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Capítulo 3 MARCOS FUNDADORES DA HISTÓRIA NACIONAL NOS

3.1 João Ribeiro e a independência do Brasil

3.2.1 Rocha Pombo e os preparativos do Centenário

Francisco José da Rocha Pombo escreveu entre os anos de 1917 e

191862. O livro didático Historia do Brasil com muitos mappas históricos e gravuras

explicativas. O período corresponde no Brasil à estruturação das idéias

nacionalistas e suas primeiras estratégias de ação63. Dentro do quadro de difusão

do ideário nacionalista, ainda em formação, foram organizadas três entidades: a

Liga da Defesa Nacional64, a Liga Nacionalista de São Paulo e a revista Braziléa. A

primeira possuía uma orientação que se confundia, na sua forma mais expressiva, com o serviço militar, enquanto a segunda, que também foi criada como resultado da atuação da Liga da Defesa Nacional, voltava-se para questões políticas.

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RIBEIRO, João, 1912, p. 208.

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Quanto à data de publicação deste manual escolar não nos foi possível identificar com completa precisão. Pelos dados apresentados no livro possivelmente se trata da 12ª ou 15ª edição, que teria circulado, nos anos posteriores a 1925. Provavelmente a obra se refere a 1918uma vez que a pequena nota introdutória escrita por Rocha Pombo data deste ano. Nela, o autor procura destacar que acrescentou outros dados que não estiveram presentes no primeiro volume. Certamente se referia aos últimos acontecimentos republicanos. A página seguinte apresenta uma autorização à Companhia Melhoramentos de São Paulo, datada de março de 1925, para usar a grafia que a editora mais conveniente. De qualquer forma, estamos considerando que a narrativa corresponde ao período de comemoração do Centenário da Independência.

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NAGLE, Jorge. Educação e sociedade na Primeira República. 2. ed. Rio de Janeiro. DP&A, 2001, p. 65.

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A criação da Liga da Defesa Nacional se deu em função da iniciativa Olavo Bilac - que além de escritor literário, colaborou na escrita de manuais escolares como Pequena História do Brazil por perguntas e Resposta, de autoria do Dr. Joaquim Maria de Lacerda – Pedro Lessa e Miguel Calmo.

A terceira entidade, a revista Brazílea, surgiu ainda em 1917 com as mesmas idéias e princípios das duas outras ligas, redefinidos, porém, de acordo com outro contexto doutrinário. Fundada por Álvaro Bomílcar e Arnaldo

Damasceno a revista teve Rocha Pombo como colaborador e mantenedor 65.

Brazílea, a “Revista Mensal de Propaganda Nacionalista, Sociologia,

Arte, Crítica”, defendia em seu programa a manutenção da religião católica, a libertação do meio intelectual da ficção dos valores portugueses, a nacionalização do comércio e da imprensa lusitana, a valorização do mestiço, o desenvolvimento das energias do brasileiro por meio da educação militar, a sustentação a todo transe da ordem constitucional republicana e a propaganda do Brasil dentro do Brasil, além de criticar a hegemonia paulista e lutar pela defesa da civilização agrária.

Se por um lado adota-se um tipo de propaganda nacionalista baseada, entre outros pontos, em uma campanha pela afirmação republicana e contra o lusitanismo, presencia-se, por um outro, a intelectualidade e toda a sociedade brasileira envolvida em um intenso e amplo debate sobre a comemoração do Centenário da Independência, um evento que recolocava em cena, exatamente, os personagens da tradição bragantina. Desse modo, a década de 20, e em especial o ano de 1922, apresenta-se como o momento de síntese das duas tradições. Por esta razão escolhemos comparar as narrativas dos principais “eventos fundadores” da história brasileira – O Sete de Setembro e o Quinze de Novembro – para verificar como a literatura destinada a estudantes elaborou a historiografia de ambos os eventos.

Rocha Pombo inscreve-se exatamente como um intelectual situado no cerne da disputa mencionada. Ligado ao IHGB desde 1900, o autor, assim como João Ribeiro, atuou na defesa da causa republicana. Ainda em 1879, quando morava no Paraná, publicou e dirigiu o jornal O Povo, semanário de propaganda abolicionista e republicana.

O envolvimento de Rocha Pombo em ambas as campanhas estendeu- se por toda a província do Paraná e lhe garantiu, em 1886, o mandato de

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Outros intelectuais que escreveram e colaboraram na manutenção de Brazílea foram Andrade Muricy, Conde A Celso, Evaristo de Morais, Laudelino Freire, Lima Barreto e Oliveira Lima. Ver: Nagle, Jorge, op. cit. e MARTINS, Wilson. História da inteligência brasileira. São Paulo: Cultrix, 1978, vol. 5.

deputado. Dentre suas realizações políticas, ainda na Monarquia, destaca-se o lançamento da pedra fundamental da Universidade Federal do Paraná cuja

instalação se deu somente em 191266.

