• Nenhum resultado encontrado

3 PRINCIPAIS INOVAÇÕES DA NOVA LEI DO MANDADO DE SEGURANÇA

3.1 Síntese das inovações mais relevantes

O art. 1º, §1º, da Lei nº. 12.016/2009, com redação mais ampla que seu correspondente na Lei nº. 1.533/51, ao delimitar quem poderia ser equiparado a autoridade, para fins de aplicação da norma em cotejo, passou a prever também “os órgãos ou representantes dos partidos políticos”.

A inclusão dos representantes dos partidos políticos, embora a priori possa parecer uma exceção à regra de que particulares não possam ser consideradas como autoridade para fins da Lei nº. 12.016/2009, justifica-se na medida em que desenvolvem atividades de enorme repercussão sócio-política, sendo conceituados por Canotilho44 como “associações privadas com funções constitucionais”.

O §2º do art. 1º, por sua vez, consagra entendimento há muito defendido pela doutrina e jurisprudência, ao vedar a impetração de mandado de segurança em face do administrador de empresas públicas, sociedades de economia mista ou de concessionárias de serviços públicos, quando no exercício dos atos de mera gestão comercial.

43Cumpre destacar aqui as Leis nº. 1.533/51 e 4.348/64, que disciplinavam, respectivamente, o mandado de

segurança e a concessão de liminares contra a Fazenda Pública.

Sabe-se, entretanto, que essas entidades por vezes praticam atos regidos pelo regime jurídico de direito público, tais como a contração mediante licitação e a admissão de pessoal através da realização de concurso público. Assim, em se tratando de atos dessa natureza, não há porque afastar a possibilidade de manejo da ação mandamental.

O art. 4 º da nova lei do mandado de segurança, levando em consideração a modernidade tecnológica e o advento do processo eletrônico, passou a prever uma gama maior de meios eletrônicos para a realização dos atos processuais em casos de urgência. Coaduna-se, assim, o instituto, com a recente legislação processual brasileira.45

Outra novidade trazida pela Lei nº. 12.016/2009 diz respeito à exigência de indicação, por parte do impetrante, da autoridade coatora e da pessoa jurídica a qual se acha vinculada a autoridade (art. 6º, caput). Essa nova previsão reacendeu os debates relativos a quem seria, de fato, a parte ré na ação mandamental: se a autoridade coatora ou a pessoa jurídica (supra 2.8)?

Previu a nova lei do mandado de segurança, em seu art. 6º, §1º, que caso o documento necessário à confirmação do alegado pelo impetrante esteja em posse da administração pública ou de terceiros, o juiz determinará liminarmente a exibição do referido documento em juízo no prazo de dez dias.

Ao contrário, pois, da norma revogada, que só previa a hipótese de o documento se encontrar em poder da Administração Pública, a Lei nº. 12.016/2009 estendeu a previsão para os casos em que o documento se encontre nas mãos de terceiro.

A medida é louvável, posto que evita que o impetrante ainda perca tempo em entrar com outra ação judicial apenas para obter tal documentação, garantindo maior efetividade na tutela dos direitos resguardados pelo mandamus.

O legislador ordinário inovou ao prever, além da notificação da autoridade coatora, que se dê ciência ao representante judicial da pessoa jurídica interessada, conforme a dicção do art. 7º, II. Na realidade, quando a norma fala em ciência à pessoa jurídica interessada, devemos entender tal ato como verdadeira citação.

Há na doutrina quem entenda que o legislador, ao prever essa exigência, acabou por estabelecer a necessidade um litisconsórcio passivo necessário, composto pela autoridade coatora e pela pessoa jurídica a que é vinculada a dita autoridade.46

O art. 7º, III, passou a prever a possibilidade de o juiz exigir a prestação de caução por parte do impetrante. Apesar da inovação ser tratada com mais zelo em momento posterior

45Leis nº. 9.800/99, 11.280/2006 e 11.419/2006. 46Bueno, 2009, p. 38.

deste trabalho (infra 4.2.3), adiantamos que tal faculdade só é legítima enquanto não impossibilitar o acesso do impetrante à justiça, respeitando-se, portanto, o princípio da inafastabilidade da tutela jurisdicional.

Assim, quando o magistrado julgar pertinente a prestação de caução por parte do autor do writ, deve exigi-lo de forma fundamentada.

O legislador houve bem na redação do art. 7º, §1º, ao prever expressamente a possibilidade de reforma da decisão que conceder ou denegar a medida liminar, através de agravo de instrumento. Em virtude do silêncio do diploma revogado, doutrina e jurisprudência se dividiam quanto à possibilidade de interposição de recurso em face de decisão acerca da liminar.

Também inovou o legislador – com acerto, diga-se – ao prever que a medida liminar, uma vez deferida, permaneceria em vigor até a prolatação da sentença, salvo se for cassada ou revogada (art. 7º, §3º).

É que a Lei nº. 4.348/64 previa em seu art. 1º, b, que a medida liminar somente teria vigência de 90 dias, prorrogáveis por mais 30 dias, caso fosse verificado que o grande volume processual no cartório judicial fosse o responsável pela demora no julgamento definitivo do writ.

