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FIGURA 9 Manta de artista

4 PROCESSAMENTO E PRODUÇÃO DE SENTIDOS COMPREENDIDOS COMO PROCESSOS SOCIOBIOLÓGICOS

4.1 A ressonância dos campos mórficos

Reinterpretando a noção de Inconsciente Coletivo40, as pesquisas de Sheldrake (1995) evidenciam outras formas de olhar para a comunicação/interação através do conceito dos campos mórficos e da ressonância entre eles, os quais tem ampla abrangência no entendimento da realidade, no modo como as "coisas são" e podem ser aplicados tanto às formas quanto aos comportamentos.

Para Sheldrake (1995 e 1997) pesquisas sobre a capacidade de regeneração verificada em certos organismos vêm dando maior credibilidade à teoria da ressonância dos campos mórficos. Estudando a espécie vegetal, o autor

39 BALDWIN, I. T., e SCHULTZ, J.C. Rapid changes in tree leaf chemistry induced by damage: evidence for communication between plants. Sciences, 221, 4607, 1983, p.277-279, citado por MORIN, 2005, p.56.

.# Segundo Jung, o inconsciente coletivo é um reservatório de dados com imagens latentes (arquétipos) que herdamos de nossos ancestrais (SILVEIRA, 2007). Não lembramos das imagens de forma consciente, mas herdamos uma predisposição para reagir ao mundo de forma semelhante ao que nossos ancestrais realizavam. Nesse sentido, a teoria do Inconsciente Coletivo afirma que o ser humano nasce com variadas predisposições que determinam formas de pensar, compreender e agir. Tal armazenamento de informações não vem de experiências pessoais, porque este armazenamento não é adquirido individualmente, mas herdado. O inconsciente coletivo é um conjunto de sentimentos, pensamentos e lembranças compartilhadas por toda a humanidade .

(SHELDRAKE, 1997), explica que, ao se cortar pequenos galhos de uma árvore ou arbusto para produção de mudas, sob certas condições de cuidado apropriado cada ramo irá se desenvolver como uma nova árvore ou arbusto, e os originais permanecerão sendo os mesmos do início dos cortes. Há, ali, uma capacidade de se regenerar, o que não acontece com máquinas, evidentemente, que não se refazem sozinhas a partir de separação em partes. Do mesmo modo, se quebrarmos um imã em pedaços teremos muitos imãs pequenos que continuarão a conter um campo magnético igual ao imã original (SHELDRAKE, 2003). E se colocarmos uma folha de papel sobre um ímã e espalharmos, sobre ela, pó de ferro, os grãos de ferro irão se distribuir ao longo de linhas geométricas, porque o campo magnético do ímã afetará toda a região à sua volta.

Embora não possamos perceber este campo de forma direta, pelos nossos sentidos, detectamos sua presença pelo efeito que ele produz. É dessa forma que, de modo parecido, os campos mórficos se distribuem imperceptivelmente através do espaço-tempo, conectando, em forma de campo, todos os sistemas individuais a eles associados (SHELDRAKE, 1997 e 2003).

Para Sheldrake (2004 e 1995), os campos mórficos não envolvem transmissão de energia: entre eles (ou através deles) transitam informações. Sua intensidade não decai com a distância, como ocorre com os campos gravitacionais e eletromagnéticos, justamente porque o que se transmite por meio deles é informação, e não energia. Numa analogia a estudos realizados com animais (SHELDRAKE, 2003), a experiência evidenciou que o conhecimento adquirido por um grupo de indivíduos se junta a um patrimônio coletivo daqueles indivíduos, o que determina ou provoca um acréscimo de consciência.

Embora ainda controvertida, a hipótese de ressonância entre campos mórficos vem sendo testada por experiências, e já existem muitas evidências a seu favor. Por exemplo, na indústria química, quando uma substância química ou uma nova droga é sintetizada ou cristaliza-se pela primeira vez (SHELDRAKE, 1995) não estará acontecendo ali nenhuma ressonância mórfica vinda de outros cristais daquele tipo. Assim, um novo campo mórfico passa a existir. Com o passar do tempo e pela repetição de experiências em qualquer parte do mundo, este mesmo composto vai se tornando cristalizável com maior facilidade e velocidade, como se uma memória cumulativa fosse sendo construída e potencializada a partir do momento em que aquele “padrão” vai se tornando cada vez mais habitual.

No campo da morfogênese biológica, a hipótese da ressonância entre campos mórficos afirma que quando organismos criam um caminho novo ou inusitado de desenvolvimento, quanto maior for a freqüência com que isso aconteça, maior será a probabilidade de que volte a acontecer novamente. Existe um vasto número de registros arquivados (SHELDRAKE, 1995) de experimentos sobre, por exemplo, a psicologia dos ratos. O monitoramento de seu processo de aprendizado, num estudo que durou 50 anos e que iniciou em Harward e prosseguiu na Escócia e na Austrália, mostrou que a velocidade de aprendizado entre os ratos da mesma espécie – não só da mesma família – aumentou em mais de 10 vezes no período, submetidos todos a situações idênticas e em lugares geograficamente distantes (Ibidem, 1995).

