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4.1 RELATO DOS DOCENTES

4.2.2 Relação Com os Alunos

Como dito anteriormente, para que o ensino e a aprendizagem aconteçam é preciso que ambas as partes estejam envolvidas, professores e alunos, que haja uma relação entre as partes que favoreça o aprendizado. Nesta categoria aborda-se essa relação a partir de um ângulo externo dela, a visão da pesquisadora.

Nas turmas observadas, os docentes incentivaram seus alunos a participarem, a trazer suas experiências para aula, e para tal tentaram criar um ambiente onde os alunos se sentissem à vontade para fazê-lo, “O professor dirige aos alunos perguntas sobre os conteúdos trabalhados. Eles participam, respondem as perguntas do professor, e este confirma a contribuição acertada do aluno, ao dizer ‘isso’” (DIÁRIO DE CAMPO – PROFESSOR FLÁVIO). O reforço positivo ̶ como dizer que o aluno está certo, usar o que o aluno disse na aula para ilustrar um ponto do conteúdo da disciplina ̶ contribui para a participação do aluno.

Alguns dos professores se aproximavam do aluno quando ele estava falando, olhavam para ele sinalizando que estavam dando atenção, que aquilo que ele estava falando tinha relevância para a disciplina, incluindo pedir a atenção do restante da turma para aquilo,

“Um aluno faz uma contribuição, o professor dá passos na direção do aluno que está falando, olha para ele. Enquanto o professor está esclarecendo a dúvida do aluno, os demais ficam numa conversinha, o professor precisa intervir, shiiiii” (DIÁRIO DE CAMPO – PROFESSOR PAULO).

Essa fala em específico ilustra a ideia de promover a participação dos alunos na aula, fazendo da sala de aula um local performático, onde o saber não tem uma única fonte e forma, mas se molda e se constrói em conjunto (DELMAR, 2012; SANTANA, 2013). A sala de aula é vista como local para o desenvolvimento do conhecimento, que se forma à medida que a teoria e a vivência prática, simulada ou real, são compartilhadas entre os estudantes e os docentes. As atividades desenvolvidas em sala de aula têm

o intuito de simular situações organizacionais reais (LIBÂNEO, 2002; SCHWARTZ; BITTENCOURT, 2012; NÖRBERG; FOSTER, 2016).

É perceptível que, quando o professor incentiva que o discente faça contribuições, não significa que está se isentando da função de mantenedor da ordem, essa é uma característica incontestável da função do docente (FÁVERO; PASINATO, 2013). Em algumas turmas observadas, a forma como os alunos indicavam ao docente que desejavam contribuir com a aula era levantando a mão. O docente, ao perceber que o aluno estava com a mão levantada, terminava seu raciocínio e lhe dava a palavra. Além disso, os docentes tentam envolver os alunos no processo, seja lhe dirigindo perguntas, seja pedindo que eles leiam ou contem alguma coisa.

Nas observações, foi possível perceber que o comportamento dos alunos é variável, numa semana a turma estava muito participativa e na outra totalmente apática. Essa é uma condição impactante no exercício do trabalho docente. O que remete a ideia do docente como estando em um palco, a sala de aula (MEDEIROS, 2007; GRILLO, 2001; DELMAR, 2012), onde há dias em que o espetáculo agrada e dias que não. Essa dimensão tem uma singularidade, pois em um espetáculo há um comportamento padrão esperado, ninguém chega ao teatro e tenta intervir no que os atores estão fazendo no palco, a menos que os atores solicitem a colaboração da plateia e, ainda assim, essa o fará quando os atores derem a deixa. E quando a plateia for solicitada, se não corresponder ao que os atores pediram, não rirem da piada contada, a peça não acontece. Da mesma forma acontece nessa comunicação simbólica que permeia a sala de aula, onde o professor vai lendo os alunos, e percebendo o que é possível ser feito naquele dia,

[...] eu tenho um aluno que é muito sério, ele é gestor de RH, eu não brinco com ele, eu não brinco, porque eu já percebi que ele tá sempre na dele, é o perfil dele, nunca brincou comigo, nunca me deu a liberdade de brincar com ele. Mas eu tenho um outro [...] que é um menino muito aberto, eu brinco. Quer dizer, o aluno me dá o tom da forma [...] eu sei com quem brincar, com quem não brincar, que turma que aceita mais brincadeira (PROFESSORA VALÉRIA).

E os alunos lendo o professor, porque também existem docentes que não gostam da participação dos alunos:

Nós tivemos um caso de um professor que estava se aposentando, professor de estatística [...] Ele reprovou de quarenta e cinco alunos matriculados, três passaram direto, os outros todos foram pra prova final, na prova final passaram quatro. E ele não conversava com os alunos. Entrava, escrevia no quadro e saía. E o aluno ia falar com ele e ele dizia, “ah vai estudar, você não

sabe nada, esse curso aqui não vale nada” [...] usavam o quadro e de costa pra os alunos, sem didática nenhuma [...] Não que ele estivesse destratando no sentido, ele (p: seco?), seco, isso, brigado, isso [...] E às vezes o que deu certo numa turma pode não dar na outra (PROFESSORA VALÉRIA).

Dessa forma, quando o docente está no seu palco, a sala de aula, o docente busca conseguir atingir o máximo de alunos possível. É como um ator que, ao perceber que algo funciona, tenta esgotar aquele recurso e vai buscando perceber o que a plateia quer, o que está acontecendo com os alunos, o porquê da agitação, negocia com os alunos,

O professor tinha acabado de mudar de slide, e isso desperta o zumzum dos alunos, ele percebe e faz uma análise e percebe que é por causa do horário e os alunos pedem a ele que termine a aula ali, pois já são 22:20h, ele atende ao pedido [...]. Hoje os alunos estão muito calados, já passa de 1h de aula e só uma intervenção dos alunos é feita, mesmo quando o professor faz pergunta não é respondido, estão menos participativos hoje (DIÁRIO DE CAMPO – PROFESSOR PAULO).

O trabalho docente porta uma carga de imprevisibilidade, por depender dos alunos e do próprio docente, por ser vulnerável aos humores, condições físicas e de trabalho, que podem comprometer a realização de uma dinâmica programada, que não renderá o mesmo resultado em um dia que os alunos ou o professor não estejam dispostos (MORSCHEL, et. Al, 2011).