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“Eu almo, tu almas, ele alma.”

(LACAN, 1985b)

O imperativo de gozar, ditado pelo princípio do prazer, impõe ao sujeito interrogações que o lançam a saber de si na esfera das relações amorosas e no acesso ao outro como fonte ou via de possibilidades de gozo. Das melhores ou piores possibilidades de confrontação do sujeito com o outro advém, como conseqüência presumível da efetivação da escolha de um objeto (se esta se efetiva), a relação amorosa propriamente. Embora não seja a relação amorosa o foco central de nosso interesse na investigação, e sim a procura do par amoroso propriamente, algumas considerações foram lançadas sobre esse tema. A primeira advém da constatação de que a procura do par é determinada previamente por uma concepção da relação que o sujeito pretenda para si. Constatou-se, na escuta dos sujeitos da pesquisa, que a descrição do homem que desejam para par amoroso redunda numa lista de atitudes que mais caracterizam a relação propriamente do que um sujeito em si. Aí está implícito o desejo de acesso a uma relação como tal, de modo que as duas coisas – escolha do par amoroso e relação amorosa – não podem ser separadas. A escolha de um par implica na escolha de um tipo de relação desejada. E aí estão em jogo os processos psíquicos do sujeito desejante.

Temos, então, como presumível, que a procura de um par amoroso traz em si, implicitamente, o desejo de uma relação amorosa, por esse lançamento à frente do ato mesmo da procura, como o lançamento de um dardo em direção a um alvo determinado. Porém, nisso reside uma questão que se abre por ordem dessa pesquisa: a procura é mesmo demanda de encontro? Será mesmo sempre esse o alvo desse dardo? A isso tratamos de dar resposta pela análise do discurso dos sujeitos pesquisados.

Quando escreveu O Mal-Estar da Civilização, Freud (1930) levantou a questão do propósito e intenção do homem, e apontou o amor como uma das vias de acesso para o seu alcance. Sua pergunta fundadora é: “o que pedem eles da vida e o que desejam nela realizar?”. A resposta incontestável é “ser feliz e assim permanecer.” Resposta que lança a uma meta positiva – experimentar intenso sentimento de prazer, e a uma meta negativa - ausência de sofrimento e desprazer. O funcionamento do aparelho psíquico, regido pelo princípio do prazer é, portanto, o que decide o propósito de vida. Mas a felicidade que pode ser traduzida como a “satisfação de necessidades representadas em alto grau”, é de natureza episódica, fugaz. O prolongamento desse estado prazeroso, alcançado em vista de um desejo, produz um sentimento diferente, um atenuamento desse prazer intenso. As possibilidades de felicidade do homem, conseqüentemente, são por natureza restringidas por sua própria constituição. Ao contrário, a infelicidade é menos rara. São três as direções apontadas por Freud, a partir das quais o sofrimento constitui uma ameaça. A primeira refere-se ao próprio corpo, sujeito ao sofrimento e ansiedade, e predeterminado à decadência e dissolução. A segunda ameaça é representada pelo mundo externo que pode voltar-se contra o sujeito como força de destruição. E a terceira, constituída pelos relacionamentos com os outros homens, apontada como a fonte causadora do sofrimento mais penoso, sendo a que concerne ao interesse mais premente desse estudo.

O funcionamento psíquico impõe que, ao longo das fases de desenvolvimento do sujeito, o princípio do prazer seja transformado no princípio da realidade. Com isso, o homem aprende a moderar suas expectativas de felicidade, e por vezes a felicidade pode implicar apenas na evitação do sofrimento, a sobrevivência a ele. O isolamento voluntário, o distanciamento das outras pessoas, o não estabelecimento de relacionamentos (o que não é possível em sua forma plena, exceto em situações muito específicas), é um comportamento de defesa contra o sofrimento que pode advir dos relacionamentos humanos. A felicidade, na esfera dos relacionamentos, pode estar pautada apenas na evitação do sofrimento a que ficaria exposto na efetivação de um laço amoroso. Ao que Freud chamou de felicidade da quietude. Trata-se da tentativa de controle sobre a vida instintiva, tal como o funcionamento psíquico de adaptação ao princípio da realidade, onde a meta de satisfação não é abandonada, mas a garantia de proteção contra o sofrimento é obtida no sentido de que a não-satisfação dos instintos mantidos nesse controle é menos penosa do que a que deriva dos instintos desinibidos. Há uma perda inegável na potencialidade de satisfação nesses casos, que denotam uma certa resignação do sujeito.