Outro relato importante na comprovação da ressonância mórfica descreve o comportamento dos pequenos pássaros bluetits, que habitam a Grã-Bretanha41. Nos anos de 1950, a Inglaterra possuía sua entrega de leite à domicílio, em garrafas com tampas de papelão. Num dado momento, nas portas das casas, os pássaros começaram a romper as tampas das garrafas de leite para comer a nata que ali ficava depositada. Muitos pássaros, inclusive, caiam acidentalmente na garrafa, que tinha a boca larga, e se afogavam no líquido.

O fenômeno começou imediatamente a se repetir em vários lugares da Inglaterra, distantes 50 ou 100 milhas entre si. Sempre que se observava uma nova ocorrência do caso em alguma comunidade, a prática logo se disseminava entre os pássaros da mesma espécie das vizinhanças, o que parecia ser apenas uma conduta de imitação. Mas os pássaros bluetits não se deslocam além de cinco milhas porque são apegados ao seu habitat original e, então, a disseminação de tal comportamento num âmbito territorial tão extenso não poderia ter acontecido por contato entre eles. Os hábitos dos pássaros foram mapeados e os cientistas verificaram que eles haviam “inventado” aquele novo comportamento em, pelo menos 50 lugares e nichos diferentes. Com o passar do tempo, foi percebido que o hábito difundia-se cada vez mais rápido, abrangendo outros lugares como a

41O caso dos pássaros bluetits é relatado, também, por Arie de Geus, consultor estratégico da Schell, em seu texto no livro “A empresa viva”, onde comparou semelhanças/diferenças entre equipes de trabalho da Schell e estes pássaros, quanto à velocidade de inovação, propagação social e mobilidade. (GEUS, 1999). Maturana e Varela (2007) também se referem a esta experiência sob o ponto de vista da Biologia Cultural, explicada, neste trabalho, mais adiante.

Escandinávia e a Holanda, onde o hábito de garrafas de leite com tampa de papelão, entregues de porta em porta, também existia.

Outro aspecto interessante a respeito destes pássaros,foi que, entre 1939 e 1940, a entrega de leite a domicílio foi suspensa devido à ocupação alemã, só voltando a distribuição em 1948. Como esta espécie de pássaros vive apenas dois ou três anos, no máximo, em 1948 não existiam mais bluetits que comiam nata nas garrafas depositadas nas portas das casas. Mas assim que a entrega de leite voltou, rapidamente reiniciou o ataque dos pássaros às tampas, e, surpreendentemente, em lugares bem distantes entre si e, em dois anos, o hábito foi restabelecido entre os pássaros, disseminando-se mais rapidamente ainda. Para Sheldrake (1995) essa difusão de conhecimento entre a espécie de pássaros não pode ser explicada por determinantes genéticas, parecendo estar vinculada a um tipo de memória coletiva alimentada por ressonância mórfica. Esta forma de herdar comportamentos, por ressonância, seria o fator determinante na organização da forma e dos modos de comportamento (SHELDRAKE, 1987 e 1995).

Nesse sentido, é possível que cada espécie de ser vivo tenha/estabeleça seu próprio campo, contidos em outros campos, numa constante possibilidade de auto- organização/regeneração, num eterno vir-a-ser coletivo. A esse respeito concordam Morin (1977 e 2005) e Maturana e Varela (2007). Sobre o processo de aprendizagem, por exemplo, Sheldrake (1987 e 1995) considera que quando alguma coisa é aprendida por alguém, muito provavelmente ela será aprendida por outro de modo mais fácil, esteja este alguém onde estiver. Formas e padrões de comportamento estão, neste momento, sofrendo uma regulação por meio de uma sintonia entre campos, com incontáveis conexões invisíveis de codificação, que ultrapassam limites do organismo. Nessa configuração, o desenvolvimento da forma resulta da interação entre o organismo e os campos mórficos com os quais ele é e está sintonizado.

A partir da hipótese da ressonância mórfica somos, como organismos, produtos de comportamentos aprendidos. Atuamos com formas desenvolvidas por indivíduos da nossa mesma espécie, colocados em nós como herança orgânica/genética, mas, também, como herança de características adquiridas pela experiência, possivelmente transmitida por ressonância mórfica.

Memória, mente e cérebro

Estamos familiarizados com o conceito de que a Memória está dentro do nosso cérebro, que, em geral, acaba se configurando como sendo a nossa mente. Sheldrake (1995 e 1998) sugere que o cérebro possa ser comparado, em alguns de seus aspectos, a um sistema de sintonia e memória e, nesse caso, a memória, talvez, não esteja organicamente alojada dentro do cérebro.

