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4 A SAÚDE INDÍGENA ENTRE PARADOXOS E FRAGILIDADES

4.2 Saúde indígena: degradação e pauperização?

Sabe-se que, historicamente, os índios vêm sofrendo as consequências de um processo de barbarização que vai se caracterizando nessa dimensão espaço-tempo, na qual se encontram envolvidos por facetas nitidamente expressas na expropriação de sua cultura, na descaracterização do seu lócus e na precarização de suas relações de trabalho e de sociabilidade. Tudo isso tem favorecido a construção de novas “formas” de conviver e interagir com a sociedade nacional, ou conforme coloca Velho (1994, p.20), referindo-se às sociedades modernas, com as “redes de relações – network–que atravessam o mundo social de

modo horizontal e vertical” resultando, em grande medida, no aparecimento de conflitos sociais que contribuem para a chamada “crise de identidade”, conforme eles mesmos já rotulam em suas falas, haja vista a luta por políticas de reconhecimento de suas particularidades, conviverem com várias contradições, inclusive a possibilidade de perda das raízes culturais.

A pesquisa realizada com os índios da etnia Guajajara em Barra do Corda, Maranhão, mostrou que o contato com a sociedade nacional tem intensificado, em muito, o perfil de morbidade e mortalidade de indígenas no que tocante a doenças antes não identificadas nas aldeias, como a diabetes, a hipertensão e as patologias comportamentais que afetam, de alguma forma, o estado emocional dos índios. Dentre essas, está a depressão, o alcoolismo, o uso do crack e o suicídio.

Tem parentes indígenas em Barra do Corda, que estou preocupado, porque isso nunca aconteceu com os Guajajara e de repente [grifo nosso] estão aparecendo com depressão, se drogando... a maconha era apenas para os rituais, pescaria. Mas hoje, eles já começam a comercializar, para consumir, e isso já muda tudo... (Sujeito YANOMAMI, p. 4)

A questão do alcoolismo, da depressão, das drogas e do suicido hoje vem crescendo de forma assustadora. A gente acha que tem a ver com essa falta de perspectiva.

Gente, eles não têm emprego!. O mercado é preconceituoso aqui. Você não vê índio trabalhando no mercado local. Não tem!. [...] eles estão sem perspectivas e vão traficar. Aqui no Polo, a gente tem que ter o maior cuidado porque o pessoal vem mesmo atrás de maconha e se a gente não ficar atento, eles vendem mesmo. ( Sujeito KANELA p. 3).

Entender a situação epidemiológica de saúde mental dos indígenas, no Estado do Maranhão, ainda é tarefa difícil, tanto pela inexistência de estudos contextualizados sobre o uso de SPAs como pelo fato de que o Sistema de Atenção à Saúde do Índio, o SASI/SUS, até o início de 2014, ainda não ter implantado um sistema de notificação desses agravos, sendo que todas as informações disponíveis, quando existem, estão sob forma de sub-registros em relatórios técnicos, livros de movimentação diária, dentre outros. Nessa busca, foi possível identificar, dentre as unidades que prestam assistência ao índio, na Casa de Saúde do Índio de Teresina - CASAI25, uma pequena amostra de como esta situação vem se desenvolvendo. No Livro de Registros de entrada e saída de indígenas da Casa de Saúde do Índio de Teresina-

25Casa de Saúde do Índio - CASAI/Teresina – Piauí, instância que compõe a estrutura administrativa do DSEI-MA. Que presta assistência ao índio através de seus polos bases, a saber: Amarante com 62 aldeias, Arame com 62 aldeias, Barra do Corda com 95 aldeias, Grajaú com 65, Bom Jesus da Selva, 8 aldeias, Montes Altos 5 aldeias, Santa Inês, 15 aldeias e Zé Doca com 12 aldeias. Considerando dificuldades na captura de dados, junto as outras CASAI’s, principalmente pela ausência de informação, analisaremos somente as informações da CASAI de Teresina-Piauí, por se constituir, inicialmente, em nosso objeto de estudo. A CASAI-Teresina, e está subordinada ao Pólo Base de Barra do Corda-Maranhão. Sua finalidade é prestar serviço de assistência à saúde aos indígenas que demandam o Polo de Saúde de Teresina, para tratamento de saúde.

CASAI, verificou-se que no período de 2008 a 2013 foram assistidos, somente por esta entidade, cerca de 5.530 pacientes indígenas, dentre esses: 1.996 enfermos, 3.534 acompanhantes, sendo que o maior fluxo de demanda ocorreu no período de 2008 a 2010, conforme tabela abaixo.

