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Proposição II: “O retorno esperado de uma ação é igual à taxa de capitalização apropriada

2.4 Regressão Quantílica aplicada a finanças

As técnicas usadas na econometria têm sido empregadas nas mais diversas áreas, incluindo a metodologia política, a sociologia, a economia da saúde, pesquisas médicas, o ambiente econômico, e inúmeras outras (GREENE, 2002). Estas técnicas podem ser usadas para a análise de resultados econômicos, de mercado ou comportamento individual e testar teorias.

No entanto, o presente trabalho foca na técnica chamada regressão quantílica, que é uma alternativa aos Mínimos Quadrados Ordinários (MQO). Segundo Cameron e Trivedi (2005) a regressão quantílica apresenta algumas vantagens em relação ao MQO, além de proporcionar uma rica caracterização dos dados. Ela é mais robusta a outliers do que a regressão de MQO, além disso, os estimadores da regressão podem ser consistentes sob as condições da heterocedasticidade, que não são possíveis ao estimador MQO.

A regressão quantílica está gradualmente emergindo como uma abordagem para a análise estatística de modelos lineares e não lineares. Por complementar o foco dos Mínimos Quadrados (cuja base, é a função condicional média), com uma técnica geral para a estimativa de funções condicionais de quantis, a regressão quantílica é capaz de expandir a flexibilidade de ambos os métodos de regressão paramétricos e não paramétricos (KOENKER; MACHADO, 1999).

A distribuição por quantil foi ilustrada por Koenker e Hallock (2001), ao analisar a relação entre a compensação executiva e o tamanho das empresas. Os autores observaram uma relação positiva entre a remuneração executiva e o tamanho da empresa, ou seja, a remuneração executiva aumenta com o tamanho da empresa. Contudo, foi possível observar outras características que influenciam neste processo, pois a distribuição dos dados em quantis permite uma leitura completa da amostra, já que numa regressão clássica é abandonada a ideia de estimações separadas para um grupo de dados, e estima-se um modelo condicional a média do grupo analisado.

Neste instante, apresenta-se uma explicação sobre a regressão quantílica antes de serem mostrados alguns trabalhos que utilizaram esta técnica, para melhor ilustrar o tema.

Os quantis de uma população ou de uma amostra podem ser definidos da seguinte forma: para uma variável aleatória contínua y, o quantil de ordem q de uma população ou amostra é o valor q tal que y é menor ou igual a q, com probabilidade q. Assim:

q = Pr [y q] = Fy ( q), (1)

onde Fy é a função de distribuição cumulativa (fdc) de y. Por exemplo, se 0.75 = 3, então a

probabilidade de y 3 é igual a 0.75. Segue-se que:

q = F-1y (q). (2)

Os principais exemplos de quantis mais utilizados são a mediana, q = 0.5, o quantil superior, q = 0,75, e o quantil inferior, q = 0.25. Para uma distribuição normal padrão, 0.5 =

0.0, 0.95 = 1.645, e 0.975 = 1.960. O percentil 100q é o qth quantil.

Para o modelo de regressão, a população qth quantil de y condicional a x é tal que a função q (x) é de tal forma que y condicional a x é menor ou igual a q (x) com probabilidade

q, onde a probabilidade é avaliada usando a distribuição condicional de y para um dado x. Segue-se que:

q (x) = F-1y|x (q),

onde Fy|x é a condição da fdc de y para um dado x.

É interessante derivar a função quantil q (x) se o processo gerador de dados (dgp) é

assumido como o modelo linear com heterocedasticidade

y = x’b + u,

u = x’ × ,

~ iid [0, 2],

onde se assume que x’ > 0. Então a população qth quantil de y condicional a x é função de

q (x, b, ), tal que

q = Pr [y q (x, b, )]

= Pr [ [ q (x, b, ) - x’b]/ x’ ]

= F ([ q (x, b, ) - x’b] / x’ ),

onde usamos u = y – x’b e = u / x’ , e F é a fdc de . Segue-se que [ q (x, b, ) - x’b]/ x’ )

= F-1 (q), de modo que

q (x, b, ) = x’b × F-1 (q)

= x’ (b + × F-1 (q)).

Assim, para o modelo linear com heterocedasticidade, na forma u = x’ × , os quantis condicionais são lineares em x. Em casos especiais de homocedasticidade, x’ é igual a constante e todos os quantis apresentam a mesma inclinação e diferem apenas na sua interseção, que se tornam maiores quando q aumenta.

Em exemplos mais gerais a função quantil pode não ser linear em x, devido a outras formas de heterocedasticidade, como u = h (x, ) × , onde h(·) é não linear em x, ou porque a própria função de regressão é de forma não linear g (x, b) (CAMERON; TRIVEDI, 2005).

