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5. REDE DISCURSIVA: O SER PROFESSORA NA EDUCAÇÃO INFANTIL

6.2 Desvelando os saberes-fazeres das professoras na educação infantil

6.3.6 Saber comunicar-se

Quem estar autorizado a falar? Optamos por esse questionamento inicial para que ele nos sirva de reflexão para compreender outra forma de saber dito pelas professoras: saber comunicar-se. Para entendermos esse saber, apresentaremos a seguir o discurso da professora Virória.

Eu acho que a professora dá um gritinho básico, pede pra fazer silêncio, até porque assim, ela preparou uma aula bem criativa,

porque a aula com fantoches, geralmente as crianças gostam muito quando a gente trabalha![...]O que leva a pensar que a professora agiria assim?Essa questão dela mandar eles pararem? Porque tem o momentinho assim deles falarem sobre o circo, aquela era uma aula que eles teria que participar, então eu acho que ela pararia, mandava é,... Ia pedir pra eles fazerem silêncio (Vitória, caso problematizador “c”, entrevista realizada em 28 de março de 2015, grifos nosso).

Em resposta a situação problematizadora, Vitória nos disse que a professora utilizaria uma entonação de voz elevada, no intuito de que as crianças silenciassem para ouvir a aula. Chama-nos atenção a atuação da professora mediante uma situação em que realiza dado planejamento, mas as crianças chegam com outras demandas e conteúdos em sala (caso problematizador “c”). Nesse sentido, a professora mobiliza sua prática na intenção de fazer, mediante o uso de sua linguagem, que as crianças voltem sua atenção para ela.

Nessa perspectiva, é perceptível a mobilização do processo de comunicação que a professora tenta estabelecer com as crianças, no entanto, Charaudeau (2012, p.1) nos afirma que “Não se pode reduzir o ato da comunicação a uma relação simétrica entre um emissor e um receptor; é necessário analisar as condições em que os sujeitos falantes reconhecem este direito recíproco de falar e construir sentido, para que o ato de comunicação se realize”.

Partindo da concepção de Charaudeau e do fazer da professora (na situação já exposta), reconhecemos que nem sempre o ato de comunicação em sala de aula tem se dado no sentido de possibilitar que a criança tenha voz, integrando-o. Por outro lado, sabemos que formas diferentes também acontecem. Vejamos a fala de Maria Clara, sobre a mesma situação problematizadora.

Apesar da professora estar bastante preparada, a necessidade e o interesse da criança naquele momento não era o que ela tava propondo, mas sim a questão do circo. Então, era aquela questão: talvez se a professora desse um espaço para as crianças falarem, conversarem e também, se você olhar direitinho a situação se assemelha, fantoche,... E foi isso que fez elas realmente lembrar do circo. Elas viram fantoches, viram guloseimas, e tudo, e acho que isso remeteu o pensamento deles a se lembrar do circo. E,muitas vezes quando você tá fazendo leitura pra criança, elas se movimentam muito. Tem aquelas que ficam paradas concentradas ali, olhe não pisca nem o olho, olhando pra você! E, tem delas, que fica só se movimentando e você fica um pouco irritada com aquela criança: meu Deus que ele ainda não consegue se concentrar nas histórias! Mas, você tem que ver que tem crianças, que mesmo se movimentando e mesmo conversando, elas estão conscientes do que está acontecendo naquele momento. Você percebe que, principalmente com crianças, é uma forma dela dizer, dela expressar o que ela tá sentindo. Às vezes, o movimento dela é uma forma dela expressar que tá feliz! (Maria Clara, caso problematizador “c”, entrevista realizada em 12 de março de 2015).

Em seu discurso Maria Clara nos sugere que a professora poderia abrir um espaço para que as crianças pudessem expressar suas ideias e pensamentos, de forma interativa com ela. Segundo Maria Clara existem entre o plano de atividades e a questão do circo elementos semelhantes, dando-nos indícios de que isso tenha possibilitado as crianças construírem uma rede de sentidos e significados para o momento vivido, por meio do entrelaçamento das cenas (anterior à aula, visto que o circo chegou à comunidade e no momento da aula, com os fantoches, as guloseimas, e mais).

Maria Clara também se remeteu a situações em que histórias estão sendo contadas as crianças, fazendo observações sobre o modo que elas interagem com aquilo que está sendo dito. Nessa direção, a professora faz uso do saber da comunicação para construir um espaço de diálogo entre as crianças e os conhecimentos, administrando-os. Assim, as coisas ditas ganham sentido e significado para as crianças, e o comportamento demonstrado dar subsídios para perceber isso acontecer.

Desse modo, concordamos com Charaudeau (2012, p. 2) ao dizer que “Em uma situação de sala de aula, os parceiros contratam sua interação, de forma a construírem suas identidades, finalidades e papéis, para que os sentidos possam ser o resultado do ato de comunicação”. Logo, “O reconhecimento do “direito à palavra” e o reconhecimento da “identidade” do sujeito falante representam então as duas faces de uma mesma moeda, moeda de troca que circula entre os parceiros de um ato de comunicação” (2012, p. 2), e nesse caso, de um ato de comunicação entre a professora e as crianças.

Assim, o grupo de professoras entrevistadas mostra que mobilizam diversos saberes no processo de fazeres da prática pedagógica. Diante de sua prática, os professores produzem saberes que formam teias de dominação, que tornam saliente os resultados do poder dos discursos e das práticas. Dentre os saberes-fazeres produzidos encontramos os saberes ligados ao exercício profissional, aos baseados nas relações de poder, o lúdico, emocional, investigativo e de comunicação.

Ao mobilizar os saberes e fazeres na dimensão da prática pedagógica, as professoras engendram um movimento que integra e reelabora-os. Desse modo, pensamos que a condição de existência para prática está na necessidade que temos, enquanto sujeitos, de adentrar os espaços reais em que ela se produz por meio da ação e de maneira que os diferentes olhares que pairam sobre ela possam ser considerados.

À vista disso, para conhecer as práticas “[...] é preciso adentrar no seu âmago, e este precisa ser buscado nos diálogos com as representações elaboradas de cada sujeito” (FRANCO, 2012, p. 164), ou seja, as práticas não acontecem isoladas à ação dos sujeitos e, estes, por sua vez, não agem pautados unicamente em saberes científicos, mas também em saberes experienciais que são aprendidos por meio do exercício docente.