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Buscou-se ao longo desta tese entender a aprendizagem pelas lentes teóricas anunciadas. A partir do cruzamento entre literatura, pressupostos teóricos e os dados de pesquisa, perseguimos em todo caminho metodológico o seguinte problema de pesquisa: “Como ocorre o processo de aprendizagem de professores de matemática em formação inicial quando se envolvem em práticas sociais em uma disciplina sobre geometria?”. Assim, a seção em questão serve para ilustrar as principais compreensões construídas e negociadas a respeito do problema citado.

Em certa medida, notou-se que os futuros professores negociaram o significado de seu próprio envolvimento na disciplina CCGEB de modo que puderam se familiarizar com o que

158 precisava ser feito na disciplina e, ao mesmo tempo, garantir possibilidades de negociação sobre o significado disso para suas vidas profissionais. Familiarizar-se com o que estavam desenvolvendo de conceitos geométricos parece ter sido necessário para criar uma espécie de concretude requisitada pela aprendizagem do professor. Vale ressaltar que essa dimensão que tomamos não se refere apenas à materialidade dos objetos em jogo na prática dos participantes, conforme discute Pais (2013) em seu estudo, mas também se refere às ancoras sociais (significados negociados, reificações, estratégias, desenhos, caminhos etc) que permitiram que eles firmassem seu entendimento, suas lições e compreensões nas práticas sociais desenvolvidas. Para eles, o significado daquilo era claro e fazia sentido.

Os dados indicam que esse movimento os fez perceber conexões possíveis entre sua própria forma de aprender sobre os conceitos construídos e a aprendizagem dos estudantes da Educação Básica. Esse fato é importante indício de aprendizagem do professor, pois, como inspira Cyrino (2008), a ele cabe ir além de saber como pode ser feita a abordagem do conteúdo, ele deve revelar proficiência no fazer de geometria, o que o coloca mais perto e sensível às questões de ensino dos conceitos abordados. Angelim (2010) argumenta nessa linha, apontando que o futuro professor deve ser capaz de proporcionar aos seus estudantes experiências significativas com a matemática.

Em termos de prática, pode-se falar a respeito de uma aprendizagem que ancora algumas dimensões, conforme discutido anteriormente como elementos estruturais e de movimento dos processos de negociação de significado. O fazer geométrico dos sujeitos, pautado nos elementos básicos ação, manipulação e visualização (LIMA, 2014), foi estruturado e movimentado no processo. No entanto, é importante ressaltar que esses elementos não se fecham em seus próprios termos. Com isso queremos dizer que a manipulação incide em objetos geométricos, mas também inclui manipulação de fórmulas; a visualização recai sobre aspectos de “ver” relações e não apenas o material concreto e; a ação sugere uma disposição direta, uma intenção de agir sobre algo, inclui uma atitude pensada sobre, por exemplo, uma rotação de um sólido ou a execução em da rotação.

Esclarecidos tais aspectos, sugerimos que a imbricação deles fornece subsídios para a tríade familiarização, alinhamento e organização no tratamento das questões. Esses três elementos foram essenciais para demarcar que o fazer geométrico carece de uma estrutura de abordagem das questões e problemas, de modo que as experiências no processo possam apresentar resultados úteis e válidos. Os futuros professores aprenderam a lidar com a geometria nesses moldes, isto é, lidando com situações que adotam o formato para ensino.

159 Isso é importante por demarcar que o professor em desenvolvimento precisa encontrar maneiras de melhorar si próprio e a sua prática profissional pela oportunidade de ter vivencias e experiências didáticas que os conecte à sua profissão (KALEFF, 2017).