Podemos pensar que, no caso dos sujeitos de nossa pesquisa, essa questão possa estar implicada em alguma medida, trazendo como resultado um comportamento que pode ser tomado pela dicotomia: inserir-se num programa de procura de par amoroso e, ao longo de seu discurso, denunciar não querer de fato um relacionamento, ou não saber se o quer. Da mesma forma, a insistência de sua impossibilidade de dar continuidade aos relacionamentos iniciados, justificada por razões diversas, pode derivar da ação de comportamentos defensivos inconscientes. Freud apontou outros métodos que o ser humano adota no intuito da evitação do sofrimento que podem nos auxiliar na análise da questão dessa investigação. A sublimação dos instintos é um deles. Implica no deslocamento da libido através da qual a satisfação é obtida pela reorientação dos objetivos instintivos. Constitui-se numa tentativa de distensão dos vínculos, intenção de tornar-se independente do mundo externo, pela busca de satisfação em processos psíquicos internos obtidos através de ilusões. Como defesa psíquica, não é permitida a confrontação dessa ilusão com a realidade, a fim de garantir a fruição obtida de fontes do trabalho psíquico e intelectual.

Lacan (1998), frente à teoria freudiana da sublimação, coloca que a pulsão tem valor de pôr em questão o que é da satisfação. Ao sujeito, tudo o que ele vive, mesmo seus sintomas, depende da satisfação, e ainda que ele não se contente com seu estado, ele se contenta assim mesmo. Nisso está implicado que a satisfação pode se dar pelas vias de desprazer, podendo, para atingir essa espécie de satisfação, o sujeito se fazer sofrer. Trata-se de um tipo de satisfação paradoxal, que remete à concepção freudiana de que o caminho do sujeito é marcado pelo impossível, na dimensão do Real enquanto obstáculo ao princípio do prazer. A função do princípio do prazer, por conseqüência, é de satisfazer pela alucinação. Não é pela apreensão do objeto que a pulsão se satisfaz, já que nenhum objeto de nenhuma necessidade pode satisfazer a pulsão. O objeto não tem nenhuma importância, é “totalmente indiferente”.

Interessou especialmente ao propósito dessa investigação a modalidade de vida que busca no amor o caminho da felicidade. Nela, o amor é colocado no centro de tudo, e toda satisfação implica em amar e ser amado, atitude psíquica derivada da intensa sensação de prazer alcançado no amor sexual, tomado como modelo natural, como protótipo de toda felicidade. Entretanto, “[...] nunca nos achamos tão indefesos contra o sofrimento como quando amamos, nunca tão desamparadamente infelizes como quando perdemos o nosso objeto amado ou o seu amor” (FREUD, 1921, p. 101). O amor se apresenta, então, como um caminho a ser tomado ou, justamente ao contrário, a ser evitado, como via de acesso à felicidade, o que se dá de acordo com os mecanismos psíquicos, adotados pelo sujeito com

vistas à economia do aparelho psíquico sempre preservado pela busca de manutenção do equilíbrio entre o princípio do prazer e o princípio da realidade.

Decorre das experiências afetivas dos primeiros anos de vida a “imago paterna”, a “imago materna” e a “imago fraterna”, que irão se apresentar nos processos de transferência ao longo da vida do sujeito, conforme o exposto nos capítulos anteriores desse estudo. Assim, Freud exemplifica: “Se a necessidade que alguém tem de amar não é inteiramente satisfeita pela realidade, ele está fadado a aproximar-se de cada nova pessoa que encontre com idéias libidinais antecipadas” (FREUD, 1912b, p. 134). A formação dessa atitude conta com as partes conscientes e inconscientes de sua libido. Implica em que as imagos infantis do indivíduo foram revividas em decorrência da libido entrar num curso regressivo, podendo desenvolver-se dois tipos de transferência: a positiva, ou transferência de sentimentos afetuosos; e a negativa, ou transferência de sentimentos hostis. A transferência positiva divide-se em sentimentos amistosos ou afetuosos, admissíveis à consciência, e na transferência de prolongamento desses sentimentos inconscientes, que remontam a fontes eróticas.

