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4.3.1 Definição do objetivo e do âmbito 4.3.1.1 Objetivo

Os principais objectivos deste estudo são identificar os aspectos ambientais mais relevantes na produção de conservas de sardinha em azeite e em óleo de girassol, fabricadas em Portugal; avaliar os respectivos potenciais impactes ambientais; e propor oportunidades de melhoria no desempenho ambiental do respetivo processo.

4.3.1.2 Unidade Funcional

A unidade funcional adotada é 1 kg (peso líquido) de sardinha em conserva em lata de alumínio à porta da indústria conserveira. Considerou-se a produção de latas de conserva com a capacidade para 125 g de produto (peso líquido), que inclui 90 g de sardinha (peso escorrido) e 35 g de conservante (azeite ou óleo de girassol).

4.3.1.3 Descrição do sistema produtivo e fronteiras do sistema

O diagrama ilustrado na figura 4.7 demonstra esquematicamente as fases de ciclo de vida da produção de sardinha em conserva e os processos incluídos no sistema de

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% AC EAD AM AT

Produção de água da rede Produção de cartão

Produção de filme estirável Produção de amoníaco Emissões da fábrica Produção de eletricidade

ACV da sardinha

produto considerado na avaliação do perfil ambiental. Neste estudo foi assumida uma análise desde o berço até à porta da fábrica conserveira (“cradle-to-gate”), sendo por isso o sistema dividido em dois subsistemas principais: pesca (SP) e processamento

(SPC).

Figura 4.7 - Fronteiras do sistema de produção de sardinha em conserva.

Subsistema Pesca (SP): Este subsistema inclui as operações de captura e descarga da

sardinha no porto para obtenção da sardinha fresca, a principal matéria-prima das conservas de sardinha. A descrição e respectiva ACV deste subsistema encontram-se na subseção anterior (ver 4.1).

Subsistema processamento (SPC): Este subsistema engloba todos os fluxos de

entradas e saídas ambientalmente relevantes associados ao processo produtivo de conservas na indústria transformadora, desde a receção das sardinhas frescas até expedição das conservas, incluindo o transporte das matérias-primas.

A sardinha recepcionada na unidade fabril é armazenada numa câmara de conservação de frescos. No processo de laboração as sardinhas são manualmente desencabeçadas e colocadas numa grelha, sendo depois levadas a cozer em fornos próprios. Após a cozedura passam por um período de descanso para arrefecimento, normalmente de um

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dia para o outro. Após esse período, estas são novamente aparadas e colocadas nas latas de alumínio, onde vão receber os respectivos molhos e temperos (por exemplo, óleo de girassol ou azeite, sal), seguindo-se a cravação. Assim que as embalagens são seladas hermeticamente (cravadas) caem por gravidade num transportador que as conduz a uma lavadora/recuperadora de óleo e posteriormente para os carros de esterilização. Estes carros, depois de cheios, são colocados em autoclaves, onde se efectua a esterilização do produto. A esterilização é o tratamento térmico que tem por objectivo tornar as conservas estáveis à temperatura ambiente durante largos períodos de tempo. Durante a esterilização, as latas são submetidas a uma pressão e temperaturas elevadas, durante um período prolongado, seguindo-se o arrefecimento rápido das latas.Por fim, procede-se ao embalamento final e expedição.

Similarmente a outras indústrias de processamento de alimentos, os principais aspetos ambientais associados às atividades de processamento de peixe incluído neste subsistema são o consumo de energia e a produção efluentes e resíduos sólidos com elevado teor orgânico, assim como o consumo de conservantes (por exemplo azeite) e de embalagens primárias, secundárias e terciárias.

O elevado consumo de energia está relacionado com a tecnologia de processamento, nomeadamente, no forno de cozimento, equipamento de esterilização e cravagem. No sistema de produto sob análise, à exceção da autoclave para esterilização das conservas, que utiliza nafta como combustível, é utilizada eletricidade em todos os processos.

Durante o processamento da sardinha cerca de 20% da matéria-prima (sardinha fresca) é desperdiçada (nomeadamente as cabeças e as vísceras, peixes partidos ou não apropriados à conserva), sendo estes resíduos orgânicos destinados a industrias especializadas para transformação de subprodutos, geralmente em farinhas de peixe ou óleo de peixe.

O consumo de óleo de girassol ou de azeite usado na conserva de sardinha é também incluído no sistema; contudo, o consumo de outros temperos não é considerado por falta de informação.

ACV da sardinha

As embalagens primárias consideradas são latas de alumínio do tipo ¼ club (as mais produzidas), cujo peso médio é de 18 g e embalam 125 g de produto. Como embalagens primárias são ainda usadas cartonetes a envolver a embalagem de alumínio, cujo peso é aproximadamente 9 g. Para facilitar a expedição e o transporte dos produtos são utilizadas, como embalagens secundárias e terciárias, caixas de cartão, paletes e filme estirável. A produção de todas estas tipologias de embalagem foi considerada neste estudo.

