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Capítulo 3 – Colaboração e compartilhamento

3.2 Parte 2 – Meios de colaboração e

3.2.3 RSIs 3.0 – Twitter

Santaella e Lemos (2010) evidenciaram que nos anos 1990 as redes já se apre- sentavam como risomáticas, entretanto, nesse momento, os usuários ainda nave- gavam de maneira limitada, por uma forma monomodal. Nesse período as expe- riências vividas nas redes caracterizavam-se ainda por situações individualizadas na escolha ou definição dos pontos de rede em que se acessava a informação. As autoras definiram como apropriada a metáfora do surf para ilustrar essa dinâmica em que se estabelecia a navegação:

Existe um “barco” ou uma “prancha” que sai navegando pelo mar de informa- ção. Através desse veículo – a percepção mediada pelo computador, o piloto – nossa própria consciência segue de porto a porto, atravessa de uma onda a outra. Só é possível acessar determinado nódulo se escolhermos passar pela conexão que nos levará até ele (SANTAELLA; LEMOS, 2010, p. 56).

Essa colocação nos permite formular uma noção do que é uma conexão mo- nomodal. Entendemos que é a condição em que as redes se apresentam como labirintos com diversas escolhas a serem tomadas e os resultados que consegui- mos sacar dos conteúdos desse meio são percursos próprios da investigação de cada usuário. Ainda que essa estrutura permita ao usuário fazer o uso de diversas “pranchas” simultaneamente, essa forma de navegação ainda mostrava uma abor- dagem monomodal de fruição pelas redes, pois o percurso que se cursou, mesmo que com maior número de alternativas de caminhos, ainda é uma exploração pelo ciberespaço na busca da diferença, da informação. As autoras salientaram que essa linearidade é própria das interfaces que mediavam o contato desses indiví- duos com as redes e não problema estrutural do ciberespaço. Destacam que um elemento peculiar às redes monomodais é a questão da temporalidade ligada à disponibilização de conteúdo nas redes, próprio do que ocorria nas redes na dé- cada de 1990, que a despeito da estrutura livre de atribuições temporais inerente à cibercultura, apresenta uma maneira de navegar vinculada a determinação tempo- ral, por exemplo, a organização de materiais postados em blogs são normalmente organizados por registros de datas.

E também nos mostraram que a fluidez das redes colaborou para as primei- ras manifestações de plataformas sociais na internet:

A intensa velocidade de extensão e interconexão entre os nódulos informacio- nais das redes fez com que comunidades se formassem ao redor de nódulos estratégicos de interesses compartilhados (...) A partir desse movimento de “tri- balização” digital é que as primeiras plataformas de redes sociais foram surgindo (SANTAELLA; LEMOS, 2010, p. 57).

As autoras destacam três grandes momentos em que as redes sociais da in- ternet (RSIs) evoluíram de maneira representativa. As RSIs 1.0, intituladas redes monomodais, em que as redes sociais permitiram a troca de informação em tempo real entre os usuários das redes. A exemplo do MSN e ICQ. As RSIs 2.0, definida pelas autoras como redes monomodais múltiplas, cuja redes sociais abrangeriam

atividades ligadas ao entretenimento e contatos profissionais/marketing pessoal. Essas redes se constituíram no compartilhamento de conteúdo contemplando o interesse mútuo exemplificadas nas redes como o Orkut, MySpace e LinkdIn. Com o surgimento do Facebook, entramos nas RSIs 3.0, definidas como redes multi- modais, que se caracterizariam pela integração dessas com outras redes, o uso massificado de jogos sociais como o Farmville e a introdução da mobilidade por meio de dispositivos móveis e as conexões sem fio como as redes wireless. As au- toras citam o Twitter como uma rede capital, ou principal case pertencente a esse contexto devido às mudanças que ocorreram por conta da introdução desse meio.

O Twitter surgiu em 2006, criado por Jack Dorsey, e como plataforma de micro- blogging, que a princípio era ambiente de comunidades restritas, normalmente, relacionadas às áreas das tecnologias e a blogosfera internacional. A adesão de celebridades da indústria do cinema e da música atraiu muitos usuários para es- sas redes; a divulgação de declarações dessas pessoas notórias trouxe ao Twitter muita atenção por parte das agências de notícias. Segundo as autoras, o Twitter recentemente alcançou mais de 11 milhões de usuários, os brasileiros represen- tam cerca de 8% dessas redes e o Brasil se tornou a segunda nação mais ativa no Twitter. Santaella e Lemos (2010) definem o Twitter como:

(...) uma mídia social que, unindo a mobilidade de acesso à totalidade always on das RSIs 3.0, possibilita o entrelaçamento de fluxos informacionais e o design colaborativo das ideias em tempo real, modificando e acelerando os processos globais da mente coletiva. O que é o Twitter? Uma verdadeira ágora digital glo- bal: universidade, clube de entretenimento, “termômetro”, social e político, ins- trumento de resistência civil, palco cultural, arena de conversações contínuas (SANTAELLA; LEMOS, 2010, p. 66).

