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O reflexo da semântica

No documento carolinaorlandobastos (páginas 54-57)

2. O MÉTODO DE ANÁLISE DA LINGUAGEM EM FREGE PARA UMA LEITURA

2.1. A estrutura da linguagem com vistas à sua funcionalidade em Frege

2.1.1. O reflexo da semântica

A semântica de Frege é resultado da linguagem aritmética, pois, anteriormente, a linguagem era classificada como natural e cotidiana. Os filólogos passaram a se preocupar com uma linguagem capaz de exprimir o trabalho científico, ou seja, cientificista, que se baseasse em um pensamento rigoroso. Essa nova perspectiva da linguagem originou uma nova semântica, chamada de contemporânea. Com a linguagem ordinária, o objetivo de apresentar um pensamento mais rigoroso era impossível, pois a representação era subjetiva153,

havia apenas os fatos psicológicos que se ocupavam, exclusivamente, com as representações, ou seja, com as ideias guardadas na memória por meio das recordações e das impressões

151 “A impossibilidade do erro lógico, de fato de toda linguagem, enquanto capacitada a exprimir pensamentos, estar imunizada contra isso, revela para onde apontam as concepções fregeanas da prioridade do pensamento, do juízo como reconhecimento da verdade de um pensamento e da verdade como caracterizando a mesma natureza da lógica. A gramática lógica, os princípios que dão conta da natureza intrinsecamente judicativa do pensamento e que, por isso mesmo, configuram o coração da lógica, constitui, ainda que não apenas ela, a gramática de qualquer linguagem” LOUZADO, G. L. Frege: lógica e linguagem.

Analytica, Rio de Janeiro, v. 3, n. 2, p. 219, 1998.

152 “A linguagem comum é acusada apenas de ter uma coordenação gramatical que não atende aos, por assim dizer, interesses exclusivos da lógica. […] A conceitografia fregeana, se merece alguma crítica, merece por ter características estruturais que divergem de sua inexplicável estrutura interna. Ser assim divergente é ser tal que a estrutura não resulta claramente revelada nas sentenças conceitográficas. É usar um mesmo sinal para diferentes símbolos e, por conseguinte, não marcar claramente os lugares de argumento. É permitir que contra-sensos (por não termos atribuído um conteúdo ao signo usado do modo distinto do que foi concebido para ser usado) ocorra”. Id. Ibid. p. 220.

153 SOUZA, L. O. Wittgenstein e a concepção agostiniana da linguagem. Paraná: Pontifícia Universidade

Católica do Paraná. 2007. p. 65. Disponível em:

<http://www.biblioteca.pucpr.br/tede//tde_busca/arquivo.php?codArquivo=1124> acesso em: dezembro de 2012. (dissertação de mestrado).

sensíveis.

Então, podemos afirmar que, na época de Frege, a linguagem utilizada era a apresentada por Agostinho. O sentido de uma palavra se referia ao objeto designado e ao valor de verdade que condizia com a realidade. Por isso, o lógico explicita que essa perspectiva se insere no velho problema ontológico, que consiste em afirmar que falar significa remeter a algo. Caso não ocorresse dessa forma, estaríamos presos a uma contradição.

Frege era um lógico que se preocupava em estudar a matemática, por isso utilizava conceitos lógicos para explicitar os princípios aritméticos e, futuramente, os linguísticos. A partir dessa preocupação, faria uma reviravolta na análise da linguagem, pois iniciou seus estudos nesse tema analisando os conteúdos proposicionais, ou seja, a relação e a distinção entre a referência e o significado154.

A proposta da linguagem realizada por Frege criou um novo paradigma na filosofia, pois buscava a solução dos problemas filosóficos através do uso da própria linguagem. Primeiro, pode-se perceber que ela – a linguagem – pode nos causar enganos, levando-nos a falsas interpretações e fundamentações. Por exemplo, vale ressaltar a maneira como Gottfried expõe sua percepção de que há quatro significados diferentes para a palavra ser (verbo) na linguagem cotidiana.