A produção de água da rede e consequentemente as águas residuais, tratadas em ETAR municipal, assim como os agentes de limpeza usados na indústria para a lavagem e desinfecção dos equipamentos e instalações, foram excluídos das fronteiras do sistema pela falta de dados. Os bens de capital, nomeadamente as infraestruturas e equipamentos/máquinas também não foram incluídos.

4.3.1.4 Metodologia de avaliação de impactes

Entre as etapas definidas na fase de análise de inventário de ciclo de vida (AICV) da metodologia de ACV, apenas as etapas de classificação e caracterização foram realizadas neste estudo. As etapas de normalização e ponderação não foram efectuadas, dado que são opcionais e não forneceriam informação robusta adicional para os objetivos estabelecidos neste estudo. A quantificação dos impactes ambientais foi obtida segundo os factores de caracterização admitidos na metodologia de avaliação de impactes midpoint ReCiPe 2008 (Goedkopp et al., 2009), sendo seleccionadas as seguintes categorias de impacte ambiental: alterações climáticas (AC), eutrofização de água doce (EAD), eutrofização marinha (EM) e acidificação terrestre (AT). O software GaBi 6,0 foi utilizado para a implementação computacional dos inventários (PE International, 2014).

4.3.1.5 Alocação

Similarmente aos subsistemas anteriormente descritos no presente relatório, o sistema de produto da sardinha em conserva é multifuncional, pois os desperdícios de peixe resultantes do processo podem ser considerados subproduto, uma vez que, são usados como matéria-prima em indústrias de transformação de subprodutos de origem animal. No entanto, uma vez que estes desperdícios não representam valor

ACV da sardinha

económico para a indústria de pescado, o subsequente processo de transformação é excluído das fronteiras do sistema e os impactes ambientais são alocados na totalidade à sardinha em conserva.

4.3.2 Análise de Inventário de Ciclo de Vida

Os dados referentes aos processos de primeiro plano do sistema em estudo, utilizados na elaboração do ICV (tabela 4.7), são dados primários. Estes dados foram recolhidos numa indústria conserveira, cuja produção é caracterizada pelo método tradicional, consumindo unicamente peixe fresco capturado diariamente na costa portuguesa. No ano 2012, a produção da indústria supra referida representou 22,6% da produção nacional de conservas de sardinha (INE, 2014).

As emissões resultantes da combustão da nafta consumida na unidade industrial foram calculadas com base no “EMEP Corinair Emission Inventory Guidebook” de 2013 e no “IPCC Guidelines for National Greenhouse Gas Inventories” de 2006.

Quanto à informação referente aos processos de segundo plano, esta é secundária, sendo os dados obtidos de bases de dados da bibliografia. Os processos associados à produção de gasóleo, nafta, electricidade e materiais de embalagem foram obtidos da base de dados Ecoinvent (Althaus et al., 2009) e da base de dados do GaBi (PE International, 2014). Os processos de produção dos conservantes - azeite ou óleo de girassol – são baseados no estudo de ACV destes produtos, elaborado no âmbito deste projeto. Para os conservantes, foram consideradas as fases de cultivo, colheita e transformação, mas excluída a fase de embalamento, dado que estas matérias-primas são transportadas para a indústria conserveira em depósitos de 1000 L, os quais são reutilizáveis.

ACV da sardinha

Tabela 4.6 - Inventário de ciclo de vida do subsistema processamento (SPC), expresso pela UF.

Fluxo Unidade Valor

Entradas da tecnosfera

Materiais e Energia

Sardinha fresca kg 0,900 Óleo de girassol ou azeite kg 0,280

Nafta g 0,031 Eletricidade kWh 0,049 Alumínio kg 0,117 Cartonetes g 72,0 Caixas de cartão g 9,64 Paletes g 0,003

Saídas para a tecnosfera

Produtos

Sardinha em conserva kg 1,00

Subprodutos

Peixe rejeitado g 225

Saídas para o ambiente

Emissões para a atmosfera

CO2 g 101 CH4 mg 0,825 N2O g 0,706 NOX g 0,091 CO g 0,034 COVNM g 0,065 PM10 g 0,028

Por fim, os transportes das matérias-primas até à unidade fabril de processamento da sardinha, considerados neste estudo, são apresentados na tabela 4.8.

Tabela 4.7 – Perfil dos transportes considerados no subsistema processamento (SPC).

