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1:28:13-1:29:40 – M2 – Comigo foi assim, eu terminei a minha faculdade em 2005 e o tema do meu TCC no começo era Grande Sertão: Veredas .Então, nós iríamos fazer uma transposição do cinema, do filme para o livro. Isso se tornou muito difícil, conturbado, mas a coordenadora do curso não deixou a gente fugir de Guimarães Rosa. Então nós continuamos fazendo com Guimarães e o livro ficou em casa, tinha o livro, aquela bíblia enorme, eu não conseguia ler. Eu tentei as primeiras páginas, mas foi difícil e tentamos várias vezes, desistimos do livro do Guimarães Rosa, do Grande sertão.Então, de repente me deu, depois que eu terminei o curso, eu resolvi abrir o livro, comecei a ler o livro e aí eu me encantei pelo livro, depois que já tinha terminado. Só que de repente entro no meu e-mail e ta lá Guimarães Rosa, obra, 50 anos, sabe quando você nem se liga, mas recebi o e-mail e me interessei para participar do workshop. E de repente eu estava com o personagem. Foi muito legal, eu já estava querendo mesmo me aprofundar mais. Eu achei muito legal, ele [Bolle] é de uma grandiosidade....e a gente aprende muito lendo. Aconselho ler porque é maravilhosa a obra.

1:29:41-1:30:34 – M3: Vocês abrem o livro e acham difícil a leitura de Guimarães Rosa né?, porque ele usa neologismos, palavras inventadas e tudo mais. Mas assim, no decorrer do nosso workshop e da apresentação [...]. Eu tive dificuldade de ler o livro, mas depois comecei a entender o espírito dele e aí eu ainda to lendo o livro e cada vez mais eu me admiro com o fato, eu não sei ele conhece o espírito dos personagens dele de uma forma assim... se os personagens existiram ou se são inventados, é muito mágico isso e a gente lendo o livro a gente começa a ter uma outra percepção do mundo. Ele mostra uns caminhos assim ... do medo, que a gente se identifica muito com as coisas que acontecem no livro. 1:31:50-1:32:43 – M4: Acho que tem um fator importante do trabalho que é a construção. Quando a gente ia vendo os jagunços, cada um que tinha um aspecto, cada um tinha um jeito, era de muita

proximidade. Não era uma história de um jagunço no sertão de Minas do Guimarães, era ou da violência ou como foi caracterizada. Cada jagunço tinha seu jeito ou uma sensibilidade do seu modo, ou uma violência do seu modo. Então, tudo isso, eu acho, não é distante, não é de um conto distante [...]. Nós comentávamos hoje à tarde o descobrimento do trabalho, o descobrimento de cada jagunço, de cada parte disso e ver a materialidade disso foi uma descoberta muito importante,eu acho que emocionante mesmo, de verdade.

1:32:45-1:34:24 – H1: Por parte minha eu diria que Grande Sertão:Veredas é um dos livro que ficam me desafiando, assim como ele, Dostoiévski, James Joyce, Ulysses também são livros que desafiam. [...]. Nesse trabalho que a gente fez especifico desse workshop, eu acho muito interessante para se um dia eu for ler esse livro, lógico que eu vou fazer isso, agora esta mais fácil,[risos de todos] é a questão de me atentar para o prazer que esses jagunços tem pelo fato da violência. Que assim, esses trechos que foram falados mostra por exemplo que tem um menino de dez anos que sente prazer em ver sangue, ver morte. Mas só que se for parar para prestar atenção, isso acontece todo dia com a gente se você ver esses programas policiais que passam hoje em dia, passam essa situações todos os dias, só que é passado como se fosse novela, de forma banal. Então ter um trabalho como esse, pelo menos eu quando ler eu vou me atentar para a gravidade dessa violência e ter indignação por isso, não é comum essa violência.

1:34:25-1:34:59 – H2: O importante, o interessante para mim que não li o livro [risos] é assim, a proximidades desses personagens comigo ou com as pessoas que viviam ao meu redor no meu mundo e assim, quantos Hermógenes, quantos seu Habão... a história se repete, foi muito lindamente contada pelo, ouso dizer, pelo Guimarães [risos], mas é muito próximo da gente, isso é o que a gente vive hoje aqui, é muito forte.

1:35:00-1:36:49 – P1: Deixa eu fazer uma pergunta para você [para M2], você falou que a primeira vez que você leu Guimarães Rosa, você achou difícil, seu trabalho de TCC, e logo após um espaço de tempo, você achou... chegou a essa mesma dificuldade, mas mesmo assim se viu disposta a vencer o desafio, pois estava descompromissada da obrigação. Conta um pouco mais sobre isso, porque a academia, ela nos remete a pressões... eu mesmo passei pela faculdade de publicidade e muitas coisas foram jogadas, eles jogam mesmo. A faculdade é castrante, eu falo o que passei, é horrível [risos, alguma participante diz: é o sertão, né?]. Dentro do meio acadêmico, a gente, você vê muitas pessoas indo pela cabeça dos mestres, tomando os mestres como deuses e não com referência. Então assim, é muito bom um questionamento por parte dos alunos e dos professores também terem a cumplicidade, mas assim, conta um pouco essa sua segunda experiência com Guimarães Rosa fora a obrigação, compromisso com a academia.

