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A investigação empírica das últimas duas décadas tem comprovado o importante papel das regras orçamentais quantitativas para a estabilização macroeconómica. Enquanto as primeiras pesquisas se concentravam na experiência dos Estados norte-americanos (Alesina e Bayoumi, 1996; Bayoumi e Eichengreen, 1995; Bohn e Inman, 1996; Hagen, 1991), a criação da UEM fomentou a adoção de regras orçamentais nos Estados-membros da UE e mudou o foco da pesquisa empírica para a Europa (Comissão Europeia, 2006; Debrun e Kumar, 2007a; Debrun et al., 2008; Deroose, Moulin e Wierts, 2006). A maioria dos debates e análises têm-se centrado sobre o quadro orçamental da UE. As regras orçamentais quantitativas estabelecidas a nível nacional têm merecido menor atenção, sendo que o artigo de Hagen e Wolff (2006) é dos primeiros artigos a debruçar-se sobre a sua importância na UE.

Como foi referido no capítulo anterior, tem-se verificado uma crescente introdução de regras orçamentais quantitativas a nível nacional nos países da UE. Para este facto, parece ter contribuído o relatório do conselho ECOFIN, publicado em Março de 2005 aquando da primeira reforma do PEC, em que se reconhece que um quadro orçamental a nível nacional adequado é um complemento fundamental para um bom funcionamento do quadro orçamental da UE. A publicação de artigos sobre as regras orçamentais nacionais tem acompanhado o seu crescimento.

O estudo de Debrun et al. (2008) fornece ampla evidência sobre a influência das regras orçamentais quantitativas para a estabilização macroeconómica e para a disciplina orçamental. Com base nos dados recolhidos pelo inquérito realizado pela Comissão Europeia (2006) aos Estados-membros da UE, os autores construíram quatro índices para o período de 1990 a 2005:

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o índice de cobertura da regra orçamental que identifica o nível da administração pública (nacional ou subnacional) a que se aplicam as regras orçamentais e tem como objetivo mensurar o grau de intensidade no uso; o índice de força das regras orçamentais que tem em conta as características individuais das regras orçamentais; o índice de regras orçamentais que incorpora as características qualitativas das regras orçamentais suscetíveis de afetar a sua eficácia; e o índice de ciclicidade da regra orçamental que tem como objetivo fornecer informação sintética sobre o provável impacto de regras orçamentais quantitativas sobre a estabilização orçamental. Os autores, no seu estudo, através um modelo OLS (ordinary least squares), mais especificamente o least-squares dummy variables (LSDV), detetaram uma forte relação entre as regras e a disciplina orçamental, concluindo que quanto mais fortes são as regras orçamentais, melhor é o saldo orçamental primário ciclicamente ajustado. Tal como já comprovado em outros estudos de Debrun (2007) e de Debrun et al. (2007a, 2007b), as regras podem servir para “amarrar as mãos” dos governos que, de outra forma, seriam tentados a seguir políticas orçamentais míopes e procíclicas. Debrun et al. (2008) salientam que as regras de equilíbrio orçamental e de dívida pública parecem ser mais eficazes do que as regras de despesa.

A base legal, o acompanhamento e a existência de mecanismos de correção em caso de incumprimento devem ser cuidadosamente tidos em consideração na conceção das regras orçamentais para garantir a sua influência efetiva na condução da política orçamental (Bohn et al., 1996). Tem sido demonstrado que a eficácia das regras orçamentais nacionais depende crucialmente dos mecanismos estabelecidos para garantir a conformidade com a regra. Características relacionadas com a execução e a correção são particularmente relevantes para a eficácia das regras orçamentais (Ayuso-i-Casals, Hernández, et al., 2007). Hagen (2010) demonstra que o cumprimento dos planos orçamentais por parte dos governos da UE (considerado como um elemento central da supervisão orçamental) depende fortemente do rigor das regras orçamentais.

