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deixa, não valia a pena”.

Ressalta-se que as metáforas visuais descritas pelo entrevistado e presentes no estágio IV “baixar a cabeça” e “virar as costas” que são índices tanto de decepção, tristeza, isolamento quanto de negação, negligência ou o ato de ignorar algo ou alguém.

ENTREVISTA 9 ([L,U,46,M,SI])

ANÁLISE 91

L1 (91.a) Quando você pensa em violência o que que vem à sua cabeça em primeiro lugar? L11 desestrutura e a banalização

L1 desestrutura e banalização... do quê?

L11 (91.b) desestrutura dos vários governante né... ão conseguem ã:: mais dá conta... da coisa né... (91.c)

distribuição da droga... isso é::

No segmento (91.b), encontra-se o modelo metonímico do tipo CAUSA PELO EFEITO, em que a “desestruturação do governo”, ou seja, a desorganização dos líderes políticos no que concerne a manutenção da segurança dos cidadãos, não é conquistada, pois o governo “não dá conta”. Sendo assim, DESESTRUTURA GOVERNAMENTAL pode ser tomada como uma das CAUSAS da violência.

Assim como nos trechos (18), (22), (53), (58), (61) e (66), no segmento (91.c), reaparece a menção ao problema das drogas como uma das CAUSAS da violência.

ANÁLISE 92

L1 [ tu tem... uma função social né, que nem tu disse, tu é o tio, tu é a tia e:: Na sua comunidade, morando lá no centro, vendo Caxias do Sul por duas óticas né, porque tu mora lá e tem atividades aqui na zona rural né, o que que tu acha que é mais comum assim de violência nesses dois ambientes ou só lá ou só aqui?

L11 violência... acontece o seguinte (92.a) tu não encontra todo dia a violência, então a hora que tu encontra tu... parece que tu... ã:: uma coisa assim ó, (92.b) eu acho violência pedindo esmola, que nem a moça, aquela ali... aquilo ali, meu Deus do céu, será que não há uma instituição que pegue ela, ela passou lá por mim, essa mulher, mas só que ela não fica em nenhum lugar, ela teria que ser tranCAda né, como um dependente, um doente mental porque ela pode ser considerada já uma doente mental, porque ela não tem mais jeito

L1 [ ela teria que passar

mesmo por uma avaliação psiquiátrica né

L11 [(92.c) isso é uma violência, a gente vê pessoas brincando com ela, dando esmola e:: né...

L3 [ e eu já vi até pessoas

marcando programa com ela, isso aí é:: [...](92.d) isso aí é uma punhalada L1 uma punhalada... algo que fere... Mas então é a omissão da sociedade?

L11 omissão da sociedade, eu assim ó como colocavam nessa campanha do craque... tentá ajudar essas pessoas colocá elas num... é que na verdade não existe, não existe um lugar que tu coloque essa pessoa e ela fique internada dois, três anos pra ter o tratamento legal, não existe então... o que que eles fazem, eles mandam pra Porto Alegre doze, quinze dias, devolvem, já largam ela

L1 [ nos sítios aqueles né, de recuperação L11 é mas aí no sítio de recuperação a pessoa tem que querê ir... essa não qué, essa, (92.e) a rua e as drogas já

tomaram conta, não tem como... isso teria que ser um lugar fechado, que a sociedade teria que ter esse lugar,

porque se em Caxias tem ela, tem o Robson, tem vários em Caxias... que se não tem esse tratamento a longo prazo...

Em (92.a), pode-se inferir que “não encontrar a violência todos os dias” é tornar a violência uma ENTIDADE que pode ser ou não encontrada, que pode ser ignorada, que pode ser insistente, que pode vagar pelas ruas, mas que não pode estar em todos os lugares.

O segmento (92.c) expõe uma violência que afeta o nível EMOCIONAL da pessoa que assiste à cena de alguém “pedindo esmola”. Mesmo que possa ser considerado por muitos um ato caridoso, o ato de esmolar é um símbolo da injustiça social – presente na análise (64) – quando é visto como um ato de humilhação, retratando a miséria social e financeira, ou quando vem adicionado de atos de humilhação e desrespeito à vida. Para explicar essas questões, o entrevistado e a participante utilizaram de um exemplo saliente, ao contarem aspectos da história e do comportamento de uma pedinte que conhecem. A partir disso, observa-se, conforme o segmento (92.c), que a esmola é, para eles, considerada um ato de violência uma vez que as pessoas que dão esmola muitas vezes “brincam com”, ou seja, humilham a pedinte. A participante da entrevista (L3) acrescenta que essas ações são “uma punhalada” (92.d). Há aqui um modelo metafórico em que o domínio-alvo PUNHALADA está pelo domínio-fonte INDIGNAÇÃO.

