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Relatos de aflatoxicoses e implicações na produção pecuária

As doenças provocada no homem ou em animais por micotoxinas é chamada micotoxicose (SANTOS, 2008), cuja severidade varia com a toxidade da micotoxina, grau de exposição, dose ingerida, frequência de ingestão, espécie animal, estado nutricional, sexo, idade, entre outros. Apesar das micotoxicoses não serem contagiosas, por não haver transmissão de um indivíduo a outro, um mesmo individuo pode contrair em seu metabolismo simultaneamente duas ou mais micotoxicoses, fato que aumenta significativamente os malefícios à sua saúde (SOUZA, 2007).

As micotoxicoses se destacaram mundialmente em 1960 com a doença “X” dos perus (AMARAL et al., 2006). Essa doença se difundiu como um dos maiores desastres econômicos ocorridos na Inglaterra, quando cerca de 100.000 perus morreram por causa desconhecida. As aves adoeciam, tornavam-se apáticas, perdiam as forças e morriam em aproximadamente uma semana. Após muitos estudos, verificou-se que as aves morriam por necrose hepática, ocasionada pela ingestão de quantidades significativas de aflatoxina B1,

presente na ração fornecida aos animais, cujo ingrediente contaminante era a torta de amendoim importada do Brasil (CALDAS et al., 2008).

As aflatoxicoses estão relacionadas à ingestão de alimentos contaminados por aflatoxinas, inalação ou contato com a toxina, pelo manuseio periódico de produtos

contaminados (SOUZA, 2007). Dentre as micotoxinas já estudadas, as aflatoxinas ocasionam os maiores impactos no desempenho produtivo e reprodutivo de aves, pois o seu trato gastrointestinal absorve rapidamente as aflatoxinas contidas nas rações e as primeiras alterações são: aumento do fígado, baço e rins e a redução da bursa e do timo, além de mudanças na coloração dos órgãos. Em surtos, é possível visualizar palidez das mucosas e pernas, além de partículas de ração mal digerida na excreta das aves com aumento na secreção de lipídios, devido à baixa absorção provocada pelo mau funcionamento do pâncreas. Estes sintomas implicam prejuízos na conversão alimentar. Nos frangos de corte causam redução no ganho de peso, principalmente nos primeiros 21 dias de vida. Enquanto nas aves de postura, causam redução na produção de ovos e respectiva diminuição no seu tamanho físico e condição nutricional (SANTURIO, 2000).

Como os efeitos causados pelas aflatoxinas nas aves podem variar com a concentração ingerida e com o nível de stress em que estas se encontram, Pereira (2009) analisou o desempenho de 1080 frangos de corte submetidos a quatro tipos de dietas: milho de alta densidade, milho de alta densidade contaminado com 2,8 ppm de aflatoxinas, milho de baixa densidade e milho de baixa densidade contaminado com 2,8 ppm de aflatoxinas. O pesquisador constatou que os frangos que ingeriram aflatoxinas e milho de baixa densidade tiveram menor desempenho em termos de ganho de peso e conversão alimentar.

Um surto de aflatoxicose ocorrido em uma granja de suínos em Sentinela do Sul - RS, em outubro de 2004, causou 2 abortos e levou a óbito 7 porcas e 8 leitões. Foi diagnosticado que o milho utilizado para o arraçoamento dos animais foi o causador do surto, pois estava amplamente contaminado com aflatoxinas, 3140 µg kg-1 de B1,195µg kg-1

de B2, 585 µg kg-1 de G1 e 50 µg kg-1 de G2. O milho havia sido produzido e armazenado na

propriedade (ZLOTOWSKI et al., 2004).

Na meta-análise realizada por Andreatta (2011), sobre as interações das micotoxinas na alimentação de suínos e frangos de corte, a pesquisadora concluiu que, quando submetidos à alimentação com rações contaminadas, os suínos apresentaram redução no consumo e no ganho de peso de 18 e 21%, respectivamente, do mesmo modo os frangos de corte de 12 e 14%; que as micotoxinas de maior impacto no desempenho, índice produtivo e crescimento de órgãos dos suínos são a desoxinivalenol e as aflatoxinas; das aves as ocratoxinas e aflatoxinas, tendo estas micotoxinas maior efeito sobre animais jovens e, sobretudo, machos.

Pierezan et al. (2010) relatam um surto de aflatoxicose em bezerros de raça leiteira no Rio Grande do Sul, onde vieram a óbito 6 bezerros com cerca de 4 meses de idade e 100 kg, alimentados por feno de alfafa, milho quebrado e um substituto de leite. Pelos sinais clínicos e necropsia, constataram que a causa das mortes era aflatoxicose. Após avaliar os

alimentos ingeridos, através de cromatografia em camada delgada foi detectada a contaminação do milho consumido por aflatoxina B1, na concentração de 5136 µg kg-1. Embora a toxicidade das aflatoxinas seja variável entre as espécies animais e os ruminantes sejam mais resistentes que os monogástricos, o alto nível de contaminação por aflatoxina B1

ocasionou o surto.

Diagnosticou-se que a morte e a perda de apetite em patos na University Poultry and Duck Farm de Kerala na Índia em 2011, foi provocada por aflatoxicose, embora sejam raros os casos reportados em patos, os sinais clínicos revelaram fígado pálido e aumentado, com sintomas de cirrose e hepatite, mudanças na composição e postura dos ovos, além da redução no consumo de ração (BIBU, 2011).

Nos cavalos, os sinais clínicos provocados pelas aflatoxicoses não são específicos, podendo consistir na redução do apetite, depressão, febre, tremores, ataxia e tosse, observam-se nas necropsias fígado marrom-amarelado, necrose centrolobular, icterícia, hemorragia, inflamação na traqueia e urina marrom (CALONI; CORTINOVIS; 2011).

Em animais de companhia, cães e gatos, as aflatoxicoses provocam grave depressão, perda de apetite, vômitos, fraqueza e podem levar à morte. Já animais ruminantes, como bovinos, ovinos, cabras e veados possuem menor sensibilidade aos efeitos das aflatoxinas, embora possam ter reduzido o crescimento e o desempenho produtivo e reprodutivo, contaminando subprodutos como leite e carne (ZAIN, 2011).

A ingestão de aflatoxina B1 por bovinos em lactação, através do consumo de rações

contaminadas, transfere em algumas horas 1 a 3% da toxina ao leite, através de seu derivado hidroxilado denominado aflatoxina M1. Logo, derivados como queijo, ricota, iogurte,

nata, manteiga, entre outros, podem estar contaminados (ARAÚJO, 2011). Navarro (2011) observou a presença de aflatoxina M1 em 93,5% das 62 amostras de leite coletadas em

propriedades leiteiras da região dos Campos Gerais, entre 2009/2010, em níveis de 0,045 a 0,442 µg L-1. As quantidades detectadas se encontram abaixo do LMT pela legislação brasileira para o leite fluído (0,5 µg L-1), mas acima do LMT pela União Europeia como alimento seguro (0,05 µg L-1).

Segundo Scussel (2002), desconhecem-se espécies que não sofram com os efeitos das aflatoxinas, entretanto, dependendo da espécie e do estado imunológico algumas são mais suscetíveis. Animais jovens e fêmeas prenhes são mais vulneráveis às implicações das aflatoxicoses e, ainda, as fêmeas prenhes podem transferir os efeitos ao feto. Os machos são mais sensíveis que fêmeas. Para aves e peixes, doses de 10 a 30 µg kg-1 de aflatoxina B1 podem causar carcinoma hepático e, para roedores, os efeitos podem ser