• Nenhum resultado encontrado

Da origem e da admissibilidade da reclamação sucedânea de recurso especial

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Da origem e da admissibilidade da reclamação sucedânea de recurso especial"

Copied!
65
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

VICTOR RIBEIRO DA SILVA MAIA TEIXEIRA

DA ORIGEM E DA ADMISSIBILIDADE DA RECLAMAÇÃO SUCEDÂNEA DE

RECURSO ESPECIAL

NITERÓI

2014

(2)

VICTOR RIBEIRO DA SILVA MAIA TEIXEIRA

DA ORIGEM E DA ADMISSIBILIDADE DA RECLAMAÇÃO SUCEDÂNEA DE

RECURSO ESPECIAL

Monografia apresentada ao Curso de

Graduação em Direito da Universidade

Federal Fluminense, como requisito

parcial para obtenção do grau de

Bacharel em Direito

Orientador: Profº. Gustavo Sampaio

Telles Ferreira

NITERÓI

2014

(3)

VICTOR RIBEIRO DA SILVA MAIA TEIXEIRA

DA ORIGEM E DA ADMISSIBILIDADE DA RECLAMAÇÃO SUCEDÂNEA DE

RECURSO ESPECIAL

Monografia apresentada ao Curso de

Graduação em Direito da Universidade

Federal Fluminense, como requisito

parcial para obtenção do grau de

Bacharel em Direito.

Aprovada em 13 de janeiro de 2014.

BANCA EXAMINADORA

Prof. Dr. GUSTAVO SAMPAIO TELLES FERREIRA – Orientador

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

Prof. Dr. GUILHERME BRAGA PEÑA DE MORAES

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

Prof. Dr. FERNANDO GAMA DE MIRANDA NETO

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

NITERÓI

2014

(4)

AGRADECIMENTOS

À Universidade Federal Fluminense pela

oportunidade e pelo conhecimento.

À minha família pelo apoio e sacrifício.

À Luciana pela paciência, compreensão,

amor e incentivo.

Ao Professor Gustavo Sampaio Telles

Ferreira pelos ensinamentos e preciosa

orientação.

(5)

RESUMO

A presente monografia se debruça sobre a origem do instituto da Reclamação,

analisando detidamente seus precedentes e sua trajetória jurisprudencial e

normativa. Visa cotejar os sucessivos entendimentos das cortes superiores e buscar,

acaso existente, algum parâmetro de coerência e sistematicidade, valendo-se, para

tanto, de paradigmas legais e doutrinários. Culmina na questão relativa à

admissibilidade da Reclamação ao Superior Tribunal de Justiça, proposta contra

acórdão das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Estaduais, e seus hodiernos

contornos.

Palavras-chave: Reclamação (direito constitucional). Superior Tribunal de Justiça

(STJ). Recurso especial. Juizado especial. Admissibilidade.

(6)

ABSTRACT

This monograph purports to address the origins of Complaint as a legal institute

through a close analysis of its precedents and its jurisprudential and normative

trajectory. It aims to collate the successive understandings of higher courts and to

seek parameters of consistency and systematicity, should there be any, by resorting

to legal and doctrinal paradigms. The study culminates in inquiring about the

admissibility of complaints to the Superior Court of Justice as proposed against

rulings by Panels of Appellate Judges in Special State Courts, as well as about their

current outlines.

Key-words: Complaint (constitutional law); Superior Court of Justice (STJ); Special

Appeal; Special Court; Admissibility.

(7)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO... 08

1.DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA... 10

2.DA ORIGEM DA RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL... 18

3.DA NATUREZA DA RECLAMAÇÃO ATRAVÉS DE UMA ÓTICA

JURISPRUDENCIAL... 28

3.1.RECLAMAÇÃO 136/SE... 28

3.2.RECLAMAÇÃO 141/SP... 29

3.3.REGIMENTOS INTERNOS A PARTIR DA EMENDA DE 1957 E

CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1967... 32

3.4.REPRESENTAÇÃO 1.092/DF... 35

3.5.DECISÕES APÓS A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988... 39

3.6.O POSICIONAMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA... 45

3.7.DA RECLAMAÇÃO AO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA COMO

SUCEDÂNEO DO RECURSO ESPECIAL... 48

4.DA QUESTÃO DO CABIMENTO DA RECLAMAÇÃO AO SUPERIOR TRIBUNAL

DE JUSTIÇA COMO SUCEDÂNEO DO RECURSO ESPECIAL... 52

CONCLUSÃO... 57

ANEXO I...62

(8)

INTRODUÇÃO

O Superior Tribunal de Justiça foi criado pela Carta Magna de 1988 com o

intuito de uniformizar a interpretação da legislação federal e dividir com o já então

assoberbado Supremo Tribunal Federal algumas de suas competências,

possibilitando à Corte Suprema se concentrar um pouco mais em seu papel de

Guardião da Constituição.

Dentre suas competências estabelecidas pela Constituição Federal, está

arrolada a para julgar "a reclamação para a preservação de sua competência e

garantia da autoridade de suas decisões

1

", havendo sido distribuídas, apenas no ano

de 2012, 3.329 (três mil trezentas e vinte e nove) destas reclamações

2

.

Tal instituto jurídico, por sua vez, nas palavras abalizadas de Gilmar Ferreira

Mendes

3

:

(...) é fruto de criação jurisprudencial. Afirmava-se que ela decorreria da idéia dos implied powers deferidos ao Tribunal. O Supremo Tribunal Federal passou a adotar essa doutrina para a solução de problemas operacionais diversos. A falta de contornos definidos sobre o instituto da reclamação fez, portanto, com que a sua constituição inicial repousasse sobre a teoria dos poderes implícitos.

O presente estudo pretende avaliar a congruência entre os critérios

constitucionais, legais e doutrinários de admissibilidade da Reclamação para a

preservação da competência e garantia da autoridade das decisões do Superior

Tribunal de Justiça e a prática jurisprudencial recente desta corte.

Para tanto, haverá de repisar questões relativas à origem do Superior

Tribunal de Justiça, à origem da Reclamação, assim como à sua natureza e ao seu

atual regramento, fornecendo, então, ferramentas e subsídios bastantes para a

análise, sob a ótica da coerência e da sistematicidade, dos atuais julgados que

flexibilizam as hipóteses de sua admissão.

1 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado,

1998. Art. 105, I, f

2http://www.stj.gov.br/webstj/Processo/Boletim/verpagina.asp?vPag=0&vSeq=185

3 MENDES, Gilmar Ferreira. A Reclamação Constitucional no Supremo Tribunal Federal: Algumas

(9)

Nossa Corte Superior de Justiça admitiu, nos últimos anos, diversas

Reclamações oriundas dos Juizados Especiais Estaduais, fulcrada unicamente no

entendimento exarado pelo Colendo Supremo Tribunal Federal no julgamento dos

Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário 571.572/BA

4

, relatados pela

ex-ministra Ellen Gracie, onde se declarou:

(...) o cabimento, em caráter excepcional, da reclamação prevista no art. 105, I, f, da Constituição Federal, para fazer prevalecer, até a criação da turma de uniformização dos juizados especiais estaduais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça na interpretação da legislação infraconstitucional.

Teme-se, todavia, que a aplicação do referido paradigma venha a se tornar

panaceia para possibilitar ao Tribunal a apreciação "seletiva" das reclamações a ele

dirigidas, posto que podem encontrar passagem também "quando a decisão

impugnada apresentar sinais de teratologia que justifique a relativização desses

critérios"

5

.

Ora, a "teratologia" não está presente nas hipóteses de cabimento do

Recurso Especial, muito menos da Reclamação, havendo, em análise perfunctória,

clara malversação do instituto, ainda que considerado sua recepção alargada pela

decisão não vinculativa e exarada em controle incidental pelo Supremo Tribunal

Federal.

Através do cotejo de alguns recentes entendimentos de nossa Corte

Superior, pretende-se aqui ressaltar eventuais incoerências capazes de fragilizar

e/ou obscurecer a sistemática da Reclamação.

