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Responsabilidade dos sócios na liquidação de sociedades

6.2. Espécies de responsabilidade tributária no Código Tributário Nacional

6.2.1. A responsabilidade tributária de terceiros

6.2.1.1. O artigo 134 e a natureza jurídica da regra de responsabilidade

6.2.1.1.2. Responsabilidade dos sócios na liquidação de sociedades

Superada esta discussão, cumpre analisar, ainda que de forma sucinta o inciso VII, do artigo 134, que dispõe sobre a responsabilidade dos sócios nas hipóteses de liquidação de sociedades de pessoas.

O grande ponto controvertido neste dispositivo está justamente em saber quais são as sociedades de pessoas que, em caso de liquidação, permitem a responsabilização dos sócios.

Nas palavras de Fran Martins118:

“Tomando-se em consideração a influência que a pessoa dos sócios possui nas sociedades comerciais, estas podem ser classificadas em

sociedades de pessoas e sociedades de capitais. Sociedades de pessoas são aquelas em que a pessoa do sócio tem papel preponderante, não apenas na constituição como durante a vida da pessoa jurídica. Assim, constituindo-se uma dessas sociedades, ficará, durante sua existência, subordinada à pessoa dos sócios: a morte ou incapacidade de um se refletirá na pessoa jurídica, provocando a sua dissolução.”

De plano pode-se afirmar que os acionistas, administradores e diretores de sociedades anônimas não estão incluídos no rol de responsáveis elencados no

118 MARTINS, Fran.

artigo 134 do Código Tributário Nacional, eis que tais sociedades configuram claras sociedades de capitais, uma vez que priorizam o intuitu pecuniae.

O ponto de discórdia está justamente no fato de ser a sociedade por quotas de responsabilidade limitada classificada como de pessoas ou de capital.

A doutrina não é uníssona neste tema, sendo que para alguns doutrinadores, a sociedade por quotas de responsabilidade limitada é de pessoas; para outros é de capital; e há os que entendam, ainda, que se trata de uma forma híbrida.

Tal distinção é de extrema relevância, pois conforme a classificação adotada, pode-se incluir ou não o sócio de tais pessoas jurídicas dentre os responsáveis elencados no artigo 134 do Código Tributário Nacional.

Fran Martins119 entende que a sociedade por quotas de responsabilidade limitada deve ser classificada como sendo uma sociedade de pessoas:

“Como sociedade de pessoas temos, no direito brasileiro, as sociedades em nome coletivo, as em comandita simples, as de capital e indústria e as por quotas, de responsabilidade limitada.”

Waldirio Bulgarelli120, por sua vez, disserta que:

São consideradas como sociedade de pessoas, típica: a sociedade em nome coletivo; como sociedade mistas: de capital e indústria, em comandita (simples e por ações) e em conta de participação; como de capital, típica: a sociedade anônima; e em campo à parte, como tipo especial, a sociedade por quotas de responsabilidade limitada.”

Aliomar Baleeiro entendia que o artigo 134, inciso VII, do Código Tributário Nacional não deveria ser aplicado às sociedades por quotas de responsabilidade limitada, visto que estas, segundo sua visão, não se enquadram na classificação de sociedades de pessoas.

119 MARTINS, Fran.

Curso. Ob. Cit. p. 262. 120 BULGARELLI, Waldirio.

A verdade é que a sociedade por quotas de responsabilidade limitada possui certas características peculiares que realmente a tornam um tipo híbrido, misto.

Fábio Ulhoa Coelho121 bem demonstra esse caráter híbrido deste tipo societário:

“A discussão sobre a natureza da sociedade limitada é um dos mais importantes temas do direito societário brasileiro. Deriva, por certo, do contexto em que ela surgiu, como um novo tipo de sociedade, isto é, o da busca de uma alternativa para a exploração de atividades econômicas, em parceria, que pudesse assegurar a limitação da

responsabilidade característica da anônima, mas sem as

formalidades próprias desta. A meio caminho, portanto, entre as sociedades de pessoas, existentes ao tempo de sua introdução no direito alemão no fim do século XIX, e a anônima, sempre de capital, a limitada acabou assumindo uma configuração híbrida, revelando ora os traços daquela, ora os desta.

