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Repensando o partidarismo 2: a estratégia de dispersar recursos

Capítulo 3. Partidos Políticos, Candidaturas e o Financiamento de

3.4. Olhando a prestação de contas dos candidatos: o financiamento empresarial das

3.4.3. Repensando o partidarismo 2: a estratégia de dispersar recursos

É possível que uma empresa opte por doar aos candidatos do PSDB e do PMDB, em um mesmo momento eleitoral, para a disputa de um mesmo cargo? O comportamento das empresas é “fiel” às candidaturas de um mesmo partido? Para responder tais indagações, partiremos do CNPJ de cada empresa como unidade de análise44 e indagaremos se ela dispersou ou concentrou recursos em um ou mais partidos em suas doações aos candidatos, em 2006. É possível pensar na hipótese de que as empresas não dispersariam recursos em candidatos de outros partidos, portando-se de maneira fiel, em uma situação onde prevalecesse o “modelo partidário” de relação entre financiadores e o sistema político.

Antes de olhar diretamente os partidos, a análise das empresas se ateve em responder a indagação “se há dispersões de doações em candidatos”. A Tabela 3.9 mostra que, em 2006, a maior parte das empresas fez doações apenas a um candidato (87%), mas não é desprezível a quantidade que dispersou seus recursos (13%). Esta estratégia foi a mais comum entre

44 Nesse ponto, o esforço foi de uniformizar os CNPJs com os nomes das empresas. Assim, se

uma empresa, com o mesmo nome, apresentou mais de um CNPJ, ela foi tratada como uma única empresa. Uma limitação dessa opção é a existência de mais de um CNPJ em agrupamentos (empresariais), o que traz problemas em relação ao que pode ser compreendido do comportamento das grandes empresas.

aquelas com doações elevadas às candidaturas, em 2006: entre as que fizeram doações totais acima de R$50.000, a quantidade de empresas que dispersaram recursos em mais de um candidato chegou a 34% (22% para dois ou três, 7% para quatro ou cinco e 6% para mais de cinco candidatos). Assim, embora o fenômeno da dispersão seja minoritário, ele se torna significativo no grupo dos grandes doadores às campanhas para Deputado Federal.

Tabela 3.9. A distribuição das empresas pela dispersão de recursos em candidatos eleitos em 2006 e o volume de recursos totais doados por cada uma

Quantidade de candidatos/ Volume de

recursos total de doações Total

Até R$ 5000 Entre R$1000 e R$50000 Entre R$5000 e R$10000 R$50.000 ou mais Apenas um candidato 84% 97% 90% 80% 38% Dois ou três candidatos 12% 3% 10% 18% 34%

Quatro ou cinco candidatos 2% 0% 0% 1% 12%

Mais de 5 candidatos 2% 0% 0% 0% 16%

Total (N = 4497) 100% 100% 100% 100% 100%

Fonte: TSE (Tribunal Superior Eleitoral)

Mesmo contribuindo com mais de um candidato, é possível que essa dispersão se dê entre outros de um mesmo partido. A Tabela 3.10 nos mostra que, em 2006, entre 16% das empresas, apenas 12% optaram por doar a candidatos de um mesmo partido. Ou seja, quem escolheu dispersar recursos o fez majoritariamente em candidatos de partidos diferentes (71% doaram a candidatos de dois ou três partidos e 17% a quatro partidos ou mais). Esse valor é ainda mais elevado entre aquelas que fizeram doações totais de “R$50.000 ou mais”: 57% contribuíram para dois ou três candidatos e 32% para mais de três45.

45 Em 2010, é possível ver valores muito semelhantes: apenas 10% daquelas que fizeram

doações a mais de um candidato (16% em relação ao total) doaram a candidaturas de um mesmo partido. A dispersão em mais de um partido é a estratégia predominante em 90% desse conjunto de empresas (73% doaram a dois ou três partidos e 18% a quatro ou mais). Entre as empresas que mais recursos doaram, o percentual das que fizeram para quadro partidos ou mais é de 30%.

