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2 A PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO EM SAÚDE NO CONTEXTO DA PÓS-

2.3 ANÁLISE DOS PERÍODOS HISTÓRICOS

2.3.2 Saúde Mental e o Trabalho do (a) Assistente Social

Com relação à discussão do tema Saúde Mental, segundo tema mais estudado nas dissertações do PPGSS entre os anos 2000 e 2014, este aparecimento se dá tanto no governo Lula quanto no governo Dilma, demarcando sua relevância social perante os estudantes de pós-graduação, acompanhada de um momento em que esta área da saúde vem ganhando espaço na busca pela consolidação da Reforma Psiquiátrica em consonância com os princípios defendidos pela Reforma Sanitária, bem como se vincula também aos preceitos que definem e consolidam o Serviço Social.

Sobre o panorama da saúde mental nos últimos 15 anos, temos que esta área da saúde vem passando por mudanças significativas em sua composição e estrutura desde meados dos anos 1980 com o processo de desinstitucionalização que buscava substituir os hospitais psiquiátricos por ampla rede de serviços extrahospitalar (TENÓRIO, 2002).

Outro ponto que chama atenção nesse momento de reconfiguração, e que é oriundo da Reforma Sanitária e da Reforma Psiquiátrica, é o rompimento do paradigma patologia/cura, que passa agora a considerar outras dimensões da vida em sociedade como elementos fundamentais à compreensão da saúde. Com o advento do SUS, a rede de saúde mental passa a contar com os Centros de Atenção Psicossocial – CAPS e com os Núcleos de Atenção Psicossociais – NAPS, diminuindo a quantidade de internações e iniciando o processo de reestruturação da saúde mental. Rocha (2012, p. 48) reforça esta ideia ao afirmar:

Neste sentido, reconhece-se a dimensão social dos sujeitos, isto é, a reforma psiquiátrica reconhece a questão social como um dos determinantes do sofrimento mental, que deve ser levado em conta na reabilitação dos indivíduos. As condições de vida dos doentes mentais

passam a ser um elemento de reabilitação, pois parte-se do pressuposto que, se as relações sociais destes indivíduos são caracterizadas por violações de direitos, se seu ambiente de vivência cotidiana é marcado por expressões da questão social, tais como insalubridade, dificuldade do provimento de alimentação e medicação, dentre outros, certamente o processo de reabilitação psicológica destes sujeitos encontrará sérios limites.

Nessa direção, o Brasil começa a vivenciar um processo de redução dos hospitais psiquiátricos e maior desenvolvimento de serviços substitutivos, como os CAPS, sendo este também mais um campo de trabalho para o Serviço Social, visto que os CAPS e NAPS desempenham suas funções de modo interdisciplinar, atributo advindo da Reforma Psiquiátrica, onde as especialidades são essenciais para reconstrução dialética do objeto. (ROBAINA, 2010).

Esse novo modo de conceber a saúde mental, para além da mudança quantos a oferta de serviços traz também uma nova estrutura de trabalho com os usuários, que agora passam a ser sujeitos de direitos vistos em uma perspectiva de integralidade e, para tanto, passam a ter uma equipe interdisciplinar que o enxerga como indivíduo humanizado e reconhecido dentro da sociedade, de modo que as políticas sociais também precisam estar fortalecidas e integradas para receber esse público. Scheffer e Silva (2014) apontam que a intersetorialidade na saúde mental propõe superar a lógica de fragmentação que acompanha a história das políticas públicas no enfrentamento da questão social.

Destaca-se que imerso na conjuntura neoliberal, a política de saúde mental sofre diretamente os efeitos perversos desse sistema que vem se difundido cada vez mais desde o governo FHC, tendo continuidade no governo Lula e também no governo Dilma. De acordo com Melo e Rosa (2009) o que se observa é que sendo a política de saúde mental um eixo da política de saúde que integra o tripé da seguridade de social juntamente com a assistência e a previdência social, é importante destacar que esta se encontra em um momento difícil, tendo em vista que a assistência social vincula-se majoritariamente a políticas sociais de focalização e seletividade, de modo que os usuários não encontram nesta um meio de ultrapassar as expressões da questão social, até mesmo porque este não o objetivo deste tipo de política focalizada.