A primeira de forma subsunção, quando dizemos “Platão é um filósofo”; A segunda como identidade, ao dizermos “A Estrela da manhã é o planeta Vênus”;

A terceira é a subordinação ao afirmarmos que “O cavalo é um animal herbívoro”;

E a quarta é quando usamos uma expressão de existência do tipo “Deus é”; Por isso a necessidade da análise lógica proposta por Frege, pois há nesses enunciados um mau uso ou abuso da palavra é. Existe aqui uma transgressão do uso da palavra em questão. Nos três primeiros exemplos notamos a existência de uma certa confusão devido a falta de clareza da função ou do conceito da palavra “é” e no último caso um forçoso uso do conceito de existência. Para Gottfried a saída poderá ser efetivada na mudança do foco. Em vez de se dirigir a atenção para as coisas (supostamente existentes) o cuidado deve se voltar para a análise do discurso155.

Na asserção, a existência do objeto é pressuposta, pois é uma propriedade real. Diante

154 A lógica tradicional estava interessada apenas na relação atributiva, enquanto que a moderna se ocupava da relação do estado das coisas, pois se investigamos apenas a relação sujeito e predicado, acabamos no paradoxo de identidade.

disso, Frege156 se ocupou em investigar proposições que indicam generalidade para distingui-

las. Busca-se aqui uma diferenciação entre quando falamos do indivíduo e das funções generalizadas – que podem ser classificadas em duas formas sequenciais:

a) as funções de primeira ordem e, b) as funções de segunda ordem. Vejamos a primeira delas: Proposições do tipo “Joaquim é um homem”, “Bonifácio é um homem”, “Salvador é um homem”, obedecem todas a um mesmo padrão por terem o mesmo núcleo, o predicado da proposição '… é um homem'. E, por necessidade lógica, cada proposição tem um valor de verdade, o “V” ou o “F”, conforme o caso de cada uma.

Visto o primeiro caso (de individuais), passamos ao segundo (de generalidade), que é uma extensão ou possibilidade de extensão do primeiro que são as funções de segunda ordem. Esta, por sua vez se divide em “quantificador universal todos” e o “quantificador existencial alguns”. Esta, para receber o valor de verdade requer que seja analisado cada caso dos individuais que a compõe, já que esta por ser geral é composta por várias funções de primeira ordem. Portanto, neste caso, uma proposição do tipo “todos os homens” só será verdadeira se e somente se cada função de primeira ordem for verdadeira157.

Portanto, ao falarmos de valor semântico do nome próprio, estamos inferindo que o objeto exista. Caso contrário, estaríamos falando do valor semântico de um quantificador, em que não se implica a existência do objeto, apenas sua relação com a linguagem. Esse último valor é caracterizado como um desacoplamento da palavra com a coisa158, ou seja, a relação

entre ambas passa a ser mera possibilidade. Por isso, Frege afirmará que muitas expressões têm sentido, mas não têm referência.

Através da proposta apresentada por Frege, a linguagem foi desvinculada da obrigatoriedade de que toda expressão falada tivesse que remeter e retomar ao ser ou a alguma coisa – como um objeto. Por exemplo, através do princípio da diferença intuitiva do pensamento, podemos afirmar que a estrela vespertina e da manhã possuem a mesma referência – o planeta Vênus – mas sentidos diferentes159.

156 Acredita-se que Frege foi o primeiro a investigar esse tipo de proposição.

157 SOUZA, L. O. Wittgenstein e a concepção agostiniana da linguagem. Paraná: Pontifícia Universidade

Católica do Paraná. 2007. p. 39.Disponível em:

<http://www.biblioteca.pucpr.br/tede//tde_busca/arquivo.php?codArquivo=1124> acesso em: dezembro de 2012. (dissertação de mestrado).

158 Cf. If. Ibid. p. 39-50.

159 “É, pois, plausível pensar que exista, unido a um sinal (nome, combinação de palavras, letra), além daquilo por ele designado, que pode ser chamado de sua referência, ainda o que eu gostaria de chamar de o sentido do sinal, onde está contido o modo de apresentação do objeto. […] A referência de 'Estrela da Tarde' e 'Estrela da manhã' seria a mesma, mas não o sentido”. FREGE, G. Lógica e filosofia da linguagem. Tradução: Paulo Alcoforado. São Paulo: Cultrix, 1978. p. 62.

No documento carolinaorlandobastos (páginas 54-57)