Rocha Pombo não se dedicou exclusivamente à produção de livros didáticos, possui uma vasta produção histórica, trabalhos como jornalista, foi professor em escolas paranaenses e instituições, como o Colégio Pedro II e a

Escola Normal do Rio de Janeiro. No meio literário brasileiro67 é considerado

um dos pioneiros do romance simbolista, tendo se tornado muito conhecido após 1905, quando publicou seu livro de maior sucesso – No Hospício – romance no qual, segundo Raimundo Menezes, “existem notas precursoras do

romance psicológico moderno”68. Escreveu para revistas simbolistas, como O

Sapo, O Cenáculo, e artigos literários para a revista fluminense “A Escola” 69,

além de publicações de contos, poesias e um dicionário de sinônimos de português.

No campo histórico, escreveu História do Paraná, Paraná no

Centenário, História da América, que foi premiada70, História do Rio Grande do

Norte, Nossa Pátria, com mais de 40 edições71, História de São Paulo, Notas de

Viagem, Instrução Moral e Cívica, uma história universal72 e História do Brasil, em

10 volumes73.

Neste trabalho, estamos compreendendo seu compêndio escolar como uma compilação de sua monumental obra intulada História do Brasil, em 10 volumes, publicada entre 1915 e 1917, e que o tornou muito conhecido da sociedade brasileira, despertando elogios e críticas. Rodolfo Garcia, historiador que editou História geral do Brasil, de Varnhagen, com as anotações de

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Outros jornais por ele dirigido foram A Gazeta Paranaense e o Diário Popular. Ver também site: Loja Maçônica N. 78. <http://www.rochapombo78.hpg.ig.com.br/internacional/95/index_int_3.html.> Acesso em 5 fev. 2005.

67

Além do IHGB, pertenceu à antiga Academia de Letras do Paraná, sendo hoje patrono da cadeira nº 17 da Academia Paranaense de Letras. Em 1933 iria ingressar na Academia Brasileira de Letras, mas faleceu antes, em extrema pobreza no Rio de Janeiro.

68

MENEZES, Raimundo. Dicionário Literário Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1979, 4v., p. 1014.

69

Ver site: Loja Maçônica N. 78. <http://www.rochapombo78.hpg.ig.com.br/internacional/95/index_ int_3.html.> Acesso em 5 fev. 2005.

70

REVISTA DO LIVRO, ano II, dez. p. 289-290, 1957. (Seção noticiário)

71

ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS. Biografia de Rocha Pombo. <http://www.academia.org.br>. Acesso em 21 jun. 2004.

72

Ver site: Loja Maçônica N. 78. <http://www.rochapombo78.hpg.ig.com.br/internacional/95/index_ int_3.html.> Acesso em 5 fev. 2005.

73

Capistrano de Abreu, e sucessor de Rocha Pombo na Academia Brasileira de Letra, foi quem mais elogiou a obra de Rocha Pombo quanto ao seu caráter

pedagógico74, como se pode perceber no seguinte comentário:

[...] não há como desconhecer o extraordinário mérito da obra de Rocha Pombo [História do Brasil em 10 Volumes], sua utilidade provada, os serviços prestados aos estudiosos, que a estimam entre todas as congêneres. Se conferidas as estatísticas das bibliotecas, verifica-se que sua "História do Brasil" é, nessa classe, o livro mais consultado, o mais lido de todos, o que significa popularidade e vale pela mais legítima das consagrações75.

João Ribeiro, no entanto, não iria dizer o mesmo, chegando a ponto de classificá-la como enfadonha e de difícil leitura:

Rocha Pombo escreveu uma grande história prolixa em dez ou doze grossos volumes, nunca lido e provavelmente ilegíveis; é o mais pesado, volumoso e, todavia o mais estéril. Duvido muito que o presente ou o futuro lhe dêem um lugar conspícuo entre os nossos historiadores. Falta- lhe o senso crítico fora dos caminhos batidos pelos historiógrafos76.

A maior crítica que João Ribeiro dirigia a Rocha Pombo é quanto sua inabilidade de empolgar os leitores, por essa razão considera sua escrita fria e difusa, próxima à esterilidade. Segundo Martins, esse era um juízo suspeito, de animosidade pessoal, pois o próprio Ribeiro reconhecia que nos livros do autor

constava grande cópia de informações úteis 77. Diferentemente de João Ribeiro,

Pombo não viajou, não pesquisou em arquivos do exterior e não manteve amplas relações sócio-afetivas valiosas que lhe garantisse freqüentar círculos influentes

como os de Ribeiro78.

Feita a apresentação do autor, analisaremos as narrativas da Independência e da Proclamação da República elaborados, por um republicano, como Rocha Pombo, na conjuntura comemorativa do Centenário da Independência.

74

GOMES, op. cit., p. 121.

75

ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS. Biografia de Rocha Pombo. <http://www.academia.org.br>. Acesso em 21 jun. 2004.

76

RIBEIRO, João apud MARTINS, Wilson, op. cit., p. 25.

77

MENEZES, 1979, op. cit., p. 1015. Ver também MARTINS, op. cit. p. 25.

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