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Regime de Casamento e direito dos cônjuges no divórcio e na sucessão

3.3 A sucessão nos negócios agrícolas

3.3.2 Regime de Casamento e direito dos cônjuges no divórcio e na sucessão

No processo de constituição de uma holding familiar em que os bens da família serão integralizados na sociedade, é necessário haver correta avaliação dos direitos e deveres de cada componente da família, por isso a identificação do regime de casamento e a compreensão dos direitos daí advindos é parte integrante do planejamento sucessório.

O regime de casamento escolhido revela, por exemplo, a importância da cláusula de incomunicabilidade quando da doação das quotas da sociedade pelos patriarcas aos herdeiros. Outro aspecto importante é a vedação legal de os cônjuges se tornarem sócios de uma mesma empresa devido ao regime escolhido.

Ainda, no caso da doação, é necessário avaliar corretamente os bens que pertencem a um dos cônjuges e aqueles em que há meação, ou seja, é patrimônio comum do casal. É, portanto, o regime jurídico do casamento que definirá a situação patrimonial do casal, sendo fundamental para os propósitos do planejamento sucessório o conhecimento das consequências de cada um deles.

A legislação brasileira prevê quatro tipos de regime de casamento: comunhão parcial de bens, comunhão universal de bens, separação de bens e participação final nos aquestos.

Segundo Nader (2011, p. 370-371), regime de bens é o estatuto que rege os interesses patrimoniais na constância do casamento, cujos efeitos se fazem notar especialmente em face de eventual ruptura na vida conjugal. O regime dispõe a respeito dos bens existentes à época do consórcio, os adquiridos durante a vida em comum, bem como define o critério de administração dos bens em geral. Como o patrimônio se compõe de ativo e passivo, aquele composto pelas coisas móveis, imóveis, e créditos, e este, pelas obrigações, o regime compreende um e outro.

A escolha do regime de bens a ser seguido durante o casamento cabe ao livre arbítrio das partes, salvo em situações previstas no art. 1.641 do Código Civil:

Art 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento: I. das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento;

II. da pessoa maior de 70 (setenta) anos;

III. de todos que dependerem, para casar, de suprimento judicial.

Nessas situações de separação obrigatória de bens, em caso de falecimento de um dos cônjuges, de acordo com o art. 1.829 do Código Civil, o cônjuge

sobrevivente somente herdará os bens particulares do de cujus caso ele não tenha deixado descendentes, e ainda assim, concorreria com os ascendentes do falecido.

Não se enquadrando nas exceções já citadas, a escolha do regime de bens pelo casal é livre. Eventual alteração posterior somente é permitida mediante autorização judicial, conforme previsão expressa no art. 1.639 do Código Civil:

Art 1.639. É ilícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver.

§1º O regime de bens entre os cônjuges começa a vigorar desde a data do casamento.

§2º É admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros.

Por esse motivo, revela-se importante a avaliação cuidadosa dos regimes de bens disponíveis e das consequências nas relações econômicas dos cônjuges previamente à celebração do casamento, visto que eventual alteração no regime demandará autorização judicial, acarretando custos e enfrentamento de procedimentos burocráticos por parte do casal.

O art. 1.640 do Código Civil dispõe que “não havendo convenção, ou sendo ela nula ou ineficaz, vigorará, quanto aos bens entre os cônjuges, o regime da comunhão parcial”. Dessa forma a regra geral é mais justa segundo o senso comum, pois privilegia o esforço de cada um dos cônjuges na aquisição do patrimônio.

A comunhão do patrimônio comum atende a certa lógica e dispõe de um componente ético: o que é meu é meu, o que é teu é teu, e o que é nosso, metade de cada um. Assim, resta preservada a titularidade exclusiva dos bens particulares e garantida a comunhão do que for adquirido durante o casamento. Nitidamente, busca evitar o enriquecimento sem causa de qualquer dos cônjuges. O patrimônio familiar é integrado pelos bens comuns, que não se confundem com os bens particulares e individuais dos sócios conjugais. Comunica-se apenas o patrimônio amealhado durante o período do convívio, presumindo a lei ter sido adquirido pelo esforço comum do par (DIAS, 2015, p. 315).