Outro enfoque a ser desenvolvido neste trabalho é a verificação da

coerência e sistematicidade dos julgados interna e relativamente à natureza jurídica

do instituto, assim como sua inserção no ordenamento jurídico pátrio.

4 RE 571572 ED, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 26/08/2009, DJe-223

DIVULG 26-11-2009 PUBLIC 27-11-2009 EMENT VOL-02384-05 00978 RTJ VOL-00216- PP-00540

(10)

1. DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

O Superior Tribunal de Justiça foi criado pela Constituição Federal

promulgada no ano de 1988, que a ele se referiu em seus artigos 92, II

6

, 104

7

e 105

8

.

É composto por trinta e três ministros escolhidos pelo Presidente da

República, dentre brasileiros com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e

cinco anos, de notável saber jurídico e reputação ilibada, depois de aprovada a

6 CRFB, Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário:

II - o Superior Tribunal de Justiça;

7 CRFB, Art. 104. O Superior Tribunal de Justiça compõe-se de, no mínimo, trinta e três Ministros.

Parágrafo único. Os Ministros do Superior Tribunal de Justiça serão nomeados pelo Presidente da República, dentre brasileiros com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos, de notável saber jurídico e reputação ilibada, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal, sendo: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

I - um terço dentre juízes dos Tribunais Regionais Federais e um terço dentre desembargadores dos Tribunais de Justiça, indicados em lista tríplice elaborada pelo próprio Tribunal;

II - um terço, em partes iguais, dentre advogados e membros do Ministério Público Federal, Estadual, do Distrito Federal e Territórios, alternadamente, indicados na forma do art. 94.

8 CRFB, Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:

I - processar e julgar, originariamente:

a) nos crimes comuns, os Governadores dos Estados e do Distrito Federal, e, nestes e nos de responsabilidade, os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais;

b) os mandados de segurança e os habeas data contra ato de Ministro de Estado, dos Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica ou do próprio Tribunal; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 23, de 1999)

c) os habeas corpus, quando o coator ou paciente for qualquer das pessoas mencionadas na alínea "a", ou quando o coator for tribunal sujeito à sua jurisdição, Ministro de Estado ou Comandante da Marinha, do Exército ou da Aeronáutica, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 23, de 1999)

d) os conflitos de competência entre quaisquer tribunais, ressalvado o disposto no art. 102, I, "o", bem como entre tribunal e juízes a ele não vinculados e entre juízes vinculados a tribunais diversos; e) as revisões criminais e as ações rescisórias de seus julgados;

f) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões; g) os conflitos de atribuições entre autoridades administrativas e judiciárias da União, ou entre autoridades judiciárias de um Estado e administrativas de outro ou do Distrito Federal, ou entre as deste e da União;

h) o mandado de injunção, quando a elaboração da norma regulamentadora for atribuição de órgão, entidade ou autoridade federal, da administração direta ou indireta, excetuados os casos de competência do Supremo Tribunal Federal e dos órgãos da Justiça Militar, da Justiça Eleitoral, da Justiça do Trabalho e da Justiça Federal;

i) a homologação de sentenças estrangeiras e a concessão de exequatur às cartas rogatórias; (Incluída pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

II - julgar, em recurso ordinário:

a) os "habeas-corpus" decididos em única ou última instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão for denegatória; b) os mandados de segurança decididos em única instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando denegatória a decisão;

c) as causas em que forem partes Estado estrangeiro ou organismo internacional, de um lado, e, do outro, Município ou pessoa residente ou domiciliada no País;

III - julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão

(11)

escolha pela maioria absoluta do Senado Federal, na forma do parágrafo único do

aludido artigo 104.

A teor do que dispõe o artigo 27, caput, do Ato das Disposições

Constitucionais Transitórias

9

, foi instalado, na capital federal, sob a presidência do

Supremo Tribunal Federal que, consoante parágrafo primeiro do mesmo artigo,

exerceu, até a referida instalação, as competências a si previstas na Carta

Constitucional anterior

10

:

recorrida:

a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência;

b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal.

Parágrafo único. Funcionarão junto ao Superior Tribunal de Justiça: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

I - a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados, cabendo-lhe, dentre outras funções, regulamentar os cursos oficiais para o ingresso e promoção na carreira; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

II - o Conselho da Justiça Federal, cabendo-lhe exercer, na forma da lei, a supervisão administrativa e orçamentária da Justiça Federal de primeiro e segundo graus, como órgão central do sistema e com poderes correicionais, cujas decisões terão caráter vinculante. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

9 BRASIL. Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Constituição da República Federativa do

Brasil. Brasília, DF, Senado,1998.

10 BRASIL. Constituição (1967). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado,

1967. Artigo 114. - Compete ao Supremo Tribunal Federal: I - processar e julgar originariamente:

a) nos crimes comuns, o Presidente da República, os seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República;

b) nos crimes comuns e de responsabilidade, os Ministros de Estado, ressalvado, o disposto no final do art. 88, os Juizes Federais, os Juízes do Trabalho e os membros dos Tribunais Superiores da União, dos Tribunais Regionais do Trabalho, dos Tribunais de Justiça dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios, os Ministros dos Tribunais de Contas, da União, dos Estados e do Distrito Federal, e os Chefes de Missão Diplomática de caráter permanente;

c) os litígios entre Estilos estrangeiros, ou organismos internacionais e a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

d) as causas e conflitos entre a União e os Estados, ou Territórios, ou entre uns e outros;

e) os conflitos de jurisdição entre Juizes ou Tribunais federais de categorias diversas; entre quaisquer Juizes ou Tribunais federais e os dos Estados; entre, os Juizes federais subordinados a Tribunais diferentes; entre Juízes ou Tribunais de Estados diversos, inclusive os do Distrito Federal e Territórios;

f) os conflitos de atribuições entre autoridade administrativa e judiciária da União ou entre autoridade judiciária de um Estado e a administrativa de outro, ou do Distrito Federal e dos Territórios, ou entre estes e as da União;

g) a extradição requisitada por Estado estrangeiro e a homologação das sentenças estrangeiras; h) o habeas corpus , quando o coator ou paciente for Tribunal, funcionário ou autoridade, cujos atos estejam diretamente sujeitos à jurisdição do Supremo Tribunal Federal ou se tratar de crime sujeito à essa mesma jurisdição em única instância, bem como se houver perigo de se consumar a violência antes que outro Juiz ou Tribunal possa conhecer do pedido;

i) os mandados de segurança contra ato do Presidente da República, das Mesas da Câmara e do Senado, do Presidente do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal de Contas da União;

j) a declaração de suspensão de direitos políticos, lia forma do art. 151;

l) a representação do Procurador - Geral da República, por inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual;

(12)

Art. 27. O Superior Tribunal de Justiça será instalado sob a Presidência do Supremo Tribunal Federal.

§ 1º - Até que se instale o Superior Tribunal de Justiça, o Supremo Tribunal Federal exercerá as atribuições e competências definidas na ordem constitucional precedente.

"Nasceu" o STJ, assim como os Tribunais Regionais Federais (ainda que

com competências distintas), em "sucessão" ao Tribunal Federal de Recursos,

extinto no mesmo dia 07 de abril de 1989 em que foi instalada a então novel Corte

Superior, conforme bem salientou o à época Presidente do Supremo Tribunal

Federal, ministro José Neri da Silveira, em seu discurso quando da cerimônia

11

:

Cumpre-se, com esta solenidade, mais um mandamento da nova Constituição, que prevê, entre os órgãos do Poder Judiciário, o Superior Tribunal de Justiça, na enumeração de seu art. 92. Instalada, passa a nova Corte a exercer as importantes competências, que lhe confere o art. 105, da Lei Maior. Mercê do extraordinário esforço da administração do TFR, à frente seu ilustre Presidente, Ministro Evandro Gueiros Leite, já estão em funcionamento, desde 30 do mês pretérito, os Tribunais Regionais Federais, em número de cinco, criados pelo art. 27, § 6º, das Disposições Transitórias, e com a competência definida no art. 108, ambos da Constituição Federal.