Santaella e Lemos (2010) ainda nos mostram que o Twitter serve como “(...) meio multidirecional de captação de informações personalizadas (...)” (SANTAELLA; LE- MOS, 2010, p. 66), algo como uma mídia colaborativa de expansão contínua de ideias. As autoras definem como um ambiente de amplo debate em que questões de interesse restrito ou global podem ser discutidas nas mais profundas consequ- ências dos temas.

As autoras colocaram que as principais diferenças nas interações que ocor- reram na RSIs 3.0, com relação às redes anteriores, foram encontradas nas múltiplas modalidades de interconexão que se estabelecem. Muito devido à

libertação dessas redes do tempo e do espaço para então se revelarem RSIs ubíquas, contando com os fatores dos pontos de conexão que deixam de ser fixos e passam a ser móveis nas tecnologias 3G e redes Wireless, somados aos devices que permitem explorar sua geolocalização ao conceito always on que liga as RSIs ao acontecimento.

A mobilidade no acesso da internet, por meio dos smartphones, diminuiu o ta- manho dos displays que passam de telas do computador pessoal e notebooks para visores de aparelhos móveis, o que naturalmente motivou a adaptação dos aplicativos para ajustar-se a essa mudança que ocorreu na forma prática da lei- tura. As autoras defenderam que essa alteração no dispositivo acabou causando uma mudança profunda na linguagem da comunicação, pois motivou o surgimento do conceito de microblogging. Numa maneira de contemplar as novas necessida- des emergentes, como uma proposta para resolver essa questão da adaptação da linguagem aos dispositivos móveis, surgiu o Twitter.

Elas nos mostraram que o Twitter diferencia-se de outras RSIs ao considerarmos fatores de sua “ecologia relacional” (SANTAELLA; LEMOS, 2010), que consiste em uma complexa ecologia de veiculação de ideias. Essa dinâmica ocorre por meio de dimensões cognitivas, e, em uma analogia ao cérebro humano, as informações circulam como sinapses em tramas neurais digitais.

Entretanto, a introdução de um indivíduo no ambiente que se cria em torno do Twitter é uma relação problemática no que se refere à atração do indivíduo para essas redes e a sua permanência nelas, que pode ser afetada pela não compreen- são da dialética desse meio. Os primeiros contatos do usuário de conta do Twitter, segundo as autoras, se estabelecem por meio da “importação” de relações que esse indivíduo possui em seu trabalho, faculdade etc. para as redes do Twitter. As autoras descreveram que esse primeiro passo seria apenas uma introdução às possibilidades do Twitter. Uma experiência satisfatória no Twitter se revela quando esse usuário se percebe em pleno estado de imersão nessas redes. Cerca de 60% dos novos usuários desse segmento abandonam suas contas após um mês de uso (SANTAELLA; LEMOS, 2010), provavelmente devido à complexidade deve impedir que muitos se socializem nessas redes. Um usuário bem integrado trilha um longo caminho para ocupar uma situação de plena imersão, com exceção dos experts atraentes aos olhares por causa da concentração de conhecimento específico que possuem e compartilham. Como exemplo citamos as celebridades que, normal- mente, atraem muitos seguidores de maneira instantânea.

As autoras falam das batalhas travadas entre “predadores” e “colaboradores” e de- finem aqueles como usuários que se utilizam das redes em causa própria, no entanto, não retribuem com a geração de valor; esses acabam por extrair benefícios no curto prazo, nos êxitos imediatos, enquanto os colaboradores conseguem êxitos a longo prazo, na construção de uma imagem perante aos usuários das redes. Foram defini- dos como o oposto dos predadores, são atores que oferecem valores às redes e se beneficiam pelo reconhecimento de seu papel ocupando local de maior relevância.

As autoras nos mostram que o Twitter possui diferenças particulares com re- lação a outras redes em voga no momento, como o Facebook e nos apresenta os conceitos de inflow e outflow próprios dele, com os fluxos internos e externos de comunicação que desafiam as nossas capacidades cognitivas. Ao seguirmos outrem no Twitter, passamos a receber conteúdo desse usuário. A profusão de informações, constituída pela diversidade de naturezas de conteúdos postados por aqueles que seguimos, forma o total de nosso inflow. Cada usuário possui um inflow único de informações, as autoras nos mostraram que ao escolhermos nossas fontes, com base em nossos gostos e preferências, estamos fazendo o design personalizado desse nosso inflow e, assim, acabamos por definir uma identidade coletiva enquanto usuários.

