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Relação professor, acompanhante e paciente: um bom exemplo

dessa integração ocorreu no Hospital A, pediatria cirúrgica. A criança já havia sido hospitalizada diversas vezes. A cada internação os laços afetivos entre todos se fortaleciam. A mãe passou a ter mais confiança no trabalho da professora. Durante a pesquisa, a mãe foi incentivada a pintar um quadro junto com a filha e logo se prontificou a ajudar outra criança, evidenciando já conhecer a sistematização do atendimento.

Contudo, embora a maioria dos acompanhantes demonstre interesse em participar das atividades junto com as crianças, a situação de internação não necessariamente ocasiona isso. É preciso compreender que a hospitalização não ocorre apenas para o paciente. Além de presenciar as debilidades e preocupações acarretadas pela doença, os pais vivenciam a rotina da internação. Isso implica, em alguns casos, certo distanciamento do trabalho realizado pelo professor, pois aproveitam esse período para descansarem ou realizarem outras atividades.

Na opinião de uma das professoras, há acompanhantes que mesmo com toda explicação sobre a função do programa classe hospitalar e do professor nesse ambiente não enfatizam a importância das atividades educativas. Para ela (M.N, 2010), “há pais que incentivam, quer que eles se divirtam, distraiam. Outros jamais, porque acham que têm que descansar. Mas a maioria quer se livrar”.

Há também a não aprovação dos pais com relação à oportunidade dos filhos em desempenharem atividades fora do leito. O trabalho de conscientização das professoras em muito contribuiu para desmistificar a ideia de que a criança que apresenta uma enfermidade deve manter-se distante dos trabalhos escolares ou qualquer outra atividade. Porém, ainda existem aqueles que persistem com esse julgamento. Como bem expôs a professora do Hospital A:

Para muitos pais é a primeira vez que se deparam com um professor dentro de um hospital. Boa parte dos hospitais ainda não funciona assim. Muitos nem são de Brasília. Então é claro que num primeiro momento eles não entendem o nosso papel aqui. E muitos ainda têm a ideia de que a criança precisa apenas ficar quieta, descansando porque assim vai se recuperar mais rápido. Isso é cultural. O nosso trabalho vai acontecendo aos poucos, inclui também essa abordagem com os pais. De fazê-los entender a importância do trabalho, a ajuda que proporciona aos seus filhos, né? E os médicos incentivam a criança a sair do leito e vir para cá. Então tem todo esse respaldo da própria equipe médica (E.A, 2010).

Outro aspecto identificado pela professora do Hospital C é a necessidade de prestar assistência educacional a alguns acompanhantes. Por se tratar de um atendimento que engloba muitas famílias carentes, a professora sente-se na obrigação de ajudar os pais para que posteriormente possam agir de maneira correta na recuperação da saúde dos filhos. Segundo ela (M.N, 2010), muitos não sabem ler e escrever o que dificulta uma melhor compreensão do tratamento a ser efetuado. Isso é identificado na própria interação incentivada naturalmente no programa classe hospitalar que costuma aproximar as relações mantidas entre pais e filhos. É principalmente no momento do brincar mais direcionado que a professora constata quais acompanhantes carecem de seu apoio, o que pode ser identificado na sua fala:

Muitos acompanhantes pedem um jogo, alguma atividade. Já teve caso de ter que ensinar até o acompanhante. Quer um exemplo? Uma criança com diabetes que estava acompanhada com a mãe que era analfabeta. Os médicos pediram que eu ensinasse também a mãe, pois alguns conteúdos básicos ajudariam a lidar com aquela situação. Ela precisou aprender os números, medição, pois ela ia precisar saber a dosagem do remédio para dar ao filho. Acabou que trabalhei outras coisas também como aprender a escrever o nome. Então, muitas vezes, o pai ou a mãe acaba não só participando da brincadeira, como aprendendo com o filho também (M.N, 2010).

