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Relação entre o género e a sobrecarga nos CIs (Objectivo 3.1.)

CAPÍTULO V: DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

5.3. Resultado da análise da relação entre as variáveis sócio-demográficas e a sobrecarga do cuidado nos CIs (Objectivo 3)

5.3.1. Relação entre o género e a sobrecarga nos CIs (Objectivo 3.1.)

Através da análise descritiva dos CIs do género feminino, verifica-se que os factores SE e

IVP são os que contribuem em maior peso para a sobrecarga – neste caso uma sobrecarga

grave – sugerindo que a maioria destas cuidadoras revela emoções negativas capazes de originar conflitos internos, sentimentos de fuga à sua situação, bem como repercussões negativas da prestação de cuidados.

Os restantes factores sugerem uma sobrecarga moderada pela seguinte ordem: RE, SupF,

PMEC, SF e SPF. No entanto, é de salientar que as pontuações de todos estes factores

RE e SupF, sugerindo que as percepções de manipulação, ofensa e embaraço, o escasso

suporte familiar, a percepção de carência face a mecanismos de eficácia para enfrentar os problemas decorrentes da prestação de cuidados, as dificuldades económicas inerentes à situação de prestação de cuidados ao idoso demenciado e as incertezas relativamente ao futuro, contribuem, em conjunto, para uma sobrecarga moderada (quase grave) nestes CIs.

Verifica-se, também, um elevado coeficiente de dispersão nos factores SF e SupF, o que revela que existem CIs em ambos os extremos, ou seja, uma parte revela maiores dificuldades financeiras e maior carência de suporte familiar comparativamente com uma outra parte que se mostra financeiramente menos afectada e com um maior suporte familiar.

Através da análise descritiva dos CIs do género masculino verifica-se que as pontuações obtidas revelam uma sobrecarga moderada para todos os factores. Tal como nas mulheres, o factor SE corresponde ao factor que acarreta maior sobrecarga para estes CIs, indicando que a maioria dos mesmos revela emoções negativas capazes do originar conflitos internos e sentimentos de fuga à situação da prestação de cuidados, o que é compreensível, uma vez que a prestação de cuidados a pessoas com demência é uma situação stressante e esgotante que pode originar um decréscimo do bem-estar e um aumento dos problemas de saúde do CI (Figueiredo, 2007; Pearlin et al., 1990). Neste sentido, os resultados mostram uma tendência para que a sobrecarga emocional seja o factor que mais afecta os CIs de ambos os géneros o que vai de encontro a Paúl (1997), que refere que o stress relacionado com a situação de cuidar está mais associado aos elementos emocionais da situação e a forma como ela é percepcionada pelo cuidador, do que ao número de tarefas objectivas ou grau de dependência física ou mental do doente.

Seguem-se os factores PMEC e IVP indicando que a percepção de carência face a mecanismos de eficácia para enfrentar os problemas decorrentes da prestação de cuidados e as repercussões sentidas por estes CIs devido à prestação de cuidados aos seus familiares demenciados (e.g. falta de tempo, sentimento de se estar preso à situação de prestação de cuidados; negligência das próprias necessidades em detrimento do bem- estar do doente etc.) contribuem para uma sobrecarga moderada destes cuidadores. Os

factores RE, SPF, SupF e SF correspondem aos factores que, comparativamente com os outros factores, acarretam uma sobrecarga menor para os CIs do género masculino.

Observa-se que, apesar destes factores ainda se situarem dentro do parâmetro da sobrecarga moderada, situam-se já próximos do limite da sobrecarga ligeira, sobretudo o factor SF. Deste modo, as percepções de manipulação, os sentimentos positivos inerentes à prestação de cuidados e à pessoa cuidada, o seu suporte familiar, as dificuldades económicas inerentes à prestação de cuidados ao idoso demenciado e as incertezas relativamente ao futuro, não se traduzem numa sobrecarga elevada comparativamente com os restantes factores. Tal como nas mulheres, verifica-se também nos homens um coeficiente de dispersão mais acentuado nos factores SF e SupF. Isto é perfeitamento viável uma vez que, tanto nos CIs homens como nas CIs mulheres, o suporte familiar e a situação financeira são dimensões que variam muito de pessoa para pessoa, sendo influenciados pelas oportunidades de emprego, o nível sócio-económico e o funcionamento/coesão da família o que vai de encontra a Tak e McCubin (2002) que consideram que o suporte familiar é um preditor significativo de coping familiar que influencia a resiliência das famílias que lidam com familiares doentes crónicos.

Comparando os resultados obtidos através da análise descritiva efectuada no que concerne à relação da variável género e a sobrecarga dos CIs, destaca-se que as mulheres pontuam uma sobrecarga mais elevada em todos os factores do QASCI, o que vai de encontro à literatura que aponta para a existência de diferenças ao nível da percepção da sobrecarga, no sentido em que o género feminino percepciona maior sobrecarga, tanto objectiva (Farran, 2004) como subjectiva (Miller & Cafasso, 1992) comparativamente com os homens. Especificamente, evidenciam uma pior qualidade de vida (Borden & Berlin, 1990; Lutzky & Knight, 1994) e maior desconforto psicológico uma vez que: (a) são pressionadas socialmente a assumirem o papel de CIs ao invés dos homens (b) prestam maior assistência ao nível dos cuidados pessoais; (c) recebem menos ajuda

formal e informal na prestação de cuidados; (d) são mais pressionadas socialmente para assumirem o papel de cuidadora principal, enquanto o género masculino é mais pressionado em questões financeiras; (e) permanecem mais tempo no papel de CI mesmo que a experiência se torne demasiado stressante e (f) tendem a ter menos recursos de

masculino que é mais externo (Collins & Jones, 1997). No entanto, através da análise inferencial, os resultados obtidos referem que os níveis de sobrecarga dos CIs variam significativamente consonante o género apenas para os factores RE, IVP evidenciando, por um lado que os homens parecem adaptar-se melhor ao papel de cuidador, empregando estratégias de coping mais eficazes quando comparados com as mulheres, e por outro, tendem a despender menos tempo para prestação de cuidados, tendem a ter mais ajudas na própria prestação de cuidados e, frequentemente têm ajudas na limpeza do lar e na preparação das refeições, o que lhes dá mais tempo para cuidarem de si próprios, de actividades sociais ou de hobbys (Allen, 1994; Borden & Berlin, 1990, Gilhooly, Sweeting, Whittick, & McKee, 1994 citado por Braun et al., 2009).

Os resultados inferenciais obtidos para os restantes factores mostram que não existem diferenças significativas ao nível da sobrecarga entre ambos os géneros. Na literatura, o estudo levado a cabo por Fitting, Rabons, Lucas e Eastham (1986) que pretendia avaliar a sobrecarga nos cuidadores cônjuges de ambos os géneros, vai de encontro aos resultados obtidos para estes factores, uma vez que verificaram que “husband and wife caregivers

for demented spouses experience similar degrees of burden” (p. 250).