A sociedade limitada, pode ser de pessoas ou de capital, de acordo com a vontade dos sócios. O contrato social define a natureza de cada limitada.”

A jurisprudência, por seu turno, também não é pacífica com relação à aplicação ou não do artigo 134 às sociedades por quotas de responsabilidade limitada.

Atualmente, o artigo 1.057 do Código Civil auxilia na verificação da sociedade por quotas de responsabilidade limitada ser de capital ou de pessoas. Referido artigo reza:

Art. 1.057. Na omissão do contrato, o sócio pode ceder sua quota, total ou parcialmente, a quem seja sócio, independentemente de audiência dos outros, ou a estranho, se não houver oposição de titulares de mais de um quarto do capital social.

121 COELHO, Fábio Ulhoa.

Curso de Direito Comercial – Direito de Empresa. Vol. 2. Saraiva. 2007.

A análise de referido dispositivo legal leva a seguinte conclusão: é o contrato social da empresa que revelará ser a sociedade por quotas de responsabilidade limitada de capital ou de pessoas.

Isto porque, o sócio retirante pode ceder suas quotas a estranhos, desde que não haja oposição de pessoas que detenham mais de 25% do capital social. Nesse sentido, se houver a oposição de mais de um quarto do capital social com relação à cessão das quotas para estranhos, inegavelmente, a sociedade será de pessoas. Haverá uma sociedade de capital, quando for expressamente prevista tal característica no contrato social.

Uma vez mais utilizando-se dos ensinamentos de Fábio Ulhoa Coelho122:

“A hibridez do tipo importa a existência de sociedades limitadas de pessoas e de capital, de acordo com o respectivo contrato social. A discussão sobre a natureza da sociedade limitada, assim, somente se completa pelo exame do disposto no documento que instrumentaliza a sua constituição. Em outros termos, para se definir se uma específica sociedade limitada é de capital ou de pessoas, deve-se consultar o seu contrato social. Mas, indaga-se, que cláusula desse instrumento deve ser consultada?

A resposta é simples. A cláusula sobre a qual deve recair o exame é aquela que trata do tema relevante para a classificação. Ou seja, a definição da natureza de uma sociedade limitada em particular é feita pela consulta ao que os seus sócios contrataram sobre cessão de quotas. Se, no contrato social, estabeleceu-se que a venda das quotas sociais depende da autorização de todos os sócios, foi intenção destes formar uma sociedade de pessoas; na hipótese contrária, prevendo o instrumento que a venda não fica condicionada à anuência dos demais componentes da sociedade, é esta de capital. É essa a cláusula do contrato social que reclama consulta na aferição da natureza de uma sociedade limitada específica. As demais não têm relevância nesse contexto.”

122 COELHO, Fábio Ulhoa.

Portanto, para que haja a responsabilização dos sócios em hipóteses de dissolução de sociedade de pessoas, quando tais sociedades sejam por quotas de responsabilidade limitada, deve haver uma análise minuciosa do caso concreto, para verificar se referida pessoa jurídica possui uma tendência maior para ser classificada como sociedade de capital ou então em sociedade de pessoas.

Sem dúvida, trata-se de tema bastante tormentoso que, de longa data, traz bastante celeuma para a doutrina e, principalmente, para os operadores do direito, sendo que ainda demorará um bom tempo para que um entendimento dominante seja efetivamente firmado.

Concluindo, tem-se que a responsabilidade prevista no artigo 134 do Código Tributário Nacional não se coaduna perfeitamente com a disposição prevista no artigo 128 do mesmo diploma legal, eis que surge do descumprimento do dever de representação legal ou negocial que o responsável detém sobre o contribuinte. Por essa razão, trata-se de uma hipótese de responsabilidade sancionatória, não pelo fato isolado do não pagamento do tributo devido, mas sim porque no antecedente da norma que institui a responsabilidade constará a não observação dos deveres impostos em decorrência da representação (fato ilícito), que culminará no nascimento da regra citada.

6.2.1.2. O artigo 135 e a natureza jurídica da regra de responsabilidade

Por outro turno, o artigo 135 do Código Tributário Nacional traz as hipóteses em que haverá a responsabilidade pessoal dos terceiros. Referido dispositivo legal reza:

Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos

correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:

I - as pessoas referidas no artigo anterior; II - os mandatários, prepostos e empregados;

III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.