Consequentemente, os futuros professores puderam agregar mais elementos ao seu desenvolvimento enquanto profissional docente pelo que aprenderam a respeito dos conceitos geométricos, das situações para ensino e da leitura que fizeram sobre as estratégias de ensino. Fiorentini e Crecci (2013) sinalizam que esse aspecto foi possível em virtude do envolvimento e pertencimento dos sujeitos em diversas situações e processos que promoveram a formação e melhoria da imaginação de prática docente que eles tinham. Aliás, as relações estabelecidas levaram os sujeitos a se posicionarem em relação às implicações da disciplina CCGEB para si e para essas práticas no futuro profissional.

Essa dimensão de olhar para si, para suas limitações e, consequentemente, para suas necessidades e motivações fez com que os futuros professores tomassem consciência do seu processo de desenvolvimento como dependente da doação de si e da participação no processo formativo. Esse movimento de olhar as experiências fundamentalmente formativas de identidade - isto é, pela possibilidade de, a partir delas, conhecer coisas novas e compartilhar visões diferentes – sugere que o desenvolvimento profissional do professor é modulado pelas motivações e interesses dos sujeitos (KRZYWACKI, 2009; ĐOKIĆ, 2018), que por sua vez são refletidos diretamente na prática na forma como percebem e negociam o significado para, por exemplo, as mesmas atividades.

Enquanto prática social nos forneceu arcabouço para compreender a aprendizagem em termos do fazer do grupo, identidade subsidiou a compreensão acerca do percurso dos sujeitos como trajetórias que se definem no tempo e espaço, conectando elementos do passado - como vivências no ensino fundamental e médio – nos significados dos elementos do presente. Isto significa, portanto, em virtude de tudo o que os sujeitos viveram e experimentaram, sua aprendizagem é afetada e isso os torna diferentes, mudados em relação ao que conseguiam falar, fazer, contribuir, opinar, discutir, responder, calcular e desenhar, por exemplo. O

alinhamento os mudou, regrou o fazer e os sujeitos; a imaginação permitiu que fizessem uma

viagem sem limites inspirados nos significados de suas atividades e discussões em geometria; e a negociação sobre suas experiências forneceu elementos para que pudessem ajustar quem eram e quem precisavam ser no contexto da prática em geometria para alcançar seus objetivos.

160 Nesse processo de se ajustar a si mesmos e os colegas, os sujeitos se desenvolveram a partir do que aprenderam (sobre e) sendo curiosos epistemológicos, questionando e buscado se aprofundar nos conceitos aos quais eram apresentados. Em especial, ao professor é realmente plena a necessidade de aprender a ensinar como uma construção que ele possa dizer, ao longo do processo, que é sua. Sobre isso, inclusive, Mizukami, Reali e Tancredi (2015) sinalizam que aprender a ensinar é uma atividade dinâmica e, em virtude de sua complexidade, os futuros professores precisavam se submeter a experiências vividas para criar suas próprias histórias de aprendizado às quais poderão contar como histórias sobre como aprenderam a lidar com os conteúdos de geometria, principalmente por poderem estabelecer as conexões com o que compreendem como estratégias de ensino.

Por fim, entendemos que os futuros professores aprendem como um intenso processo de relações sociais que se estabelecem e são negociadas no uso e trato constante de elementos e conceitos de geometria. Assim, estamos considerando que aprender a ensinar inevitavelmente envolve aprender sobre tópicos do conteúdo e sobre suas abordagens, de modo que possam estabelecer conexões para além das práticas sociais imediatas. Com isso, entendemos que há três ao menos três aspectos de aprendizagem do professor: aprendizagem sobre si, para si e para sua profissão. Em certa medida esses aspectos se confundem - o que é natural mas nesse momento simbolizam: a primeira refere-se a uma consciência sobre suas limitações e necessidades sobre seu conhecimento da disciplina; a segunda refere-se ao processo no qual buscam atender e suprir essas necessidades imediatas de conhecimento; por fim, a terceira se refere ao atendimento às expectativas da formação, da profissão e do desenvolvimento profissional, ou seja, a partir da qual o professor estabelece os parâmetros e organização de suas estratégias de ensino de conteúdos de geometria.