A referida regra, entretanto, tal a sua teratologia, há muito deixou de ser aplicada pelos tribunais pátrios. Afinal, seria ilógico penalizar o impetrante, que nada tem a ver com a falta de estrutura da justiça brasileira, pela demora na resolução da lide.

Houve bem, pois, o legislador, em afastar de uma vez por todas semelhante disposição.

A nova lei passou a prever, ainda, que as restrições concernentes à concessão da medida liminar em sede de mandado segurança são aplicáveis também aos casos de antecipação de tutela, em ações contra o Poder Público de qualquer natureza (não só de mandado de segurança).

Com essa previsão, o legislador acabou por eliminar qualquer possibilidade de tutela de urgência em face do Poder Público quando se está diante de determinadas hipóteses, o que, a nosso ver, afronta severamente os direitos e garantias do cidadão (infra 4.2.5 e 4.2.6).

Como todos sabemos, um dos maiores entraves à representação do Poder Público em juízo é, sem duvida, a demora e a burocracia na obtenção de informações imprescindíveis à defesa dos atos administrativos questionados. Por tal razão é que, por exemplo, a Fazenda Pública dispõe de prazo em quádruplo para contestar e em dobro para recorrer.

A urgência necessária à tutela dos direitos via ação mandamental, entretanto, não se coaduna com dilatações de prazo e entraves da Administração Pública.

Assim, a nova lei do mandado de segurança, além de determinar prazos para a atuação da Fazenda Pública em juízo, o fez também em relação à prestação das informações necessárias por parte dos órgãos da Administração aos representantes judiciais do Poder Público.

Com esse escopo, o legislador lançou mão do art. 9º da Lei nº. 12.016, que prevê que, uma vez determinada a autoridade coatora, esta, independentemente de qualquer provocação, deverá enviar ao órgão a que se acha subordinada, bem como ao órgão de representação judicial do Ente do qual faz parte, a cópia autenticada do mandado de notificação e todas as informações necessárias para a devida defesa em juízo do ato tido como ilegal ou abusivo.

Continuando com nossa análise acerca das inovações advindas da nova lei do mandamus, chegamos ao art. 10, §1º, que passou a prever o agravo interno como recurso cabível em face da decisão do relator que indeferir a inicial em processo de mandado de segurança de competência originária do tribunal.

Ressalte-se que o artigo em comento guarda pertinência apenas para com a decisão monocrática do relator. Destarte, em se tratando da decisão do colegiado, quando do julgamento do writ, o recurso cabível será o ordinário, a ser interposto perante o Supremo Tribunal Federal ou no Superior Tribunal de Justiça, a depender da matéria.47 Nesse caso, o cabimento do recurso ordinário não é expressamente previsto pela Lei nº. 12.016/2009, decorrendo da própria sistemática recursal vigente.48

O mesmo artigo, dessa vez em seu §2º, também passou a prescrever que não será admitido o ingresso de litisconsorte ativo facultativo após a petição inicial ser despachada. Tal medida se coaduna com a celeridade que deve ser inerente ao mandado de segurança, além de evitar que o litisconsorte ulterior se valha da tendência demonstrada pelo juiz - ao deferir a medida liminar, por exemplo - para burlar o princípio do juiz natural.

O art. 12 da nova lei, por sua vez, prevê novos prazos para o parecer do Ministério Público e para a prolatação da sentença. Assim, enquanto que a Lei nº. 1.533/51 prescrevia o prazo de cinco dias para que o Ministério Público prestasse seu parecer, o novo diploma dobrou o referido prazo, que hoje é, portanto, de dez dias.

47Arts. 105, II, b, e 102, II, a, da CF/88. 48Bueno, 2009, p. 65.

Quanto ao prazo para o juiz sentenciar – que no art. 10 da norma revogada era também de cinco dias – este passou a ser de trinta dias. Na prática, pouco ou nada mudou.

É bem verdade que o prazo de trinta dias se aproxima mais da realidade da justiça brasileira do o que anterior, mas os magistrados continuarão a durar o quanto possibilitarem sua dedicação e suas condições de trabalho. Apesar de os prazos destinados aos juízes constantes de inúmeros dispositivos legais serem reiteradamente desconsiderados, sob o argumento da doutrina de que se tratam de prazos impróprios, meramente indicativos, em se tratando de processo de mandado de segurança, é imprescindível para a efetividade do instrumento em comento que o prazo para sentenciar seja devidamente observado pelo julgador.

Outra inovação trazida pela Lei nº. 12.016/2009 foi a vedação expressa à execução provisória da sentença, naquelas hipóteses nas quais é vedada a concessão da medida liminar (art. 14, §3º).

Afora qualquer discussão acerca da (in)constitucionalidade da medida, restou afastada a possibilidade de a sentença ser executada enquanto pendente recurso de apelação (ou reexame necessário) ao tribunal competente.

Uma vez decidida a apelação ou o reexame necessário, nada obsta que se execute provisoriamente o acórdão. Destarte, caso pendente apenas recurso ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça, não existe empecilho para a execução provisória da decisão que conceder a segurança, inclusive nas hipóteses de restrição da medida liminar.