Tabela 2- Atendimentos de indígenas referenciados para a CASAI-Teresina ( 2008 a 2013)

ANO ENFERMOS ACOMPANHANTES TOTAL

2008 457 976 1433

2009 424 793 1217

2010 332 636 968

2011 200 439 639

2012 319 690 1009

2013 264 380 644

TOTAL 1996 3534 5530

Fonte: Dados produzidos pela autora através de pesquisa documental/Livro de Registro da CASAI-Teresina-PI. Ano: set/2013

No gráfico 2, abaixo, percebe-se no período de 2008 a 2013, que a etnia Guajajara se sobressai com o maior número de indígenas referenciados para a CASAI-Teresina, para serem atendidos pelo SUS ou rede conveniada, para tratamento de saúde, com cerca de 1.560 indígenas no período, seguida da etnia Kanela com 377 indígenas. Tal fato se justifica por ser a etnia Guajajara mais populosa e ter seu fluxo de demanda espontânea direcionado, dentre as outras CASAI’s do Maranhão, para a CASAI de Teresina.

Gráfico 2 - Número de indígenas referenciados à CASAI-Teresina, por etnia, no período de 2008 a 2013

Fonte:Dados produzidos pela autora através de pesquisa documental/Livro de Registro da CASAI-Teresina-PI. Ano: set/2013

Em relação às especialidades médicas mais procuradas e de acordo com as principais patologias apresentadas, observa-se que os transtornos mentais (CID 10) identificados nas especialidades neurologia (5,34%) e psiquiatria (1,83%) se sobressaem com 7,17% do total da patologias encaminhadas à Casa do Índio para atendimento na rede do SUS, em Teresina.

Gráfico 3 - Demandas indígenas dos polos base do Estado do Maranhão à CASAI-Teresina, segundo especialidade médica no período de 2008 a 2013.

Fonte: Dados produzidos pela autora através de pesquisa documental/Livro de Registro da CASAI-Teresina-PI. Ano: set/2013

No entanto, embora com um percentual pequeno em relação a outras patologias como demandas por Clínica geral (7,47%), Ortopedia (5,95%) e Urgência (19,02%), as doenças neurológicas e psiquiátricas chamam a atenção pela necessidade de uma maior investigação, não só no seu aspecto clínico, mas, sobretudo, nos aspectos comportamentais, culturais e sociais que, embora com a política de saúde mental implantada, esses agravos ainda são trabalhados de forma assistemática e artesanal, pela política de saúde local. No que se refere aos transtornos mentais percebe-se que foi acometido um maior número de pessoas do sexo feminino, com faixa etária entre 20 a 59 anos, conforme mostram os gráficos abaixo.

Gráfico 4 - Indígenas acometidos por transtorno mental segundo sexo (2008 a 2013)

Fonte: Dados produzidos pela autora através de pesquisa documental/Livro de Registro da CASAI-Teresina-PI. Ano: set/2013

Segundo o relatório da OMS sobre a saúde no mundo,

A maioria dos estudos chegou à conclusão de que a prevalência geral de transtornos mentais é aproximadamente a mesma no sexo masculino e feminino. As diferenças porventura existentes são explicadas pela distribuição diferencial dos transtornos. Os transtornos mentais graves são também mais ou menos igualmente comuns, com exceção da depressão, que é mais comum no sexo feminino...” (OMS, 2001, p. 21)

Segundo este mesmo relatório, “em contextos de atenção primária, os diagnósticos mais comuns são depressão26, ansiedade e transtornos do uso de substâncias” (OMS, morte e suicídio, diminuição da concentração e perturbação do sono e do apetite”. (OMS, 2001, p. 28)

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transtornos exercem um significativo impacto sobre a vida dos indivíduos, das famílias e da comunidade. Os sentimentos de incapacidade e discriminação concorrem para o agravamento de cada caso em particular associando a isto outros fatores como o stress, a alteração da rotina familiar e as restrições às atividades sociais.Tudo isso impõe ao Estado e à sociedade "uma carga de agravos indesejáveis e extremamente dispendioso, que acometem os indivíduos em todos os domínios de sua vida" (BRASIL, 2004, p. 16).

Gráfico 5 - Pacientes indígenas referenciados à CASAI-Teresina com transtorno mental por idade no período de 2008 a 2013

Fonte: Dados produzidos pela autora através de pesquisa documental/Livro de Registro da CASAI-Teresina-PI.