Matos e Mugiatti (2007) alertam para a necessidade de valorização da família no processo de educação promovido como forma de obter resultados satisfatórios em todos os aspectos do tratamento. Para elas, “a experiência tem sido pródiga em mostrar quão férteis são os investimentos a ela direcionados, enquanto elemento contributivo e indispensável ao trabalho multi/inter/transdiciplinar” (p. 63). Segundo Junqueira (2003, p. 3-4) o brincar para a família abarca as seguintes ideias:

O brincar aparece como sinal de saúde na perspectiva das mães.

O brincar se estabelece como uma outra possibilidade de a mãe se comunicar e relacionar com seu filho, que não somente a perspectiva da doença.

O brincar possibilita à mãe ausentar-se para descansar.

Nos casos em que a criança é portadora de algum distúrbio neurológico, o brincar assume o papel de diluir qualquer tipo de diferença acarretada pela patologia, permitindo à mãe perceber seu filho aceito, olhado e respeitado como qualquer outra criança e, consequentemente, ela própria aceita, sem discriminações.

Para as mães, particularmente aquelas que brincavam mesmo que separadamente dos filhos, o brincar funcionava como um espaço de escoamento das ansiedades.

Evidenciada todas essas situações nas classes hospitalares visitadas, nessa condição, a função do professor, em muitos casos, vai além do esperado para este no hospital. Porém, o fato da atenção dispensada ao adulto interferir positivamente no tratamento da criança reflete a importância que o profissional confere ao paciente. Situações atípicas, não previstas em lei, mas que garantem ações efetivas de todos os envolvidos na recuperação da criança. Pode-se concluir que o trabalho do professor abarca o resgate da afetividade entre pais e filhos, envolve mecanismos motivacionais criados para superar o sentimento de exaustão provocada pela hospitalização e incentiva a participação nas atividades educativas e lúdicas.

6.2.1.2 - Estruturando o aprender brincando

Todo professor comprometido com o trabalho que realiza procura organizar um detalhado planejamento de aula no intuito de estabelecer objetivos e definir quais metodologias e recursos serão utilizados na construção de conhecimentos pelo aluno. Além de facilitar na ação educativa, os materiais empregados têm a função de atrair a atenção dos estudantes de forma a tornar esse momento ainda mais participativo.

Para esse profissional nada é mais importante que observar os avanços obtidos pelo aluno. E isso se torna ainda mais gratificante quando percebe o interesse do educando pelo o que foi criteriosamente delineado. O bom professor sabe adequar antigos recursos pedagógicos às novas tecnologias ou mesmo empregar em sala de aula alguns elementos que originalmente não detém uma função educativa para, assim, despertar o interesse do corpo discente.

Antigamente, o uso de elementos lúdicos na educação produzia um errôneo entendimento de não seriedade ao processo de aprendizagem. O que era sinônimo de bagunça passa a ser visto, atualmente, como oportunidade de criar um novo cenário para o ato de aprender da melhor maneira possível. Esse modo para muitas crianças é brincando.

Reportando às ideias de Libâneo (2002), o autor destaca que a função do professor é programar de forma detalhada suas ações visando promover atividades que impulsionem os

alunos a se tornarem atuantes na própria aprendizagem. Para ele, “não há ensino verdadeiro se os alunos não desenvolvem capacidades e habilidades mentais, não assimilam ativamente os conhecimentos ou se não dão conta de aplicá-los, seja em classe, seja na prática da vida (p. 6). Partindo desse pensamento, pode-se dizer que qualquer elemento empregado no processo educativo, seja ele lúdico ou não, deve atender a essa necessidade de estimular o aluno a fazer descobertas e utilizá-las em seu cotidiano. É justamente nesse sentido, que são estimulados o uso de jogos e outros brinquedos no âmbito da classe hospitalar.