Em (92.d), apresenta-se um modelo metonímico em “as drogas e as ruas já tomaram conta (do pedinte)”, em que DROGAS e RUA são ENTIDADES que podem possuir alguém.

DROGA ENTRA NO ORGANISMO COMO VÍCIO. No caso de RUAS, tem-se uma metonímia, pois não é a rua em si que “toma conta” da pedinte, mas RUA como espaço de vivências onde não há restrições e segurança como LUGARES SEGUROS provêm. As experiências vividas nas “ruas” moldam o comportamento da pedinte, que cede facilmente, ou seja, sem controle e força de vontade, aos riscos que lhe podem causar danos. Nesse sentido, portanto, DROGAS E RUAS DESTROEM A FORÇA MORAL DA PESSOA.

ANÁLISE 93

L1(93.a) ã:: em uma escala de mais violência e menos violência, o que que tu pode me dizer de exemplo de

uma coisa muito violenta e de uma coisa pouco violenta?

L11 (93.b) muito violenta... ã:: as chacinas, (93.c) os sequestros né, muito violento isso...privá a liberdade de

uma pessoa pra pedi dinheiro isso aí... a liberdade não ou até matá isso... e as chacinas que tão acontecendo

que graças a Deus por enquanto por aqui não têm, mas nas grandes cidades

L1 [ nas metrópoles né, de vez em quan do a gente ouve L11 Ouve, e bastante

L1 E menos violento, uma violência leve

L11 (93.d) acho que aqui é a esmola... pode ser?

Em reposta à pergunta do segmento (93.a), o entrevistado expõe a gradação de violência por meio dos critérios de NÚMERO DE VÍTIMAS e DANOS. Em (93.b) e (93.c), o sujeito expõe dois exemplos típicos de modelo metonímico, que são: CHACINA e o SEQUESTRO.

A CHACINA é um ato de violência considerado mais grave pelo entrevistado, pois o causa o maior DANO, atinge grande número de VÍTIMAS e não apresenta um PROPÓSITO justificável. A partir disso, pode-se estruturar, por meio do esquema ORIGEM-PERCURSO- META, o seguinte cenário de esquemas de imagens:

f) AGENTE (SINGULAR ou COLETIVO) e, normalmente, perceptível; g) AÇÃO (DIRETA) perceptível (com INSTRUMENTO);

h) PACIENTE (mais de uma pessoa); i) DANO (FÍSICO-CORPORAL).

O SEQUESTRO, por sua vez, é considerado mais grave em função do PROPÓSITO, conseguir dinheiro, da expansão dos DANOS (emocionais e físicos em diferentes VÍTIMAS) e da MANEIRA, “privá a liberdade de uma pessoa”, conforme segmento (93.c). Feltes (2010, no prelo) expõe que uma das violências urbanas é o sequestro. Em sua análise (por meio da semântica de frames), a autora explica que há um AGENTE, o sequestrador ou grupo de sequestradores, mas diversos PACIENTES durante um SEQUESTRO: um PACIENTE DIRETO, aquele que é sequestrado, sofrendo DANOS FÍSICOS e EMOCIONAIS; e um PACIENTE INDIRETO, normalmente a família, que sofre DANOS EMOCIONAIS. Todos

esses elementos contribuem para afirmar que SEQUESTRO é um ato de violência muito grave.

Em oposição à CHACINA e SEQUESTRO, o entrevistado afirma que ESMOLA é um ato de violência menos grave pois não gera DANOS FÍSICOS e o PACIENTE é indireto, sofrendo DANOS EMOCIONAIS.

ANÁLISE 94

L1 (94.a) Quais foram ã:: tu sofreu né, essa questão do assalto e as sensações que tu sentiu na hora? L11 (94.b) raiva, impunidade, tu não poder fazer nada, meu Deus do céu tu... o cara te chamando de vagabundo, te chutando e (94.c) tu não podê fazê nada... assim ó, minha reação não ia sê de confronto com eles, eu ia pegá a minha família e saí né, dexá ele aí e pronto, não adianta se tu reagi tu... (94.d) mas não podê

protege a família isso...