[...] todas as relações emocionais de simpatia, amizade, confiança e similares, das quais podemos tirar bom proveito em nossas vidas, acham-se geneticamente vinculadas à sexualidade e se desenvolveram a partir de desejos puramente sexuais, através da suavização de seu objetivo sexual, por mais puros e não sensuais que possam parecer à nossa autopercepção consciente (FREUD, 1912b, p. 140).

Lacan (2005) acrescentou ao conceito de transferência seu caráter de constituir-se como a realização da relação humana sob forma de símbolo. Nessa medida, concebe que o sentido que pode ser dado ao amor – “esse algo limítrofe” – é a conjugação total do símbolo e da realidade, que afinal fazem a mesma e única coisa.

No seminário A Transferência, Lacan (1992) apontou o amor como um significante, na medida em que se trata de uma metáfora, uma vez que coloca em causa a substituição. Por essa via, considera a entrada no que há de obscuro no objeto de desejo. Esse objeto amado não sabe o que tem de oculto e que constitui sua atração, o quê o designa enquanto desejado. Na relação de amor, o objeto tem aquilo que é convocado a se revelar, a ser atualizado, ou seja, é de outra coisa que se trata, pois está na correlação do outro, o desejante. Assim, no fenômeno do amor, encontra-se o dilaceramento, a discordância, uma hiância. O outro, enquanto visado no desejo, não é um sujeito, mas é visado justamente como objeto amado, é sua qualidade de objeto que está posta na relação. Trata-se de saber de quê, como significante, o amor é correlativo.

Lacan (1992) tomou o mito de Platão sobre o nascimento do Amor como fundamento para sua fórmula de que “o amor é dar o que não se tem”. Segundo esse mito, o amor é filho de Poros e Penia. O nome Poros, personagem masculina, remete, pela tradução, à “expediente”, “recurso”, “astúcia”; e Penia, personagem feminina, remete à “pobreza”, “miséria”, sem recursos. No texto ela é caracterizada como “aporia” – termo que remete ao “sem recurso”, mas que é usado também com referência ao processo filosófico no sentido de um impasse, “aquilo frente a quê entregamos os pontos, ficamos sem recursos” (p.125). No mito, é a Aporia que engendra Amor com Poros. No momento da concepção é ela, Aporia, quem velava de olhos abertos. Conta a história mitológica que Penia, ou seja, Aporia, viera à festa de nascimento de Afrodite, a deusa da beleza, mas pela sua condição de aporia, de nada ter a oferecer, permanecera à porta da festa sem nela poder entrar. Quando Poros adormece, embriagado após os festejos, e por assim estar, cria-se a condição para que Aporia se faça emprenhar por ele e daí gere um filho, que recebeu o nome de Amor. Pela coincidência da data de sua concepção com o aniversário de Afrodite, temos que o Amor tem sempre uma relação obscura com o belo. O Amor, nessa concepção, pertence a uma forma de negócio, de coisa, de “práxis”, no mesmo nível que “doxa”, termo que se refere aos discursos e comportamentos que são verdadeiros sem que o sujeito possa sabê-lo. Articula-se em torno de uma falta.

A definição dialética do amor vem ao encontro da função metonímica no desejo. Seu discurso trata “[...] de alguma coisa que está para além de todos os objetos, que está na passagem de um certo objetivo e de uma certa relação, a saber, do desejo, através de todos os objetos, e rumo a uma perspectiva sem limite” (LACAN, 1992, p.132). O processo metonímico se produz no sujeito como suporte da cadeia significante. O sujeito, submetido à marca da cadeia significante, institui-se na possibilidade desse deslizamento indefinido dos significantes, e tudo o que se acha uma vez associado à cadeia significante, os elementos mais-além no qual essa atividade desemboca, são tomados como equivalentes uns aos outros. Assim, um elemento qualquer da atualidade, circunstancial, pode assumir o valor representativo daquilo que é o termo da enunciação subjetiva, constituindo-se no objeto para o sujeito, o objeto privilegiado do desejo, capaz, ao menos momentaneamente, de estancar esse deslizamento infinito, pelo valor essencial que pode assumir na constituição da fantasia fundamental. Esse objeto, enquanto supervalorizado pelo sujeito, é o que possibilita ao sujeito fazer-se distinto da submissão ao deslizamento infinito do significante, designando-o enquanto dignidade. O sujeito, enquanto sujeito no desejo, é a possibilidade de ascensão à condição de sujeito propriamente, como culminância.