No que se refere à previdência, a vida dos usuários da saúde mental tem se tornado mais complicada, pois esta política tende a restringir os contribuintes e se

torna deficitária na medida em que faz parte dos gastos sociais que o governo neoliberal não se propõe a assumir em sua plenitude; por conseguinte, na própria política de saúde, temos os constantes processos de privatização sobre os serviços de saúde, sem falar nos CAPS e NASF que o projeto neoliberal coloca-os como serviços ambulatoriais dissociados do SUS, devendo dar conta da sua própria demanda.

Por ser um campo de atenção psicossocial, constitui-se também como um espaço em que as expressões da questão social apresentam-se cotidianamente, sendo, portanto, espaço genuíno de trabalho do (a) Assistente Social. Conforme nos lembra Iamamoto (2011, p. 160) sobre a questão social:

A questão social expressa, portanto, desigualdades econômicas, políticas e culturais das classes sociais, mediatizadas por disparidades nas relações de gênero, características étnico-raciais e formações regionais, colocando e causa amplos segmentos da sociedade civil no acesso aos bens da civilização. Dispondo de uma dimensão estrutural, ela atinge visceralmente a vida dos sujeitos numa ‘luta aberta e surda pela cidadania’, no embate pelo respeito aos direitos civis, sociais e políticos e aos direitos humanos. Esse processo é denso de conformismos e rebeldias, expressando a consciência e a luta pelo reconhecimento dos direitos de cada um e de todos os indivíduos sociais. É nesse terreno de disputas que trabalham os assistentes sociais. (grifos da autora)

Melo e Rosa (2009) destacam que por demandas psicossociais a que se atribui o exercício profissional do (a) Assistente Social não se verifica a prática de terapias, mas de demandas referentes à moradia, educação, trabalho e cidadania. Robaina (2010) afirma que o trabalho do Serviço Social nos CAPS e NAFS direciona-se às famílias no que se refere ao perfil de famílias dos usuários, aos serviços que podem ser ofertados a este grupo, aos direitos individuais e coletivos através de serviços de assistência social, saúde, educação, cidadania, moradia e ainda participação em conselhos e associações, despertando e estimulando os sujeitos para o controle social. Silva (2010, p. 17) complementa o expor:

O profissional deve trabalhar no fortalecimento da rede se esta já estiver articulada, se não o trabalho deve estar na construção desta rede, para que todos os componentes da rede estejam com sua ação particular e também relacionada com os outros para que atinjam o objetivo comum, a consolidação das políticas sociais, pois só assim a saúde será efetivada integralmente, pois ela está integrada aos demais direitos.

A importância do Serviço Social na Saúde Mental cresceu, ainda mais, com a inclusão dos usuários e familiares nas políticas, ações de cidadania e ações de direitos do sujeito e na questão social que vivencia o usuário e sua família. Hoje essa realidade mudou para melhor atender o sujeito com transtorno mental enquanto sujeito portador de direitos. O Serviço Social tem um papel diferenciado para complementar a equipe multidisciplinar nos CAPS, que promove na rede uma articulação de direitos sociais.

Outro ponto de atuação é a questão da geração de trabalho e renda, relações de trabalho, valor de uso e valor de troca, tendo em vista que nestes serviços são desenvolvidos trabalhos artesanais em oficinas e que há usuários que mantém vínculo empregatício, a exemplo dos usuários do CAPS destinado a tratamento de usuários de álcool e drogas. Sobre a atuação do (a) Assistente Social na saúde mental, Melo e Rosa (2009, p. 16) ratificam o exposto ao afirmar:

Desse modo, o assistente social contribui no processo de acesso a determinados direitos pela veiculação de informação, aproximação dos canais garantidores de direitos e no fomento à criação de conselhos locais de saúde. De outra maneira, também, pode atuar como agente político no interior da própria equipe de saúde mental, pois é identificado como um profissional que faz circular as informações entre os diferentes membros da equipe; questiona o cotidiano institucional fazendo com que a equipe funcione e acione seu potencial em prol das necessidades dos usuários e do serviço.

Assim, o campo da saúde mental vem se constituindo um espaço cada vez mais abrangente de trabalho do Serviço Social, em que é possível materializar os preceitos do Código de Ética da Profissão, em consonância com a Reforma Sanitária, construindo práticas indisciplinares que integram o saber e buscam compreender e trabalhar os usuários em uma perspectiva macrossocial, tal qual é a realidade que os cerca, tomada por determinantes diversos e que possuem extrema relevância na atuação profissional.