Além disso, o Código Civil prevê algumas exceções à essa regra:

Art. 1.659. Excluem-se da comunhão:

I - os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar;

II - os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares;

III - as obrigações anteriores ao casamento;

IV - as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal;

V - os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão; VI - os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;

VII - as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.

Conforme a letra fria da lei, no art. 1.829 do Código Civil, e o entendimento da terceira turma do Superior Tribunal de Justiça, mesmo no regime de comunhão parcial de bens, o cônjuge sobrevivente tem direito, em concorrência com os descendentes do de cujus, a seus bens particulares:

Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:

I - aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares;

II - aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge; III - ao cônjuge sobrevivente;

IV - aos colaterais.

Por meio do pacto antenupcial os nubentes podem estipular que o regime matrimonial de bens será o da comunhão universal, pelo qual não só todos os seus bens presentes ou futuros, adquiridos antes e depois do matrimônio, mas também as dívidas passivas se tornam comuns, constituindo uma só massa. Instaura-se o estado de indivisão, passando a ter cada cônjuge o direito à metade ideal do patrimônio comum, logo, nem mesmo poderão formar, se quiserem contratar, sociedade entre si, conforme disposto no art. 977 do Código Civil. Logo, nenhum dos consortes tem metade de cada bem, enquanto durar a sociedade conjugal, e muito menos a propriedade exclusiva de bens discriminados, avaliados na metade no acervo do casal. Estes bens compenetram-se de tal maneira que, com a dissolução da sociedade conjugal, não se reintegram ao patrimônio daquele que trouxe ou os adquiriu (DINIZ, 2015, p. 196-197).

A comunhão universal de bens está prevista no art. 1.667 do Código Civil, na qual ocorre a comunicação integral dos bens do casal, excetuados aqueles descritos no art. 1.688 do mesmo diploma legal:

Art. 1.668. São excluídos da comunhão:

I - os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar;

II - os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva;

III - as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum;

IV - as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade;

V - Os bens referidos nos incisos V a VII do art. 1.659.

Nesse regime, no caso de falecimento de um dos cônjuges, o cônjuge sobrevivente manterá sua meação sobre os bens do casal, ao passo que a outra metade será destinada aos herdeiros na ordem definida pelo art. 1.829 do Código Civil.

Por sua vez, sendo a separação de bens o regime convencionado pelas partes e não fruto de imposição legal, o cônjuge sobrevivente herdará em concorrência com os descendentes.

Por fim, tem-se o regime de participação final nos aquestos, raramente visto, cuja definição consta no art. 1.672 do Código Civil, que dispõe:

Art. 1.672. No regime de participação final nos aqüestos, cada cônjuge possui patrimônio próprio, consoante disposto no artigo seguinte, e lhe cabe, à época da dissolução da sociedade conjugal, direito à metade dos bens adquiridos pelo casal, a título oneroso, na constância do casamento.

Na hipótese de dissolução conjugal deve ser procedida a divisão dos aquestos na forma do art. 1.674 do Código Civil:

Art. 1.674. Sobrevindo a dissolução da sociedade conjugal, apurar-se-á o montante dos aqüestos, excluindo-se da soma dos patrimônios próprios: I - os bens anteriores ao casamento e os que em seu lugar se sub-rogaram; II - os que sobrevieram a cada cônjuge por sucessão ou liberalidade; III - as dívidas relativas a esses bens.

Parágrafo único. Salvo prova em contrário, presumem-se adquiridos durante o casamento os bens móveis.

Por outro lado, na hipótese de falecimento de um dos cônjuges, o cônjuge sobrevivente é herdeiro em concorrência com os descendentes, conforme interpretação literal do art. 1.829 do Código Civil.

Cabe mencionar ainda, que caso a situação fática configure a união estável, os direitos e deveres dos cônjuges se assemelham aos decorrentes do matrimônio em regime de comunhão parcial de bens, salvo estipulação diversa em contrato.

Dessa forma, a adoção de qualquer dos regimes traz consequências quando se analisa o planejamento sucessório, uma vez que a doação de bens e a herança poderão comunicar ou não ao cônjuge, conforme o caso.

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