A transferência, importa enfatizar, é o processo pelo qual, de um lado, o sujeito viabiliza a repetição de uma necessidade, uma necessidade já há muito superada, por isso teve seu desaparecimento possível; e por outro lado, a transferência aparece como uma fonte de ficção, onde o sujeito fabrica, constrói alguma coisa, servindo à rememoração do sujeito, indo além disso. É o que Lacan procura descrever pelo termo da “ágalma” – o que contém um ponto central encoberto, que não se dá muito a saber, e que exerce sobre o sujeito uma atração pelo brilho que expande.

Assim, resta saber, para o entendimento dos nossos sujeitos – se por antecipação sabemos estarem sob efeito do processo da transferência nessas relações que estabelecem, como pressuposto – resta saber que imagos infantis estão operando, e que implicações vão ter – a partir das pré-condições estabelecidas na infância – de gerarem relacionamentos satisfatórios ou frustrantes nessas relações atuais. Que significantes operam nesses sujeitos. Que “negócio” lhes é possível fazer frente às questões do amor, e que objetos podem vir a constituir-se como esse lugar de passagem de um certo objetivo.

Lacan, na intenção e impossibilidade de responder a questões como: quem é o outro? quem é o meu semelhante? o que é o objeto de desejo?, inventou nessa intenção de definição o “objeto a”, cujo símbolo “a” se refere à primeira letra da palavra outro (autre). Assim, o “objeto a” vem ocupar um lugar vazio de respostas, na intenção de qualificar o objeto e designar o nosso semelhante, o alter ego. Refere-se a algo impossível de ser respondido, expressa uma ausência de resposta a uma pergunta que, sendo fundamental ao sujeito, não cessa de se repetir, conforme abordado nos demais capítulos desse estudo. É, afinal, a pergunta norteadora dessa investigação: quem é (ou pode vir a ser), o que é, o “objeto a” do sujeito da pesquisa? A quem (ou o quê) procura esta mulher que se insere na Internet num programa de busca de par amoroso? Quem poderá (será que poderá?) ocupar esse lugar vazio de “objeto a” para ela, lugar de objeto do seu desejo? Quem poderá viabilizar junto ao sujeito sua condição de acesso à condição de sujeito, enquanto sujeito no desejo, à sua dignidade?

No artigo Luto e Melancolia (1917) Freud já denominava de “objeto” a pessoa que foi perdida e de quem se faz o luto, de onde Lacan tomou base para sua teoria. Mas é na questão do traço identificatório que aqui vamos nos deter. Freud propõe que amamos aquele que carrega o traço do objeto anteriormente amado, e a tal ponto que poderíamos afirmar que todas as pessoas que amamos na vida se assemelham por um traço, traço que não é outra coisa senão o próprio sujeito. “O sujeito é o traço comum dos objetos amados e perdidos no curso da vida” (NASIO, 1993, p. 94). Lacan o chamou de traço unário. Freqüentemente é possível

ao sujeito surpreender-se ao constatar que, num novo encontro, a pessoa traz a marca, um traço do que foi anteriormente amado. Isso foi possível de ser identificado na escuta das mulheres, sujeitos dessa pesquisa.

