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3 “RENDA PRA QUEM PRODUZ E COMIDA NA MESA DE QUEM PRECISA”: AS POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO E SEGURANÇA ALIMENTAR E

3.2 O PNAE em Santo Amaro

O PNAE é responsável pela alimentação, durante o ano letivo, dos alunos das escolas de educação infantil e ensino fundamental da rede pública, e, também, de entidades filantrópicas e escolas indígenas, como forma de contemplar o direito constitucional à alimentação escolar, instituído na Constituição de 1988.

O PNAE tem caráter suplementar, como prevê o artigo 208, incisos IV e VII, da Constituição Federal, quando determina que o dever do Estado (ou seja, das três esferas governamentais: União, estados e municípios) com a educação é efetivado mediante a garantia de "educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até cinco anos de idade" (inciso IV) e "atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde" (inciso VII). (FNDE, 2015)

Como um dos maiores e mais antigos programas do governo federal , O PNAE, contempla a área de educação, atendendo cerca de 37,8 milhões de crianças, o que representa 21% da população brasileira, tendo como principal objetivo contribuir para uma melhor aprendizagem em sala de aula e na formação de bons hábitos alimentares, assim como suprir, no mínimo, 15% das necessidades nutricionais diárias dos alunos das creches, pré-escolas e escolas de ensino fundamental e 30% das necessidades dos

alunos das creches e escolas indígenas e remanescentes de quilombolas (FNDE, 2015). Atualmente, o PNAE está ligado ao Programa Fome Zero, que como afirmou-se, foi lançado no primeiro governo do então presidente Luis Inácio Lula da Silva, no dia 31/03/2002. A perspectiva desse programa é a promoção de políticas chamadas de estruturantes, que tenham o objetivo de se chegar a raiz do problema da fome e da pobreza, gerando emprego e renda.

O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) realiza a assistência financeira em caráter complementar, normatização, coordenação, acompanhamento, monitoramento e fiscalização da execução do programa, além da avaliação da sua efetividade e eficácia

O valor per capita repassado pela União é definido de acordo com a etapa e modalidade de ensino, creches: R$ 1,00; Pré-escola: R$ 0,50; Escolas indígenas e quilombolas: R$ 0,60; Ensino fundamental, médio e educação de jovens e adultos: R$ 0,30; Ensino integral: R$ 1,00; Alunos do Programa Mais Educação: R$ 0,90; Alunos que frequentam o Atendimento Educacional Especializado no contraturno: R$ 0,50. (FNDE, 2015)

Os recursos destinam-se à compra de alimentos pelas secretarias de Educação dos estados e do Distrito Federal e pelos municípios. O repasse é feito diretamente aos estados e municípios, com base no censo escolar realizado no ano anterior ao do atendimento.

O programa é acompanhado e fiscalizado diretamente pela sociedade, por meio dos Conselhos de Alimentação Escolar (CAEs), pelo FNDE, pelo Tribunal de Contas da União (TCU), pela Secretaria Federal de Controle Interno (SFCI) e pelo Ministério Público. Para 2016, o orçamento previsto é de R$ 3,8 bilhões destinado a 42,6 milhões de estudantes. Com a Lei nº 11.947, de 16/6/2009, 30% desse valor – ou seja, R$ 1,14 bilhão – deve ser investido na compra direta de produtos da agricultura familiar, medida que estimula o desenvolvimento econômico e sustentável das comunidades. (FNDE, 2015)

A partir dos dados do censo escolar de Santo Amaro observa-se uma redução de matrículas dos estudantes desde 2011, quando havia 15.258, em 2012 haviam 14.174 estudantes, em 2013, 13.617 estudantes e em 2014, 13.416. De acordo com o gestor municipal da educação, está ocorrendo uma evasão escolar além de um maior rigor no censo, esses dois fatores geraram esse impacto nos números de educandos no município.

Esse, por sua vez, atribui essa evasão às dificuldades de se encontrar emprego em Santo Amaro, afirmando que “O processo de educação sequenciada de emprego não existe atualmente, é muito comum que os estudantes tenham que se escolarizar e trabalhar ao mesmo tempo, e as oportunidades em Santo Amaro são muito poucas, apesar dos esforços para que as escolas não se esvaziem, o problema da evasão não é só um problema da Secretaria de Educação” (S.E., informações coletadas em campo, 2015).

Apesar dessa involução sistemática do número de matrículas, os investimentos na alimentação escolar não seguiram o mesmo padrão.No gráfico a seguir é possível ver a evolução dos investimentos do FNDE e executados pela prefeitura de Santo Amaro na alimentação escolar entre os anos de 2011 e 2015 e a parcela executada na compra da agricultura familiar (FNDE, 2015):

Figura 3: Evolução dos investimentos do PNAE em Santo Amaro, 2011 a 2014. Fonte: SILVA, J.G., 2015.

