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4 DIREITOS FUNDAMENTAIS

4.2 Os níveis insatisfatórios de proteção dos Direitos Fundamentais em um cenário de

4.2.2 Regulamentação dos Direitos Fundamentais

Noutro momento, foi informada a aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais, como regra geral de sua eficácia, decorrente do que estabelece o art. 5º, §1º, da constituição federal (ver subcapítulo 5.1).

Contudo, como é de conhecimento de todos que, algum dia, estudaram direito constitucional, as normas constitucionais, quanto à sua aplicabilidade (ou eficácia, se achar melhor), contam com uma classificação clássica, estabelecida por José Afonso da Silva161: a) normas de eficácia plena, que são as exequíveis de imediato; b) as de eficácia contida, que contam com aplicabilidade imediata, mas podem ter seu alcance restringido por norma infraconstitucional; e c) as normas de eficácia limitada, que somente passam a surtir efeito a partir da edição de legislação infraconstitucional regulamentadora.

Pode ser considerada norma de eficácia plena o art. 5º, inciso LXIX, da constituição federal162; por sua vez, apresenta-se como norma de eficácia contida a constante do art. 5º, XIII, da mesma carta163; por último, contêm eficácia limitada as regras dos arts. 7º, XI164, e 37, VII165, da constituição federal.

160 NOBRE JÚNIOR, Edilson Pereira. Jurisdição Constitucional: aspectos controvertidos. 1. ed. Curitiba: Editora Juruá, 2012, p. 223.

161 SILVA, José Afonso. Aplicabilidade das normas constitucionais. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 82- 83.

162 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 18. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 18-24. “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público;”.

163 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 18. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 18-19 . “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;”.

164 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 18. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, p. 24-26. “Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: [...]XI – participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração, e, excepcionalmente, participação na gestão da empresa, conforme definido em lei;”.

165 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 18. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, ps. 42/43. “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá

Essa distinção é feita em face da densidade das normas constitucionais, isto é, da importância e fundamentalidade do direito que alberga.

Mas, pelo menos no aspecto negativo, a vigência das regras de direito fundamental, assim como as demais regras constitucionais, é imediata e as referidas normas contam com efeito vinculante quando impedem que o judiciário, o executivo e o legislativo, desde logo, lancem atos/provimentos que contrariem seu teor.

Com relação ao enfoque positivo da aplicação dos direitos fundamentais, Ingo Sarlet ensina que

a vinculação do legislador implica um dever de conformação de acordo com os parâmetros fornecidos pelas normas de direitos fundamentais e, neste sentido, também, um dever de realização destes, salientando-se, ademais, que, no âmbito de sua faceta jurídico-objetiva, os direitos fundamentais também assumem a função de princípios informadores de toda a ordem jurídica166.

Nesse cenário é que se vislumbra a falta de aproximação do poder legislativo dos fatos sociais e de determinações constitucionais específicas, em razão de não ter procedido à regulamentação de direitos fundamentais previstos desde outubro de 1988, por não ter dado ou não dar importância e prioridade a projetos de lei de vital importância para a sociedade e por adiar, por anos, a reforma política.

De outro lado, Ingo Sarlet revela a teoria de R. Breuer, sobre os direitos fundamentais, em síntese, da seguinte maneira: a) o reconhecimento de direitos fundamentais originários a prestações no âmbito de uma solução de natureza minimalista; b) a ideia de que a garantia de um standard mínimo e de um padrão elevado de distribuição de justiça são tarefas do legislador; c) direitos subjetivos a esse mínimo de direitos fundamentais surgirão quando o legislativo não se desincumbir, adequadamente, de seus misteres167.

Mas o que vem a ser esse mínimo fundamental, garantidor de uma liberdade fundamental que faz com que o indivíduo tenha condições de exercer, com autonomia, sua liberdade, sem a ajuda do Estado? O próprio Ingo Sarlet crê que o mínimo fundamental se

aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...] VII - o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica;”.

166 SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 8. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 391.

167 SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 8. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007, p. 367-368.

relaciona com os princípios da proteção da vida e da dignidade humana, vistos através de uma interpretação guiada pela realidade social168.

Como afirmado alhures, num país como o Brasil, não há dificuldade em identificar o mínimo existencial que não é atendido pelo estado, até porque nele não são assegurados, como deveriam ser, os direitos à saúde, à educação, à segurança, ao lazer, enfim, a diversos direitos fundamentais prestacionais.

Ocorre que o orçamento público é limitado, é esboçado pelo poder executivo e aprovado, com ou sem alterações (normalmente com), pelo poder legislativo. A questão é saber se, quando da elaboração/aprovação desse orçamento, são alocados recursos suficientes para o atingimento do mínimo fundamental a ser estendido à população, para que tenha uma vida digna.

Com relação a alguns direitos fundamentais, a constituição federal indica a necessidade da previsão de percentuais mínimos que devem ser destinados, como é o caso da saúde e da educação (arts. 34, VII, 35, III, 160, § único, 167, IV, 198, §2º, e 77, do ADCT).

Ocorre que o orçamento público é feito num cenário de distribuição e manutenção de poder, no âmbito das funções estatais, com a concessão de excessivos benefícios, vantagens e privilégios, sem que os direitos fundamentais contem com a prioridade que merecem, assim como não há pressa na tramitação de projetos de lei importantes, assim como dos que venham a regulamentar direitos fundamentais, como é o caso do direito de greve dos servidores públicos, por exemplo.

Essa omissão do poder legislativo contribui, sobremaneira, para a crise de legitimidade da democracia representativa, a uma porque deixa direitos de fundamental importância sem regulamentação; a duas, em razão de sua omissão propiciar a interferência do poder judiciário, para substituí-lo na concessão e na regulamentação de direitos fundamentais, promovendo o desequilíbrio entre as funções estatais, uma vez que não se encontra habilitado para o exercício de funções políticas, como será adiante debatido.