Para ilustrar os benefícios da regressão quantílica serão apresentados alguns trabalhos que optaram por utilizar esta técnica, para estudar os determinantes da estrutura de capital. Fattouh, Scaramozzino e Harris (2003) apresentaram a evolução dos determinantes da estrutura de capital de empresas sul-coreanas, no período de 1992 a 2001. As evidências sinalizaram que, a assimetria de informação influencia as decisões de financiamento em todos os quantis observados, contudo, seus efeitos diferem entre as empresas em diferentes quantis. Os autores decidiram usar a regressão quantílica para explorar a mudança na distribuição dos níveis de endividamento das empresas, pois as técnicas convencionais que usam a média condicional das variáveis não consideram a heterogeneidade completa das empresas.

Já Qiu e Smith (2007) observaram a relação entre a necessidade de fluxo de caixa e a emissão de dívidas. Os resultados encontrados dão suporte a pecking order modificada, que considera o papel primário dos custos de falência nas decisões da estrutura de capital quando os déficits financeiros são grandes, e o papel secundário do tamanho da empresa, da lucratividade, do market-to-book e a tangibilidade. Para os autores, além da robustez a

outiliers, com a regressão quantílica foi possível observar toda a distribuição das emissões de

dívida em relação ao déficit financeiro. Fato importante, pois permitiu identificar a proporção de empresas que não usavam dívidas para cobrir seus déficits, a certa necessidade de caixa.

A literatura, também, tem dado atenção às decisões sobre a estrutura de capital, associando-as as práticas de governança corporativa. Wellalage e Locke (2012) analisaram como as características das empresas e as práticas de governança influenciam nas escolhas da estrutura de capital de empresas neozelandesas, ao longo de 2003 a 2010. Este trabalho trouxe algumas contribuições aos estudos sobre estrutura de capital, ao apresentar evidencias de que as características das firmas e as práticas de governança influenciam as escolhas da estrutura de capital; e por utilizar uma técnica econométrica robusta, pouco utilizada em estudos sobre estrutura de capital se comparada a outras técnicas de análise. Para os autores, com a regressão quantílica foi possível esboçar toda a distribuição de alavancagem, condicional a um conjunto de variáveis explicativas, em vez de uma única medida de tendência central da distribuição da estrutura de capital das empresas. Além disso, a amostra apresentava outliers e a variância do termo de erro é não normal, assim a regressão quantílica foi considerada robusta, como técnica de análise para o estudo.

No Brasil, Oliveira et al. (2012) examinaram os determinantes da estrutura de capital das empresas nacionais entre os anos de 2000 a 2009. A pesquisa apresentou a regressão quantílica como método de análise e a comparou com os modelos convencionais (mínimos quadrados e efeitos fixos). As evidências sugerem que a regressão quantílica traçou mais detalhadamente a distribuição do endividamento das empresas, ou seja, permitiu observar que as políticas de emissão de dívidas mudam de acordo com o nível de endividamento da empresa. Por fim, os autores concluíram que os efeitos dos determinantes variam dependendo do quantil. Essa influência é justificada pelos custos de falência e agência correspondente ao nível de endividamento das empresas, a cada quantil. Portanto, as previsões dos efeitos das principais teorias da estrutura de capital (pecking order e trade-off), se aplicam, dependendo do determinante, do tipo de dívida e quantil analisados.

Os estudos internacionais sobre estrutura de capital têm sido realizados por muitos pesquisadores como Bastos, Nakamura e Basso (2009), Ivashkovskaya e Solntseva (2008), Öztekin (2011), e Rajan e Zingales (1995) que fazem uso das técnicas econométricas como Regressão Pooled, Painel de Dados com efeitos fixos e aleatórios e Mínimos Quadrados Ordinários, como métodos de análise.

O presente trabalho, entretanto, destaca-se por usar a regressão quantílica como diferencial metodológico na compreensão da estrutura de capital, pois o uso deste instrumental quantílico ainda é pouco utilizado para este fim, apesar da sua robustez no tratamento dos dados. Além disso, apresenta alguns atributos importantes para esta investigação como: (a) mais robusta a outliers, (b) um método adequado para a análise de

dados heterogêneos, assim, os dados são gerados com uma rica caracterização por considerar as diferenças entre as empresas, ou seja, os níveis de endividamento distintos, e (c) é uma abordagem semiparamétrica, no sentido de que evita hipóteses sobre os erros de regressão em uma distribuição do tipo paramétrica (CAMERON; TRIVEDI, 2010; FATTOUH; SCARAMOZZINO; HARRIS, 2003).

Para Fr lich e Melly (2010) a estimação por quantil é uma ferramenta poderosa e intuitiva que nos permite descobrir os efeitos sobre toda a distribuição dos dados. Assim, a regressão quantílica torna-se adequada aos estudos de estrutura de capital, pois a distribuição da variável dependente pode mudar de várias maneiras que não são completamente observáveis em análises por médias (por exemplo, a distribuição dos níveis de endividamento por ser comprimida, ou, a desigualdade na parte superior da distribuição pode aumentar enquanto desigualdade na parte inferior diminui).