Diferentemente do artigo 134 estudado anteriormente, o artigo 135 do Código Tributário Nacional é expresso no sentido de que as pessoas ali indicadas são responsáveis pessoalmente pelo pagamento dos valores relativos aos tributos devidos.

Isto quer dizer que as pessoas elencadas no artigo 135 respondem pelas dívidas com seu próprio patrimônio.

Desta forma, de acordo com os incisos do artigo 135 do Código Tributário Nacional, são responsáveis pessoais pelos tributos devidos: todas as pessoas elencadas no artigo 134; os mandatários, prepostos e empregados; e, os diretores, gerentes e representantes de pessoas jurídicas, desde que tais pessoas tenham agido com excesso de poderes ou infração a lei, ao contrato social ou aos estatutos.

A figura de maior relevância no estudo do artigo sob comento é a do administrador (mandatário, preposto, empregado, diretor, gerente e representante de pessoas jurídicas), visto que as situações de aplicação da responsabilidade pessoal trazida pelo artigo 135 do Código Tributário Nacional praticamente se esgotam nas hipóteses do inciso II e III de referido dispositivo legal.

É importante salientar que para ter responsabilidade pessoal é necessário ser efetivamente o administrador da pessoa jurídica. Neste norte, estão excluídos da responsabilização pessoal os sócios e acionistas que não possuam poderes de administração da sociedade, bem como os diretores, gerentes, prepostos e empregados que não atuem de forma administrativa da empresa.

Alguns doutrinadores entendem que a regra estabelecida no artigo 135 do Código Tributário Nacional estabelece uma verdadeira hipótese de substituição tributária. Isto porque, a obrigação tributária já nasceria tendo como sujeito passivo o responsável elencado em lei, motivo pelo qual, o contribuinte não figuraria em momento algum na relação jurídica desencadeada.

Entretanto, este entendimento não pode ser aceito. Explica-se:

A norma decorrente do artigo 135 do Código Tributário Nacional é deflagrada tendo em vista a ocorrência de um fato ilícito.

Na verdade, nasce a relação jurídica tributária tendo como ocupante do pólo passivo o contribuinte. No entanto, ante a verificação da ocorrência de um ato praticado com excesso de poderes ou infração (a lei, contrato social ou estatutos) por uma das pessoas elencadas no dispositivo legal sob comento, há o surgimento da regra de responsabilidade, que fará nascer uma relação jurídica entre o fisco e o responsável designado. Como é sabido, contudo, esta nova relação jurídica não terá natureza tributária, mas sim caráter administrativo.

Com o surgimento da regra de responsabilidade, decorrente de um ato ilícito, o responsável passa a responder pessoalmente pelos valores devidos a titulo de tributos, com seus próprios bens.

Obviamente que as hipóteses de responsabilidade trazidas pelo artigo 135 do Código Tributário Nacional também são de caráter sancionatório, eis que decorrem de um ato ilícito.

Portanto, não há que se falar no nascimento de relação jurídica tributária tendo como sujeito passivo terceiro pessoalmente responsável. A relação tributária nasce sim em face do contribuinte, mas este perde a condição de adimplir a obrigação tributária, em decorrência da existência de um fato ilícito cometido por terceiros, que passam a integrar uma relação jurídica de cunho administrativo com o fisco.

Claro está, uma vez mais, que, a regra de responsabilidade não é tributária, mas sim de natureza administrativa.

Deve-se esclarecer, ainda, que para os terceiros responderem pessoalmente pelos valores relativos aos tributos devidos, é preciso que pratiquem atos em nome de outras pessoas (os verdadeiros contribuintes). Por tal razão, pode-se afirmar que referidos contribuintes devem ter conferido poderes de representação ou administração aos terceiros.

Importante salientar que não é o tributo que decorre de ato ilícito, mas sim, a responsabilidade pessoal dos terceiros ocorre em decorrência de um ato ilícito por eles praticados.

