabilidade social e/ou econômica. Dessa forma, haveria graus diferentes de precariedade e vulnerabilidade, variando de um grupo de trabalhadores para outro. Os mais vulneráveis e com maior incidência nas ocupações consideradas atípicas seriam as mulheres, os jovens, e os indivíduos com nível educacional e de habilidades inferior à média de seu respectivo grupo (sexo e idade).

Algumas especificidades se destacam nesse processo. Em primeiro lugar, o fato de que essas transformações não ocorreram de maneira homogênea em todos os setores econômicos. Em segundo lugar, a simultaneidade entre a acumulação de processos produtivos antigos (como as formas artesanais de produção e o fordismo) e novos padrões flexíveis de produção. E, em terceiro lugar, a importante contradição estabelecida no processo de incorporação dos trabalhadores no processo produtivo. De um lado, o aumento do

subproletariado e do trabalho precário, com expansão dos contratos temporários, dos subcontratos, dos processos de terceirização, ampliação da jornada, multiplicação de vínculos e tendência de assalariamento. De outro, a demanda por trabalhadores mais qualificados, especializados e intelectualizados, capazes de se adequar ao novo padrão tecnológico e de dar respostas satisfatórias aos novos desafios colocados. Portanto, amplia-se “(...) a qualificação profissional necessária ao trabalho, mas também a desvalorização do trabalho e o desemprego” (PEDUZZI, 2002; p. 77).

O impacto da reestruturação produtiva sobre o setor de serviços constitui-se em uma literatura ainda restrita e com interpretações até certo ponto ambíguas. A seguir são apresentados os principais aspectos destacados por essa literatura.

No que diz respeito à organização do trabalho no setor de serviços, ocorre, no período recente, a expansão da padronização de algumas atividades, como os serviços de alimentação estilo fast food. As rotinas criadas se efetivam com o auxílio de diversos mecanismos de controle, como a cobrança de gerentes e treinadores, as imposições dos regulamentos da empresa e, até mesmo, o julgamento e a avaliação dos clientes. Em segmentos onde a possibilidade de padronização é mais restrita, como no caso do setor de vendas, uma das soluções propostas tem sido a realização de treinamentos com técnicas que façam com que o trabalhador identifique seus interesses com os da empresa, ajustando sua personalidade, suas atitudes e o próprio processo de venda a esses interesses (ANTUNES, 2011).

O avanço da racionalização das atividades terciárias é reflexo da necessidade de diminuição de custos e melhoria do nível de produtividade no contexto da reestruturação produtiva. Offe (1991)18 apresenta três possibilidades utilizadas pelas empresas para minimizar seus custos. A primeira seria a promoção do avanço da mecanização, com a introdução de máquinas que permitem menor utilização da força de trabalho e maior rendimento. A segunda seria a implementação de mudanças organizacionais, com o objetivo de ampliar ao máximo a capacidade de trabalho dada. E a terceira trata da externalização das atividades para outros agentes ou instituições, fenômeno conhecido atualmente como terceirização.

A consequência dessa configuração do setor de serviços para os usuários é, principalmente, o aumento dos preços e do número de autosserviços. Para os trabalhadores, porém, os efeitos são um pouco dúbios. Em termos do volume de emprego, espera-se uma

18 OFFE, C. Trabalho e sociedade: problemas estruturais e perspectivas para o futuro da sociedade do trabalho.

expansão de vagas, principalmente dos trabalhos mais qualificados. Contudo, é possível que a racionalização econômica favoreça uma redução dos postos de trabalho em geral. No que diz respeito à qualidade do trabalho, de um lado há a desqualificação técnica e a intensificação do trabalho e, de outro, há o aumento da demanda por trabalhadores mais qualificados. Já em relação à remuneração, o setor de serviços tende a agregar trabalhadores com níveis salariais mais baixos, inclusive por empregar em maior quantidade grupos mais vulneráveis, como mulheres e idosos (PIRES, 1996).

Bolaño e Silva (2005) reforçam a ideia da existência de diferenciação crescente entre trabalhadores menos qualificados e menos bem remunerados, e profissionais mais intelectualizados com melhores salários no setor de serviços. Há segmentos modernos, intensivos em capital e que demandam trabalhadores com alto nível de especialização, enquanto ainda permanecem existindo setores mais tradicionais, intensivos em trabalho, e que tendem a absorver o excedente de mão-de-obra do mercado de trabalho em geral.