Extingue-se, definitivamente, nesta data, em consequência, o Egrégio Tribunal Federal de Recursos, após quarenta e um anos de fecundos serviços à causa da Justiça brasileira. Criado pela Constituição de 18 de setembro de 1946, empossados, em 23 de junho de 1947, perante o Senhor Ministro José Linhares, então Presidente deste Tribunal, seus nove Ministros – Afrânio Antônio Costa, Armando da Silva Prado, Abner Carneiro Leão de Vasconcelos, Amando Sampaio Costa, Francisco de Paula Rocha Lagoa Filho, Vasco Henrique D'Ávila, Edmundo de Macedo Ludolf, José Thomaz da Cunha Vasconcelos Filho e Djalma Tavares da Cunha Melo, – n) a execução das sentenças, nas causas de sua competência originária, facultada a delegação de atos processuais;

II - julgar, em recurso ordinário: (Redação dada pelo Ato Institucional nº 6, de 1969)

a) os habeas corpus decididos, em única ou última instância, pelos Tribunais locais ou federais, quando denegatória a decisão, não podendo o recurso ser substituído por pedido originário; (Redação dada pelo Ato Institucional nº 6, de 1969)

b) as causas em que forem partes um Estado estrangeiro e pessoa domiciliada ou residente no País; (Redação dada pelo Ato Institucional nº 6, de 1969)

c) os casos previstos no art. 122, § 2º; (Redação dada pelo Ato Institucional nº 6, de 1969)

III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas, em única ou última instância, por outros Tribunais, quando a decisão recorrida: (Redação dada pelo Ato Institucional nº 6, de 1969) a) contrariar dispositivo desta Constituição ou negar vigência a tratado ou lei federal; (Redação dada pelo Ato Institucional nº 6, de 1969)

b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; (Redação dada pelo Ato Institucional nº 6, de 1969)

c) julgar válida lei ou ato do Governo local, contestado em face da Constituição ou de lei federal; (Redação dada pelo Ato Institucional nº 6, de 1969)

d) dar à lei federal interpretação divergente da que lhe haja dado outro Tribunal ou o próprio Supremo Tribunal Federal. (Redação dada pelo Ato Institucional nº 6, de 1969)

11 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Ata da Sessão Solene de Instalação do Superior Tribunal de

Justiça. Disponível em: http://www.stj.jus.br/publicacaoseriada/index.php/coletanea/article/viewFile/ 3085/3143. Consulta realizada em 01 de novembro de 2013.

(13)

instalou-se a Corte, solenemente, na mesma data, na sala de sessões do Supremo Tribunal Federal, na cidade do Rio de Janeiro, sob a presidência do saudoso Ministro Armando da Silva Prado. Desde a sua composição inicial e até a presente data, setenta Ministros fazem a história do Tribunal Federal de Recursos. Dele egressos, compuseram o Supremo Tribunal Federal o saudoso Ministro Rocha Lagoa, os ilustres Ministros aposentados Antônio Neder e Décio Miranda e, aqui, hoje oficiam os eminentes Ministros Aldir Passarinho e Carlos Madeira. Também, posteriormente, o primeiro Subprocurador-Geral da República, que atuou no TFR, o então Dr. Luiz Gallotti, – por igual, empossado a 23 de junho de 1947, perante o Presidente José Linhares, – foi um dos mais insignes membros desta Corte. Tive a honra de ser o seu 28º Juiz, presidindo-o, no biênio 1979/1981, em época de intensa atividade naquele Tribunal, quando cumpria, nele, se implantasse, em definitivo, a reforma editada pela Emenda Constitucional nº 7/1977. É, destarte, com profunda emoção, que registro, neste momento, o término das atividades jurisdicionais e administrativas do Egrégio Tribunal Federal de Recursos, embora guarde a certeza de que terá ele, sempre, uma posição de honra na história do Poder Judiciário brasileiro.

Em seu lugar nasce, entretanto, uma nova Corte, nos termos em que concebida pela Constituição de 1988, que determina, inclusive, participem da composição inicial os ilustres Ministros do Tribunal ora extinto. Tal como sucedera com o Tribunal Federal de Recursos, em 1946, o Superior Tribunal de Justiça recolhe em sua competência parcela significativa da que se reservava, em regime anterior, ao Supremo Tribunal Federal.

Acerca de tal "sucessão", há de se referir à similitude dentre os movimentos

de criação do Superior Tribunal de Justiça e, quarenta e um anos antes, do então

Tribunal Federal de Recursos, ambos trazidos por Cartas Constitucionais que

inauguraram períodos de redemocratização em nosso país, ambos intentando

diminuir a carga de trabalho do Supremo Tribunal Federal através da divisão de

suas competências, assumidas em parte pelos citados órgãos. Neste sentido,

esclarecedora a lição de Themístocles Brandão Cavalcanti

12

:

O artigo [103] contém uma das grandes inovações da Constituição de 1946, isto é, a criação de uma instância de recurso ordinário para substituir o Supremo Tribunal Federal em uma de suas funções mais importantes; naquela em que se lhe atribuía o julgamento em segunda instância das causas em que era interessada a União.

A competência do Tribunal de Recursos, como veremos, envolve uma questão das mais interessantes, qual da conveniência de atribuir-se a competência ratione materiae, nas causas em administrativas, fiscais, etc., a um tribunal determinado, instituindo-se uma verdadeira justiça administrativa dentro da organização judiciária comum.

Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça surgiu no bojo da chamada

"Constituição Cidadã" - nome este influência definitiva para o surgimento da alcunha

12 CAVALCANTI, Themístocles Brandão. A Constituição Federal comentada, V. II. 3.ed. rev. Rio de

(14)

"Tribunal da Cidadania"

13

-, a qual deixou para trás definitivamente o período

ditatorial iniciado pelo Golpe Militar de 1964.

Há de se ressaltar que a própria Constituição Federal, em seu Ato das

Disposições Constitucionais Transitórias, vinculou o surgimento do STJ à instalação

dos Tribunais Regionais Federais e à extinção do Tribunal Federal de Recursos,

afinal, os ministros do TFR comporiam o nascente Tribunal Superior

14

, ao passo que

sua competência (TFR) passaria aos novos Tribunais Regionais

15

.

O Tribunal Federal de Recursos, a seu turno, foi criado pela Constituição dos

Estados Unidos do Brasil de 1946

16

- que a ele se referiu nos artigos 94, II

17

, 103

18

,

13 "A Constituição de 88 ampliou os direitos e garantias fundamentais, provocou a edição de novas

leis que regulamentaram tais conquistas, e, consequentemente, as matérias a serem enfrentadas pelo STJ teriam relação direta com essa nova realidade jurídica do cidadão. Dessa constatação, surgiu o termo Tribunal da Cidadania, como o STJ também é conhecido". SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. A Constituição Cidadã e o Tribunal da Cidadania. Brasília. 2013. Disponível em :

http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=111614. Consulta realizada em 30 de outubro de 2013.

14 ADCT artigo 27, § 2º - A composição inicial do Superior Tribunal de Justiça far-se-á:

I - pelo aproveitamento dos Ministros do Tribunal Federal de Recursos;

II - pela nomeação dos Ministros que sejam necessários para completar o número estabelecido na Constituição.

§ 3º - Para os efeitos do disposto na Constituição, os atuais Ministros do Tribunal Federal de Recursos serão considerados pertencentes à classe de que provieram, quando de sua nomeação.

15 ADCT artigo 27, § 6º - Ficam criados cinco Tribunais Regionais Federais, a serem instalados no

prazo de seis meses a contar da promulgação da Constituição, com a jurisdição e sede que lhes fixar o Tribunal Federal de Recursos, tendo em conta o número de processos e sua localização geográfica. § 7º - Até que se instalem os Tribunais Regionais Federais, o Tribunal Federal de Recursos exercerá a competência a eles atribuída em todo o território nacional, cabendo-lhe promover sua instalação e indicar os candidatos a todos os cargos da composição inicial, mediante lista tríplice, podendo desta constar juízes federais de qualquer região, observado o disposto no § 9º.

16 BRASIL. Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1946. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao46.htm. Consulta realizada em 30 de outubro de 2013.