Maria Rita Ferragut123 demonstra essa diferença:

123 FERRAGUT, Maria Rita.

“Na realidade, a infração não diz respeito ao fato jurídico tributário, que é sempre lícito, mas à decisão de sua prática, contrária aos objetivos sociais contemplados no contrato social ou no estatuto, à competência pessoal para a tomada de decisões, e, ainda, aos limites fixados em lei.”

6.2.1.2.1. Responsabilidade integral do terceiro

A responsabilidade pessoal das pessoas elencadas no artigo 135 do Código Tributário Nacional ocorre independentemente da possibilidade dos verdadeiros sujeitos passivos da relação jurídico tributária poderem adimplir a obrigação instaurada. Tal fato se dá, pois a responsabilidade decorre da prática de atos que excedam aos poderes de representação ou administração a eles conferidos.

Assim, no presente caso, não há que se falar em responsabilidade solidária ou subsidiária, eis que é o terceiro que responde sozinho e de forma integral pelo adimplemento da obrigação decorrente de seus atos.

Neste sentido, Vittorio Cassone124:

“No caso do art. 135, entendemos que, se aquelas pessoas praticarem atos com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos, não será correto penalizar a sociedade e, em conseqüência, os demais sócios (em Limitada) ou acionistas (em Sociedade Anônima), por ato doloso e ilegal cometido por outrem – devendo, por isso, responder pessoalmente pelos excessos não autorizados.

Só cabe atribuir a responsabilidade ao sócio-gerente, diretor ou administrador que tenha praticado o ato, excluídos os demais que dele não participaram.”

124 CASSONE, Vittorio.

Renato Lopes Becho125 também afirma:

“Não há solidariedade no art. 135, o que significa que as pessoas

jurídicas não são responsáveis pelos tributos devidos por seus administradores (diretores, gerentes, representantes), que devem

pessoalmente os tributos na tipificação do artigo 135.”

A partir do momento em que se conclui pela inexistência de solidariedade ou subsidiariedade no presente caso, não há lógica também em afirmar-se que é necessário primeiro exaurir o patrimônio da pessoa jurídica para somente depois atingir o patrimônio pessoal de seu administrador que tenha agido contra a lei ou com excesso de poderes.

Ora, a responsabilidade pessoal é inerente ao artigo 135 do Código Tributário Nacional, sendo que desde o surgimento da regra de responsabilidade o terceiro passa a responder com seus próprios bens pelos valores relativos aos tributos devidos.

Na verdade, este é um típico caso de desconsideração da personalidade jurídica.

Quando se vislumbra a ocorrência de um ato praticado com excesso de poderes ou que infrinja determinada lei, desconsidera-se a o patrimônio da pessoa jurídica existente e busca-se o patrimônio da pessoa física que tenha agido de forma ilícita para responder os débitos relativos a sua conduta.

Desta forma, pondo em prática a desconsideração da personalidade jurídica, quando há a utilização da sociedade de maneira fraudulenta, ou na existência de abuso de direito ou desvio de finalidade, atinge-se o patrimônio pessoal de seus administradores, ultrapassando-se a barreira imposta pela pessoa jurídica.

Obviamente, deve-se respeitar a autonomia existente entre a pessoa jurídica e a dos administradores, principalmente, no tocante ao patrimônio distinto de cada um deles.

125 BECHO, Renato Lopes.

Contudo, nos casos em que há a utilização da pessoa jurídica com fins outros daqueles a ela inerentes, devem os terceiros serem responsabilizados por seus atos, incluindo-se a forma patrimonial.

Importante esclarecer que a desconsideração da personalidade jurídica não visa enfraquecer o instituto da pessoa jurídica, muito pelo contrário, pretende sim ressaltar seu valor, fazendo com que não haja abusos por parte de seus controladores, o que pode ocasionar a perda da identidade e, pior, da credibilidade da pessoa jurídica.

Fazendo o adequado uso da desconsideração da personalidade jurídica será possível alcançar-se, em boa parte dos casos, a verdadeira efetividade da justiça buscada pelas partes nas demandas.

Todavia, é preciso bastante cuidado e cautela para se aplicar a teoria da desconsideração da personalidade jurídica de uma empresa. Somente nos casos previstos em lei é que o véu da pessoa jurídica pode ser levantado e a barreira imposta pela separação patrimonial pode ser transposta, atingindo-se os bens das pessoas físicas controladoras.