Antunes (2011) destaca que, nos Estados Unidos, a tendência dos últimos anos é de baixa remuneração dos trabalhadores do setor, configurando uma nova sociedade de classe média baixa. Esse fator é agravado pela permanência de uma mão-de-obra excedente, já que a manutenção de jornadas elevadas não abre espaço para a redistribuição do trabalho.

Nos 40 maiores grupos ocupacionais dos EUA (...), tem-se 18 estritamente nos serviços finais (saúde, alimentação, professores, serviçais em geral etc.), no qual a larga maioria não precisa de ensino superior, tem pouca estabilidade e recebe salário médio de US$ 33.147,25, quase um terço abaixo da renda per capita (rpc) dos EUA (US$ 46.904,00). Dentre estas ocupações, 28 grupos têm rendimento abaixo de metade da rpc e apenas 7 estão acima dela. (...) entre as 30 ocupações com maior expansão do volume de emprego, apenas 7 precisam de diplomas de graduação e 23 não necessitam de mais que treinamento no trabalho, além de dar pouca ou nenhuma possibilidade de ascensão profissional (...) (ANTUNES, 2011; p. 128).

A baixa remuneração e as condições ruins de trabalho são agravadas pela tendência de baixa sindicalização do setor de serviços. A dispersão dos trabalhadores em diversos locais, a elevada taxa de rotatividade, o perfil heterogêneo destes trabalhadores e o clima de competição em detrimento da solidariedade de classe entre eles tornam difícil a associação destes profissionais para defesa de interesses coletivos (ANTUNES, 2011).

Em suma, as atividades do setor de serviços expandiram-se significativamente ao longo do século XX, contribuindo de maneira decisiva para a geração de riqueza e de postos de trabalho. O setor apresenta especificidades em relação ao formato de organização do trabalho e de acumulação de capital, mas foi influenciado pelas práticas tayloristas e fordistas e, atualmente, está sujeito ao processo de reestruturação produtiva e à nova onda de inovações tecnológicas (PIRES, 1996). As consequências desse processo ainda não se mostraram claras,

mas muitos autores apontam tendências como a desregulamentação das relações de trabalho, o aprofundamento da heterogeneidade entre os trabalhadores e o achatamento de rendimentos.

Assim como ocorre no setor de serviços em geral, os impactos do processo de reestruturação produtiva e da consolidação do novo padrão flexível de produção sobre o trabalho no setor saúde ainda não são totalmente compreensíveis. Mas, há pistas importantes relacionadas a mudanças organizacionais e gerenciais e à incorporação de inovações tecnológicas.

O cenário de busca por ganhos de produtividade e redução de custos em prol da valorização do capital é evidenciado por Souza (2010), que descreve como a lógica de mercado contaminou o setor de serviços públicos e, especialmente, o setor saúde. O novo padrão de regulação estatal trouxe importantes inovações para o setor saúde, com a consolidação de novas práticas de gestão nos hospitais e nas instituições de saúde em geral, e de novas modalidades de prestação de serviços (públicos e privados).

Ocorreram transformações importantes também nos processos de negociação coletiva, fonte predominante de determinação de remunerações na área da saúde. No Reino Unido, onde o sistema público de saúde de referência internacional também não escapou às transformações em curso, houve um processo de descentralização destas negociações e de criação de entidades autônomas, que passaram a defender apenas incentivos de caráter individual relacionados a qualificação, tempo de profissão, produtividade etc.

Como consequência do avanço da flexibilização e dos novos arranjos de gestão e regulação propostos, no setor de saúde em geral houve precarização das condições de trabalho, redução do poder dos trabalhadores e do nível de profissionalização, e destruição das instituições laborais relacionadas à gestão do processo de trabalho (BRITO et al.; 20_).

O trabalho em saúde passou a enfrentar “(...) não só uma desregulamentação das relações e condições de trabalho, mas uma desestruturação da atividade em saúde que envolve o trabalhador de saúde e os usuários do serviço” (SOUZA, 2010; p. 342).

O processo de desvalorização do trabalho em saúde

(...) se expressa através de problemas como: a desestruturação no planejamento dos serviços, a descontinuidade dos programas assistenciais, a intensificação da jornada de trabalho pela adoção dos múltiplos vínculos, as baixas remunerações, a alta rotatividade, a inadequação de pessoal e as precárias condições de trabalho que comprometem uma intervenção qualificada e põem em risco a vida dos usuários (SOUZA, 2010; p. 342).