Ano: set/2013

Conforme relatório de gestão da FUNASA (2005), no item referente ao componente de gestão da Casa de Saúde do Índio - CASAI-Teresina, nota-se que as patologias e queixas mais comuns apresentadas pelos indígenas à rede de saúde de Teresina são as pneumonias, como principal causa de demanda da população infantil de 0 a 10 anos (33.33%). Por sua vez, na população adulta de 20 a 29 anos, observa-se uma frequência maior de patologias como DSTs/AIDS e tuberculose pulmonar (11.11%). Na faixa etária de 30 a 39 anos aparecem mais uma vez as DSTs/AIDS, com 17%, seguidas de neuroses/psicoses com 5,5%.

No relatório citado, é comum identificar na população de 40 anos ou mais o aparecimento de queixas correlacionadas a agravos como hipertensão arterial, fratura óssea, hipertrofia prostática, cardiopatias, diabetes, lúpus eritematoso, dermatoses, dentre outros. Ressalta-se, ainda, a partir do referido documento, a coexistência de outros agravos como: suicídio, consumo arriscado de SPAs e a depressão. Esta comorbidade chegou a alcançar em torno de 5,0% do total das patologias apresentadas pelo referido documento, naquele ano.

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Consta no Relatório de Gestão da FUNASA, referente ao ano de 2007, quando a CASAI-Teresina dispunha em sua estrutura de um serviço de psicologia implantado, o registro dos seguintes procedimentos: 146 (cento e quarenta e seis) consultas psicológicas, 185 (cento e oitenta e cinco) psicoterapias de apoio familiar, 29 (vinte e nove) terapias de auto-ajuda e 72 (setenta e duas) terapias de aconselhamento no período de 2009 até julho de 2011.Todas essas intervenções estão concentradas nas etnias Guajajara e Kanela - Maranhão, que residem nos municípios de Barra do Corda e Grajaú. Ainda segundo os dados apresentados pela CASAI-Teresina, 80% dos casos de psiquiatria registrados naquele ano, são da etnia Guajajara. Não obstante a esse perfil de atendimento, não se evidenciou no documento quaisquer correlação dos atendimentos psicológicos com as estruturas de vida dos indígenas sendo, neste caso, ignorados os determinantes sociais que interagem no processo saúde-doença. No período de 2008 a 2013, identificou-se que dentre as demandas motivadas por transtornos mentais sobressaiu-se, conforme gráfico 6 os episódios depressivos e com maior incidência na população feminina, seguida dos Transtornos Não Especificados (F99).

Entretanto, é comum, também, se observar o aparecimento de Transtornos Comportamentais pelo uso abusivo de SPAs.

Gráfico 6 – Caracterização e intensidade dos transtornos mentais em indígenas (TMI) atendidos pelo Polo de Barra do Corda-MA

Fonte: Dados produzidos pela autora através de pesquisa documental/Livro de Registro da CASAI-Teresina-PI. Ano: set/2013

Pode-se visualizar ainda, no gráfico 6, que nos anos de 2011 a 2013 houve uma queda no número de casos de TMI, bem como a não identificação de casos novos por álcool e outras substâncias psicoativas, o que não quer dizer que esses casos não existam. Segundo informações da equipe técnica da CASAI-Teresina, em reunião realizada para discussão dos indicadores (DIÁRIO DE CAMPO, 22 de setembro de 2013), atribui-se a ausência desses

dados às dificuldades de atendimento pela rede do SUS de Teresina o que, provavelmente, tenha contribuído para reprimir a demanda.

De acordo com o relatório de gestão da FUNASA (MS/FUNASA,2009), dentre os 424 atendimentos registrados na CASAI-Teresina, naquele ano, nas diversas especialidades 5 (cinco), cerca de 1,1%, foram de indígenas para a especialidade Psiquiatria na rede de saúde de Teresina. Esses casos estão relacionados aos transtornos mentais por uso de SPAs e depressão. Os mesmos episódios são verificados no ano de 2010 quando foram registrados 7 (sete) atendimentos de psiquiatria, com diagnóstico de depressão, outros TMI ocasionados por álcool e outras drogas. No ano de 2011, só no período de janeiro a julho, foram realizados 4 (quatro) atendimentos psiquiátricos pelas mesmas causas. Conforme se observa, a presença de casos de TMI vai aumentando, sem considerar os casos encaminhados a outros centros de atendimento à saúde indígena no Estado do Maranhão, bem como os casos de demanda reprimida. No gráfico 7 a seguir, observa-se que os casos referenciados de TM em indígenas do Polo de Barra do Corda a Teresina estão localizados, em sua maioria, nas aldeias das etnias Guajajara e Kanela. Nesta última, os casos estão concentrados nas aldeias Escalvado e Sabonete dos Leões.

