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4. ANÁLISE DO USO DAS TECNOLOGIAS DE TRADUÇÃO

4.2. Representações de si: preocupação com a hegemonia tecnológica

Este eixo singulariza ansiedades, advindas das demandas tecnológicas, que parecem ameaçar a constituição identitária, desvalorizando o tradutor experiente que se posiciona como um crítico, legitimado pelo contexto em que está inserido, sendo, por isso, capaz de problematizar sua própria área de atuação, ao mesmo tempo, em que se apresenta fragilizado pela reconfiguração imposta pelas tecnologias de tradução. Observemos o dizer de TRAD 10.

RD 10 (TRAD 10)

As ferramentas de auxílio à tradução podem ser divididas em dois grandes tipos. A chamada Machine Translation (MT), ou tradução de máquina, a exemplo do Google Translator e outros. Desde que foi lançada, a tradução de máquina melhorou muito, mas ainda não trabalha sozinha e nunca trabalhará, porque esbarra na estrutura dos idiomas, a construção de uma frase em português é diferente da construção de frases no inglês e daí por diante, mas essa ferramenta tem sua utilidade. Se eu estiver escolhendo um texto para saber se vale a pena mandar traduzir ou não, essa primeira tradução rudimentar já poderá me dar essa resposta. Por outro lado existem os programas de auxílio à tradução, como Trados, Wordfast, SDL Studio e uma infinidade de outros, que são bancos de dados que o tradutor vai abastecendo à medida que trabalha e que facilitará o seu trabalho quando ele ou ela vier a traduzir outro texto da mesma área. Uma pesquisa longa que tenha feito sobre aquele assunto, não precisará ser feita novamente. Quando surgiram, essas ferramentas eram vistas com grande desconfiança por parte da maioria dos tradutores (entre os quais eu me incluo) especialmente porque eram (e são) caras. Então eu teria que comprar um produto que iria competir comigo, tirar trabalho de mim, mas as grandes empresas de tradução ou os grandes clientes passaram a exigir o uso dessas ferramentas. Hoje, os tradutores não têm mais este temor. Todos os tradutores técnicos (para os literários as ferramentas não são tão boas) trabalham com algum tipo de ferramenta.

Inicialmente, o dizer de TRAD 10 apresenta organização textual com sentença tópica (As ferramentas de auxílio à tradução podem ser divididas em dois grandes

tipos.), corpo de texto com detalhamento, exemplificação, argumentação e

conclusão pessoal, assemelhando-se a um procedimento didático, o que faz aflorar uma posição professoral que parece objetivar o reconhecimento de seu conhecimento e profissionalismo, pelo histórico descritivo impessoal. Ao escolher os verbos “trabalhar” e “esbarrar” e os substantivos “estrutura”, “construção” e “ferramenta”, no enunciado desde que foi lançada, a tradução de máquina melhorou

muito, mas ainda não trabalha sozinha e nunca trabalhará, porque esbarra na estrutura dos idiomas, a construção de uma frase em português é diferente da construção de frases no inglês e daí por diante, mas essa ferramenta tem sua utilidade, delineia-se uma concepção estruturalista de língua, bem como uma

concepção positivista de tradução.

Nesse sentido, se a língua é pensada como uma estrutura e, por sua vez, a tradução é possível de ser automática, é porque no dizer de TRAD 10 há a crença de que a língua pode ser controlada e que a interpretação não é considerada em sua multiplicidade de sentidos. Ou seja, os sentidos não são pensados como deslizamentos na superfície porosa da linguagem. É interessante observar que o enunciador afirma que a linguagem técnica é passível de controle por meio de aplicação de sistemas automáticos.

Com o enunciado se eu estiver escolhendo um texto para saber se vale a pena

mandar traduzir ou não, essa primeira tradução rudimentar já poderá me dar essa resposta, acenam-se opiniões antagônicas sobre tecnologias de tradução. De um

lado, com os verbos de ação “escolher, “saber”, “mandar” e “traduzir” – que pressupõem um sujeito (cons)ciente do que fala –, o dizer de TRAD 10 aponta para alguma certeza de que as tecnologias de tradução são úteis para avaliar a relevância da empreitada de tradução. Por outro lado, não são capazes de lidar com as diferenças sintáticas entre idiomas. A contradição interna no dizer de TRAD 10 – tecida pelas malhas da linguagem e de como os advérbios “ainda” (mas ainda não

trabalha sozinha), “mas” (mas essa ferramenta tem sua utilidade) e “j ” (primeira tradução rudimentar já poderá) são colocados para sinalizar a argumentação –, causa ruído na orquestração de argumentos. Se há especificidades linguísticas que a máquina não pode resolver, como possibilitará, ao tradutor, uma avaliação prévia do trabalho a ser desenvolvido? Apoiar-se em uma primeira tradução rudimentar não

poderia induzir o tradutor ao erro quanto à complexidade do trabalho a ser desenvolvido?

