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Renda Mínima e Inclusão Social: combinando políticas compensatórias e

Políticas Públicas de Combate à Pobreza: Contribuições e Limites

2.3. Renda Mínima e Inclusão Social: combinando políticas compensatórias e

estruturais

Entendida a focalização como instrumento necessário frente às limitações de recursos e à urgência no tratamento dos problemas e demandas sociais, a discussão se volta para os critérios a serem adotados pelas políticas públicas na área social.

No debate de qual o melhor caminho para combater a pobreza e a exclusão social, assegurando o direito à cidadania a todas as pessoas, vem se fortalecendo a concepção de um problema de privação de capacidades40 e de acesso a facilidades econômicas; de insuficiência para gerar as capacidades mínimas para acessar as oportunidades que permitam a participação econômica, e não apenas de baixa renda. A ênfase é sobre a formação de um estoque de ativos e não sobre o fluxo de renda, e as atenções se voltam para as diversas dimensões do bem-estar social. Para a FGV (2001:7) é “preciso ir além do óbvio, como baixa renda, para se entender a pobreza; é necessário entender mais porque os pobres recebem menos”. Ou seja, o impacto dos programas sociais sobre o bem-estar dos indivíduos tem sido avaliado com base não apenas no acesso à renda e o que, a partir dela, se pode obter em termos materiais, mas também considerando-se as oportunidades que lhes são geradas e a forma com que delas tiram proveito. Nesse sentido, cresce a importância das políticas públicas que combinam transferência de renda e formação de capacidades, em especial relacionadas à educação e à formação de capital humano.

Não se reduz, com isso, a importância do problema da pobreza que se manifesta através da insuficiência de renda. Soma-se, a essa preocupação, aquela que se volta para a necessidade de prover meios para que os indivíduos tenham acesso às oportunidades de escolha, de usos, e de reprodução e ampliação autônoma da renda, e para a inclusão social.

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Passa a ganhar destaque o conjunto de diferentes programas que visam combinar ações compensatórias com ações estruturais, como defendem os trabalhos da FGV (2001).

Como ações compensatórias estão as políticas públicas que se baseiam na transferência de um fluxo renda, com o objetivo de reduzir a pobreza no curto prazo, concedendo um benefício que tem o significado de uma adição suplementar de renda. A vantagem está na velocidade com que os efeitos são sentidos, imediatos ao recebimento do benefício. No entanto, têm a desvantagem de ter efeitos que são, em geral, transitórios e temporários: no momento em que cessar a concessão do benefício, na forma das transferências, os indivíduos acabam voltando para a situação original. É o caso dos programas de transferência de renda, seguro-desemprego, previdência social, frentes de trabalho, distribuição de cestas básicas41.

No caso das políticas estruturais, o objetivo é promover uma transferência de estoque de ativos, com ações que desenvolvam a capacidade de geração e acúmulo de renda permanente, contribuindo para a (re)inserção social dos pobres e excluídos. Como tal, são ações cujos efeitos são sentidos no longo prazo, o que imputa certa lentidão na percepção desses efeitos, e que pode trazer alguma dificuldade na sua defesa como instrumentos essenciais no combate às armadilhas da pobreza. É o caso das políticas públicas na área de educação, saúde, infraestrutura, a exemplo das ações para a provisão de educação, combate ao trabalho infantil e crescimento da alfabetização, políticas de microcrédito, reforma agrária.

Segundo a FGV (2001), o problema das políticas públicas brasileiras na área social é o predomínio do aspecto compensatório, que “não deixa raiz na vida dos indivíduos” e que

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Segundo Lavinas (1999:5), “os programas compensatórios são reconhecidos como pouco eficazes e bastante ineficientes, corroborando evidências de que o compensatório pouco agrega ao bem-estar dos grupos sociais em situação de risco alimentar e extrema pobreza. (...). No entanto, a magnitude da indigência que ainda hoje compromete o desenvolvimento do país não permite que se descartem medidas compensatórias que possam verdadeiramente aliviar a pobreza e assegurar um patamar básico de cidadania”.

“uma vez interrompido o programa, a sua condição volta ao status marginalizado original” (p. 9)42.

O que se coloca como ideal, em termos de desenho das políticas públicas e dos programas de combate à pobreza, é que estes sejam uma combinação daquele dois tipos básicos de ações, que terão importantes rebatimentos sobre a população mais pobre. A combinação de transferências de fluxo de renda com transferências de estoque de ativos exercem efeitos persistentes, duradouros, atuando sobre a formação de capacidades e funcionamentos das quais trata Sen (2000) e da forma como defende a FGV (2001), agindo como um instrumento de alavancagem social e combatendo a pobreza estruturalmente.

No campo das políticas estruturais, a combinação com os investimentos e incentivos à educação ganham terreno no desenho dos programas. Os investimentos em educação produzem externalidades positivas à medida que o retorno desses investimentos para a sociedade é elevado:

(...), dados os benefícios da educação básica compartilhados pela comunidade, que podem transcender os ganhos da pessoa que está recebendo a educação, a educação básica pode conter também um componente de bem público (...). As pessoas que recebem educação obviamente se beneficiam com isso, mas, adicionalmente, uma expansão geral da educação e alfabetização em uma região pode favorecer a mudança social (até mesmo a redução da fecundidade e da mortalidade, [...]), além de ajudar e aumentar o progresso econômico que beneficia também outras pessoas. (SEN, 2000:154)

Considerado o importante papel da educação, entende-se que há uma complementaridade natural entre as transferências de renda e as políticas de geração de renda, que envolvem a formação de capital humano. Ou seja, para que os efeitos sejam duradouros, é preciso transferir renda e dar condições de converter renda em capacidades, e essa é uma

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“A maior parte das políticas adotadas não mira os desvalidos; aquelas que miram não acertam o alvo ou quando acertam, não proporcionam efeitos duradouros em suas vidas. Em suma, a dificuldade está na qualidade das ações sociais. (...) Além da falta de alvo e pontaria, as nossas políticas sociais atacam tipicamente conseqüências e não as causas da miséria. (...) Pobres precisam, acima de tudo, de oportunidade, e não de caridade. (...) em muitos casos, as pessoas dispõem de ativos mas não conseguem aproveitar as oportunidades produtivas associadas à sua posse.” (FGV, 2001:5)

função da educação.

Neste sentido, as iniciativas de políticas públicas com os programas de transferência de renda atrelados à educação – como os de bolsa-escola – têm-se mostrado inovadoras, adotando critérios de elegibilidade que permitam a focalização em famílias mais necessitadas, utilizando informações observáveis, buscando mecanismos que reduzam os custos operacionais e de administração, para evitar vazamentos. Esse tipo de transferência tem, ainda, a seu favor o fato de que não restringe a liberdade de escolha do indivíduo, que, ao receber recursos monetários, é o responsável pela decisão de consumo que lhe possa gerar o maior nível de bem-estar.