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2.5. Como Conservar a Natureza em Estabelecimentos Rurais?

2.5.7. Restauração da paisagem rural

Como foi visto nos capítulos anteriores, os principais problemas relacionados à conservação da biodiversidade no meio rural são o desmatamento, com a destruição dos habitats, e a fragmentação florestal, grande responsável pelos problemas genéticos relacionados ao isolamento das populações.

A ação básica que se opõe à fragmentação é conhecida como conectividade. Para que ocorra restauração, ambientes fragmentados devem ser reconectados (METZGER, 2003).

Neste capítulo serão abordadas ações para amenizar a fragmentação dos habitats, como a construção de corredores e trampolins ecológicos, além de alterações na permeabilidade da matriz.

Quando se fala em interligação de fragmentos florestais, logo se tem em mente os difundidos corredores ecológicos, comumente vistos como a solução para os problemas de fragmentação florestal no campo.

Os corredores ecológicos, também chamados de corredores de conservação ou corredores de movimento, são pequenas porções de habitat, em sua maior parte no formato retangular, que facilitam a dispersão de plantas e animais de um fragmento para outro, permitindo um maior fluxo de genes entre as populações e a colonização de novos fragmentos. Além disso, os corredores também podem ser considerados úteis para refugiar animais que são obrigados a migrar sazonalmente entre uma série de habitats para obter alimento (PRIMACK, RODRIGUES, 2001; METZGER, 2003).

Embora a idéia dos corredores seja, a princípio, atraente, ela tem alguns inconvenientes em potencial. Metzger (2003) vê como desvantagens a facilidade de disseminação de perturbações, como doenças e fogo e o bloqueio de fluxos gênicos por espécies territorialistas, como ocorre com algumas aves, que acabam impedindo o fluxo de outras, principalmente em corredores estreitos.

Primack e Rodrigues (2001) acreditam que os corredores podem facilitar o trânsito de doenças e de espécies daninhas, especialmente quando estreitos e tomados pelo efeito de borda. Além disso, para eles, animais que dispersam por entre os corredores poderiam ser expostos a maiores riscos de extinção devido à maior vulnerabilidade aos caçadores e predadores, que tendem a concentrar-se em rotas utilizadas pelos animais selvagens.

Todavia, apesar destas possibilidades serem plausíveis, inexistem dados que os suportem (PRIMACK, RODRIGUES, 2001). Além disso, as vantagens que os corredores podem trazer superam suas prováveis desvantagens (METZGER, 2003).

Os corredores ecológicos podem ser criados para estabelecer ou para manter a ligação de grandes fragmentos florestais, como as Unidades de Conservação, e também para ligar pequenos fragmentos dentro de uma mesma propriedade ou microbacia. Comumente, no meio rural, criam-se corredores através da manutenção ou da recuperação das matas ciliares, responsáveis por estabelecer conexão entre as Reservas Legais e outras áreas florestais dentro das propriedades (SCHÄFFER, PROCKNOW, 2002).

Desta forma, as matas ciliares degradadas, que margeiam os cursos d’água, devem ser consideradas prioritárias para as ações de revegetação e/ou enriquecimento, pois, além de terem um papel estratégico na conservação da biodiversidade através da formação de corredores, são essenciais à manutenção da qualidade da água (MACEDO, 1993).

Para Toledo e Mattos (2003), as matas ciliares são importantes pois reduzem o assoreamento das margens dos rios, mantém em níveis baixos a temperatura da água, preservam as fontes e nascentes, formam refúgios à fauna e protegem os cursos d’água pela filtragem de resíduos do processo produtivo agrícola, como fertilizantes, corretivos e defensivos, sendo essenciais para a sustentabilidade do sistema ambiental.

Para Barrela (2001), além destas vantagens, as matas ciliares e as zonas ripárias são importantes na formação de corredores de migração entre as espécies, na regulação da entrada e saída de energia do sistema, no fornecimento de matéria orgânica, na regulação da vazão e do fluxo de corrente, além de influenciarem na concentração de elementos químicos na água.

Todavia, Kageyama (1995); Kageyama e Gandara (2001) alertam que, por apresentarem condições edafo-climáticas distintas, as zonas que margeiam os corpos d’água devem ser caracterizadas por uma vegetação diferenciada, merecendo ser particularizadas nos projetos de restauração florestal. Além disso, para que a mata ciliar venha a ser um corredor de fluxo gênico, faz-se necessário que se conheça a real largura de mata ao longo dos rios e não a legal, contemplando não somente as espécies típicas das zonas ripárias, como também as de terra firme.