1:36:50-1:41:14 – M2: Foi assim, na verdade o meu TCC tornou-se Guimarães Rosa porque nos fizemos A hora e vez de Augusto Matraga. Então nos fizemos todo o trabalho que a gente ia fazer com o Grande Sertão: Veredas nos fizemos com A hora e vez de Augusto Matraga. Passamos do livro para o filme como era todo aquele processo. As falas, a leitura, o estudo daquilo começou a despertar um gosto por Guimarães, porque eu fui lendo partes pequenas. E a gente tem livros de Guimarães que a gente tem uma visão melhor, ensina como você fazer essa leitura. Então eu tive acesso a esses livros, onde eu comecei a entender melhor o que Guimarães fazia e pude perceber, quando eu comecei a ler o livro de novo, que as palavras que estavam ali não eram muito difíceis, que quando ele fala Nonada, eu achei que era um monstro e eu já fui logo procurar no dicionário [risos], sabe, aquele desespero, então pra gente pegar logo de cara e começar a ler foi muito difícil. Depois que eu comecei, peguei outros fragmentos onde fui entendendo como é a maneira dele escrever, a forma de escrita dele, o porque ele escrevia assim, onde ele foi buscando, então a gente foi buscando todos essas coisas,esses suprimentos,esses subsídios, isso aí foi me dando mais clareza. Quando não era mais pra fazer Grande Sertão: Veredas, aí que alívio, isso tirou um peso. Quando eu retornei agora em 2005, em 2005 voltei a ler, parei. Tinha um ano que eu tinha terminado a faculdade, li cem páginas parei. Aí um dia eu vi uma reportagem que uma critica falou:quando você começar a ler Guimarães rosa, lê as primeiras dez paginas cantando, em voz alta para você. E aquilo me direcionou o trabalho, me direcionou a leitura

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através disso. E geralmente quando chegava em alguma parte que eu não entendia muito aí eu lia alto, eu retornava novamente. Às vezes eu estava lendo no ônibus e ria de alguma coisa que estava acontecendo no livro... A leitura para você tem que se tornar prazerosa. Você não tem que ler porque é obrigado a ler. Justamente concordo com você que a faculdade joga pra gente um monte de coisa, mas porque é assim, quando você entra na faculdade todos os professores pensam que você já leu quase todas as obras, que você já conhece todas as obras. Mas eu particularmente entrei na faculdade sem conhecer obra nenhuma. Porque quando eu terminei o meu antigo ginásio, eu fui logo fazer magistério, eu estudei coisas para dar aula de 1 a 4 série, então eu não tive contato nenhum com livros. E, quando eu cheguei aqui depois de quase 18 anos que eu tinha terminado o magistério, entrei na faculdade, a professora me jogou tudo aquilo lá, Sócrates, não sei o que... eu quase morri, levei um choque. Édipo eu nunca tinha ouvido falar isso. Sabe foi uma loucura, aquilo me deixou quase louca. Mas eu fui atrás, eu investiguei, eu procurei. Eu não fiquei ali na faculdade eu fui alem da faculdade. Porque se você não for alem da faculdade, você realmente em paranóia e desiste da faculdade. Uma coisa que eu descobri foi assim, quando eu fiz a faculdade, foi um transtorno, é cansativo, desgastante, eu trabalhava, tinha minha casa, meus filhos,mas eu aprendi assim que quando você conhece um pouquinho você , se você esta no seu mundo, você acostuma com aquilo, e se você vai a luta você sempre pensa que você sabe menos e que quer aprender muito mais e isso é o que eu descobri quando eu fiz faculdade.eu conheci um pouquinho e agora eu quero conhecer muito mais, por isso que eu estou aqui hoje.

1:48:44-1:50:08 – M5: Eu sinto medo de estar aqui, não conseguir... Posso dizer que eu senti medo, uma hora eu não conseguia... No primeiro dia, eu saí um momento da roda e não conseguia voltar. Me assustei com esse mundo. Disse pro seô Habão, que não é seô Habão [referindo-se ao ator que faz o seu papel] que eu tinha medo desse mundo e que eu não conseguia entrar de novo na roda. Se ele não tivesse me pego pela mão e me trazido para a roda e depois eu não tivesse segurado na mão da Nice [colega de cena], eu fiquei um bom tempo segurando a mão da Nice pra conseguir perceber essa... conseguir, não é bem suportar, mas pensar [...] nesse mundo de violência, de seres que oprimem e que são oprimidos e saber que eu também faço parte desse círculo.

1: 53:22-1:54:04 – M5: A academia me aparece de um outro jeito, ela não me aparece com esse elemento castrador. São as aulas mais mágicas, encantadas, uma aula que me repercute, me ressoa. Eu digo que se a academia tem esse elemento castrador e muita gente comenta que tem, eu digo que para mim estar onde estou, é onde eu aprendo a falar. É onde eu aprendo a ouvir o que vem daqueles que estão lá, mas é onde eu aprendo a falar, onde eu tenho a liberdade de colocar aquilo que eu recebi da obra, esse contato genuíno com a obra. Se essa é a regra, copiar, ficar processando folhas, eu tenho que dizer que eu não tenho recebido essa ordem. As pessoas, os professores que eu tenho contato eles me dizem que é pra eu dizer aquilo que a obra me diz. Não se trata de sentimentalismos, mas de dizer aquilo que a obra me diz, quais são as questões, quais são as minhas questões, quais são as questões que ela me traz e como é que ela responde e conseqüentemente me faz perguntar como é que eu respondo a essas questões.

2:04:55-2:05:20 – Ana Célia (organizadora): Eu gostaria de agradecer muito mesmo, porque eu acho que esse é o único trabalho assim digamos de formação, fora as palestras, mas que propõe que as pessoas atuem né?, que façam interferências, é um workshop prático diria né? Ele cruza o teatro e a literatura, mas com esse objetivo de ter uma compreensão melhor da obra e também do nosso contexto social.