L1 e eles chegaram de surpresa? L11 surpresa

L1 e não tinha nada, eles entraram na casa direto

L11 [ah eu tava ali fora e aí... ah é aqui que mora um tal de Alan? não, ah então fica quieto... com uma pistola... é um assalto... aí eu disse pro cara vai com calma que tem criança né... então eles botaram eles deitado em baixo da mesa...

L1 só tava o teu filho de pequeno aqui? L11 só

L1 e depois assim, que reações foram geradas depois, tu teve raiva na hora

L11 eu... eu trabalhava com os adolescentes e:: (94.e) muita raiva, inclusive eu fiquei trinta dias numa clínica né... eu ia durante o dia na clínica pra... passá né... pra..

Em (94.b), observam-se dois exemplos típicos, de modelo metonímico, na categorização de VIOLÊNCIA: RAIVA e IMPUNIDADE. Sobre RAIVA, também presente no fragmento (94.e), pode-se verificar as análises (21), (29), (37) (46), (51), (70), (71), (75), (81), (86), (89) e (90), nas quais esse conceito já foi amplamente estudado, gerando VIOLÊNCIA É RAIVA.

IMPUNIDADE, por sua vez, não é um exemplo muito comum, mas é pertinente para o entrevistado uma vez que se consideram aspectos circunstanciais. O sujeito foi vítima de uma invasão de domicílio, acompanhada por AMEAÇA e ROUBO. Em função de os AGENTES desse ato de violência não terem sido presos, ou seja, punidos pelos seus atos, IMPUNIDADE é um exemplo possivelmente mais prototípico para esse entrevistado. Sendo assim, apresenta-se metonímia do tipo EFEITO PELA CAUSA, em que VIOLÊNCIA É IMPUNIDADE.

Em (94.c) e (94.d) encontra-se o sentimento de IMPOTÊNCIA, analisado também em outros segmentos, como em (8.g), (10.c) e (70.c). A IMPOTÊNCIA é um sentimento consecutivo de um ato de violência que reaparece, no qual a VÍTIMA de um ato de violência não apresenta reações sobre o fato.

L1 (95.a) o que que você considera ser um ato de violência, como é que eu posso caracterizar, ato de

violência é?

L11 tudo que encobre a violência, o:: (95.b) tráfico de drogas, o sequestro... (95.c) eu acho assim a

desestrutura familiar hoje em dia ela tá na cara né... então... mas eu não acho culpa do governo eu acho culpa

da sociedade do nosso momento... (95.d) porque tem gente que vai lá, casa e:: bota cinco, seis filhos lá e:: isso

aí eu acho um ato de violência, e depois larga e então dão a culpa pra sociedade, pro governo, mas... peraí...

L1 é a velha medida de controle de natalidade , às vezes parece interessante né [...]

L11 aí tu vai pros bairros, quanto tu vê... uma família com dez filhos, e não tem condições de sustentá um, aí vai colocá a culpa no governo, mas a culpa é de quem...

[...]

L1 o que que leva as pessoas, ou um grupo de pessoas a cometer atos de violência, na tua opinião? L11 na minha opinião é que começa desde cedo eu já tinha falado... (95.e) a disistruturação da família

Em (95.b) apresentam-se exemplos típicos de modelos metonímicos do tipo CAUSA PELO EFEITO, em que:

VIOLÊNCIA É TRÁFICO DE DROGAS VIOLÊNCIA É SEQUESTRO.

Nos segmentos (95.c a 95.e), VIOLÊNCIA É DESESTRUTURAÇÃO FAMILIAR, em que uma das CAUSAS da violência é tomada pela própria VIOLÊNCIA.

ANÁLISE 96

L1 (96.a) [...] como tu vê o tratamento da violência na mídia?

L11 (96.b) banalizado né, hoje em dia qualquer... tu liga um canal, nossa... é:: assalto, é robo, é morte , é

marido matando mulher, é pai matando o filho... nossa... é uma banalização

No segmento (96.b), observa-se o modelo metonímico MÍDIA BANALIZA A VIOLÊNCIA (vejam-se as análises (50) e (79) para a metonímia para MÍDIA). Com a repetição exagerada de reportagens que remetem a atos de violência, “assalto, é robo, é

morte, é marido matando mulher, é pai matando o filho...”.