Matéria transportada Tipo de veículo Distância considerada Qualidade dos dados Sardinha Camião 7,5 toneladas (Euro 5) 6,1 km Dado real

Azeite Camião 16-32 toneladas (Euro 5) 771 km Dado real Óleo de girassol Camião 7,5 toneladas (Euro 5) 329 km Dado real Latas de alumínio Camião 7,5 toneladas (Euro 5) 267,5 km Dado real Cartonetes e cartões Camião 7,5 toneladas (Euro 5) 30 km Dado real Europaletes Camião 7,5 toneladas (Euro 5) 10 km Dado real Filmes plásticos Camião 7,5 toneladas (Euro 5) 30 km Dado estimado

4.3.3 Avaliação dos impactes ambientais e interpretação dos resultados

Os resultados da Avaliação de Ciclo de Vida da sardinha em conserva são apresentados na tabela 4.9, quantificados em função da unidade funcional adotada no estudo - 1 kg

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de sardinha em conserva (peso líquido) à porta da indústria conserveira. Os resultados absolutos são apresentados para a sardinha em conserva de azeite e em conserva de óleo, produzida com sardinha capturada em 2011 e em 2012. Da análise destes resultados pode constatar-se que o impacte ambiental da sardinha em conserva, por exemplo para a categoria CC, varia entre 1,72 e 1,99 kg de CO2 equivalente por kg de

sardinha em conserva. Pode concluir-se que as maiores variações nos resultados obtidos devem-se mais ao conservante utilizado do que ao ano de captura da sardinha, pelo que o impacte ambiental da conserva em azeite apresenta valores mais elevados em todas as categorias analisadas, à exceção da EAD. De salientar que nas categorias de impacte EM e AT o impacte ambiental da sardinha em conserva em azeite é mais do dobro do impacte da conserva em óleo de girassol. Em contrapartida, na categoria EAD o impacte da conserva em azeite é aproximadamente 20 % mais reduzido.

Tabela 4.8 – Resultados da avaliação de impactes associados ao sistema produção de sardinha em conserva, expressos pela UF.

Categoria de impacte Unidade 2011 2012 Conserva em azeite Conserva em óleo de girassol Conserva em azeite Conserva em óleo de girassol Alterações Climáticas (AC) kg CO2 equivalente 1,88 1,72 1,99 1,84

Eutrofização de água doce (EAD) g P equivalente 0,499 0,616 0,502 0,619 Eutrofização marinha (EM) g N equivalente 9,77 3,61 9,78 3,62 Acidificação terrestre (AT) g SO2 equivalente 18,04 8,16 18,3 8,40

Como se verifica na figura 4.8, que mostra a contribuição dos dois subsistemas, o processamento da sardinha para a produção de conservas (SPC) é o subsistema que mais

contribui para o impacte total do produto, em todas as categorias analisadas, variando entre 57% e 99%.

ACV da sardinha

Figura 4.8 - Contribuição relativa dos subsistemas: peca (SP) e processamento (SPC).

Assim, é analisado com maior pormenor o SPC e a contribuição dos processos/atividades

associados a este subsistema (figura 4.9). Pela análise desta, pode concluir-se que a produção de latas de alumínio e de conservantes, quer de azeite, quer de óleo de girassol, são dominantes no impacte ambiental resultante deste subsistema (SPC).

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

AC EAD EM AT AC EAD AM AT AC EAD EM AT AC EAD AM AT

2011 2012 2011 2012

Conserva em azeite Conserva em óleo de girassol SPC: Processamento (conservas) SP: Pesca

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% AC EAD EM AT

Conserva em óleo de girassol

Óleo de girassol Paletes

Cartão Cartonete Alumínio Nafta 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% AC EAD EM AT Conserva em azeite Azeite

Figura 4.9 - Contribuição relativa dos processos/atividades incluídos no subsistema processamento de sardinha em conserva (SPC) de: a) azeite; b) óleo de girassol.

ACV da sardinha

Na categoria AC, a produção de embalagens alumínio é o que mais contribui para o impacte total, variando entre 42% e 46%, dependendo do conservante usado. Esta contribuição resulta das elevadas necessidades energéticas requeridas para a extracção das matérias-primas e transformação do produto (alumínio). Noutros estudos de ACV de peixe e mariscos em conserva, são obtidos resultados similares. Quer no estudo de Almeida et al. (2015) quer no estudo de Vázquez-Rowe et al. (2014), em que ambos analisam a sardinha em conserva em embalagem de alumínio, a contribuição da produção das embalagens é dominante na emissão total dos GEE. Para além destes, em estudos que analisam outros peixes ou mariscos em embalagem de alumínio, identificam as embalagens primárias como foco para as oportunidades de melhoria ao nível ambiental (Iribarren et al., 2010; Hospido et al., 2006; Lokke e Thrane, 2008). As segundas maiores contribuições são a produção de conservante, 35 % no caso do azeite e 29% no caso do óleo de girassol, seguindo-se a produção de cartonetes, a produção de nafta e as emissões da indústria (combustão da nafta), cujas cargas ambientais de cada processo representam uma contribuição relativamente menor (6%). À excepção da categoria EM, nas restantes categorias analisadas as contribuições de cada processo/atividade seguem a mesma tendência. Na EM mais de 9 % dos impactes tem origem na produção do conservante utilizado.

A elevada importância dos conservantes (azeite ou óleo de girassol) nas categorias analisadas deve-se principalmente às fases de cultivo e colheita. Durante os cultivos são aplicados vários fertilizantes e pesticidas e são realizadas muitas operações mecanicamente, nomeadamente o semeio, irrigação, aplicação de fertilizantes, colheita, entre outros, que requerem energia, contribuindo assim para emissões para a água e solo.

Conclusões

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