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REGIMENTOS INTERNOS A PARTIR DA EMENDA DE 1957 E

A já citada modificação do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal,

ocorrida em 1957 e que lhe acrescentou o capítulo V-A, tem caráter decisivo para a

definição, à época, de qual seria a natureza jurídica do instituto da Reclamação. Isso

porque, não apenas ensejou a superação dos anteriores entendimentos (de alguns

ministros) de que não seria admissível Reclamação por não figurar ela da

sistemática processual positivada, como também, em sua justificação

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, explanou se

tratar de medida correicional, portanto administrativa.

67 RECURSOS. PRECEITOS PROCESSUAIS IMPROPRIOS DE LEIS DE ORGANIZAÇÃO

JUDICIÁRIA DOS ESTADOS. REJEIÇÃO DE EMBARGOS. (RE 11543, Relator(a): Min. OROZIMBO NONATO, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/09/1953, ADJ DATA 22-06-1950 PP-01902)

68 ADINs 2.212 e 2.480, p. ex.

Tal mudança, como ressalta Mendes

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, foi encabeçada pelos ministros

Lafayette de Andrade e Ribeiro da Costa, que já haviam esposado entendimento

neste sentido

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.

Com a Constituição Federal de 1967, foi atribuída - pelo parágrafo único,

alínea "c", do artigo 115

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de seu texto original - à Suprema Corte competência em

matéria processual, elevando seu Regimento Interno ao status de lei: haveria ele de

regular o processo e o julgamento dos feitos de sua competência originária ou

recursal. Essa foi a lição do professor e ministro Alfredo Buzaid

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:

O Supremo Tribunal Federal legisla, nas matérias de sua competência, através do ‘regimento interno’. O Regimento é um conjunto de normas que disciplinam a economia interna de um órgão. Encarado como lei orgânica dos tribunais, a sua missão consiste, em grande parte, em regulamentar atos que escapam ao regime dos Códigos. Mas, na verdade, não é desse tipo de regimento que a Constituição do Brasil cuida no art. 115, parágrafo único, letra "c". Este preceito outorgou ao Supremo Tribunal Federal atribuição privativa para estabelecer o processo e o julgamento bem como os recursos nos casos de sua competência originária. O que distingue o tipo comum de regimento interno daquele que foi definido no art. 115, parágrafo único, da Constituição do Brasil é precisamente seu conteúdo. Enquanto no regimento interno comum a matéria concerne ao funcionamento normal dos trabalhos, o regimento interno, que o Supremo Tribunal foi autorizado a baixar, reúne regras de caráter eminentemente legislativo. Em uma palavra, o regimento tem o valor de lei.

Por conseguinte, a questão da essência da Reclamação, que nunca havia

sido verdadeiramente pacificada, permanecendo, como visto, profunda dissidência

entre os ministros durante todo o período em que fora debatida a matéria, ganhou

70 A reclamação foi adotada pelo Regimento Interno do STF em 02.10.1957, dentro da competência

que lhe dava a Constituição de 1946, em seu art. 97, II, quando foi aprovada proposta dos Ministros Lafayette de Andrada e Ribeiro da Costa, no sentido de incluir o instituto no RISTF, em seu Título II, Capítulo V-“A”, intitulado “Da Reclamação”. (MENDES, ob. cit., p.22)

71 Ementa: Reclamação. Trata-se de procedimento sumário pelo Supremo Tribunal Federal, de acôrdo

com a sua competência construtiva, compreendendo faculdade corregedora, tendente a corrigir excessos, abusos e irregularidades, com a finalidade de manter em sua inteireza e plenitude, o prestigio da autoridade, a supremacia da lei, a ordem processual e a força da coisa julgada. Na hipótese, ocorre ofensa à coisa julgada, constituida por decisão do Supremo Tribunal, já em fase executória. O mandado de segurança é inidôneo, liminarmente deferido, como meio de rescindir a coisa julgada. No processo da reclamação, a parte interessada é o requerente e aquela contra a qual se reclama. (Rcl 315 primeira, Relator(a): Min. RIBEIRO DA COSTA, TRIBUNAL PLENO, julgado em 31/05/1957, DJ 04-07-1957 PP-07967 EMENT VOL-00303-02 PP-00873)

72 Art 115 - O Supremo Tribunal Federar funcionará em Plenário ou dividido em Turmas.

Parágrafo único - O Regimento Interno estabelecerá:

a) a competência do plenário além dos casos previstos no art. 114, n.º I, letras a, b , e, d, i, j e l , que lhe são privativos;

b) a composição e a competência das Turmas;

c) o processo e o julgamento dos feitos de sua competência originária ou de recurso;

d) a competência de seu Presidente para conceder exequatur a cartas rogatórias de Tribunais estrangeiros.

novo fôlego, encorpando teses e variando correntes. Neste sentido, vale se referir à

Reclamação 831/DF

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onde, desde sua ementa, restou entendida não mais como

procedimento administrativo, mas como verdadeiro recurso:

