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QUADRO DE ATIVIDADES DO PROJECTO EM 2012 Competências

RELATÓRIO DE OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE

No dia 14 de Agosto de 2012, tivemos a oportunidade de realizar uma

observação participante (Yin, 2005)92 numa das oficinas de reciclagem realizadas no âmbito do projecto que nos propusemos a analisar.

Para o referido autor, a observação participante é uma modalidade de observação em que o observador assume uma postura ativa e participa dos eventos que estão sendo estudados (Yin, 2005).

Muito embora haja críticas a este método, sobretudo no que tange à possível influência do pesquisador no comportamento dos observados, e também sobre a possibilidade de desvio do observador para a subjetividade, dado ao seu envolvimento pessoal com o objeto de estudo, ou mesmo sobre o papel de “participante” sobrepujar o de “observador”, entendemos que esta técnica seria importante para a construção de nossa compreensão global acerca do projecto “Histórias de Quintal”, em 2012.

Isso porque, num estudo de caso (Yin, 2005), múltiplas fontes de evidência devem ser utilizadas, e, nosso entender, participar de uma das oficinas de reciclagem poderia nos oferecer importantes dados sobre a dinâmica da atividade, a sua metodologia, sobre a relação educador-educando e sobre a perspectiva de educação ambiental não-formal trabalhada.

Reconhecemos que nossa participação possa ter provocado alguma alteração na atividade, e na postura do educador e das educandas, mas a consideramos uma importante fonte complementar de informação, que nos revelou fatos que viriam depois a ser confirmados nas entrevistas que realizamos com a responsável pelas oficinas, Samantha Silva, e com duas das jovens que participaram do projecto.

Esta oficina teve a participação de cinco educandas e a atividade principal deste dia foi a confecção de ecosacolas a partir de folhas de jornal, que foram doadas pelo Instituto Algar, por meio do Algar Mídia (empresa do Grupo Algar que tem como

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missão conectar pessoas e organizações, criando e desenvolvendo mídia e conteúdo, para informar, entreter e gerar negócios, com sustentabilidade)93.

Antes, contudo, de iniciarem os trabalhos artesanais com os jornais, educadora e educandas discutiram a seu respeito, e foram exibidos alguns vídeos sobre as suas diferentes possibilidades de reciclagem. As alunas então optaram por fazer bolsas ecosacolas.

Então, o processo criativo arrancou e o clima na oficina era de alegria e expectativa. As alunas ajudavam umas às outras e Samantha Silva aproveitava este momento para dialogar com elas acerca de termas diversos, em especial da relação que elas tinham com a família.

Nesta mesma oficina, uma das alunas, Isabela, sugeriu a confecção de papéis reciclados a partir dos jornais, para a posterior criação de cartões de presente. As outras alunas gostaram da sugestão, assim como a líder da oficina, e ficou decidido que nas oficinas seguintes elas começariam a fazer estes cartões, sob a orientação de Isabela, que havia aprendido esta técnica tempos atrás, na escola de ensino formal onde estuda.

De maneira geral, a oficina correu num ambiente de satisfação e contentamento, e houve uma intensa troca de ideias e experiências. E graças a esta observação-participante, pudemos chegar a algumas importantes constatações.

Primeiro, mencionamos o ambiente democrático de construção do conhecimento, uma vez que fora assegurado às jovens ampla e direta participação nas atividades desenvolvidas, e elas tiveram a oportunidade de expor suas opiniões e pontos de vista sobre as questões socioambientais discutidas durante a atividade.

Observamos, pois, que as educandas não eram meras expectadoras, mas que, ao contrário, participavam efetivamente das atividades realizadas, por meio de uma pedagogia que em muito se aproxima com aquela proposta por Freire (1987).

Segundo, notamos que a reciclagem foi tratada como um tema-gerador para o debate acerca da problemática socioecológica, servindo então como ponto de partida

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para a discussão e o questionamento de alguns dos valores da sociedade moderna, especialmente àqueles ligados ao consumismo.

Terceiro, observamos que a questão ambiental foi tratada a partir da realidade local das educandas e dos problemas por elas vividos no seu dia-a-dia. Exemplo disso, todas as jovens foram unânimes em dizer que tinham um contato diário com os jornais, seja em casa, seja na rua, ao observarem a sujeira do seu entorno.

Quarto, notamos também que houve uma preocupação com os aspectos subjetivos do grupo-alvo e das suas relações pessoais com seus amigos e familiares, que foram tema de conversa durante a atividade da qual participamos.

Quinto, mais do que simplesmente ensinar técnicas de produção de artigos a partir de materiais recicláveis, a oficina se revelou um espaço no qual a principal preocupação era a formação de cidadãs conscientes, social e ecologicamente.

Isso porque a temática socioambiental foi tratada como intimamente ligada à ideia de cidadania, no sentido de que a participação de todos os membros do tecido social é fundamental à superação da crise da modernidade e à construção de um novo modelo de sociedade, assentado sobre os emergentes valores do ambientalismo.

Nesse sentido, foi ressaltado às educandas que a questão ambiental diz respeito a todos e que elas, mesmo com gestos aparentemente simples, poderiam contribuir não apenas para a solução dos seus problemas locais, mas, também, numa dimensão mais ampla, para a transformação do mundo.

Sexto, e em decorrência da observação anterior, notamos uma preocupação com o resgate da autoestima das jovens e com a oferta de novas fontes de renda, através da venda dos artigos criados durante as oficinas – aspecto ressaltado pelas próprias alunas ainda durante a oficina.

Sétimo, constatamos que a perspectiva de educação ambiental promovida pela atividade de educação não-formal observada mostrou-se emancipatória (Lima, 2011), já que adotou uma postura crítica e política diante dos desafios impostos pela crise ecológica, apresentou como complexa a questão ambiental, relacionou entre si questões como pobreza, participação social, democracia e sustentabilidade, e,

também, mostrou uma vocação transformadora dos valores e práticas contrários ao bem estar público.

Assim, a oficina que tivemos a oportunidade de observar revelou-se como um espaço democrático de construção do conhecimento que, fazendo uso de uma metodologia crítica, dialógica (Freire, 1987) e emancipatória, forjou caminhos para uma renovada percepção da relação homem x ambiente e, também, para a construção de uma cidadania ativa no viés socioambiental.

A oficina da qual participamos, portanto, ofereceu condições para a construção de uma ética que se possa dizer ecológica, e, ao nosso ver, despertou nas jovens participantes um interesse genuíno pela problemática ecológica.

ANEXO IV