O art. 15, caput, a seu turno, diminuiu o prazo para a interposição do recurso de agravo interno em face da decisão do presidente do tribunal acerca da suspensão da liminar ou da sentença (infra 4.5.8). Assim, o prazo que era de dez dias49 passou a ser de apenas cinco dias.

O novo prazo melhor se coaduna com a urgência que reclama as hipóteses de deferimento de medida liminar ou mesmo de sua suspensão.

Outra previsão introduzida pela Lei nº. 12.016/2009 consiste na garantia de defesa oral nos julgamentos de processos de mandado de segurança de competência originária dos tribunais. De fato, a previsão de defesa oral pelos procuradores das partes era disciplinada pelos regimentos internos dos respectivos tribunais. Exemplificativamente, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, nunca existiu qualquer óbice à sustentação oral em julgamentos

de mandado de segurança, sendo, entretanto, vedada nos casos de embargos declaratórios, agravo, argüição de suspeição e medida cautelar.50

Uma vez que não implica em dilatação da marcha processual, a sustentação oral é medida que se afina com o instituto do mandado de segurança, sendo útil em muitos casos para o devido esclarecimento de questões fáticas e jurídicas.

O art. 16, parágrafo único, veio prever expressamente o cabimento do agravo interno contra a decisão do relator que conceder ou denegar a medida liminar, a ser apreciado pelo órgão competente do tribunal, nos casos de competência originária deste.

O entendimento consagrado pelo legislador felizmente afasta de uma vez por todas a incidência da Súmula 62251 do Supremo Tribunal Federal, pela qual a decisão do relator acerca da medida liminar seria irrecorrível.

Ressalte-se que se trata aqui de agravo legal, posto que expressamente previsto em lei, não regimental como chamam alguns. Quanto ao prazo de interposição, este é de cinco dias.

Com a nova lei, abriu-se também a possibilidade de o acórdão ser substituído pelas notas taquigráficas, caso a decisão do tribunal não seja publicada no prazo de trinta dias. O dispositivo refere-se não só ao julgamento do mandado de segurança propriamente dito, mas de todos os recursos a ele inerente.

A finalidade da nova previsão é, sem dúvida, conferir ao procedimento de mandado de segurança a maior agilidade possível, reforçando o princípio da razoável duração do processo.

O dispositivo em comento ganha especial relevância quando analisamos a executividade do acórdão. É que o acórdão é proferido em sessões colegiadas, ficando a cargo do relator do processo a sua publicação. Por vezes, tal procedimento ultrapassa os limites temporais razoáveis. Assim, passados os trinta dias constantes do art. 17 sem que haja a publicação do acórdão, este, ao ser substituído pelas notas taquigráficas, já está apto a produzir todos os seus efeitos.

50Art. 159 do RISTJ. “Não haverá sustentação oral no julgamento de agravo, embargos declaratórios, argüição de

suspeição e medida cautelar.

§1º. Nos demais julgamentos, o Presidente da Corte Especial, da Seção ou da Turma, feito o relatório, dará a palavra, sucessivamente, ao autor, recorrente ou impetrante, e ao réu, recorrido ou impetrado, para sustentação de suas alegações.”

51Súmula 622 – STF. “Não cabe agravo regimental contra decisão do relator que concede ou indefere liminar em

Importa dizer que cabe ao relator do mandado de segurança decidir acerca da pretensão do interessado em se valer das notas taquigráficas, manifestada através de simples petição.

O art. 20 da nova lei do mandado de segurança foi responsável por trazer duas inovações: a) a ampliação do prazo para conclusão dos autos, de vinte e quatro horas para 5 dias; e b) a determinação de que os processos de mandado de segurança e seus eventuais recursos terão prioridade sobre todos os demais atos judiciais, excetuando-se apenas o habeas corpus.

Os dispositivos em comento são normas que evidenciam o caráter emergencial da tutela buscada através do writ, sendo a ampliação do prazo para conclusão dos autos medida que melhor se adéqua ao atual volume processual da justiça brasileira.

A Lei nº. 12.016/2009 expressamente acrescenta à redação do art. 17 da Lei nº. 1.533/51, que não só o mandado de segurança terá prioridade de tramitação, como também seus recursos. Assim, depreende-se da redação do dispositivo em comento, que não se trata apenas de prioridade de julgamento, mas de prioridade de processamento, referente, portanto, a todos os atos que dizem respeito ao mandado de segurança ou a seus recursos.

Acrescenta a doutrina, por fim, que o descumprimento dos prazos estipulados pelo artigo em comento não produz quaisquer conseqüências processuais, posto que se tratam de prazos impróprios. 52

Finalmente, os dispositivos que seguramente causaram maior frisson dentre todos foram os arts. 21 e 22, que vieram disciplinar o mandado de segurança em sua modalidade coletiva. Essa especial inovação, tamanha sua relevância, mereceu tópico próprio nesta obra monográfica, sendo abordada logo a seguir.

Documentos relacionados