Em outra direção, com o verbo “abastecer” na forma nominal de gerúndio – que determina uma ação em andamento – o dizer de TRAD 10 traz à luz o cerne da discussão sobre a competitividade entre tradução humana e tradução automática. Ao abastecer os bancos de dados, os tradutores são os trabalhadores por trás do que eles mesmos criticam, temem ou desprezam, isto é, a tradução por máquina. A tradução automática só é possível pela ação do trabalho dos próprios tradutores. Entretanto, nota-se um jogo interessante de personificação da máquina e de objetificação do humano: a concorrência entre homem e máquina ou do tradutor que trabalha para a existência de programas de auxílio à tradução.

Embora TRAD 10 declare não haver mais uma ameaça das tecnologias de tradução ao trabalho do tradutor (Hoje, os tradutores não têm mais este temor), a própria explicação de não haver mais essa preocupação produz efeitos de sentido de denegação, ou seja, uma recusa em aceitar algo que incomoda e que não se pode mudar ou controlar, embora alegando que tinham esse temor antes, mas que, agora, supostamente, o temor acabou. Na verdade, a demanda das empresas de tradução por softwares de tradução estimulou um agenciamento circular, em que já não se pode distinguir se o tradutor se vê livre da ameaça de perder sua legitimidade profissional, ou se o tradutor se tornou cativo de uma situação em que já se via como perdedor. A naturalização de procedimentos parece ter arrefecido o temor da competição, fomentando a colaboração voluntária dos tradutores para a construção de imensos bancos de dados, sintaticamente corretos e de qualidade. Em outras palavras, a tradução de máquina é apenas um meio para a realização tradutória e não a atividade de tradução em si.

Todavia, o dizer de TRAD 10 parece indicar o contrário, tendo em vista a afirmação de as tecnologias de tradução se encontrarem mais voltadas à tradução técnica, e não à tradução literária (Todos os tradutores técnicos (para os literários as

ferramentas não são tão boas) trabalham com algum tipo de ferramenta.).

Vislumbra-se, nesse enunciado, uma hierarquização ou elitização entre áreas de tradução (literária, juramentada, técnica e legendagem), sendo a literária vista como aquela que é impermeável às distorções ou manipulações tecnológicas, pois o

tradutor literário é, talvez, tido, no imaginário coletivo, como aquele que tem um dom nato para lidar com a complexidade da linguagem literária, não necessitando de assistência ou colaboração de qualquer natureza a não ser talento ou expertise. É como se a tradução literária resistisse à automatização pela própria maneira como a linguagem nela se constrói e que, diferentemente da tradução técnica, não pode ser controlada ou auxiliada por ferramentas tecnológicas. A construção de sentidos estaria imune à aplicação da automatização na tradução literária, mas não na técnica, que suposta e, idealmente, seria constituída por construções terminológicas rígidas e padronizáveis.

Ao enunciar que Hoje, os tradutores não têm mais este temor. Todos os tradutores

técnicos (para os literários as ferramentas não são tão boas) trabalham com algum tipo de ferramenta, o dizer de TRAD 10 remete, duplamente, ao conceito de fetiche

em De rosses e em Freud, devido ao emprego do substantivo “temor”. Isto é, para De Brosses, o fetiche, para os povos primitivos, se configurava como um amuleto ou um talismã que afastaria o temor pelo que é maléfico. Em Freud, o fetiche se caracteriza por um substitutivo ou uma prótese que também afastaria o temor pela castração. Nesse sentido, ao conceber a tecnologia como um fetiche (que o protegeria da ameaça de ter sua posição de tradutor substituída pelas tecnologias de traduções), o temor parece ser afastado. Assim, existiriam dois tipos de tradutores: aqueles que precisam de fetiche, da tecnologia para funcionar, e aqueles que não precisam, por se verem completos e bem dotados. Com o enunciado Então,