Marçal Justen Filho126 demonstra que não pode haver arbitrariedade na utilização de referida teoria:

“A desconsideração não é, então, fenômeno arbitrário. Não é uma ficção porque a personificação (rectius, a pessoa jurídica) não é ficção nem produto da livre vontade. A desconsideração é, até, uma imposição necessária, instrumento indispensável quando o direito adota concepção acerca de pessoa jurídica que permite a ‘personificação’ indevida.

No Direito Tributário os requisitos que permitem a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica são: a prática de atos com excesso de poder ou com infração a lei, contrato social ou estatutos.

126 JUSTEN FILHO, Marçal.

Desconsideração da personalidade societária no direito brasileiro.

O excesso de poder sempre ocorrerá quando existir a prática de atos que vão além dos limites estabelecidos pela representação ou administração conferidos pela lei ou contrato, às pessoas mencionadas no artigo 135 do Código Tributário Nacional.

Dignos de nota são os comentários de Maria Rita Ferragut127 acerca deste tema:

“A finalidade da sociedade é alcançada mediante o cumprimento de seu objetivo social, definido no estatuto ou no contrato social. Quando o administrador pratica qualquer ato dentro dos limites estabelecidos, pratica ato da pessoa jurídica, e não seu.

Por outro lado, quando o administrador, investido dos poderes de gestão da sociedade, vier a praticar algum ato, ainda que em nome dessa mesma sociedade, mas extrapolando os limites contidos nos contratos sociais, terá cometido ato com excesso de poderes.”

Portanto, são atos que vão além do permitido e que criam conseqüências jurídicas, mais precisamente, fazem nascer relações jurídicas com o fisco.

Em outro turno, a prática de atos com infração à lei, contrato social ou estatutos é um requisito que permite a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica, justamente porque, uma vez ocorridos, desvirtuam sobremaneira as finalidades sociais da pessoa jurídica.

Quando o administrador de uma sociedade, seja ela limitada ou por ações, descumpre as determinações contidas nos documentos sociais da pessoa jurídica, agindo de forma a infringir tais documentos, fica evidente que a empresa está sendo utilizada de forma equivocada, em dissonância com seus contratos ou estatutos, motivo pelo qual não pode ser penalizada em adimplir débitos tributários que surgiram de forma indevida.

Assim, os administradores que utilizaram a empresa de forma ilícita passam a ser os responsáveis pelo pagamento dos valores relativos aos tributos devidos, com seus patrimônios pessoais.

127 FERRAGUT, Maria Rita.

Com relação à infração à lei, surge uma discussão interessante e que deve ser aqui tratada.

A infração de qual lei dá ensejo à aplicação da desconsideração da personalidade jurídica? Qualquer ato legislativo?

De acordo com os ensinamentos de Helena Marques Junqueira128, qualquer lei descumprida pode dar ensejo à responsabilização pessoal de terceiros:

“(...) qualquer lei que não cumprida tenha conseqüências negativas para o sujeito ativo tributário, impedindo o surgimento da relação jurídica tributária para a pessoa jurídica e fazendo nascer para o agente da infração uma relação jurídica sancionatória, de mesmo valor monetário, incluindo o que deveria ter sido pago a título de

tributo e demais acréscimos legalmente impostos pelo

descumprimento da lei tributária.”

No entanto, não parece ser este o entendimento mais acertado, caso contrário, os sócios seriam sempre responsáveis pelas dívidas da sociedade, independentemente de sua origem, o que acarretaria o fim da separação e autonomia da personalidade jurídica.

Renato Lopes Becho129 mostra essa preocupação quando assevera:

“Se assim fosse, qualquer infração à lei (devolução de cheques sem correspondentes fundos, aplicação de multas de trânsito, atraso no pagamento de duplicata ou de qualquer outra obrigação) transferiria a responsabilidade para o administrador, com o que teríamos o fim da personalidade jurídica da sociedade.”

128 JUNQUEIRA, Helena Marques.

A responsabilidade tributária dos sócios e administradores da

pessoa jurídica. Dissertação apresentada à banca examinadora da Pontifícia Universidade Católica