Ayuso-i-Casals, Deroose, Flores e Moulin (2007), com o objetivo de fornecer uma visão abrangente das regras orçamentais quantitativas em vigor nos 25 países da União Europeia e analisar os seus determinantes e o seu impacto sobre os resultados orçamentais, realizaram, através dos dados recolhidos pelo inquérito da Comissão Europeia, um estudo para o intervalo de tempo de 1990 e 2005, com base num modelo de efeitos fixos, em que a variável dependente

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é o saldo orçamental primário ciclicamente ajustado. O estudo confirma a existência de uma ligação entre as regras orçamentais quantitativas e os resultados orçamentais. A análise mostra que as regras orçamentais conduzem, ceteris paribus, a uma redução dos défices.

Em Hallerberg, Strauch e Hagen (2007), a variável dependente é a variação da dívida pública bruta das administrações públicas em percentagem do PIB. Neste estudo pretende-se provar se regras orçamentais mais rigorosas reduzem o crescimento da dívida pública. Na sua análise, os autores constatam que o índice de regras orçamentais é estatisticamente significativo, sugerindo que fortes regras orçamentais tendem a diminuir a taxa de crescimento da dívida pública.

Larch e Turrin (2008) focaram no seu artigo as regras orçamentais e os procedimentos orçamentais. Assim como Debrun et al. (2008) e Ayuso-i-Casals, Hernández, et al. (2007), a sua base de dados também é composta pelos dados apresentados pela Comissão Europeia (2006), igualmente para a UE25 e no período 1990-2005. O método de estimação utilizado foi uma regressão probit11 com dados em painel, procurando responder à pergunta: “A

probabilidade de iniciar uma consolidação orçamental aumenta com a cobertura e a força das regras orçamentais quantitativas e com a qualidade dos procedimentos orçamentais?”. Os autores concluem que a qualidade dos procedimentos orçamentais é determinante para o sucesso da consolidação orçamental. Confessam que a relação entre a qualidade dos procedimentos orçamentais e as hipóteses de sucesso da consolidação orçamental é bastante complexa e precisa de ser examinada com mais detalhe. Mas salientam que o ponto principal é que uma governação orçamental eficaz leva a uma implementação eficaz dos planos orçamentais e promove a disciplina orçamental12.

Os estudos que procuram analisar o impacto das instituições orçamentais independentes sobre a disciplina orçamental são ainda bastante raros e, na sua maioria, limitados a regiões específicas (Alesina e Perotti (1999) analisam a OCDE, Schmidt-Hebbel (2012) estudam os

11 Este tipo de análise de regressão é apropriado para conjuntos de dados em que a variável dependente é medida em unidades do tipo “Sim” ou “Não”. O probit foi proposto por e Fisher (1935).

12 A contribuição das regras orçamentais para melhorar a disciplina orçamental é bem documentada pelo Fundo Monetário Internacional (2009), expondo um grande número de episódios de consolidação.

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países ricos, Europa e América Latina) ou a federações específicas (Alesina et al. (1996) analisam os Estados Unidos e a Suíça).

Hagemann (2010) compara indicadores de desempenho orçamental antes e depois da criação de uma instituição orçamental independente, para o caso da Bélgica, Chile, Hungria e Reino Unido. O autor conclui que as reformas institucionais são uma condição necessária para restabelecer e manter a disciplina orçamental. Nomeadamente, a experiência e a evidência empírica sugerem que a delegação de previsões macroeconómicas a um conselho orçamental independente pode, efetivamente, reduzir os erros de previsão e, portanto, o enviesamento deficitário. Os autores defendem, no entanto, que a sua existência não é uma condição suficiente, mencionando a importância de um compromisso político forte e permanente e de uma meta orçamental de médio prazo. Bogaert, Dobbelaere, Hertveldt e Lebrun (2006) também sugerem que os conselhos orçamentais contribuem para melhorar o desempenho orçamental.

Fabrizio e Mody (2006) concluem no seu estudo que uma maior qualidade de instituições orçamentais independentes tem uma influência relevante sobre a disciplina orçamental. Esta disciplina, aparentemente, atua através de restrições sobre os gastos públicos, que é onde a possibilidade de indisciplina é maior. Os resultados da sua regressão em painel sugerem que instituições orçamentais independentes estão associados a um maior superavit primário.