Nesse contexto, os trabalhadores da saúde passaram a ser apenas parte de um processo produtivo, e os serviços de saúde apenas uma ferramenta ou mercadoria para elevar

a produtividade, descolados, portanto, das necessidades sociais e epidemiológicas vigentes (SOUZA, 2010).

No que tange às inovações tecnológicas, nota-se que a promoção destas se tornou uma necessidade primordial para as organizações de assistência à saúde. O cenário atual é marcado pelos custos crescentes com os cuidados em saúde e por uma transição demográfica que tende a pressionar a oferta de serviços de saúde. Devido a isso, os sistemas de saúde precisam obter o equilíbrio entre controle de custos e garantia da qualidade do cuidado a partir da melhor escolha entre as opções de diagnóstico e tratamento.

As inovações no setor de saúde podem ser traduzidas em novos produtos, processos ou estruturas. Os primeiros são os novos bens ou serviços disponíveis, como medicamentos ou equipamentos para diagnósticos e tratamentos de saúde. Novos processos significam novas formas de produção ou de prestação de serviços e, normalmente, estão associadas a mudanças no padrão de exercício do trabalho dos profissionais de saúde. Já a “inovação estrutural geralmente afeta a infraestrutura interna e externa, e cria novos modelos de negócios” (OMANOCHU, EINSPRUCH, 2010; p. 5).

As tecnologias de base microeletrônica chegaram ao setor saúde no fim do século XX e representam tanto a introdução de equipamentos inéditos, quanto o aperfeiçoamento de equipamentos já existentes e utilizados anteriormente (PEDUZZI, 2002; PIRES, 1996). Atualmente, vivencia-se a fronteira de um novo paradigma tecnológico, conhecido como a Quarta Revolução Industrial ou indústria 4.0. As biotecnologias, os materiais e as nanotecnologias irão realizar transformações profundas em indústrias e setores, entre os quais o da saúde (IEDI, 2017). Além disso, para muitos autores, a grande mudança que ocorrerá nos próximos anos dar-se-á pela incorporação crescente da Inteligência Artificial (IA) no setor saúde, e pelas consequentes alterações inéditas nos padrões dos produtos, processos e estruturas em saúde (LOBO, 2018)19.

Alguns exemplos das novas tecnologias disponíveis no cenário atual com impacto significativo sobre a oferta de serviços de saúde são:

O uso de robôs em terapia de reabilitação para vítimas de acidente vascular cerebral; o sistema cirúrgico (“Da Vinci Surgical System”) que permite aos médicos realizar procedimentos minimamente invasivos, principalmente no tratamento de condições urológicas e ginecológicas; o Sistema de Radiocirurgia Estereotática CyberKnife que é usado pelos médicos para aplicar altas doses de radiação com grande precisão, permitindo cirurgias sem incisões para tumores previamente inoperáveis; o sistema CT Feixe Cônico Sinérgico da Elekta que permite aplicar a radioterapia guiando-se por uma imagem em 3D do paciente, facilitando a detecção de mudanças muito

19 Trata-se de um segmento da ciência da computação que utiliza algoritmos para identificar problemas e

pequenas de posição que podem ser corrigidas antes do tratamento, (...) usado principalmente para tratar câncer de próstata e câncer de cabeça e pescoço; a terapia de ablação transformou o que 20 anos atrás era um risco, uma cirurgia invasiva de coração aberto para o tratamento de distúrbios do ritmo cardíaco, num procedimento que leva horas e tem uma taxa de sucesso de 95%. A terapia pode corrigir definitivamente um batimento cardíaco irregular, possivelmente substituindo desfibriladores e marca-passos (OMANOCHU, EINSPRUCH, 2010; p. 7 e 8).

A evolução dos processos de saúde estará centrada na utilização combinada das tecnologias de informação e comunicação (TIC) com a IA, o que poderá acarretar, em um período próximo, transformações substanciais na oferta de serviços de saúde, contribuindo para maior efetividade de diagnósticos e tratamentos. Prontuários eletrônicos interconectados, baseados em tecnologias industriais-padrão e em modelos de dados, permitirão que médicos e os próprios pacientes tenham acesso seguro aos respectivos históricos de saúde. A telerradiologia tornará possível o acesso ao resultado de um raio X realizado em local diferente de onde se encontra o paciente20. Dessa forma, profissionais poderão trocar informações em diferentes localidades e realizar diagnósticos remotos. O avanço da telemedicina, portanto, além de possibilitar a ampliação do acesso aos serviços de saúde e um menor tempo de permanência nos hospitais (como o hospital-dia), poderá abrir espaço para o avanço da prestação de serviços em outros ambientes, como a realização de cirurgias em ambulatórios e a oferta de cuidados domiciliares (COSTA et al., 2013; OMANOCHU, EINSPRUCH, 2010).

