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O Ministro Relator Nelson Jobim em seu voto, que fez parte do entendimento prevalecente dos integrantes do Supremo, pautou-se eminentemente no parecer do Vice-Procurador-Geral da República, Haroldo Ferraz de Nobrega que defendeu que:

[...] Nos parece correto o entendimento de que não se pode processar agente político com base exclusivamente na Lei nº8.429/92. O regime de crime de responsabilidade fixado no art.102, I, c da Carta Magna é disciplinado pela Lei nº 1.079 de 1950 é que se dessume coerente com o nosso sistema constitucional.

Com efeito, os atos de improbidade administrativa, enquanto crimes de responsabilidade, estão amplamente contemplados no Capitulo V da Lei 1.079, de 10.04.1950 – instituto que regula os crimes de responsabilidade (Dos crimes contra a administração – art.9º).Observe-se que a pena imposta, exemplo daquela prevista na lei de improbidade, é extremamente severa: perda do cargo e inabilitação para o exercício de função pública pelo prazo de até cinco anos. Por outro lado consoante disposto no art.3º da Lei nº 1.079/50, a imposição da penalidade não exclui o processo e julgamento do acusado por crime comum.Denota-se portanto, que a lei dos crimes de responsabilidade, tais como os ilícitos arrolados na Lei 8.429/92, são delitos políticos-administrativos.Não se mostra plausível, portanto, a incidência de ambos os diplomas legais sobre um mesmo agente.

Logo pode-se concluir que o agentes políticos, como Ministros de Estado, por estarem submetidos a um regime de responsabilidade, não se aplica as regras comuns da lei de improbidade .Assim sendo, configura-se a plena e exclusiva competência desse SupremoTribunal Federal para processar e julgar os delitos políticos-administrativos, na hipótese do art. 102, I, c, da Constituição Federal.10

No entendimento de Vice-Procurador-Geral da República Haroldo Ferraz de Nóbrega a aplicação de ambas as leis ensejaria em bis in idem, ou seja, se estaria punindo o agente duas vezes pelo mesmo ato, e para solucioná-lo seria aconselhável aplicar a lei mais específica aos agentes políticos que seria por crime de responsabilidade.

O relator Nelson Jobim, ainda sobre a eventual confusão entre os conceitos de improbidade administrativa e crime de responsabilidade, pautou seu voto nos texto de Arnold Wald e Gilmar Mendes:

9 BRASIL. Rcl 2138/DF. Loc. cit. 10 Ibid.

[...] Em verdade, a análise das conseqüências da eventual condenação de um ocupante de funções ministeriais, de funções parlamentares ou de funções judicantes, numa ‘ação civil de improbidade’ somente serve para ressaltar que, como já assinalado, se está diante de uma medida judicial de forte conteúdo penal. Essa observação parece dar razão àqueles que entendem que, sob a roupagem da ‘ação civil de improbidade’, o legislador acabou por elencar, na Lei nº 8.429/92, uma série de delitos que, ‘teoricamente, seriam crimes de responsabilidade e não crimes comuns’. [...] Se os delitos de que trata a Lei nº 8.429/92 são, efetivamente, ‘crimes de responsabilidade’, então é imperioso o reconhecimento da competência do Supremo Tribunal Federal toda vez que se tratar de ação movida contra MINISTROS DE ESTADO ou contra integrantes de tribunais superiores [...].11

Desta forma defende que pela gravidade das sanções imposta pela lei de improbidade administrativa, aos agentes políticos deveria prevalecer o julgamento com prerrogativa de foro, tendo em vista que até sanções menos graves, como no caso de multa lhes são atribuídos essa prerrogativa.

Nesse sentido cita entendimento extraído do Livro de Hely Lopes Meirelles, segundo o qual: “Os agentes políticos exercem funções diferenciadas quando comparadas com aquelas dos demais agentes públicos, e para que não sejam tolhidos de tal exercício, deve-se garantir a eles ampla liberdade funcional.”12

O Ministro Nelson Jobim afirma ainda que “todos aqueles que têm alguma experiência da vida política conhecem os riscos e as complexidades que envolvem as decisões que rotineiramente são tomadas pelos agentes políticos”, e que submetê-los ao arquétipo a que são submetidos os agentes públicos comuns” é “cometer uma grotesca subversão”, proibida constitucionalmente, uma vez que o exercício das atribuições dos agentes políticos não se confunde com as funções exercidas pelos demais servidores públicos.13

No mérito em defesa dos atos do ex-ministro de Estado, sujeito da ação que ensejou a presente reclamação, o ministro Nelson Jobim dispõe sobre a questão do afastamento do cargo ou função, sanção constante na lei de improbidade administrativa e entende pelo absurdo de um juiz de primeiro grau afastar do cargo determinados agentes políticos acrescentando:

Assim, a aplicação dessa Lei aos agentes políticos pode propiciar situações extremamente curiosas: (a) o afastamento cautelar do PRESIDENTE DA REPÚBLICA [...] mediante iniciativa de membro do Ministério Público, a despeito das normas constitucionais que fazem o próprio processo penal a ser movido perante esta Corte depender da autorização por dois terços da

11 WALD; MENDES apud BRASIL. Rcl. 2138/DF. Loc. cit. 12 BRASIL. Rcl 2138/DF. Loc. cit.

Câmara dos Deputados (CF, art. 102, I, b c/c art. 86, caput); [...] (c) o afastamento cautelar ou definitivo do PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, de qualquer de seus membros ou de membros de qualquer Corte Superior, em razão de decisão de juiz de primeiro grau; [...].14

Pergunta-se, também, se há permissão constitucional para a coexistência de dois regimes de responsabilidade para os agentes políticos:

Os atos de improbidade, enquanto crimes de responsabilidade, estão amplamente contemplados no Capítulo V da L. 1.079, de 10.04.1950. Ela disciplina os crimes de responsabilidade (Dos crimes contra a probidade na administração - art. 9º). A pena prevista também é severa (art. 2º - perda do cargo e inabilitação para o exercício de função pública pelo prazo de até cinco anos).15

Ao final Ministro Nelson Jobim afirma seu entendimento no sentido de que

Não tenho a menor dúvida de que o Ministro de Estado não se submete ao regime geral da lei de improbidade administrativa. O entendimento contrário importaria no completo esvaziamento da competência do STF para processar e julgar, por crime de responsabilidade, os Ministros de Estados [...]Desaparecerei a competência constitucional da alínea c, do inciso I do art. 102 da CF/88. Demonstrei que a ação de improbidade é uma ação por crime de responsabilidade. Não há que aceitar o bis in idem que se pratica em detrimento da competência desta corte.16

Acompanharam este entendimento seis dos onze ministros da Corte Suprema, mas importando mencionar que quatro ministros da atual composição (Carlos Brito, Eros Grau, Ricardo Lewandowski e Carmem Lúcia) não proferiram votos por terem substituído ministros aposentados que já haviam votado. Assim, existe a possibilidade de que a Suprema Corte venha a modificar tal entendimento.17

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