RECLAMAÇÃO. NATUREZA JURÍDICA. CABIMENTO. PRESSUPOSTOS. FINALIDADE. 1. A FINALIDADE DA RECLAMAÇÃO E A DE PRESERVAR A INTEGRIDADE DA COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL OU ASSEGURAR A AUTORIDADE DO SEU JULGADO. 2. TERMINADA A INSTÂNCIA, ISTO E, ENTREGUE A PRESTAÇÃO JURISDICIONAL E POSTO TERMO A RELAÇÃO PROCESSUAL, NÃO SE HÁ COMO FALAR EM RECLAMAÇÃO. 3. SÃO PRESSUPOSTOS DA RECLAMAÇÃO: A) A EXISTÊNCIA DE UMA RELAÇÃO PROCESSUAL EM CURSO; E B) UM ATO QUE SE PONHA CONTRA A COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL OU CONTRARIE DECISÃO DESTE PROFERIDA NESSA RELAÇÃO PROCESSUAL OU EM RELAÇÃO PROCESSUAL QUE DAQUELA SEJA DEPENDENTE. 4. NÃO CABE RECLAMAÇÃO, UMA VEZ QUE NÃO HAJA ATO PROCESSUAL CONTRA O QUAL SE RECORRA, MAS UM ATO ADMINISTRATIVO, QUE, SE VIOLENTO OU ILEGAL, TEM POR REMEDIO AÇÃO PROPRIA, INCLUSIVE O MANDADO DE SEGURANÇA. 5. RECLAMAÇÃO NÃO CONHECIDA.

Aponte-se que o ministro relator, reconhecendo a controvérsia que envolve a

questão, propôs solução que, contudo, sequer cogitou da hipótese de se tratar a

reclamação de mero procedimento administrativo:

Mas perdura a difícil questão: a reclamação é ação ou recurso? No regime anterior ao Regimento vigente, não se definiu a natureza jurídica da reclamação. Para o eminente Min. Orosimbo Nonato, tratava-se de um remédio incomum. (...).

Na Reclamação n. 315, relatada pelo eminente Min. Ribeiro da Costa, se conceituou a reclamação como "procedimento sumário admitido pelo Supremo ... coisa julgada" (CORDEIRO DE MELO, p. 282)

Na linguagem dessas afirmações e no seu conteúdo, que não primam pelo selo da técnica processual, em que os eminentes Ministros eram mestres, sente-se o receio de encarar-se o verdadeiro tema: é a reclamação ação ou recurso?

É de se reparar que o eminente relator afastou a possibilidade de a

reclamação ser classificada como algo que não ação ou recurso sem qualquer

justificativa para tanto, apenas afirmando que as teses que cogitavam se tratar de

remédio sui generis ou de "procedimento sumário admitido pelo Supremo" não

primariam pelo selo da técnica processual. Contudo, ao desenvolver sua tese, chega

a tocar a possibilidade de se tratar de procedimento correicional, afastando-a

74 Rcl 831, Relator(a): Min. AMARAL SANTOS, Tribunal Pleno, julgado em 11/11/1970, DJ 19-02-

unicamente como consequência de considerar a reclamação recurso (em espécie, a

nosso ver, de petição de princípio):

Tais pressupostos [citados na ementa] me levam a configurar a reclamação muito mais aproximada de um recurso que da ação. Reclama- se, recorre-se contra um ato da relação processual em curso.

(...)

A reclamação se destina a atacar um ato processual, ou seja, uma decisão interlocutória que desnature a competência do Supremo Tribunal Federal ou desconheça, ou ofenda, a autoridade de sua decisão na relação processual.

Bem por isso, eu entendo que a correição parcial, criada pelas legislações estaduais não sendo um recurso é, entretanto, um sucedâneo dos recursos, nascido da necessidade de se atacarem certas decisões contra as quais a lei processual não deu recurso. e entendo que a reclamação de nosso Regimento, é recurso criado pelo Supremo, agora com apoio na Constituição, art. 120, parágrafo único, letra c.

Contudo, ainda que suas conclusões tenham sido acompanhadas

unanimemente pelo plenário da Corte, seus fundamentos não foram reconhecidos

por todos os ministros, a exemplo do ministro Luiz Gallotti, que ressalvou:

Sr. Presidente, acompanho o eminente relator apenas na conclusão. S. Exa. faz alusão a Philadelfo de Azevedo, que dissertou sôbre aquela reclamação, que tem parentesco com a correição parcial. Mas esta reclamação, de que cuida nosso Regimento, é muito posterior à morte do saudoso jurista e muito diferente daquela sobre que êle escreveu. A tese do eminente relator é brilhante, mas penso que muito radical.

Data venia, não conheço da reclamação, concordando com a conclusão do voto de S. Exa..

Isto posto, novamente observamos que os julgados aparentam reunir um feixe

de ideias jurídica e sistematicamente incongruentes, com isso, afastando qualquer

possibilidade de delineamento de uma posição ao menos majoritária acerca da

essência da Reclamação.

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