Tabela 3.10. As empresas que distribuíram recursos em partidos, pelo volume de doações totais, em 2006

Quantidade de candidatos/ Volume de recursos total

de doações Total Até R$ 5000 Entre R$1000 e R$50000 Entre R$5000 e R$10000 R$50.000 ou mais Apenas um partido 12% 19% 14% 11% 11% Dois ou três partidos 71% 77% 85% 87% 57% Acima de três partidos 17% 4% 2% 3% 32% Total (N = 700) 100% 100% 100% 100% 100%

Fonte: TSE (Tribunal Superior Eleitoral)

A lógica da distribuição de dinheiro em várias candidaturas e partidos pode ser guiada ou ditada por considerações ideológicas; a doação múltipla se daria entre partidos que compartilhassem o mesmo espaço ideológico. A Tabela 3.11, indica que apenas 25% obedecem à condição de semelhança ou proximidade ideológica. Por exemplo, o dinheiro foi doado a candidatos do PT e do PC do B, mas não aos do PP. Assim, a dispersão em partidos de diferentes pontos da escala ideológica foi majoritária entre esse grupo de empresas: 75% das que distribuíram recursos a mais de um candidato o fizeram a partidos de diferentes pontos da escala ideológica. Trata-se de um dado que denota uma inconsistência ideológica de um conjunto de empresas, quando optou em dispersar seus recursos.

3.11. Dispersão de recursos por categoria ideológica em 2006

%

Apenas partidos de uma categoria ideológica 25%

Partidos de duas categorias ideológicas (1) 56%

Partidos com as três categorias ideológicas 16%

Partidos não classificados (pequenos) e outros de uma categoria ideológica 2% Partidos não classificados (pequenos) e duas categorias ideológicas 0% Partidos não classificados (pequenos) e três categorias ideológicas 1%

Apenas partidos não classificados (pequenos) 0%

Total (N= 700) 100%

(1) Nas eleições de 2006, 21% doaram aos candidatos de centro e direita, 21% aos de centro e esquerda e 14% aos de esquerda e direita.

Fonte: TSE (Tribunal Superior Eleitoral)

O mesmo teste foi feito, olhando o posicionamento dos partidos em relação ao governo. Como a tabela 3.12 nos mostra, um comportamento mais “fiel” pode ser identificado, quando comparamos com o cruzamento da ideologia, na

tabela anterior: 42% das empresas distribuíram seus recursos apenas em partidos que compartilharam da mesma postura em relação ao governo. Entretanto, é ainda significativo o percentual de empresas que dispersaram em candidatos de partidos governistas e oposicionistas (54% em ambos).

Tabela 3.12. Dispersão e a posição dos partidos em relação ao Governo em 2006

%

Apenas partidos governistas ou oposicionistas 42%

Partidos oposicionistas e governistas 54%

Partidos não classificados e partidos governistas ou oposicionistas * 2% Partidos não classificados e partidos governistas e oposicionistas * 2%

Apenas em partidos não classificados* 0%

Total (N= 700) 100%

* Nessas categorias foram agregadas empresas que dispersaram recursos em candidatos de partidos maiores, classificados pela posição em relação ao governo, e que também doaram àqueles de partidos menores, que não foram classificados.

Fonte: TSE (Tribunal Superior Eleitoral)

Assim, embora seja possível identificar alguns padrões partidários entre as empresas, pode-se vislumbrar movimentos opostos a esse comportamento, que indicaram a convivência de uma lógica que não pode ser derivada da sigla partidária. Uma quantidade significativa de empresas se mostrou “infiel”, “promíscua”, doando, simultaneamente, a candidatos de partidos da “oposição” e “situação”, de “esquerda” e “direita”. Embora não seja um comportamento disseminado, ele foi identificado naquelas que contribuíram com maior quantidade de recursos, as quais acabaram dispersando suas doações em candidatos de partidos de distintos posicionamentos.