Kehl, reafirmamos, trabalha a idéia de que todo desejo sexual é constituído de uma espécie de objeto-fetiche. Em psicanálise, toda a sexualidade humana é tomada como perversa quando se tem em vista que a sexualidade não se dirige ao outro propriamente, como alteridade, como semelhante, mas dirige-se ao objeto que ele (outro) porta, objeto causa do desejo, que se instala no nível do imaginário. “[...] O que mobiliza o desejo é um pequeno traço, um olhar, um movimento de corpo, um tom de pele – algo que funciona, na fantasia, como capaz de fazer cintilar o brilho fálico no corpo do outro” (KEHL, 2002, p. 175). O neurótico não identifica a natureza do objeto que o fascina, ignora o que no outro lhe atrai, esse “não sei quê” que torna um homem ou uma mulher irresistível ao outro. Ao contrário do fetichista, que conhece e domina os caminhos de seu gozo, o neurótico se põe à mercê da fantasia inconsciente, conforme já abordamos.

Gori (2004) refere que Freud descobriu que os sintomas constituem o modo de amar do neurótico e explora o sentido etimológico da palavra “patologia”, que foi utilizada inicialmente como o estudo das paixões: logos (estudo), pathos (paixões). O objeto do desejo, da paixão, apresenta-se na lógica do discurso do sujeito, onde o que se pode ver é que o objeto não é mais do que uma parte deste todo que representa seu desejo. “[...] o objeto da paixão pode apenas deduzir-se do desejo que, em própria vida, “mantém” aquele que por ela foi capturado” (GORI, 2004, p. 29). O ser amado é o meu bem, minha coisa, ele é eu, é a projeção ideal de mim mesmo. Pode-se ouvir a ressonância dessas afirmativas na fala dos sujeitos da pesquisa, especialmente quando elas descrevem as características do homem que desejam encontrar. Ouvir seu discurso tornou possível identificar, na sua auto-definição, uma forma muito próxima dessa com que designam os homens de seu desejo; diríamos até, trata-se de uma forma espelhada. Estes aspectos foram melhor explorados no capítulo da discussão dos dados. Gori insiste no ressurgimento de um sentimento anteriormente vivido que, contrariamente ao que o sujeito possa tomar consciência e dar-se conta, evidentemente não é um sentimento novo para ele. Os traços do objeto do desejo no adulto se desenham muito mais à imagem destes primeiros objetos perdidos irreparavelmente, antes mesmo do acesso à sua lembrança, do que daquele que presentemente ocupa esse lugar na sua vida adulta. A paixão está a serviço de obliterar essa perda originária. O amor, portanto, vem atender um desamparo, um abandono (suposto abandono) originário.

A metáfora do amor proposta por Lacan de que “amar é dar aquilo que não temos”, deve ser tomada considerando a mensagem dentro do princípio dos processos de linguagem (explorado no capítulo das implicações metodológicas): a mensagem enviada implica na sua inversão. Assim, quando uma mulher diz querer amar, e por isso está a procura de um par amoroso (no caso desse estudo o procura na Internet), podemos inferir que o que diz é que ela própria quer ser amada. Em outro termos, o que diz é que quer do outro o que ele não tem para dar-lhe. A falta de um reconhecimento ilusório de um outro que possa, para ela, ao menos sustentar essa metáfora, a remete repetidamente à circularidade da busca, garantia de si, enquanto sujeito desejante.

O desejo se inscreve no sujeito por uma contingência corporal designada por: “pára de não se escrever”, indicando sua condição de S1: o significante dos significantes, do gozo. A relação sexual, enquanto o impossível, é designada pelo “não pára de não se inscrever.”. Lacan (1985 b) com isso propõe que o princípio do prazer se baseia em pouca-realidade, a ponto de que “[...] tudo que nos é permitido abordar de realidade reste enraizado na fantasia” (p. 127). A natureza do “objeto a” se demostra quando o símbolo se dirige para o real. O suporte da aparência de ser, do “objeto a”, é que o indica. A escolha de um par, então, se dá pela escolha de um suporte de aparência por outro qualquer, que de todo modo não poderá ser qualquer, mas um outro que se preste a encarnar essa miragem do desejo do sujeito. Nessa contingência – pára de não se escrever – :

[...] aí não há outra coisa senão encontro, o encontro, no parceiro, dos sintomas, dos afetos, de tudo o que em cada um marca o traço do seu exílio, não como sujeito, mas como falante, do seu exílio da relação sexual. [...] Ilusão de que algo não somente se articula mas se inscreve, se inscreve no destino de cada um, pelo quê, durante um

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