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RUPTURAS E LEIS QUE MARCAM A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DOS

No documento Uma professora pomerana e sua comunidade (páginas 54-56)

1 PROFESSORA POMERANA E SUA COMUNIDADE: A CONSTRUÇÃO DE UM

1.5 RUPTURAS E LEIS QUE MARCAM A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO DOS

Se levantarmos as políticas públicas em relação à Educação do Campo perceberemos que, de acordo com Ferreira (2011, p. 9), até o fim do governo militar e início da nova República (1985), o que detectamos na zona rural por parte dos diferentes governos, foram políticas de ensino. Enquanto educação, virá a aparecer somente na Constituição Federal de 1988.

O autor ainda analisa que embora a Constituição de 1988 não cite diretamente a Educação do Campo, o artigo 206 prescreve que deve haver igualdade de condições para o acesso e permanência na escola. Depreende-se daí a inclusão das escolas do campo como direito de todos e dever do Estado e da família (artigo 205), mas ainda não contempla o campo como lócus de aprendizagem, e nem o privilegia com educação própria, específica e diferenciada.

A Resolução CNE/CEB de 3 de abril de 2002 institui as Diretrizes Operacionais para Educação Básica nas Escolas do Campo. Assim, define a identidade da escola do campo em seu artigo 2º:

Parágrafo único. A identidade da escola do campo é definida pela sua vinculação às questões inerentes à sua realidade, ancorando-se na temporalidade e saberes próprios dos estudantes, na memória coletiva que sinaliza futuros, na rede de ciência e tecnologia disponível na sociedade e nos movimentos sociais em defesa de projetos que associem as soluções exigidas por essas questões à qualidade social da vida coletiva no país.

Os documentos oficiais, embora acenem para algumas transformações e apontem para um ensino mais democrático, ainda deixam a desejar em alguns quesitos. A Educação do Campo, onde se insere esta pesquisa, vem conquistando

consideráveis avanços no campo da legislação. Entretanto, na prática escolar ainda há necessidade de maior aproximação entre as três esferas de governo para que de fato se concretizem as leis em vigor. O distanciamento de interesses do Estado e dos Movimentos Sociais ainda se constitui como lacuna a ser superada nesse debate.

Um dos maiores avanços em relação à Educação do Campo transparece no artigo 28 da LDB Nº 9.394/96:

Na oferta de educação básica para a população rural, os sistemas de ensino promoverão as adaptações necessárias à sua adequação às peculiaridades da vida rural e de cada região, especialmente:

I - conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais necessidades e interesses dos alunos da zona rural;

II - organização escolar própria, incluindo adequação do calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas;

III - adequação à natureza do trabalho na zona rural.

Essa proposta, teoricamente, quebra a política de padronização das escolas públicas que vinham sendo adotadas nacionalmente. E despontam para a necessidade de valorização das peculiaridades regionais e locais. Muito embora ainda em agosto de 2014 a revista Veja tenha lançado nota intitulada Um currículo para o Brasil, que sustentava o seguinte:

Embora os alunos brasileiros enfrentem avaliações nacionais como a Prova Brasil e o Enem, o país não possui um currículo unificado, que estabeleça o que os estudantes do ensino básico devem aprender - e quando. Mas agora existe a determinação para que o MEC finalize uma proposta de currículo até 2016 (p. 9).

A intenção não é aprofundar essa discussão, trata-se somente de ilustrar as contradições que persistem quanto à demanda por uma educação de valorização das culturas locais. Enquanto há avanços relativos não somente na educação do campo, como também nas diretrizes para a Educação das Relações Étnico-Raciais; Educação de Jovens e Adultos; para a Educação Especial na Educação Básica; funcionamento das escolas indígenas e para a Educação Escolar Quilombola, parece haver uma corrente contrária vislumbrando uma unificação curricular.

A necessidade de ofertar uma proposta educativa específica para o campo encontra- se respaldada também por outros documentos oficiais, que buscam destacar o seu caráter particular, a exemplo do Plano Nacional de Educação (PNE) aprovado em 2001, que destaca a necessidade de tratamento especifico para a escola do campo;

da Resolução CNE/CEB nº 1/2002, que estabelece as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo; em 2004, das Referências para uma Política Nacional de Educação do Campo; e da Resolução CNE/ CEB nº 2/2008, que estabelece diretrizes complementares, normas e princípios para o desenvolvimento de políticas públicas de atendimento da Educação Básica do Campo.

O próprio Currículo Básico Comum da Rede Estadual de Ensino do Espírito Santo, em sua redação introdutória, prevê na organização curricular da escola campesina participação e diálogo com a comunidade, com a organização dos conteúdos baseados no contexto produtivo e cultural dos sujeitos do campo. Ressalta a valorização da trajetória dos movimentos sociais e suas lutas pela terra; valorização nos conteúdos, de saberes dos povos tradicionais da terra e seus territórios. Além de propor o estudo das culturas dos moradores/as do campo; a agricultura familiar como alicerce da produção de alimentos no campo; o processo de produção orgânica de alimentos; discute o trabalho no campo como práxis/poiesis (CBC, p. 397).

Dessa forma, a agricultura familiar, as práticas agroecológicas e a economia solidária, área em que atua considerável número de pomeranos, permeiam o currículo do campo com respaldo legal.

No entanto, a educação, embora leve em conta algumas das reivindicações dos movimentos sociais do campo, continua sendo pensada nos gabinetes dos centros urbanos, por intelectuais e por governantes que não possuem relação com o campo. Não havendo políticas educacionais que contemplem de fato esta realidade. Assim, a grande questão que se coloca é até que ponto esse modelo de pensar a educação contempla de fato as populações campesinas?

A escola que temos ainda não prepara os alunos para os desafios que a sociedade impõe. A legislação aponta para a democratização do ensino nos moldes freireanos. As comunidades anseiam por essa educação de maior autonomia. As lacunas a serem superadas estão justamente num dos mais conhecidos conceitos de Paulo Freire: o diálogo.

No documento Uma professora pomerana e sua comunidade (páginas 54-56)