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Resolução nº 125 do CNJ – “A mediação enquanto política pública”

O emprego da mediação no ordenamento jurídico brasileiro, teve ao longo dos anos, uma tímida evolução legislativa, vez que hodiernamente não se tem uma normatização específica quanto a temática. A mediação iniciou seu processo de construção legislativa no Brasil a partir do Projeto de Lei nº 4.827/98 da deputada Zulaiê Cobra, o qual previa uma regulação e estabelecia disposições acerca do tema. O projeto, após algumas alterações decorrentes de emendas constitucionais, encontra-se, atualmente, junto ao Congresso Nacional, com parecer aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça.

Enquanto tramita o projeto legislativo anteriormente mencionado, o Conselho Nacional de Justiça editou, em 29 de novembro de 2010, importante Resolução nº 125, que dispõe sobre a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado de conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário, objetivando efetivar o direito constitucional de acesso à justiça previsto no artigo 5º, XXXV, da CF. A Resolução determina a implantação pelos Tribunais brasileiros de Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania, os quais devem promover as sessões de conciliação e mediação. Desta forma, evidencia-se, a relevância de sua edição, pois serve como diretriz para a prática do método da mediação.

A mediação, atualmente, tem sido considerada como mecanismo de efetivação da política pública. No entendimento de Morais e Spengler (2012, p. 167):

Mais do que um meio de acesso à justiça fortalecedor da participação social do cidadão, a mediação e a conciliação são políticas públicas que vem ganhando destaque e fomento do Ministério da Justiça, da Secretária de Reforma do Judiciário e do CNJ brasileiros, uma vez que comprovada empiricamente sua eficiência no tratamento de conflitos.

Antes propriamente da análise de tal Resolução, importa compreender a expressão política pública, a qual consiste em um conjunto de programas e ações governamentais voltadas para a satisfação de objetivos coletivos, com intuito de assegurar determinado direito. Prelecionam Morais e Spengler (2012, p. 168): “no caso da mediação/conciliação como política pública elas cumprem com um objetivo que é tratar de maneira adequada os conflitos sociais pelos membros da própria sociedade.” Contudo, para a implementação e efetividade de tais institutos, são necessários investimentos por parte da administração estatal, os quais correspondem às políticas públicas.

A partir da constatação de diferentes práticas de mediação e conciliação, nos distintos Estados da Federação, vislumbrou-se a necessidade de padronização e incorporação dessas práticas a um programa nacional de política pública. Visando cumprir os objetivos estratégicos do Poder Judiciário de ampliação ao acesso à justiça e eficiência operacional, o Conselho Nacional de Justiça - CNJ, por meio da Resolução nº 125, de 29 de novembro de 2010, instituiu a Política Judiciária Nacional de Tratamento Adequado aos Conflitos de interesse no âmbito do Poder Judiciário. Para Valeria Fioreli Lagrasta Luchiari (2014, p. 49), a Resolução

traça as diretrizes da Política Judiciária, respeitando a autonomia dos Estados

e consequentemente, dos tribunais, na organização dos serviços afetos aos

métodos consensuais de solução de conflitos; e, dessa forma, reserva ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) apenas o auxílio e orientação na implantação da política pública, com a responsabilidade pela interlocução política com entidades públicas e privadas, bem como pelo estabelecimento da rede de conciliação, integrada por todos os órgãos do Poder Judiciário.

Com a sua regulamentação, o CNJ reconheceu os mecanismos consensuais de resolução de controvérsias, em especial a mediação e a conciliação como instrumentos

eficazes de pacificação social, solução e prevenção de litígios. Dentre os pilares da Resolução, Watanabe (2014, p. 37) estabelece:

a) mudança do paradigma de serviços judiciários, fazendo-os abrangentes também dos mecanismos de solução consensual de conflitos de interesses [...] b) assegura serviços de qualidade, exigindo que os mediadores e conciliadores sejam devidamente capacitados e treinados; c) centralização dos serviços de conciliação, mediação e orientação, com organização de Centro de Resolução de Conflitos e de Cidadania (Cejusc), assegurando-se o aperfeiçoamento permanente das práticas e seu controle e avaliação mediante a organização de banco de dados e cadastro de mediadores e conciliadores.

Luchiari (2014, p. 48) elenca os objetivos almejados pela Resolução:

1) tornar efetivo o acesso à justiça qualificado, com prestação inclusive de serviços de informação e orientação aos jurisdicionados para lhes possibilitar o pleno exercício da cidadania; 2) mudar a mentalidade dos operadores do Direito e da comunidade em geral em relação à utilização dos métodos consensuais de solução de conflitos, abrindo mercado de trabalho para advogados; e 3) assegurar a qualidade do serviço prestado por conciliadores e mediadores, o que envolve a sua capacitação, treinamento e permanente aperfeiçoamento.