eu teria que comprar um produto que iria competir comigo, tirar trabalho de mim,

TRAD 10 fala em primeira pessoa e faz emergir representações de falta e de incompletude, pois reluta em não adquirir ferramentas consideradas inimigas. Com a afirmativa entre os quais eu me incluo, TRAD 10 descreve o embate psicológico que viveu ao prognosticar uma batalha vencida, como efetivamente ocorreu, ou seja, hoje é integrante do grupo que necessita de próteses, isto é, de ferramentas tecnológicas que se instauram como fetiche. Em seguida, o dizer de TRAD 12 também revela alguma indisposição às prerrogativas ao uso de tecnologias de tradução.

RD 11 (TRAD 12)

Elas estão certamente melhorando ano a ano e o que mais nos deixa a vontade com a profissão é a certeza que enquanto a máquina não conseguir raciocinar não conseguir fazer o trabalho do tradutor.

Valendo-se do advérbio “certamente” e do substantivo “certeza”, que poderiam reforçar a opinião de TRAD 12 (também partilhada por TRAD 10), de que os tradutores não precisariam temer nenhuma ameaça, insinua-se uma preocupação do passado e do presente. Da mesma forma, com o verbo “melhorar”, na forma nominal de gerúndio, e com a expressão temporal “ano a ano”, que apontam para uma circunstância em continuidade e com destino iminente, o dizer de TRAD 12 produz efeitos de sentido de denegação, com afirmações inconsistentes, como uma tentativa do tradutor de amenizar seu temor de perder seu trabalho. Ademais, com o enunciado enquanto a máquina não conseguir raciocinar não conseguirá fazer o

trabalho do tradutor, é possível entrever, na denegação de TRAD 12, a crença de

que as máquinas já raciocinam e que o trabalho do tradutor já está com os dias contados.

Se TRAD 12 não concebesse a possibilidade de uma máquina raciocinar, não relacionaria uma ação mental humana a uma máquina nem utilizaria o advérbio de temporalidade “por enquanto”. o fazê-lo, parece tentar arrefecer o medo de perder sua posição (o que nos deixa a vontade com a profissão é a certeza ...), pois tenta acreditar que sua profissão só estará ameaçada quando a máquina raciocinar como um humano, realmente ocorrer. O que escapa de seu dizer é que a hegemonia tecnológica neoliberal não pretende que a máquina raciocine como o homem, mas que o homem funcione como uma máquina eficaz e eficiente. Com isso, TRAD 12 se vale da denegação para lidar com algo que o atemoriza e, diferentemente dos demais, resiste ao uso de uma prótese, de um fetiche para a realização tradutória. TRAD 13, por sua vez, deflagra a sensação de rebaixamento da profissão pela imposição tecnológica.

RD 12 (TRAD 13)

Do ponto de vista do público em geral, as novas tecnologias acarretaram uma acentuada desvalorização da profissão, pois criou-se a impressão de que qualquer um pode traduzir, bastando usar uma dessas novas ferramentas. Do ponto de vista dos profissionais da área as novas tecnologias resultaram em aumento da produtividade e, consequentemente, da possibilidade de ganhos financeiros. Por outro lado, exigiram mais especialização, pois aprender a usar e dominar essas novas ferramentas não é um processo simples nem r pido. Esses novos softwares são complexos, suas curvas de aprendizagem são lentas, e demandam esforço e dedicação até que possam ser usados de modo eficiente. Você pode escolher um software específico (Trados, MemoQ, Wordfast etc.) ou apenas um. Como as memórias de tradução são compatíveis e você pode entregar aos clientes os arquivos unclean (bilíngues), isso não chega a ser um problema.

Quando o dizer de TRAD 13 expressa a desvalorização da profissão (Do ponto de

vista do público em geral, as novas tecnologias acarretaram uma acentuada desvalorização da profissão, pois criou-se a impressão de que qualquer um pode traduzir, bastando usar uma dessas novas ferramentas.), parece fazer referência a

conversas informais, em situações variadas do cotidiano, acerca do quanto a qualidade da tradução possa estar cada vez mais exposta à criticidade. Devido ao fenômeno da globalização e da internet, a aprendizagem e a utilização, ainda que de nível básico do idioma inglês, aumentaram exponencialmente, ao contrário do que ocorria no passado, quando o intercâmbio de línguas estava restrito a alguns segmentos mercantis. Ou seja, devido à hegemonia linguística, a tradução do inglês para uma língua de chegada se encontra cada vez mais suscetível a comentários levianos, pois o público em geral parece se ver capacitado para julgar a qualidade da tradução de enunciados ou vocabulário populares, sem conhecimento da realidade do contexto de tradução que tem exigências e critérios rígidos, os quais tradutores, mais especificamente legendadores, devem seguir. Muitas vezes, as escolhas linguísticas não são unicamente de responsabilidade dos tradutores, pois há sempre prerrogativas culturais, sociais ou religiosas que esbarram em questões morais ou financeiras que impedem que o tradutor possa traduzir livremente.