ANÁLISE 97

L1 (97.a) ã:: você já cometeu um ato de violência?

L11 eu acho que não, um ato de violência... (97.b) eu briguei num jogo de futebol... L1 não, mas como tu falou antes né, que uma violência é dá esmola, por exemplo, L11 não, já, já cometi

L1 então já cometi uma violência porque dei esmola, já cometi um ato de violência porque briguei no futebol, são violências mais brandas digamos assim, mais comuns, menos agressivas

L11 é:: mas já...

L1 você seria capaz de cometer um outro tipo de violência, um outro tipo de ato de violência?

L11 olha, nunca pensei nisso... (97.c) ah, no dia do assalto eu pensei... que se eu pegasse um eu matava L1 se tu tivesse a possibilidade

L11 é:: matava os três que tavam ali

No segmento (97.b), encontra-se o modelo metonímico de exemplos típicos, do tipo EFEITO PELA CAUSA, gerando a metonímia VIOLÊNCIA É BRIGA DE JOGO DE FUTEBOL.

Em (97.c), retoma-se a metáfora da RAIVA em que uma VÍTIMA de um ato de violência pode, dentro da METÁFORA DA CONTABILIDADE MORAL, retribuir o ato de

violência com violência. Essa perspectiva está ligada à FORÇA MORAL que compele as pessoas a manterem o equilíbrio na ARITMÉTICA MORAL, por meio de VINGANÇA. ANÁLISE 98

L1 [...] com as suas palavras, o que você quiser falar, (98.a) definir a violência pra mim

L11 definir a violência.... a violência começa na desestruturação da família né, (98.c) eu acho que o nosso governo tá pecando nisso ainda, a sociedade peca... nisso, tem culpa nisso aí e o dia que não houver mais violência então, vai ser uma maravilha o mundo né, porque (98.b) hoje em dia a gente é refém da violência

Complementando a análise do fragmento (88.c), pode-se inferir de (98.b) a metáfora PESSOAS SÃO REFÉNS DA VIOLÊNCIA. A VIOLÊNCIA é tomada como uma ENTIDADE capaz de sequestrar as pessoas, tirando a liberdade de ir e vir. Por isso, podem ser levantados os seguintes acarretamentos:

VIOLÊNCIA É UMA ENTIDADE ENTIDADE É UM SEQUESTRADOR O SEQUESTRADOR PRENDE PESSOAS O SEQUESTRADOR TIRA A LIBERDADE PESSOAS SÃO REFÉNS

REFÉNS NÃO TÊM LIBERDADE

A VIOLÊNCIA É UM SEQUESTRADOR QUE TIRA A LIBERDADE DAS PESSOAS

ENTREVISTA 10 ([A,U,63,F,SC])

ANÁLISE 99

L1: Quando você pensa em violência, o que vem em sua mente em primeiro lugar?

L12: em primeiro lugar me vem que ã:: (99.a) a liberdade do ser humano está sendo cortada e se a gente não é livre a gente não é feliz... então que a gente tem que buscá... então é um trabalho... a nível de Estado que se faz é tentá trabalhá na área preventiva né... porque tu pode trabalhá na área curativa, só que ã:: o que vem junto e o que tu consegue é muito poco, tá mudando alguma coisa... nós trabalhamos na área preventiva e também a curativa que é:: dando atenção, é:: eu acho legal também existe a lei maria da penha existem as (...) de assistente social que trabalham com as crianças

Em complemento à análise do fragmento anterior (98.b), pode-se inferir que A VIOLÊNCIA TIRA A LIBERDADE DAS PESSOAS. Nesse caso, VIOLÊNCIA apenas superficialmente é AGENTE (como algum tipo de ENTIDADE) é metonimizada: porque as pessoas estão expostas, como VÍTIMAS POTENCIAIS, a ATOS DE VIOLÊNCIA, elas têm suas condições de vida sujeitas a restrições que lhe provêm maior SEGURANÇA. Por maior SEGURANÇA as pessoas sacrificam sua LIBERDADE.

ANÁLISE 100

L1 hoje se você pudesse comparar violência com alguma coisa, uma ideia, um conceito, pudesse completar essa frase pra mim: violência é como... tu tem alguma ideia pra compará? Até pra gente explicá pras pessoas né