Além dos corredores ecológicos, existem outras formas para restaurar a conectividade ecológica, como os chamados trampolins ecológicos, do inglês stepping- stones, que nada mais são que pequenos agrupamentos de árvores, geralmente essências

nativas ou parcelas de agroflorestas, dispostos linearmente entre fragmentos muito maiores. Os trampolins, além de enriquecerem a matriz local, aumentam a biodiversidade e facilitam o movimento de organismos entre fragmentos florestais, contribuindo para o fluxo gênico de muitas espécies (CULLEN JR., 2003).

Para Kageyama et al. (2003), os trampolins ecológicos podem “acordar” certas sub-populações isoladas, estimulando a dispersão e criando um cenário metapopulacional, principalmente aves, morcegos e insetos polinizadores, os grandes responsáveis pelos serviços de fluxo gênico, ou seja, polinização, dispersão e chuvas de sementes pela paisagem.

Porém, apenas a presença desses remanescentes na paisagem não é suficiente para garantir a viabilidade das populações de espécies arbóreas presentes em seu interior. A restauração de áreas degradadas deve ter prioridade na formação de corredores de fluxo gênico entre fragmentos, já que essa ação aumenta a probabilidade de que os outros organismos, além das árvores, se estabeleçam nesses ecossistemas restaurados (KAGEYAMA et al., 2003).

Para Metzger (2003), todo o trabalho de restauração da conectividade na paisagem pode ser resumido de duas grandes formas. A primeira delas consiste na melhoria da rede de corredores e a segunda resume-se no aumento da permeabilidade da matriz da paisagem, seja alterando as características das unidades da matriz, tornando-as menos resistentes aos fluxos, seja aumentando a densidade de stepping-stones.

Neste sentido, passam a ser prioritárias para restauração as áreas impostas por lei, como as áreas ripárias, topos de morros e encostas íngremes. Consideradas Áreas de Preservação Permanente (APP’s), estes locais acabam aumentando a conectividade da paisagem ou diminuindo os riscos de extinção, além de restabelecerem uma série de outras funções de uma paisagem equilibrada, evitando-se, por exemplo, vastas erosões, cheias repentinas e colmatagem acelerada dos rios. As Reservas Legais, por outro lado, podem ser vistas como stepping-stones ou com funções complementarias aos corredores ripários na matriz (SCHÄFFER, PROCHNOW, 2002).

Deve-se atentar, porém, que com a melhoria da conectividade, há um restabelecimento do fluxo biológico e um aumento da riqueza de espécies, mas não na

abundância. Para que se possa garantir a manutenção das populações na paisagem, deve-se partir para ações que alterem a estrutura no hábitat, como o aumento da área efetiva e a melhoria da qualidade dos habitats (METZGER, 2003).

Tabela 5. Análise das principais estratégias para restauração de paisagens fragmentadas baseadas no aumento da conectividade e na diminuição dos riscos locais de extinção (Fonte: METZGER, 2003)

Para aumentar a conectividade

Estratégia Aspectos Positivos Aspectos Negativos Recomendações

Corredores ecológicos

x Estabilização das margens dos rios; x Controle de erosões e assoreamento; x Permitem aumento na diversidade. xAlto custo; xEfetividade não comprovada cientificamente; xPodem propagar perturbações. xPara fragmentos pequenos ou de baixa qualidade, com matriz resistente. Melhoria na permeabilidade da matriz x Fácil aceitação; x Não há perda de área produtiva. xEfetiva somente para espécies que utilizam matriz. xEconomicamente viável em atividades agrossilvopastoris. Trampolins ecológicos x Baixo custo em relação aos corredores; x Demandam pouca área.

x Não são efetivos para espécies de interior;

xEfetividade não comprovada cientificamente.

xPara áreas com pastagem;

xPara aglomerados de pequenas propriedades. Para diminuir risos de extinção local

Aumento da área dos fragmentos x Fácil implantação; x Rápido crescimento da área do fragmento. x Não efetiva em fragmentos pequenos. x Para fragmentos de tamanho intermediário; x Fragmentos-chave;

Proteção das bordas

x Fácil implantação; x Pode ser

economicamente rentável.

--- x Em fragmentos de qualquer tamanho.

Ações que podem estar voltadas para melhoria da qualidade do habitat são o controle das espécies invasoras, o controle seletivo de cipós e o enriquecimento com espécies nativas. Medidas voltadas ao aumento da área são proteção do entorno, que impede o

pisoteio pelo gado e favorece o processo de sucessão secundária, e as revegetações, com o plantio de espécies nativas, principalmente aquelas utilizadas pela fauna dispersora de sementes. A proteção do entorno também pode ser feitas através de zonas-tampão, que reduzem efeitos negativos como mudanças microclimáticas, aumento da mortalidade, predação e parasitismo (METZGER, 2003).

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