Em outra direção, essa mesma afirmativa (Do ponto de vista do público em geral, as

novas tecnologias acarretaram uma acentuada desvalorização da profissão, pois criou-se a impressão de que qualquer um pode traduzir, bastando usar uma dessas

novas ferramentas) permite entrever duas possibilidades: a utilização de softwares

de tradução automática, por exemplo o Google Tradutor, por usuários em geral, e a utilização de tecnologias de tradução, por exemplo memória de tradução, por tradutores amadores ou em início de carreira. O dizer de TRAD 13 parece se referir à segunda opção, pelo uso da expressão “qualquer um” que não se relacionaria à popularidade do Google Tradutor, o qual oferece traduções automáticas e gratuitas, mas sim à tradução amadora que, graças às novas tecnologias, entraria em competição com a tradução profissional, considerando a entrada de uma nova geração, tecnologicamente mais preparada, para competir com tradutores mais experientes.

Ainda com o enunciado por outro lado, exigiram mais especialização, pois aprender

a usar e dominar essas novas ferramentas não é um processo simples nem rápido, o

dizer de D (ao empregar os verbos “usar e dominar”, nas formas infinitivas) apontaria para uma dupla insegurança de que a ameaça ao tradutor chegue tanto pelas tecnologias de tradução quanto por tradutores mais jovens e, invariavelmente, mais tecnológicos, em razão de terem nascidos no auge da explosão tecnológica, poucas décadas atrás. Pelo enunciado Esses novos softwares são complexos, suas

curvas de aprendizagem são lentas, e demandam esforço e dedicação até que possam ser usados de modo eficiente, afigura-se também algum anseio em narrar o

desafio que novos profissionais poderão enfrentar, especialmente, pelo uso da expressão “modo eficiente”, que remete a uma tentativa de enobrecer a própria experiência em detrimento da inexperiência alheia.

No enunciado Do ponto de vista dos profissionais da área as novas tecnologias

resultaram em aumento da produtividade e, consequentemente, da possibilidade de ganhos financeiros, o emprego das expressões “aumento da produtividade” e

“ganhos financeiros” fazem emergir sentidos de que as tecnologias de tradução agregam valor por meio da produtividade que gerará lucros e, neste sentido, o dizer de TRAD 13 se apresenta opaco e nebuloso, possibilitando a emergência de sentidos conflituosos na constituição identitária do tradutor que ora se vê desvalorizado, ora se vê altivo, ou, mais frequentemente, ameaçado por tecnologias ou por pares concorrentes. Novamente, as tecnologias parecem funcionar como um objeto fetichizado capaz de aplacar a angústia do rebaixamento disfarçado em

produtividade a que o tradutor está submetido. Isto é, ele parece ter vislumbres de que a hegemonia tecnológica o colocou em um patamar mais baixo em comparação à antiga hierarquia de profissões intelectualizadas, pois hoje cada vez mais ele está se tornando um tecnólogo, ou mesmo, um operário que precisa entregar produtividade e qualidade em tempos recordes. Igualmente, o dizer de TRAD 14 enseja alguma objeção ao uso indiscriminado de ferramentas tecnológicas em tradução.