Gráfico 7- Casos de transtornos mentais em indígenas dos Polos base do Maranhão, por aldeia, encaminhados à CASAI-Teresina no período de 2008 a 2013, por aldeia. Fonte: Dados produzidos pela pesquisadora através de pesquisa documental/Livro de Registro da CASAI-Teresina-PI. Ano: set/2013

A busca por tratamento de saúde coloca o Polo de saúde de Teresina como palco de acolhimento a essas demandas, que são referenciadas para a rede do SUS ou rede privada conveniada, de acordo com o nível de complexidade que apresentam. Atualmente, a porta de entrada do indígena no SUS, em Teresina, não é feita através da central de marcação de

Mussun coquinho M. Branco Porquinho Ponta d'agua Roldão Sab. dos leões o Pedro Tarrafas Escalvado Cumaru Tiririca Mardonio Urucu-juruá Igarana IPU Bacurizinho Sardinha Bom Jesus

consultas do SUS, pois conforme já evidenciado, não existe pactuação, mas vem ocorrendo através da Unidade Básica de Saúde (UBS) onde o referenciamento é feito, de acordo com a patologia, para as seguintes unidades de saúde; a) Unidades de Alta complexidade: Hospital Getúlio Vargas – geral; Hospital Infantil Lucídio Portela, Hospital de Doenças Tropicais Natan Portela, Hospital Maternidade Dona Evangelina Rosa, Hospital Areolino de Abreu, e como unidades de média e alta complexidade: Hospital Parque Piauí, Hospital e Maternidade do Buenos Aires, Hospital do Mocambinho e Hospital da Primavera. Os casos de transtornos mentais tem como unidade de referência o Hospital Areolino de Abreu e o CAPS adulto situado no bairro São João, na zona leste de Teresina e o CAPS AD situado, no Monte Castelo, na Zona sul, onde os indígenas com TM passam por tratamento ambulatorial e, após as sessões, retornam à CASAI e, consequentemente, às suas respectivas aldeias, para acompanhamento no CAPS no seu município de origem.

Na escuta aos indígenas se observa, através de suas falas, que essa realidade não é só complexa como também dinâmica, cujos agravos vão se prolongando em quantidade e intensidade, fazendo recrudescer tanto patologias não mais existentes como o aparecimento de novas patologias.

Então esses contatos fizeram aumentar também o número de diabéticos e hipertensos, cárie dentária, porque eles consomem muito biscoito recheado, refrigerantes, doces, balinhas, salgadinhos... eles mudaram drasticamente seus hábitos de vida, o modo de se alimentarem.[...] ultimamente está aparecendo muito câncer entre eles, a gente sabe que tem a predisposição genética mas, também, tem a questão da alimentação, do fumo (de rolo), tomam muito café, usam muito sal, não pescam, não criam galinha.... a fonte de subsistência desapareceu, eles se acomodaram com os benefícios do governo, Bolsa Família. Então é melhor plantar ou ir comprar o que já está pronto? Vai pelo mais fácil!... E isso tem acarretado fome, muita fome...[pausa], você vê muitas crianças desnutridas... o índio tem passado muita fome porque ele não tem mais como se manter. (Sujeito KANELA, p.

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A leitura dessa realidade mostra que existe um perfil sócio-sanitário preocupante, pois na medida em que os indígenas vão intensificando seus contatos com a sociedade nacional, os serviços de saúde não acompanham a fisiologia da doença, sua compreensão e funcionamento. Isto é, sua natureza e processamento, no meio indígena. Há um desconhecimento do processo saúde-doença, sua temporalidade histórica e consequentemente dos meios de enfrentamento. A tendência é se estabelecer um verdadeiro 'desencaixe' nos comportamentos, percepções e atitudes dos indígenas.

Diante do exposto, infere-se que a atual situação de saúde no meio indígena evidencia uma crise sócio-sanitária que vai se agravando em intensidade e velocidade, trazendo novos

desafios às políticas públicas, impondo às instituições de saúde não só a necessidade em redirecionar seu foco de atuação diante da realidade que se descortina, como também em dar um maior dinamismo à gestão e condução de sua política de saúde. Neste sentido, faz-se necessário não só a contextualização da situação-problema, mas sua identificação precoce e seus respectivos direcionamentos.

O diagnóstico e o tratamento precoce da dependência de álcool têm papel fundamental no prognóstico deste transtorno, o que se amplia em uma perspectiva global de prevenção e promoção da saúde, e se agrava ao constatarmos que, de uma forma geral, há despreparo significativo e desinformação das pessoas que lidam diretamente com o problema, sejam elas usuários, familiares, sejam profissionais de saúde (BRASIL, 2004a, p. 16).