Também nos apresentam abordagem outflow e as diferenças entre as duas abordagens. Em suma, abordagem inflow, por analogia, pode ser entendida como fones de ouvido, enquanto a outflow pode ser representada por um mi- crofone ligado à rede. O estado de imersão nas redes do Twitter, descrito acima, é entendido como o equilíbrio das abordagens inflow e outflow nas redes desse usuário, recebendo conteúdo e o recombinando a informação em intensidades semelhantes. As autoras trataram a questão da identidade informacional como um elemento de grande importância para definir a intenção do usuário ao utilizar o Twitter. Esse elemento é inerente à abordagem do inflow, pois o comporta- mento desse usuário deve se relacionar com os objetivos que tem ao ingressar nessa rede. O processo informacional que ocorre no Twitter institui uma ideia de fluxo dos acontecimentos que se apressa por alcançar o próximo pensamento (características do conceito always on). As autoras nos mostraram o design das ideias que se ligam por meio das hashtags para formar um só corpo coletivo. As hashtags são meio relacionais de conferir aos tweets17 a adesão a um fluxo

coletivo de informações advindas de outflow coletivo. E destacam que o termo

design se define por criar algo para algum fim e assim nos apresentam o conceito de design de ideias dentro do Twitter, e nos mostram esse fenômeno como um processo que liga as colaborações individuais às coletivas.

Nesse caso, em que a inteligência se expressa por meio do design colaborati- vo de ideias, surge uma inteligência coletiva que se baseia não apenas no uso e acesso aberto ao conhecimento disponibilizado coletivamente, mas sim em esquemas conceituais que começam a ser acessíveis apenas ao visualizarmos o todo dessas microcolaborações. A indexação de ideias ao redor de �hashta- gs específicas faz com que a reunião de tweets isolados (que são em si mes- mos resultados de processos individuais de microdesign de ideias) possibilite a construção de arcabouços teóricos elaborados coletivamente (SANTAELLA, LEMOS, 2010, p. 81).

Pudemos ver que o design das ideias coletivas ocorre de maneira espontâ- nea e no fluxo da informação por meio da indexação das hashtags que vincu- lam os tweets que emergem, por exemplo, de um evento. Os usuários acabam por aferir a validade das respostas ao dar RTs18 nos tweets que consideram re-

levantes e, dessa forma, acabam por surgir respostas dessa inteligência coleti- va para determinada pergunta. Na obra citada foi descrito que o Twitter é uma importante ferramenta de “(...) engajamento e participação em colaboração inte- lectual on-line (...)” (SANTAELLA, LEMOS, 2010, p. 82). As hashtags permitem a reunião de comunidades interessadas em compartilhar valores em comum usando essa capacidade fluente das redes do Twitter, no sentido de colaborar entre si para a construção de um conhecimento coletivo. É o que faz do Twitter um meio de va- lorização informacional, em que o compartilhamento e a colaboração funcionam como estratégias para cooperação em torno de um conhecimento coletivo, como uma característica peculiar, inserido no fluxo contínuo nesse desenvolvimento das ideias por meio das inteligências coletivas.

As autoras nos mostraram o conceito que divide o valor “informação” como algo que sempre fez parte das sociedades, do valor “informacional”, e que ocorreu após a revolução digital ao ultrapassarmos os limites da localização, processo que atribui maior valor à comunicação que passou, então, a ser fator central da produ- ção econômica atual.

Sendo dessa forma, as características dessa sociedade em rede são, segundo as autoras:

Globalização de atividades estrategicamente decisivas da economia; Forma de organização em rede;

Instabilidade do trabalho e individualização do emprego;

Cultura de virtualidade real, construída por um sistema pervasivo, interconectado e diversificado de sistemas de mídia;

Transformação das condições materiais da vida, do espaço e do tempo sem tem- po (SANTAELLA; LEMOS, 2010, p. 16).

Notamos que as funcionalidades pertinentes ao Twitter são medidas que determi- nam as formas de interação que ocorrem entre os usuários, entretanto esses recur- sos são obviamente dispostos no sentido de contemplar esses processos. Segundo Bonsiepe (1997) esse campo entre a interação do usuário e o sistema das redes é a interface e, portanto, o campo de atuação do design. Dessa forma podemos con- cluir que as facilidades que as redes oferecem em compartilhar os arquivos são pos- síveis por medidas de design que favorecem esse processo e acabam por participar de forma decisiva nos expressivos números em torno das redes sociais.

Contudo, Souza (2009) nos mostrou que o design das redes sociais deve com- preender a interação entre os usuários, apropriar-se de comportamentos sociais propiciando novas formas de relacionamento; criar espaços para a interação dos usuários trazendo a pessoa para o foco desse processo por meio de elementos que permitam expressar a identidade, cultura e o aprendizado desses usuários; manter em campos secundários as questões técnicas inerentes a essas redes. O autor afirma que as redes sociais são a forma do surgimento de uma cultura coletiva, que se desdobra em uma inteligência coletiva.

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