Ao visualizar os dados do gráfico deve-se buscar as razões pelas quais os investimentos apresentam variabilidade, além de tentar compreender os motivos pelos quais os 30% para compra da agricultura familiar não estão sendo executados, tendo compras apenas nos anos de 2012 e 2014, ambas realizadas em anos eleitorais, em âmbito municipal e Estadual/Federal, respectivamente.

Outro fator a ser levado em conta é o aumento do número de estudantes na educação integral, o que implica uma maior quantidade de refeições e consequentemente um maior repasse do FNDE ao município. Visto que, em 2011, haviam 3.566 (23,37%), em 2012 4.901 (34,58%), em 2013 3.171 (23,29%) e em 2014 3.626 (27,02%), estudantes matriculados na educação integral. Em 2013, o município fez adesão para oferecer educação em tempo integral em 40 escolas do ensino fundamental, sendo 27 com mais da metade dos seus alunos no Programa Bolsa Família.

Entre as justificativas apresentadas pelo gestor municipal da educação em Santo Amaro para a não utilização dos recursos do PNAE durante a compra de alimentos produzidos pela reforma agrária aparecem: a dificuldade de encontrar cooperativas e associações com aptidão para o fornecimento, ou seja, o grande número de endividamentos coletivos ou individuais dos agricultores/as é um dos principais entraves para essa política no município. Os agricultores apontam a burocracia para o acesso à política como um dos principais entraves.

Pode-se perceber que os problemas gerados pela falta de política de ATER e ATES, ou até mesmo, políticas não acertadas causaram problemas incomensuráveis para o processo produtivo dos pequenos agricultores. Assentados do Bela Vista relatam o momento em que se beneficiaram do PRONAF, no qual o técnico indicou a produção de abacaxis, no qual tiveram divergências em relação às orientações do técnico da ATER:

A gente achou estranho, ele mandou plantar abacaxi, a gente sabia que aqui abacaxi não dava, a terra é grossa e argilosa, além de chover muito, mas ele é mais estudado né? Aí falou que era pra gente usar o benefício comprando as mudas, foram mais de 6 mil mudas, e se deu muito, foram 3 abacaxis, azedos igual o diabo, eu guardei pra cortar e ele comer, mas ele num voltou mais aqui não, e a gente ficou no prejuízo. (CARDOSO, Entrevista concedida em campo, 2015)

Essa orientação técnica deficitária custou caro aos assentados, que por muito tempo não puderam mais acessar outro benefício, e tiveram grandes dificuldades para regularizar a DAP e reorganizar a associação.

Em pesquisa nacional realizada em 2010, gestores municipais em todo o Brasil foram entrevistados, e apresentaram diversos motivos para não conseguirem executar os 30% dos recursos do PNAE na compra dos produtos junto a agricultura familiar local, a tabela 2 mostra que a maioria dos gestores dos estados do nordeste apresentam a não

emissão da nota fiscal e o fornecimento irregular dos gêneros alimentícios como as principais dificuldades. Esses dois problemas são expressão do endividamento e da não regularização das associações e cooperativas.

Em campo, consegue-se visualizar alguns outros problemas, apresentados pelos agricultores, entre eles a inadimplência e a burocracia, que exige uma alta organização dos trabalhadores/as, além de assistência, que muitas vezes não é realizada pelo poder público e grupos da universidade ou ONG´s acabam apresentando uma alternativa, insuficiente para essas demandas.

Tabela 3. Justificativa para a não execução dos 30% dos recursos na compra dos produtos da Agricultura Familiar – Brasil e Regiões, FNDE, 2010.

Justificativa

Regiões brasileiras

Centro-Oeste Nordeste Norte Sudeste Sul Brasil

n n n n n n

Não emissão de nota fiscal 9 34 9 22 7 81

Fornecimento irregular e

inconstante de gêneros 46 194 59 103 68 470

Condições higiênico- sanitárias

inadequadas 5 17 9 8 16 55

Outros 96 222 76 238 101 733

Processo singular 3 11 6 14 4 38

Não Informou 81 297 90 172 164 804

Não se aplica 20 81 22 45 165 333

Fonte: CECANE, UNB, 2010.

Apresentadas essas questões, será dado no capítulo seguinte uma atenção às implicações dessa política nos assentamentos estudados, que conseguiram ter acesso ao benefício nos anos de 2012 e 2014, a partir da associação dos pequenos agricultores do PA Eldorado do Pitinga, que por muito tempo esteve com pendências, mas conseguiu se regularizar em 2011, para concorrer a diversos editais.