Através de uma análise cross-country e com base nos dados do inquérito realizado pela Comissão Europeia, Debrun et al. (2007b) analisam o impacto das instituições orçamentais na disciplina orçamental na UE15 (com exceção do Luxemburgo). Os autores desenvolvem um grupo de índices para caracterizar a configuração, a independência e a potencial influência destas instituições sobre o processo orçamental. No seu estudo concluem que as regras orçamentais estão associadas a melhores desempenhos orçamentais e que os resultados orçamentais ainda poderiam ser melhores se as regras orçamentais quantitativas forem utilizadas como complemento das instituições orçamentais independentes.

Calmfors e Wren-Lewis (2011) examinam as instituições orçamentais existentes e concluem que existe uma diversidade de conselhos que, regra geral, podem desempenhar um papel útil na

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luta contra o enviesamento deficitário. Mas sublinham que estes não são uma panaceia, dado que o seu sucesso depende de uma sólida reputação e independência, sendo um forte complemento às regras orçamentais.

Também Debrun et al. (2009) analisam as instituições orçamentais existentes, observando que as instituições orçamentais podem melhorar a qualidade da política orçamental, mais especificamente, melhorando a disciplina orçamental e a credibilidade política, pelo que desempenham um papel importante na estabilização das expetativas e redução de incertezas. Segundo aqueles autores, a eficácia das instituições depende do compromisso do governo com o mandato que lhes foi atribuído e devem ser um complemento às regras orçamentais.

O estudo de Debrun e Kinda (2014) é um dos mais recentes sobre instituições orçamentais. A sua análise empírica sugere que as instituições orçamentais independentes estão associados a melhores desempenhos orçamentais, bem como a previsões mais precisas e menos enviesadas. As principais características de bons conselhos orçamentais incluem uma independência operacional da política, o fornecimento ou a avaliação pública das previsões orçamentais, uma forte presença no debate público e um papel explícito na monitorização das regras orçamentais. Este estudo também reforça a evidência existente sobre o papel das instituições orçamentais independentes como complemento das regras orçamentais na promoção da disciplina orçamental. Em particular, os conselhos orçamentais podem minorar a rigidez das regras orçamentais que mina a sua credibilidade, conduzindo a uma maior disciplina e transparência orçamental e estimulando um debate público construtivo em torno das questões orçamentais.

No que se refere aos procedimentos orçamentais, existe uma abundante literatura empírica sobre a sua eficácia na melhoria da disciplina orçamental (Fabrizio et al., 2006; Hagen, 1992; Hallerberg et al., 2007; Poterba et al., 1999).

Para controlar o crescimento da despesa pública, é importante que o processo orçamental anual seja ancorado numa perspetiva de médio prazo. Os países da OCDE contam com uma grande variedade de estratégias neste domínio (Joumard, Kongsrud, Nam e Price, 2004).

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Moulin e Wierts (2005) investigaram os planos orçamentais plurianuais dos Estados-membros da UE, formulados nos programas de estabilidade e de convergência. Os autores concluem que a divergência entre os planos orçamentais e os resultados reais podem ser em grande parte explicadas pelo planeamento ambicioso, encontrando projeções deliberadamente otimistas. Defendem a definição pelos Estados-membros de objetivos realistas e mais detalhados e de planeamentos orçamentais a médio prazo na maior parte dos Estados-membros.

Para aferir a importância dos procedimentos orçamentais, Hagen e Harden (1995) construíram um índice de centralização do processo orçamental para os países da UE em 1991. O índice é composto por quatro itens que abarcam, respetivamente, as características da fase de orçamentação, a função do parlamento no processo orçamental, os aspetos relativos à transparência e as principais regras de execução da lei orçamental. Comparando os valores desse índice para 1991 e 2001 (atualizados por (Hagen, 2005; Hallerberg, Hagen e Strauch, 2001; Hallerberg et al., 2007) os autores encontram uma relação positiva e estatisticamente significativa entre os valores do índice de centralização do processo orçamental e os valores médios do saldo orçamental. Por outras palavras, processos orçamentais mais centralizados favorecem a disciplina orçamental (Martins, 2012).

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