Ainda, Watanabe (2014, p. 37) aduz que a regulamentação de tais métodos por meio da Resolução não objetiva resolver a crise de desempenho da justiça, bem como reduzir o monumental acervo de processos do Judiciário, mas sim, sua finalidade é dar tratamento adequado aos conflitos de interesses. Contudo, decorre da utilização mais intensa dos mecanismos consensuais, a solução mais prévia de determinados processos, mas esse resultado é uma consequência indireta da correta política pública de tratamento dos conflitos de interesses, e não seu objetivo imediato (WATANABE, 2014).

A Resolução possui 19 artigos distribuídos em quatro capítulos. Os capítulos tratam da instituição da política pública para tratamento adequado dos conflitos de interesses (Capítulo I), das atribuições do Conselho Nacional de Justiça (Capítulo II), das atribuições dos Tribunais (Capítulo III), dos Centros Judiciários de solução de Conflitos e Cidadania e do Portal da Conciliação (Capítulo IV).

Não se pretende analisar individualmente cada artigo da Resolução, mas destacar suas principais inovações e premissas. Assim, vislumbra-se, inicialmente, que o CNJ se dispõe a

auxiliar os Tribunais na organização dos serviços, a fim de possibilitar o cumprimento das metas estabelecidas, além disso, compete ao CNJ organizar programas com a participação de todos órgãos do Poder Judiciário e entidades, capacitar os profissionais, promover ações para incentivar a autocomposição de litígios através de articulações com os diversos setores sociais, a fim de incluir e valorizar a condução amigável dos conflitos.

Aos Tribunais institui-se a responsabilidade de criar os núcleos permanentes de conciliação, aos quais incumbe a gestão dos conciliadores e mediadores – através da capacitação e atualização permanente – e a gestão dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania, que representam relevante inovação.

A Resolução prevê a criação destes Centros nas Comarcas com mais de um Juízo, Juizado ou Vara, estabelecendo a realização de sessões de conciliação e mediação tanto processual quanto pré-processual, ou seja, a aplicação de tais institutos se dá aos processos existentes como aos conflitos em que não há uma demanda judicial tramitando. Muito embora o prazo máximo previsto para a instalação dos referidos Centros ser de doze meses após a edição da Resolução, sabe-se, atualmente, que na prática nem todas as Comarcas conseguiram instalá-los, muito decorrente da falta de espaço físico e questões orçamentárias (SCHRODER; PAGLIONE, 2012).

Não obstante as vantagens e os aspectos positivos pretendidos pela Resolução, a mesma tem sido objeto de críticas por compreender os institutos da mediação e conciliação como idênticos, sem distingui-los, podendo ser utilizados ao mesmo tipo de conflito. No entanto, como bem asseveram Morais e Spengler (2012, p. 172),

as diferenças entre mediação e conciliação são significantes e importantes. Elas se dão quanto a conceituação propriamente dita, mas também operam de modo expressivo no papel desempenhado pelos profissionais que administram as sessões, pelo tipo de conflito nelas tratados, pelos objetivos perseguidos e pelos resultados almejados.

Desse modo, cumpre novamente ressaltar – de acordo com os autores acima citados – que, “a conciliação é um instituto que tem por objetivo chegar voluntariamente a um acordo neutro e conta com a participação de um terceiro – conciliador que intervém, podendo inclusive sugerir propostas para fins de dirigir a discussão.” A mediação por sua vez, promove a construção do resultado do conflito, por meio da iniciativa das partes envolvidas, assim, “o

mediador, tem, então, a tarefa de possibilitar que conflitantes expressem seus sentimentos e seus interesses, dando a eles espaço para, de modo criativo, formular sugestões e propostas para a resolução adequada de seus conflitos” (MORAIS; SPENGLER, 2012).

Diante do exposto, conclui-se que a Resolução nº 125 do CNJ, constitui importante avanço em termos normativos, no entanto a plena efetivação da mediação depende ainda de alguns fatores. Alude-se a existência de pontos de fragilidade, Morais e Spengler (2012, p. 166) elencam como principais dificuldades “a estrutura física e de pessoal, a capacidade financeira do Judiciário brasileiro em arcar com os custos de implementação e a resistência social quanto a aceitação e utilização de tal mecanismo.” Importa, todavia, que o caminho para a concretização da mediação no direito brasileiro já foi iniciado, contudo para que a mesma possua efetiva viabilidade, é preciso buscar meios capazes de superar tais questões.