17 Art 94 - O Poder Judiciário é exercido pelos seguintes órgãos:

II - Tribunal Federal de Recursos;

18 Art 103 - O Tribunal Federal de Recursos, com sede na Capital federal compor-se-á de nove

Juízes, nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo Senado Federal, sendo dois terços entre magistrados e um terço entre advogados e membros do Ministério Público, com os requisitos do art. 99.

(15)

104

19

e 105

20

-, a qual inaugurou um novo período democrático em nossa federação,

após o final da Segunda Guerra Mundial, do chamado "Estado Novo" e da deposição

do então presidente Getúlio Vargas, que vinha exercendo a chefia do executivo

desde o ano de 1930.

O próprio Superior Tribunal de Justiça, em seu sítio na internet

21

, bem narra

tal passagem:

O STJ é descendente direto de uma outra instituição surgida há 60 anos: o Tribunal Federal de Recursos (TFR). Tal como o STJ, o TFR foi uma das grandes novidades de uma carta constitucional que surgia após um longo período de exceção democrática no país: o Estado Novo.

Com a deposição de Getúlio Vargas ao fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), o Brasil elegeu um novo presidente, o general Eurico Gaspar Dutra, que chegou ao poder com a missão de outorgar uma nova Constituição. O TFR foi incluído na Carta Magna com a missão de funcionar como segunda instância da Justiça Federal. A nova Corte foi instalada no Rio de Janeiro, em 17 de maio de 1947.

Pouco mais de 20 anos após a instalação do TFR, o mundo jurídico brasileiro iniciou as discussões para tornar a corte mais atuante – principalmente em função da sobrecarga de julgamentos no Supremo Tribunal Federal (STF).

A primeira iniciativa legal no sentido de se criar uma nova corte partiu dos próprios magistrados do TFR. A instituição, em 1976, mandou a minuta de um projeto de lei ao Congresso para a instituição do Supremo Tribunal de Justiça, que seria a última instância das leis infra-constitucionais do país, deixando para o STF a prerrogativa exclusiva de controlar a constitucionalidade.

Somente no recente período de redemocratização, em 1985, a iniciativa ganhou força. Atentos à possibilidade de convocação de uma Assembléia Constituinte, os magistrados do TFR resolveram se mobilizar. No ano seguinte, com o início dos trabalhos da Assembléia, o TFR formou uma comissão de magistrados – capitaneada pelo ministro Antônio de Pádua Ribeiro – para atuar junto aos parlamentares.

O empenho dos magistrados resultou em uma verdadeira revolução no Judiciário a partir da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de

19 Art 104 - Compete ao Tribunal Federal de Recursos:

I - processar e julgar originariamente: a) as ações rescisórias de seus acórdãos;

b) os mandados de segurança, quando a autoridade coatora for Ministro de Estado, o próprio Tribunal ou o seu Presidente;

II - julgar em grau de recurso:

a) as causas decididas em primeira instância, quando a União for interessada como autora, ré, assistente ou opoente, exceto as de falência; ou quando se tratar de crimes praticados em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral e a da Justiça Militar;

b) as decisões de Juízes locais, denegatórias de habeas corpus , e as proferidas em mandados de segurança, se federal a autoridade apontada como coatora;

III - rever, em beneficio dos condenados, as suas decisões criminais em processos findos.

20 Art 105 - A lei poderá criar, em diferentes regiões do País, outros Tribunais Federais de Recursos,

mediante proposta do próprio Tribunal e aprovação do Supremo Tribunal Federal, fixando-lhes, sede e jurisdição territorial e observados os preceitos dos arts. 103 e 104.

21 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Uma trajetória cidadã. Brasília. Disponível em: http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=698. Consulta realizada em 30 de outubro de 2013.

(16)

1988. Símbolo mor dessa transformação foi a criação do STJ, última instância das leis infra-constitucionais tanto no âmbito da Justiça Federal como no da estadual.

Acerca de sua composição, vinte e seis dentre os trinta e três ministros que

ingressaram no Superior Tribunal de Justiça em 1989 tomaram posse no extinto

Tribunal Federal de Recursos

22

- que também lhe legou seus ex-integrantes, então

aposentados

23

-, se encontrando algumas das cadeiras da jovem corte já em sua

quarta geração de ocupantes

24

.

Contudo, apesar de todas as narradas coincidências cronológicas e

orgânicas, ainda que muito se fale em "sucessão" entre as cortes, a competência do

Superior Tribunal de Justiça difere em muito da estabelecida para o Tribunal Federal

de Recursos, havendo este funcionado como instância recursal para os julgados

oriundos da primeira instância da Justiça Federal - se aproximando, nesta ótica,

muito mais dos atuais Tribunais Regionais Federais

25

-, ao passo que aquele exerce

a função precípua de guarda da legislação federal, garantindo sua vigência e

aplicabilidade, uniformizando interpretações de modo a agregar segurança a todo o

sistema jurídico, como explicam Grinover et al

26

:

[O STJ] Constitui inovação da Constituição de 1988 sobre a estrutura judiciária brasileira e relaciona-se com os sistemas judiciários das chamadas Justiças comuns (Justiça Federal e Justiças Estaduais); ele próprio é um órgão exercente da chamada jurisdição comum, na medida em que somente lhe cabem causas regidas pelo direito substancial comum (direito civil, comercial, tributário, administrativo) e não as regidas por ramos jurídico-substanciais especiais (eleitoral, trabalhista, penal militar).(...) Como órgão de superposição (nessa condição ao lado do Supremo), o Superior tribunal de Justiça não diz rigorosamentoe a última palavra sobre

22 ADCT artigo 27, §§ 2º e 3º.

23 ADCT artigo 27, § 4º - Instalado o Tribunal, os Ministros aposentados do Tribunal Federal de

Recursos tornar-se-ão, automaticamente, Ministros aposentados do Superior Tribunal de Justiça.

24 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Linha Sucessória dos Ministros. Brasília. Disponível em:

http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/download.wsp?tmp.arquivo=2540. Consulta realizada em 07 de novembro de 2013.

25 CF/88 Art. 108. Compete aos Tribunais Regionais Federais:

I - processar e julgar, originariamente:

a) os juízes federais da área de sua jurisdição, incluídos os da Justiça Militar e da Justiça do Trabalho, nos crimes comuns e de responsabilidade, e os membros do Ministério Público da União, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral;

b) as revisões criminais e as ações rescisórias de julgados seus ou dos juízes federais da região; c) os mandados de segurança e os "habeas-data" contra ato do próprio Tribunal ou de juiz federal; d) os "habeas-corpus", quando a autoridade coatora for juiz federal;

e) os conflitos de competência entre juízes federais vinculados ao Tribunal;

II - julgar, em grau de recurso, as causas decididas pelos juízes federais e pelos juízes estaduais no exercício da competência federal da área de sua jurisdição.

26 GRINOVER, Ada Pellegrini et al.Teoria Geral do Processo, 26. ed., São Paulo: Ed. RT, 2010.p.

(17)

todas as causas, mas a sua situação sobranceira às justiças o qualifica como tal. Embora em situações diferentes, tanto quanto o Supremo, ele julga causas que já hajam exaurido todas as instâncias da Justiça de que provém.

(...)

Como defensor da lei federal, compete-lhe julgar recursos interpostos contra decisões dos Tribunais de Justiça ou Tribunais Regionais Federais, que contrariem ou neguem vigência a tratado ou a lei federal (art. 105, inciso III, letra a).

Como unificador da interpretação do direito, cabe-lhe rever as decisões que deram à lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído o Tribunal (art. 105, inc. III, c).

Bem salientando a distinção entre os aludidos órgãos, lúcido o

esclarecimento do ministro Felix Fischer

27

:

“O STJ é, na verdade, um desmembramento do Supremo Tribunal Federal e não um sucessor do Tribunal Federal de Recursos. As funções do TFR foram transferidas aos Tribunais Regionais Federais, não ao STJ. Não somos uma corte de apelação, mas de uniformização, como toda corte superior no mundo”, explica o presidente do STJ, ministro Felix Fischer.