Historicamente, os índios vêm sofrendo as consequências de uma barbárie social envolvidos por facetas nitidamente expressas na expropriação de sua cultura, na descaracterização do seu lócus, na precarização e extensão de suas relações de trabalho, na convivência com novos hábitos e costumes, dentre outros. Tudo isso tem favorecido o aparecimento de novas “formas” de conviver e interagir com a sociedade nacional resultando, em grande medida, no aparecimento de conflitos sociais, culminando para o que chamamos de

“crise de identidade”, conforme os sujeitos da pesquisa já rotulam em suas falas, haja vista na luta por políticas de reconhecimento de suas particularidades, conviverem com várias contradições, inclusive perdas de raízes culturais.

Conforme já evidenciado, embora o DSEI-Maranhão ainda não tivesse até início de 2014 estruturado e implantado junto ao Programa de Saúde Mental um sistema de notificação e tratamento das informações em torno dos transtornos mentais e outros agravos, é possível observar, mesmo pelos sub-registros apresentados pelo órgão, através do Sistema de Informação da Atenção da Saúde Indígena (SIASI), que alguns indicadores trabalhados pela CASAI-Teresina, demonstram que algo não anda bem entre a saúde mental das etnias naquele Estado.

Assim, no período de 2009 a 2013, foram identificados, através de sub-notificação, um total de 360 casos de transtornos mentais por ingestão de álcool27, sendo que desses, 62% são em homens e 38% em mulheres. Somam-se a isto o aparecimento de outros transtornos mentais e comportamentais (CID F00-F99) que, segundo o próprio DSEI-MA, pela ausência de capacitação das equipes de campo, acabam registrando a maioria dos casos de Transtornos

27 Segundo o Ministério da Saúde, no Brasil a questão do uso do álcool é preocupante. "Ao analisarmos alguns dados correlatos e relativos aos custos decorrentes, vemos que os custos decorrentes do consumo de álcool são de grande magnitude. [...] no ano de 2001, tivemos no Brasil 84.467 internações para o tratamento de problemas relacionados ao uso de álcool, mais de quatorze vezes o número de internações ocorridas por uso de outras drogas." (BRASIL, 2004, P. 17).

Mentais (TM) como se fossem unicamente Transtornos Orgânicos (TO). No mesmo período, foram notificados 15 suicídios28, sendo observada uma evolução no número de episódios a cada ano, principalmente em 2013, cujo número de casos chegou a 42% em relação aos últimos quatro anos (2009-2012), conforme o quadro abaixo, apresentado pelo órgão.

Quadro 1 - Distribuição dos casos de suicídios entre as etnias indígenas do Maranhão por Polos de Saúde

POLOS/ANO AMARANTE ARAME BARRA DO CORDA

GRAJAÚ SANTA INES

ZÉ DOCA

2009 1 1

2010 2

2011 1 1

2012 1 1 1

2013 1 2 2 1

FONTE: SIASI/2014. Informação fornecida pelo DSEI-MA, em fevereiro de 2014.

Segundo o relatório da OMS (2001, p. 38), “o suicídio é uma das principais causas de morte de adultos jovens. Situa-se entre as três maiores causas de morte da população de 15-34 anos”. Informa ainda o relatório que “dentre os transtornos mentais que levam ao suicídio o mais comum é a depressão” (OMS, 2001, p. 38) podendo acontecer, também, pelo uso de substâncias como álcool e outras drogas.

No que se refere à população indígena, Souza e Ferreira (2014, p. 1064) inferem que,

"no Brasil, há indícios de que alguns povos indígenas apresentam taxas de mortalidade por suicídio significativamente superiores às taxas nacionais e regionais" e que essa é uma categoria que apresenta sutilezas na sua compreensão considerando que não se trata apenas de uma categoria biomédica, mas, é, sobretudo, uma categoria subjetiva da qual os índios se apropriam para denotar simbolicamente a relação vida-morte. Tal compreensão mostra que é preciso analisar os suicídios em indígenas dentro de um contexto e sob diferentes aspectos.

Sobre esta questão Durkheim (1983) menciona que,

[...], em vez de vermos neles apenas acontecimentos particulares isolados uns dos outros e que necessitam cada um por si de um exame particular, considerarmos o conjunto dos suicídios cometidos numa sociedade dada, o total assim obtido não é

[...], em vez de vermos neles apenas acontecimentos particulares isolados uns dos outros e que necessitam cada um por si de um exame particular, considerarmos o conjunto dos suicídios cometidos numa sociedade dada, o total assim obtido não é