A esse respeito concorda o neurocirurgião Penfield (1983), sobre a existência de uma dimensão extra-física da mente, assim como o físico Goswami (2008), que dá a este fenômeno o nome de Consciência. Para Penfield (1983), o substrato indispensável da consciência localiza-se fora do córtex cerebral e possui uma energia diferente daquela encontrada nos potenciais neuronais que percorrem caminhos no cérebro. Explorando com eletrodos cada parte do córtex cerebral de pessoas conscientes42, Penfield concluiu que a mente parece ser a responsável pelos fenômenos da consciência e pelos arquétipos do inconsciente, e constatou, depois de muitos anos de pesquisa, uma inexplicável separação funcional entre mente e corpo, que, na realidade, ao mesmo tempo, fazia com que uma fosse completamente inútil sem o outro (PENFIELD, 1983).

Ainda a respeito de memória, mente e cérebro, os estudos de Pribram (1987) mostram que o cérebro é capaz de guardar 10 bilhões de bits de informações atemporais e cruzadas. Nesse processo, de pensamento, cada coisa processada se mostra totalmente correlacionada à outra (WILBER, 2001, SHELDRAKE, 1997 e PRIBRAM, 1987), como numa figura holográfica, onde uma informação sobre qualquer ponto de uma imagem original está distribuída por todo o holograma. No

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Penfield (1983) relata experiências de memórias de seus pacientes trazidas por estimulação do córtex cerebral, enquanto tratava epilepsia. Os pacientes, acordados, guiavam seu procedimento. Nessas experiências, muitas vezes a riqueza de detalhes dos relatos dos pacientes não pertenciam totalmente às suas histórias de vida, e, provavelmente, eram produtos de inconsciente coletivo, segundo o autor. Em outro relato, assistindo um paciente de acidente automobilístico grave, imóvel no leito porque paralisado, a demonstração de que estava consciente acontecia por uma leve movimentação dos olhos, e pelo olhar que dirigia a sua esposa, seu comportamento pelo olhar podia demonstrar a luta entre uma mente preservada, em algum lugar, como uma consciência, e um cérebro que perdera temporariamente sua capacidade de controle motor sobre todo o organismo.

trabalho de Pribram (1987), todas as partes do cérebro são capazes de participar de todas as formas de representação, como uma grande memória holográfica. Propõe que a memória não é armazenada como num computador, de modo sequencial, mas em camadas, e os estágios de processamento são executados no domínio das frequências, nas junções dos neurônios e não dentro deles. Os impulsos nervosos vêm de dentro dos neurônios e servem para propagar os sinais/informações ao longo de grandes distâncias. O funcionamento da mente, nesse sentido, como sendo um grande processador de frequência, põe em dúvida a forma de funcionamento dos nossos órgãos sensoriais (WILBER, 2001) e o modo como olhamos e produzimos sentido do mundo que está ao redor da nossa consciência.

Ramachandran (2010), neurocientista da Universidade da Califórnia, pesquisando a atividade cerebral com eletrodos, percebeu a ação de neurônios “espelho”, que executam uma simulação da ação de outra pessoa em realidade virtual. Percebeu que o cérebro imita habilidades complexas que observa fora dele, como se as tivesse vivenciando. Por exemplo, acionamos a mesma área cerebral se observamos alguém tomando café, ou se tomamos nosso próprio café; ou seja, há uma parte em nós que não distingue se o que estamos vendo é a nossa realidade ou a realidade fora de nós. Somos, assim, capazes de reconhecer o outro e a experiência do outro, o que chamamos de empatia. A partir disso, o cientista afirma que o sistema de neurônios espelho é a base da empatia, da consciência, da representação de si mesmo, da aprendizagem e, portanto, da cultura e da civilização.

Recentemente (MACIEL, 2010) uma pesquisa que investigou a relação de pais com seu primeiro filho, medindo hormônios presentes no sangue no momento em que o pai interagia sozinho com o bebê, observou que pais que fizeram grande quantidade de toques nos filhos tinham um aumento de produção de oxitocina43 o mesmo não acontecendo com pais que fizeram pouco carinho nos filhos. No grupo de pais com alto teor de oxitocina, ocorreu um aumento da substância também nos bebês. O estudo evidenciou que pais que têm altos níveis de oxitocina têm uma relação melhor com os filhos. Outros estudos com este hormônio no cérebro vêm

43A oxitocina é um hormônio produzido pelo hipotálamo que, entre outras funções, ajuda as pessoas a ficarem juntas por muito tempo. Também é um hormônio ligado ao que as pessoas sentem ao, por exemplo, abraçar um amigo de longa data.

demonstrando, também, sua relação com a empatia, a confiança e a generosidade, como se sua produção acionasse uma alavanca de mudança na química cerebral.

Nicolelis (2010), neurocientista brasileiro que também desenvolve pesquisas nessa linha, concorda com tais estudos e vai além, evidenciando que o pensamento é uma onda elétrica que se espalha no cérebro, criando um campo elétrico e magnético. De acordo com Nicolelis (2010) a respeito da nossa capacidade de simular a realidade, nosso cérebro não tem, como se acreditava, funções alocadas em determinados espaços, territorializados e, em ciência, já se verificou viável a interação e/ou processamento entre cérebros humanos e máquinas pelo pensamento, sendo possível, hoje, compreender cientificamente e provocar que alguém “pense” em um lugar, e uma ação relacionada a este pensamento seja desencadeada numa localidade distante.