Dessa forma, a ordem constitucional de 1988 tentou "desafogar" o Supremo

Tribunal Federal, mantendo-o como órgão de cúpula do Judiciário pátrio, mas

prestigiando sua atuação como "Guardião da Constituição" e, para tanto, inaugurou,

ao seu lado, um "Guardião da Legislação Federal", o Superior Tribunal de Justiça,

que acumula mais de três milhões e meio de processos julgados desde sua estreia

no cenário jurídico pátrio

28

.

27 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. A Constituição Cidadã e o Tribunal da Cidadania. 2013.

Disponível em: http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?

tmp.area=398&tmp.texto=111614. Consulta realizada em 07 de novembro de 2013.

28 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Relatório Estatístico. Brasília. 2012. p. 19. Disponível em: http://www.stj.gov.br/webstj/Processo/Boletim/verpagina.asp?vPag=0&vSeq=185. Consulta realizada em 30 de outubro de 2013.

(18)

2. DA ORIGEM DA RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL QUAL NARRADA PELA

DOUTRINA

Um breve olhar acerca da reclamação constitucional ao longo da história nos

permite perceber uma evolução, ainda que não linear, do instituto.

Seu fundamento histórico, assim como eventual origem no direito alienígena,

todavia, é motivo de dissenso entre os autores, como bem resumido por Gonzales

29

:

Na tese defendida por JOSÉ DA SILVA PACHECO, afirma-se que os institutos como da suplicatio, do Direito Romano, o agravo de ordenação não guardada, das Ordenações Filipinas, e o agravo por dano irreparável, do Brasil Imperial, influenciaram na consagração da reclamação.

Todavia, na visão de MARCELO NAVARRO RIBEIRO DANTAS, nem esses institutos, nem mesmo o aparecimento do mandado de segurança, tiveram relevância para a criação da reclamação, que foi produto exclusivo da construção jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal com amparo na teoria dos poderes implícitos.

Tais diferenças, conforme se verá, poderão ser associadas à tese albergada

por cada autor acerca da natureza do instituto ora em comento, conforme

observamos, por exemplo, da relação estabelecida pelo ministro Néri da Silveira

30

entre o agravo de ordenação não guardada e a reclamação entendida como

incidente correicional:

A praxe portuguesa, ao lado do agravo no auto do processo, conhecia o agravo de ordenação não guardada. Por meio do primeiro, apreciava-se o mérito do incidente; seria o segundo para corrigir defeitos externos ao processo. Mais tarde, o último recurso foi abolido. É que surgiria remédio equivalente, qual fosse a correição, destinada a emenda de erros que houvesse nos processo. Abrangia a matéria compreendida no agravo de ordenação não guardada: lacunas, vícios, omissões ou defeitos externos nas formas elementares do processo. Finalmente, apareceu a correição parcial, "instituída independentemente da correição geral, em qualquer época, contra omissão de deveres, atribuída aos juízes e funcionários da justiça, ou para a emenda de erros ou abusos, e contra a inversão tumultuária dos atos e fórmulas da ordem legal dos processos, em prejuízo do direito das partes, em casos não suscetíveis de recurso." (apud JORGE AMERICANO, APLICAÇÕES DO DIREITO, págs. 341/342)

Ainda na vigência das codificações estaduais do processo, foi que surgiu, no Direito Judiciário Brasileiro, a Correição Parcial, como é chamada em alguns Estados, ou Reclamação, segundo a denominam em outros, que

29 GONZALEZ, Daniel Galliza Simões Lorenzo. Reclamação Constitucional: aspectos teóricos e

práticos. 2009. Rio de Janeiro. Disponível em:

http://www.maxwell.lambda.ele.puc-rio.br/14283/14283.PDF. Consulta realizada em 18 de novembro de 2013. p.12.

30 Rp 1092, Relator(a): Min. DJACI FALCAO, Tribunal Pleno, julgado em 31/10/1984, DJ 19-12-1984

PP-21913 EMENT VOL-01363-01 PP-00027 RTJ VOL-00112-02 PP-00504. Voto do Ministro Néri da Silveira.

(19)

se enraizou nos regimentos internos dos tribunais.e nas leis de organização judiciária sobrevivendo ao embate com as críticas por vezes acerbadas de autorizados processualistas. Assim, já em 1911, o Decreto nº 9.623, que regulou a organização judiciária do antigo Distrito federal, estabelecia, no art. 142, que, "sempre que chegar ao conhecimento do Conselho Supremo (da então Corte de Apelação) ou do Procurador-Geral, fato grave que exija correição parcial em qualquer ofício de justiça, deverá aquele efetuá-la, imediatamente, qualquer que seja a época do ano."

A doutrina existente a respeito do surgimento da Reclamação no direito

brasileiro costuma separar sua linha evolutiva em fases ou períodos. Essa divisão,

ainda que puramente doutrinária, nos ajuda a compreender melhor o tema.

Os doutrinadores parecem concordar com a ideia de que dividir a evolução

histórica da reclamação constitucional em fases é uma boa metodologia para o

estudo das mudanças que ocorreram neste instituto, mas, como não poderia deixar

de ser, dada a complexidade do tema, a doutrina diverge em relação ao número de

fases.

Alguns acreditam ser mais adequado dividir esta “linha evolutiva” em 4

(quatro) fases. É o caso, por exemplo, de José da Silva Pacheco

31

. Outros, no

entanto, preferem dividi-la em 5 (cinco) fases, como ocorre com Marcelo Navarro

Ribeiro Dantas

32

. Para Dantas, seriam elas:

1ª. Primeira fase: antes da Introdução do Regimento Interno do STF, em que

o doutrinador aborda a Teoria dos Poderes Implícitos, responsável por dar os

princípios basilares da Reclamação Constitucional;

2ª. Segunda fase: Da Adoção da Reclamação Constitucional como

Instrumento Processual no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal até o

advento da Constituição Federal de 1967;

3ª. Terceira Fase: Da Constituição de 1967 até a Promulgação da Emenda

nº 7 de 1977, à Mesma Carta;

31 O estudo da reclamação pode ser feito em, pelo menos, quatro fases: 1ª) a primeira vai desde a

criação do Supremo Tribunal até 1957; 2ª) a segunda começa em 1957, com a inserção da medida no regimento interno do STF, até 1967; 3ª) a terceira, a partir do disposto na Constituição de 1967, art. 115, parágrafo único, “c”, que foi reproduzido na Emenda Constitucional de 1969, art. 120, parágrafo único, “c”, , e, posteriormente, após a Emenda 7, de 13.04.1977, com o disposto no art.119,I, “o””, sobre a avocatória, e no §3º, “c”, autorizando que o RISTF estabelecesse “o processo e o julgamento dos feitos de sua competência originária ou recursal e da arguição de relevância da questão federal; e 4ª) a quarta, com o advento da Constituição de 05.10.1988, cujos arts. 102, I, “l”, e 105, I, “f”, prevêem, expressamente, a reclamação como da competência originária do STF e STJ. (PACHECO, José da Silva. O Mandado de Segurança e outras Ações Constitucionais Típicas. 4 ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 602)

32 DANTAS, Marcelo Navarro Ribeiro. Reclamação Constitucional no direito Brasileiro. Porto Alegre:

(20)

4ª. Quarta Fase: Da Edição da Emenda nº 7 de 1977 feita à Constituição de

1967 até a Entrada em vigor da Atual Constituição Federal de 1988;

5ª. Quinta Fase: A partir da Constituição de 5 de Outubro de 1988 aos dias

de hoje.

Sem pretender realizar uma eleição da melhor divisão doutrinária em relação

aos marcos para compreendermos o instituto, preferimos apenas expor a sucessão

histórica, conhecendo os fatos e as modificações de maior relevância que marcaram

a Reclamação Constitucional e deram a ela o formato que apresenta atualmente.