A maior resolutividade da atenção domiciliar é evidenciada pela possibilidade de pacientes com doenças crônicas (como problemas cardíacos, hipertensão, diabetes etc.) conseguirem monitorar seus respectivos estados de saúde em suas próprias residências, graças à utilização de um computador simplificado e de um software da Intel. O computador “(...) se conecta a dispositivos médicos, tais como balanças, monitores de pressão arterial e leitores de glicose, registrando e gravando informações que podem ser compartilhadas com os profissionais de saúde por meio da Internet” (OMANOCHU; EINSPRUCH, 2010, p. 8).

Mesmo com o fortalecimento de outros espaços de atenção à saúde, como os atendimentos ambulatorial e domiciliar, e até mesmo a atenção primária21, os hospitais foram e continuarão sendo o principal recinto para a promoção de transformações no conhecimento

20 O problema relacionado ao baixo número de radiologistas no mercado e à necessidade de manutenção

permanente de serviços de imagem nas emergências pode ser amenizado com esta nova tecnologia.

21 Lobo (2018) destaca a possibilidade de fortalecimento da atenção primária através da utilização das novas

tecnologias combinada ao aprofundamento de estudos sobre os determinantes sociais da saúde. Este fenômeno exigiria uma formação mais ampla dos profissionais de saúde, envolvendo os três níveis de atenção. Seria necessário “(...) preparar um profissional com bons conhecimentos de ciências básicas, incluindo biologia celular, molecular e genética, cursos de fisiopatologia de sistemas orgânicos e determinantes biológicos e sociais das doenças, integrando ciências básicas, clínicas e sociais”, os três pilares principais da nova educação médica (LOBO, 2018; pg. 7).

e para a concentração de novas tecnologias e profissionais especializados. Não é à toa que metade dos gastos totais dos sistemas de saúde está concentrada nessas instituições (COSTA; BAHIA, 2015; GADELHA, 2012). O que se propõe é um processo de reestruturação que envolve as atribuições primordiais dos hospitais, seu tamanho e sua distribuição geográfica. Os hospitais devem usufruir cada vez mais de economias de escopo, concentrando suas atividades nos maiores níveis de complexidade da atenção e na realização de projetos de investigação clínica, epidemiológica e administrativa (COSTA et al., 2013; p. 128).

No cenário da indústria 4.0, um estudo do McKinsey Global Institute (2017) evidencia a tendência de automatização das funções nos hospitais. Não só das atividades administrativas e de rotina, como registro e saída de pacientes, mas também das funções dos profissionais da saúde, por meio, por exemplo, do desenvolvimento de dispositivos que acompanham os sinais vitais do paciente e emitem diagnósticos rápidos, o que poderia aliviar a carga de trabalho do pessoal de enfermagem, e da racionalização dos testes de laboratório, que seriam mais ágeis e incluiriam a geração de relatórios. Tal contexto transformaria ainda mais a relação de médicos e enfermeiros com as tecnologias, exigindo uma nova postura destes profissionais, o desenvolvimento de novas habilidades e conhecimentos e uma relação de confiança e reciprocidade com os sistemas automatizados.

Além de novos produtos e procedimentos, a nova fronteira tecnológica permitirá que a Medicina avance na base de suas pesquisas e no conhecimento acumulado, evoluindo do método de “tentativa e erro” para uma total “(...) compreensão de como o mecanismo molecular de uma determinada doença se comporta e como ele pode ser objeto de intervenção” (IEDI, 2017; p. 8). Dessa forma, a medicina preventiva e baseada em evidências tenderá a ganhar importância, em detrimento da atual lógica curativa e de alto custo. Para Lobo (2018), o uso da IA propiciará o armazenamento e a análise, em escala sem precedentes, de bases de dados de saúde, fenômeno conhecido como big data. Diante desse cenário, a resolutividade dos diagnósticos e a eficácia da proposição de tratamentos serão muito superiores aos padrões atuais. Para o autor, a utilização inteligente destas bases de dados,