RD 13 (TRAD 14)

Sem dúvida, a tradução automática e principalmente as memórias de tradução são grande avanços na vida do tradutor profissional. Porém, a meu ver, por parte do grande público não especializado, há ainda muita confusão sobre o uso e o alcance dessas ferramentas. Como ferramentas de auxílio que são, elas apenas ajudam na tradução, mas de forma alguma substituem o papel do tradutor. A meu ver, os bons profissionais cada vez tem mais consciência disso, e mais cuidado ao usar a tecnologia. Não sei se a mesma afirmação vale para as agências de tradução ou o público em geral...

partir da expressão “sem dúvida” – que poderia ser um elemento que afastaria qualquer incerteza sobre a opinião de TRAD 14 –, em conjunto com os substantivos “avanços” (um termo com valor positivo) e “confusão” (um termo com valor negativo), é possível verificar o afloramento do embate que a ascensão da tradução automática e a opinião do grande público não especializado provocam na legitimidade da posição do tradutor profissional. Ainda, no enunciado como ferramentas de auxílio

que são, elas apenas ajudam na tradução, mas de forma alguma substituem o papel do tradutor. O emprego do advérbio de exclusão “apenas” e da conjunção

adversativa “mas” delineia uma dualidade em aceitar a contribuição ou a maldição tecnológica. Decorre, ainda, com o uso do adjetivo plural “bons” e do substantivo singular “consciência”, uma necessidade de diferenciar tradutores “bons”, “conscientes” e “cuidadosos” daqueles que não são.

Da mesma maneira, pelo uso do sinal de reticências ao final (Não sei se a mesma

afirmação vale para as agências de tradução ou o público em geral...), o dizer de

TRAD 14 insinua que a restrição não se dá apenas entre o grande público e agências de tradução, mas também entre a categoria de tradutores, dividida entre aqueles que são conscientes do contexto em que estão inseridos e aqueles que são

alienados. Mais uma vez, as representações de tradutores que se afiguram são da ordem de amadores que usam, indiscriminadamente, tecnologias de tradução, acenando para a possibilidade de que os tradutores profissionais não adotam essa atitude leviana, pois sabem balancear a utilização de tecnologias devido à sua longa experiência, elevando-os a uma categoria diferenciada em comparação aos iniciantes. Esse possível equilíbrio ao uso de tecnologias ressoa também no dizer de TRAD 11, a seguir.

RD 14 (TRAD 11)

Sem dúvida, os chamados CATs prestam imenso auxílio aos tradutores para fins de pesquisa terminológica, reaproveitamento de traduções existentes e repetições internas, consistência, aumento de produtividade e receita, e competitividade frente a outros tradutores que se abstenham de usar essas ferramentas. Por outro lado, seu uso pode levar ao empobrecimento da tradução e à autonomia dos clientes em relação ao trabalho do tradutor, mediante o uso de suas memórias, e restringe-se às traduções técnicas, de nada servindo no contexto das traduções literárias. As ferramentas de tradução totalmente automática não têm serventia outra que não apresentar um leve esboço do contexto original, como retratos distorcidos da realidade em foco, sendo incapazes de efetuar um processo tradutório satisfatório, que depende do raciocínio e da sensibilidade ausentes nos processos mecanizados. No passado essas tecnologias eram vistas com desconfiança, descrédito e temor de substituição do trabalho dos tradutores. Hoje, de forma geral, são bem aceitas, pois sabe-se que há um longo caminho a percorrer na reposição completa do homem pela máquina, se é que isto jamais ocorrerá.

Se no dizer de TRAD 14, a ameaça parece vir dos tradutores jovens tecnologicamente mais eficientes, mas com pouco conhecimento linguístico, no dizer de TRAD 11, a ameaça seria proveniente da própria tecnologia que faz sombra à capacidade do tradutor. No enunciado Sem dúvida, os chamados CATs prestam

imenso auxílio aos tradutores para fins de pesquisa terminológica, reaproveitamento de traduções existentes e repetições internas, consistência, aumento de produtividade e receita, e competitividade frente a outros tradutores que se abstenham de usar essas ferramentas, o emprego da locução adverbial “sem

dúvida”, associada ao adjetivo superlativo “imenso” produzem efeitos de sentido de que o dizer de TRAD 11 seria uma tentativa de modalização para não ser visto como retrógrado ou reacionário à presença incontestável das tecnologias na atividade tradutória.

Com a expressão frente a outros tradutores que se abstenham de usar essas

ferramentas, especialmente pelo uso da terceira pessoa do plural do verbo “abster”

no presente do subjuntivo, surge a possibilidade de que o dizer de TRAD 11 aponte para a periculosidade do uso de aparatos tecnológicos tal como uma prática nociva ou inebriante, cujo uso pode levar ao empobrecimento da tradução e à autonomia

dos clientes. Entretanto, esse poder de entorpecimento – pois apenas apresentam leve esboço do contexto original, como retratos distorcidos da realidade em foco –, é

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