Em um primeiro momento, não havia qualquer previsão da Reclamação

Constitucional em nosso ordenamento. Ela surgiu no Supremo Tribunal Federal

inspirada na Teoria dos poderes Inerentes ou, como também é chamada, Poderes

Implícitos, adotada pela jurisprudência da Suprema Corte dos Estados Unidos no

famoso caso McCulloch vs. State of Maryland

33

, em que o ministro John Marshall,

inspirado pela obra “O Federalista”

34

, entendeu ser aplicável esta Teoria

35

para

enunciar que “se o fim é legítimo e está de acordo com os objetivos da Constituição,

todos os meios apropriados e plenamente adaptáveis a ele, não proibidos, mas

dentro da letra e do Espírito da Constituição, são Constitucionais”

36

. Em outras

palavras, Marshall entendia que, se a Constituição criava determinados poderes, ela,

33 McCulloch v. Maryland, 17 U.S.316 (1819), was a landmark decision by the Supreme Court of

the United States. The state of Maryland had attempted to impede operation of a branch of the

Second Bank of the United States by imposing a tax on all notes of banks not chartered in Maryland. Though the law, by its language, was generally applicable to all banks not chartered in Maryland, the Second Bank of the United States was the only out-of-state bank then existing in Maryland, and the law was recognized in the court's opinion as having specifically targeted the U.S. Bank. The Court invoked the Necessary and Proper Clause of the Constitution, which allowed the Federal government to pass laws not expressly provided for in the Constitution's list of express powers, provided those laws are in useful furtherance of the express powers of Congress under the Constitution.

This case established two important principles in constitutional law. First, the Constitution grants to Congress implied powers for implementing the Constitution's express powers, in order to create a functional national government. Second, state action may not impede valid constitutional exercises of power by the Federal government. (Disponível em:

http://en.wikipedia.org/wiki/McCulloch_v._Maryland. Acessado em 08.11.2013).

34 Atualmente, HAMILTON, Alexander; MADISON, James; JAY, John. O Federalista. Brasília: UNB,

1984.

35 No que tange à Reclamação, a primeira fase pós-criação do Supremo Tribunal Federal foi decisivamente influenciada pelo entendimento esposado no caso McCuloch v. Maryland, em que Marshall, em um momento de elevada inspiração, impulsionou sua teleologia de guarda da constituição a um novo patamar, ao reconhecer e aplicar a Teoria dos Poderes Implícitos (Implied Powers), até então traçada por Alexander Hamilton, John Jay e James Madison, na obra O Federalista.

36 GONZALEZ, Daniel Galliza Simões Lorenzo. Reclamação Constitucional: aspectos teóricos e

práticos. 2009. Rio de Janeiro. Disponível em:

http://www.maxwell.lambda.ele.puc-rio.br/14283/14283.PDF. Consulta realizada em 18 de novembro de 2013.

(21)

implicitamente, daria também meios para que esses poderes fossem exercidos e

respeitados.

Cabe pontuar que, apesar da tese haver se destacado através da

formulação da Teoria dos Poderes Implícitos qual veiculada na obra “O Federalista”,

ela já havia sido enunciada por Niccoló di Bernardo dei Machiavelli, mais conhecido

entre nós por Maquiavel. Um dos mais antigos cientistas políticos do mundo já havia

dito

37

que, na relação entre Estado e Governo, os fins justificam os meios - naquela

época, máxima que ainda não havia tomado o sentido vulgar que hoje possui.

Foi bebendo desta fonte que o Ministro do STF, Rocha Lagoa, em 1952,

levantou a Teoria dos Poderes Implícitos para assegurar que o entendimento do

Supremo Tribunal Federal prevaleceria sobre o entendimento dos demais tribunais

regionais. Em seu célebre voto

38

, transformado em ementa, discursou com maestria:

A competência não expressa dos tribunais federais pode ser ampliada por construção constitucional. - Vão seria o poder, outorgado ao Supremo Tribunal Federal de julgar em recurso extraordinário as causas decididas por outros tribunais, se lhe não fôra possivel fazer prevalecer os seus próprios pronunciamentos, acaso desatendidos pelas justiças locais. - A criação dum remédio de direito para vindicar o cumprimento fiel das suas sentenças, está na vocação do Supremo Tribunal Federal e na amplitude constitucional e natural de seus poderes. - Necessária e legitima é assim a admissão do processo de Reclamação, como o Supremo Tribunal tem feito. - É de ser julgada procedente a Reclamação quando a justiça local deixa de atender à decisão do Supremo Tribunal Federal.

A respeito da formulação da Reclamação Constitucional, José dos Santos

Pacheco

39

, elucida que

“foi marcada, principalmente, pela influência: a) do princípio dos poderes implícitos, proclamado e reconhecido pela corte Norte-Americana; b) do Direito Romano, em que se admitia a suplicatio, a partir da cognitio extra ordine; do nosso direito antigo, em que se contemplava o agravo de ordenação não guardada, conforme Ordenações Filipinas, Livro III, tít. XX, § 46, e Livro I, tít. V,§ 4º; e do agravo por dano irreparável do Regulamento 737 de 25.11.1850; c) do direito de organização judiciária do Estados, que incluía a correição parcial, principalmente pela do antigo Distrito Federal; d) do mandado de segurança contra atos de autoridade judicial, a partir de 1934; e) do atentado contra ato judiciário”.

37 Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br/download/teste/arqs/cp041071.pdf

38 Rcl 141 primeira, Relator(a): Min. ROCHA LAGOA, Tribunal Pleno, julgado em 25/01/1952, DJ

17-04-1952 PP-03549 EMENT VOL-00078-01 PP-00001

39 PACHECO, José dos Santos. A reclamação no STF e no STJ de acordo com a nova Constituição. Revista dos Tribunais. São Paulo: RT, v. 646, ano 78, p.20, ago.1989. No sentido da influência exclusiva da teoria dos poderes implícitos: DANTAS, Marcelo Navarro Ribeiro. Reclamação Constitucional no direito Brasileiro. Porto Ato Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2000, p.51-52.

(22)

Sem dúvida, grande a influência desse contexto para fazer da Reclamação

Constitucional instituto tão polêmico, objeto de tantas e tão profundas divergências.

Anos depois, foi proposta Emenda Regimental visando alterar o RISTF e

positivar, ainda que em diploma não legislativo, o instituto da Reclamação. O projeto

de tal Emenda Regimental teve como relator o Ministro Ribeiro da Costa e a

justificativa se deu com a seguinte argumentação

40

:

A medida processual de caráter acentuadamente disciplinar e correcional, denominada reclamação,embora não prevista, de modo expresso, no art. 101, nºs I a IV, da Constituição Federal, tem sido admitida pelo Supremo Tribunal Federal, em várias oportunidades, exercendo-se, nesses casos, sua função corregedora, a fim de salvaguardar a extensão e os efeitos de seus julgados, em cumprimento dos quais se avocou legítima e oportuna intervenção.

A medida da reclamação compreende a faculdade cometida nos órgãos do Poder Judiciário para,em processo especial, corrigir excessos, abusos e irregularidades derivados de atos de autoridades judiciárias, ou de serventuários que lhe sejam subordinados. Visa a manter sua inteireza e plenitude o prestígio da autoridade, a supremacia da lei, a ordem processual e a força da coisa julgada.

É, sem dúvida, a reclamação meio idôneo para obviar os efeitos de atos de autoridades, administrativas ou judiciárias, que, pelas circunstâncias excepcionais, de que se revestem, exigem a pronta aplicação de corretivo, enérgico, imediato e eficaz que impeça a prossecução de violência ou atentado à ordem jurídica.

Assim, a proposição em apreço entende com a atribuição concedida a este Tribunal pelo art. 97, nº II, da Carta Magna, e vem suprir omissão contida no seu Regimento Interno.

Os ministros adeptos da inclusão do novo instituto o defendiam com

fundamento na Teoria dos Poderes Implícitos, ao passo que os contrários à adoção

da Reclamação pelo texto do Regimento Interno do STF arguiam sua falta de

previsão legal.

40 STF. ATA DA TRIGÉSIMA SESSÃO DO TRIBUNAL PLENO, EM 2 DE OUTUBRO DE 1957.

(23)

Em 1957, o instituto da Reclamação Constitucional foi inserido no Regimento

Interno do STF

41

, para o qual foi então criado o Capítulo V-A, artigo 1º, cuja redação

anunciava:

Art. 1º. O Supremo Tribunal Federal poderá admitir reclamação do Procurador-Geral da República, ou de interessado na causa, a fim de preservar a integridade de sua competência ou assegurar a autoridade de seu julgado.