Por meio das entrevistas realizadas, constatou-se que há por parte das professoras uma intencionalidade ao utilizar elementos lúdicos no processo de aprendizagem dos alunos. Ações educativas que utilizam recursos como jogos e brinquedos são estruturadas também para atender os objetivos traçados pela escola de origem da criança ou da própria professora da classe hospitalar. Esse último caso ocorre mais comumente em determinadas situações onde não é possível um maior contato com a instituição de ensino.

A professora do Hospital B esclareceu que a preocupação em estruturar as atividades lúdicas ocorre não apenas no momento da escolha dos materiais, mas engloba toda a construção do espaço onde serão desenvolvidas as atividades. Assim, o interesse em despertar a atenção da criança tem início ainda na concepção do que vem a ser a classe hospitalar, seu ambiente, sua importância tanto para a educação da criança, como também envolve a intenção de estabelecer um local aconchegante.

Para ela, há certa unanimidade entre as professoras das classes hospitalares ao considerarem que um espaço atrativo, cheio de brinquedos e colorido facilita o trabalho do professor, pois não é necessário que este precise ir atrás das crianças. As crianças procuram naturalmente esse espaço. A estruturação de atividades lúdicas também é defendida pela professora do Hospital C. Segundo ela, não é necessariamente o material que define o que pode ser considerado lúdico, ou seja, para ser atrativo não é preciso trabalhar apenas com brinquedos aprimorados. A simplicidade de alguns recursos também seduz as crianças no momento da aprendizagem. É a criatividade do professor o diferencial desse processo. De acordo com ela (M.N, 2010):

Sempre procuramos incentivar a criança por meio da brincadeira. Relacionar conteúdo e um jogo, uma atividade mesmo que no papel, mas bem mais lúdica, porque chama mais atenção e, além disso, acaba sendo muito mais estimulante nesse clima de internação, de hospital.

Esse modo de pensar é igualmente difundido pelas professoras do Hospital A. Ao procurarem organizar atividades levando em consideração o aspecto lúdico enfatizam a

necessidade que as crianças têm de se desvencilharem, em alguns momentos, do próprio universo hospitalar. Assim, a ludicidade acaba não somente tornando-se uma aliada da educação, mas também convida todos os participantes a se envolverem com atividades mais leves, diferentes da maioria que ocorrem no hospital.

É nessa dimensão que se baseia a atuação dessas professoras. Na perspectiva de A.C (2010), “o lúdico dentro do hospital é muito importante porque atende a todos. As crianças pequenas, as maiores e os pais também… Através da brincadeira ela melhora, recupera, desenvolve a autoestima, não se sente internada”. O comentário da professora infere a importância que outros elementos agregam ao próprio acompanhamento pedagógico. Se a criança não se encontra disposta o suficiente para participar do trabalho com cunho educativo, nem mesmo o brinquedo ou as brincadeiras propostas pelo professor serão capazes de atraírem sua atenção. Por outro lado, há situações onde esses recursos é que farão toda a diferença como apoio para o desenvolvimento de atividades tanto pelo professor como também pela equipe de saúde.

O importante é saber utilizá-los no momento oportuno, respeitando os limites da saúde da criança e compreender que os recursos lúdicos podem contribuir para melhorias no atendimento clínico ofertado e nos resultados alcançados no programa classe hospitalar, porém não podem ser entendidos como base de toda ação, nesse espaço. De acordo com Cunha e Kryminice (2009) é inquestionável o valor das atividades lúdicas tanto para a educação como para a saúde, uma vez que envolvem aspectos emocionais, sociais, o cognitivo e o físico.

Na tentativa de se compreender como é vivenciada a fase de internação pela criança, de se permitir colocar no lugar do outro e principalmente de procurar alternativas que gerem momentos menos sofridos para estas é que ocorre a organização das atividades escolares sustentadas em recursos lúdicos. Constatou-se que na realidade dessas classes hospitalares a opção de aliar diversão à seriedade do processo educativo não desfaz a importância de que esse momento também seja esquematizado. Algumas observações denotam a estruturação do aprender brincando e a utilização dos convencionais materiais didáticos.

C - Planejamento e desenvolvimento das atividades