Neste período a natureza da Reclamação Constitucional era discutida e,

enquanto alguns acreditavam que ela detinha essência correicional, outros davam a

ela uma variedade outras de vestimentas. A respeito da seu recebimento e

conhecimento, alguns ministros da Suprema Corte ainda eram contrários à sua

aceitação como instrumento processual válido, a exemplo de Hahnemann

41 A reclamação foi adotada pelo Regimento Interno do STF em 02.10.1957, dentro da competência que lhe dava a Constituição de 1946, em seu art. 97, II, quando foi aprovada proposta dos Ministros Lafayette de Andrada e Ribeiro da Costa, no sentido de incluir o instituto no RISTF, em seu Título II, Capítulo V-“A”, intitulado “Da Reclamação”:

“ATA DA TRIGÉSIMA SESSÃO DO TRIBUNAL PLENO, EM 2 DE OUTUBRO DE 1957. Presidência do Exmo. Sr. Ministro Orosimbo Nonato da Silva – Procurador-Geral da República, o Exmo. Sr. Dr. Carlos Medeiros Silva – Secretário, Sr. Hugo Mosca – Diretor de Serviço, na ausência justificada da Sra. Olga Menge S. Wood – Vice Diretora. [...]

Emenda do Regimento Interno

O Sr. Ministro Ribeiro da Costa propôs pela Comissão do Regimento a seguinte emenda. Inclua-se no Regimento Interno – No título III como capítulo V-A:

'Da Reclamação

Art. 1º O Supremo Tribunal Federal poderá admitir reclamação do Procurador-Geral da República, ou de interessado na causa, a fim de preservar a integridade de sua competência ou assegurar a autoridade de seu julgado.

Art. 2º Ao Tribunal competirá, se necessário:

I – Avocar o reconhecimento de processo em que se verifique manifesta usurpação de sua competência, ou desrespeito de decisão que haja proferido;

II – determinar lhe sejam enviados os autos de recurso para ele interposto e cuja remessa esteja sendo indevidamente retardada.

Art. 3º A reclamação, em qualquer dos casos previstos no artigo anterior, deverá ser instruída com prova documental dos requisitos para a sua admissão.

§ 1º O relator, a quem for distribuída a reclamação, requisitará informações da autoridade, que as prestará dentro de 48 horas.

§ 2º Em face de prova, convincente, poderá ser ordenada a suspensão do curso do processo, ou a imediata remessa dos autos ao Tribunal.

§ 3º Qualquer dos interessados poderá impugnar por escrito o pedido do reclamante.

§ 4º Salvo quando por ele requerida, o Procurador-Geral da República será ouvido no prazo de três dias sobre a reclamação.

Art. 4º A reclamação será incluída na pauta da primeira sessão do Tribunal que se realizar após a devolução dos autos pelo relator à Secretaria.

(24)

Guimarães

42

, Edgard Costa

43

e José Linhares

44

. A respeito Marcelo Navarro

“mapeou” as opiniões dos ministros acerca da natureza que acreditavam ter a

Reclamação.

Segundo ele, dos 15 (quinze) ministros, 2 (dois) acreditavam ter natureza

correicional, um tomou posição neutra, 3 (três) negaram a natureza correicional da

medida, 6 (seis) não trataram do tema, um não votou e 2 (dois) não deixaram

qualquer registro acerca do seu posicionamento na querela.

Nesse período, as discussões acerca do instituto eram muitíssimo acirradas,

pois, até então, o fato de haver sido criado por construção pretoriana, sem albergue

na lei, causava grande desconfiança, afinal, vislumbrou-se certa usurpação da

função/competência legislativa.

A Constituição Federal de 1967 previu a competência para o STF, em seu

regimento, estabelecer como ocorreria o processamento e julgamento dos feitos de

sua competência ou em grau de recurso

45

. Isso esvaziou o argumento baseado na

usurpação da competência legislativa e acabou por legitimar a Reclamação, que

passava a se fulcrar, indiretamente, em dispositivo constitucional

46

.

Pontuamos aqui apenas nosso questionamento acerca da amplitude de tal

competência, afinal estabelecer o processamento e julgamento dos feitos de sua

competência não aparenta se confundir com a hipótese de criar ou delimitar quais

seriam esses feitos/competências.

É de se ressaltar que a Constituição de 1967 conferiu ao regimento interno

do Supremo Tribunal Federal força de lei federal, dando à reclamação constitucional

embasamento legal, porém não constitucional, o que só ocorreria na Constituição

42Sr. Presidente, defiro a diligência, embora não conhecesse da reclamação, se ela fosse submetida

a julgamento. Entendo que não é remédio que tenha lugar em nossos sistema processual. (Rcl 144 diligência, Relator(a): Min. AFRANIO COSTA, Tribunal Pleno, julgado em 18/10/1950, DJ 07-12-1950 PP-11081 EMENT VOL-00023-01 PP-00001 ADJ 20-08-1952 PP-3917. Voto do ministro Hahnemann Guimarães).

43 Sr. Presidente, pela inépcia manifesta da reclamação, prescindo da diligência. (Rcl 144 diligência,

Relator(a): Min. AFRANIO COSTA, Tribunal Pleno, julgado em 18/10/1950, DJ 07-12-1950 PP-11081 EMENT VOL-00023-01 PP-00001 ADJ 20-08-1952 PP-3917. Voto do ministro Edgard da Costa)

44 Sr. Presidente, sem implicar em conhecimento da reclamação, de que não conheço, voto pela diligência. (Rcl 144 diligência, Relator(a): Min. AFRANIO COSTA, Tribunal Pleno, julgado em 18/10/1950, DJ 07-12-1950 PP-11081 EMENT VOL-00023-01 PP-00001 ADJ 20-08-1952 PP-3917.

Voto do ministro José Linhares)

45Constituição Federal de 1967, Art. 115 - O Supremo Tribunal Federar funcionará em Plenário ou dividido em Turmas.

Parágrafo único - O Regimento Interno estabelecerá:

c) o processo e o julgamento dos feitos de sua competência originária ou de recurso;

46 MENDES, Gilmar Ferreira. A Reclamação Constitucional no Supremo Tribunal Federal: Algumas Notas. Direito Público, América do Norte, 128 01 2010.

(25)

Federal de 1988, que passou a prevê-la, no âmbito do Supremo Tribunal Federal, no

artigo 102, inciso I, alínea l, como instrumento processual hábil à preservação da

sua competência e à garantia da autoridade das suas decisões.

47

Apenas a título de curiosidade, já que não se inclui imediatamente no objeto

deste trabalho, a Reclamação também foi adotada no Direito Militar, conforme nos

conta Marcelo Azevedo Chamone

48

:

Em 1969, com o Decreto-Lei nº 1002 – Código de Processo Penal Militar – foi introduzida a Reclamação no âmbito da Justiça Militar, nos art. 584-586. (...) mais tarde, a Lei nº 8.457/1992, que organizou a Justiça Militar Federal, reforçou a competência do STM para julgar reclamações – art. 6º, I, f.

A Emenda Constitucional nº 7, no ano de 1977, criou uma figura nova, a da

“Avocatória Irrestrita”

49

. Esse instituto possibilitava, em caso de requerimento pelo

Procurador da República, mediante certos requisitos, ao STF se fazer substituir nos

feitos de quaisquer juízos ou tribunais

50

, ou seja, o Supremo Tribunal Federal

poderia, verificando a presença de determinados requisitos, avocar a competência

para apreciar certos processos, com isso ofendendo o princípio do juiz natural - pelo

qual a competência para a ação está determinada por critérios objetivos, garantindo

que não haveria escolha do julgador ou do julgado, o que sempre foi uma garantia

do jurisdicionado contra o estabelecimento dos Tribunais de exceção.

O estudo do instituto da Avocatória é relevante, pois muitos viram nela um

instrumento muito parecido com a Reclamação Constitucional, ameaçando lhe retirar

seu sentido de existência. Acerca do tema, Marcelo Navarro Ribeiro Dantas lecionou

que, se a avocatória fosse adotada para “fins de preservação da competência da

corte, esvaziaria parcialmente a Reclamatória”

51

. Na prática, o que perdeu seu

47 ALVES, Renato de Oliveira. A reclamação constitucional no STF. Revista de Direito Constitucional e Internacional, São Paulo, v. 20, n. 80, p. 67-84, jul./set. 2012.

48CHAMONE, Marcelo Azevedo. Reclamação constitucional. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 1896, 9 set. 2008 . Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/11698>. Acesso em: 28 out. 2013.

49 Art. 119. Compete ao Supremo Tribunal Federal: (...)

o) as causas processadas perante quaisquer juízos ou Tribunais, cuja avocação deferir a pedido do Procurador-Geral da República, quando decorrer imediato perigo de grave lesão à ordem, à saúde, à segurança ou às finanças públicas, para que se suspendam os efeitos de decisão proferida e para que o conhecimento integral da lide lhe seja devolvido; e (incluída pela Emenda Constitucional nº 7, de 1977).

50 Disponível em: http://www.dominiopublico.gov.br/download/teste/arqs/cp041071.pdf. Consulta realizada em 12 de novembro de 2013.

(26)

propósito foi a própria Avocatória, vez que concedida apenas quatro vezes pelo

Supremo Tribunal Federal em toda a sua história.

A Reclamação, com a promulgação da Carta Magna de 1988, finalmente

ganhou seu reconhecimento como instituto capaz de assegurar que o entendimento

dos tribunais superiores, proferidos nos casos concretos, prevaleceria frente aos

entendimentos dos tribunais regionais

52

, através de instituto que permitia o acesso

direto às mais altas cortes do país

53

.

Inovação do texto constitucional de 1988 foi a admissão de propositura de

Reclamação não apenas ao Supremo Tribunal Federal, mas também ao Superior

Tribunal de Justiça, marcando o lugar deste como órgão de superposição de nosso

sistema judiciário.

Anos depois, com o advento da Emenda Constitucional 45/2004

54

, que,

dentre outros, introduziu na Constituição a chamada Súmula Vinculante, a

Reclamação passou a ser recebida também contra atos administrativos e decisões

judiciais que contrariassem orientações emanadas do Supremo Tribunal Federal sob

a forma destas súmulas (art. 103-A, § 3º, da CF)

55

.

Ainda hoje existem muitas teorias divergentes acerca da natureza do

instituto em comento, no entanto, sua aceitação e a validade de seu manejo não

causam mais tanta discussão, como podemos depreender das palavras de

Christianne Boulos

56

:

52 Verdadeiramente, a Constituição de 1988 consagrou o instituto da Reclamação Constitucional não só para preservar a competência e os julgados proferidos pelo Supremo Tribunal Federal. Com efeito, em relação ao Superior Tribunal de Justiça, obviamente em virtude de sua importância no controle infraconstitucional, também foi expressamente prevista a possibilidade de manifestação do respectivo interessado em também (como previsto ao Supremo Tribunal Federal) fazer prevalecer a competência e garantia da autoridade dos entendimentos consolidados nesse pretório por meio da Reclamação Constitucional (perante o Superior Tribunal de Justiça - artigo 105, inciso !, alínea “f”da

Constituição Federal). Disponível em:

http://www.dominiopublico.gov.br/download/teste/arqs/cp041071.pdf. Consulta realizada em 12 de novembro de 2013.

53 Constituição da República Federativa do Brasil, artigos 120, I, l e 105, I, f.

54 A EC 45/2005 consagrou a súmula vinculante, no âmbito da competência do Supremo Tribunal, e previu que a sua observância seria assegurada pela reclamação (art. 103-A, § 3º – “Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem aplicação da súmula, conforme o caso”). MENDES, ob. cit..

55 ALVES, Renato de Oliveira. A Reclamação Constitucional no Supremo Tribunal Federal. Disponível em: http://www.idb-fdul.com/uploaded/files/2013_02_00837_00862.pdf. Consulta realizada e, 11 de novembro de 2013.

56 BOULOS. Christianne. Decisão do STF: reclamação constitucional para garantia de súmula

(27)

A reclamação constitucional é o instrumento por meio do qual o STF é instado a agir em caso de necessidade de preservação de sua competência ou garantia da autoridade de suas decisões. Fruto originalmente de criação jurisprudencial, incorporada posteriormente ao Regimento Interno do Tribunal, a reclamação hoje possui assento constitucional (CRFB, artigo 102, I, l, ademais da prevista para o Superior Tribunal de Justiça, relativamente a suas competência e decisões, no artigo 105, I, f). Embora haja discussão em torno de sua roupagem jurídica – se de ação, recurso, incidente processual, medida excepcional – há consenso em relação a seu alcance: é capaz de anular ato administrativo ou alterar resultado de processo judicial, conforme o caso, fazendo sempre sua decisão coisa julgada, de onde se entende possuir natureza jurisdicional.

O alcance e a importância da reclamação como instrumento de efetividade da jurisdição constitucional guardam relação direta com a eficácia erga omnes e o efeito vinculante das decisões de mérito proferidas pelo STF em sede de controle concentrado (CRFB, artigo 102, parágrafo 2º). Assim, o eventual descumprimento de decisões proferidas tanto nas ações direta de inconstitucionalidade e declaratória de constitucionalidade (como resultado da evolução jurisprudencial), bem como na arguição de descumprimento de preceito fundamental (como previsto no artigo 13 da Lei nº 9.882/1.999), seja por ato administrativo, seja por decisão de outros órgãos judiciais, pode ensejar a propositura da reclamação, por quem a tanto legitimado. É cabível reclamação, igualmente, em face do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar súmula vinculante aplicável ou que indevidamente a aplicar, com a peculiaridade de, na hipótese de manejo contra omissão ou ato da Administração, o uso da reclamação somente ser admitido após esgotamento das vias administrativas (CRFB, artigo 103-A, parágrafo 3º; Lei 11.417/2.006, artigo 7º, parágrafos 1º e 2º).

Acerca da presença da Reclamação no direito comparado, ainda que

Dantas

57

tenha sido capaz de dedicar um capítulo inteiro de seu estudo a avaliar os

mais diversos ordenamentos europeus e o norteamericano em busca de similitudes,

exatamente pela conformação jurisprudencial que se exporá a seguir, em nossa

opinião, delineou-se um instituto absolutamente "múltiplo" no ordenamento pátrio e,

talvez por isso mesmo, singular no mundo. Como passaremos a demonstrar, a

jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça não

são tão certas, firmes e claras quanto faz acreditar a retrospectiva

histórico-doutrinária ora exposta.

Referências

Documentos relacionados

Avaliação do desajuste marginal de coroas totais fundidas em titânio comercialmente puro e liga de titânio-alumínio-vanádio antes e após a eletroerosão- Contreras,

Porém, como existem diferentes quantidades de cada tipo de UC, o cálculo para descobrir a quantidade total de GDFV que, se dividida igualmente entre todas as UC do mesmo tipo,

Os modelos de despacho ´ otimo atuais em usinas hidrel´ etricas (UHEs) s˜ ao realizados tendo em conta as eficiˆ encias das unidades geradoras (UGs) obtidos com a extrapola¸c˜ ao

[r]

Na análise das médias do teste de avidez dos RN das PAI com baixa e elevada avidez de IgG e dos RN não infectados das PCI, foi observada diferença entre o valor do teste de

— Você não achou estranho, Pris, esses policiais ficarem aqui o tempo todo rondando, esperando os telefonemas, discutindo como conseguir o resgate, sem nunca falar

 A relação anteroposterior entre os dois primeiros molares permanentes antagonistas, após a sua irrupção, depende de suas posições previamente ocupadas nas arcadas, da

Alimentos disponíveis: milho, farelo de algodão, farelo de soja, fosfato bicálcico, calcário Espaço de reserva: 2,5 %. Demanda a ser atendida: 6,52 kg NDT, 1,74 kg PB, 0,054