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2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2.2. A CARTOGRAFIA NAS PESQUISAS AMBIENTAIS

2.2.2. SEMIOLOGIA GRÁFICA

A semiologia gráfica, ciência que estuda os signos e seus significados, auxilia a cartografia, principalmente a temática. Os mapas tornam-se mais legíveis, ou seja, transmitem melhor as informações e os processos geográficos, tanto para uma criança quanto para um adulto.

A Semiologia Gráfica começou a ser sistematizada no Laboratoire de Graphique de

École des Hautes Études en Sciences Sociales, de Paris. Bertin (1967a) foi o

primeiro a lançar as bases de uma estrutura da linguagem gráfica, que transforma mapas para “ler” em mapas para “ver”. A sistematização da semiologia completou 30 anos e recentemente foram publicados com o Boletim do Comitê Francês de Cartografia e na CYBERGEO23 artigos sobre as idéias de BERTIN. Os autores que

participaram do colóquio concluíram que a Semiologia Gráfica persiste e é a base das novas teorias da comunicação em cartografia que surgem hoje.

A importância do conjunto da obra de Jacques Bertin desde 1965 até os dias atuais foi abordada por Bonin (1997, s.p), evidenciando dados de venda e de países, onde se traduziu a sua obra:

La “Sémiologie graphique” a été traduite en allemand, en anglais, et vendue à 10.000 exemplaires en français ; “La graphique et le traitement graphique de l’information” a été traduite en allemand, en anglais, en espagnol, en japonais, en portugais ; l’ “Initiation à la graphique” et “La graphique dans la presse”, parue en 1989, sont épuisées.

BONIN (1997) dividiu o desenvolvimento da semiologia gráfica em 4 fases principais:

De 1957-1967: années de réflexion et de gestation jusqu’à la parution de la Sémiologie Graphique;

De 1968-1985: la mise en place des traitements graphiques, et la mise en pratique des constructions graphiques;

De 1985-1995: le développement de techniques nouvelles, parallèles;

Depois 1995: L’espoir d’un renouveau ?.

Ao pesquisar sobre a semiologia gráfica, principalmente a dos anos de 1957 a 1985, Cardoso (1984) constatou que, através dela, constrói-se uma imagem viva, operacional, deixando de lado o estético, o ilustrativo e o figurativo. O gráfico, que significa qualquer tipo de representação, jamais é admitido como mera ilustração, e deve, acima de tudo, ser um instrumento de trabalho do autor. Para que os gráficos

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atendam à semiologia gráfica, é necessário obedecer às propriedades específicas da percepção visual, utilizando o conjunto de princípios e de instrumentos de representação gráfica e de tratamento de dados, como as variáveis visuais. Assim, o objetivo desses gráficos é revelar as relações verossímeis existentes entre os dados da informação e o mapa que se constrói. Bonin (1997) conceitua “... La graphique

est un système de signes qui permet de transcrire les relations de différence, d’ordre ou de proportionnalité existant entre des données qualitatives ou quantitatives”.

Os dados apresentados sob forma de mapas, que não são códigos, podem ser vistos, conforme Martinelli (1995), sob os aspectos de dois paradigmas, o sistêmico e o semiológico:

O Paradigma sistêmico ou funcionalista tem por base a teoria matemática da comunicação (WEAVER; SHANNON, 1949), a qual é expressa pelo esquema Emissor-Código-Receptor, e se preocupa com a avaliação das perdas ao longo dos circuitos de comunicação, bem como a forma de minimizá-las. As imagens figurativas, vistas pela fotografia, pintura e publicidade, são exemplos dessa comunicação. Essa corrente teórica é intitulada Comunicação Cartográfica. Entretanto, Salichtchev (1978) contesta tal posição, afirmando que não há apenas perdas, existem também ganhos, podendo se evidenciar, assim, o valor cognitivo dos mapas.

O Paradigma Semiológico (monossêmico-estruturalista), associa a cartografia à linguagem. O mapa é uma modalidade de se explorar visualmente o plano bidimensional, que pertence ao domínio da Representação Gráfica. “... A

transcrição será universal, sem ambigüidades, como nas equações matemáticas”

(MARTINELLI, 1994, p.64). No paradigma semiológico, o emissor e o receptor se colocam como atores conscientes do mesmo problema diante das três relações fundamentais entre objetos evidenciadas por Bertin (1967): diferença, transcrita por uma diferença visual; ordem, transcrita por uma ordem visual; e proporção que será transcrita por uma proporção visual.

Segundo Santos (1995, p. 307), “... a construção de representações gráficas

consiste num processo específico de comunicação ou de transmissão de uma informação, por intermédio de uma mensagem”.

Os elementos básicos do processo, segundo essa autora, são:

O emissor [...] designado o responsável pela transmissão da informação, que no processo de comunicação em questão, desempenha os papéis de seletor, descodificador e recodificador. O emissor é um elemento, que conhece e seleciona, no interior dos códigos que intervêm no processo de comunicação, os sinais que permitem a descodificação e/ou a construção da mensagem.

Os códigos ou sistemas semiológicos, [...] que compreendem sinais específicos e um conjunto de regras de combinações próprias a esses sistemas de sinais. Num esquema de transcrição gráfica de uma informação, os códigos correspondem às línguas naturais (idiomas, de modo geral), relacionadas ao modo de comunicação verbal, e às línguas matemático-estatísticas e cartográficas, referentes, respectivamente, ao modo de comunicação numérico e visuo- espacial;

As mensagens, [...] designando seqüências de sinais, construídas a partir de regras de um código, que recebem uma certa forma, variável conforme a natureza do sistema de comunicação e do código. As mensagens que são construídas e/ou descodificadas ao longo do processo enfocado são, de modo geral, mensagens verbais (textos discursivos, esquemas, etc.), mensagens matemático-estatísticas (quadros, tabelas), mensagens visuo-espaciais (gráficos e mapas).

O receptor, [...] que nomeia o destinatário propriamente dito da mensagem. Num processo de transcrição gráfica de uma informação, o receptor é o destinatário das mensagens visuo- espaciais elaboradas.

A representação gráfica da informação, por meio de mapas, é transcrita, com base na relação entre objetos, por meio das variáveis visuais, utilizando-se dos três níveis de organização existentes, o quantitativo, o ordenado e o qualitativo

(associativo/seletivo). Esses níveis de organização trazem consigo o significado do

componente, que é a tipologia da informação mapeada. Para Bertin (1967), a variável visual é a mais importante característica Semiológica, pois é a melhor

maneira de transmitir a informação geográfica em cada nível de organização24 como

exemplificados abaixo:

1. O nível quantitativo expressa quantidades, constituindo-se, pois, por série de dados. Por exemplo: “pessoas residentes em uma cidade, variável idade” (CASTRO, 2000a).

2. O nível ordenado representa uma ordem universal, como por exemplo, os dias da semana, meses do ano, hierarquia, tamanho (grande, médio, pequeno), tonalidade (claro, pardo, escuro), latitude e longitude.

3. O nível qualitativo é subdividido entre o associativo (que associa) e o seletivo (que difere). Por exemplo: “moradores de uma cidade, variável: cor dos olhos

(pretos, castanhos, azuis, etc.); ou, peças produzidas por uma máquina, variável: qualidade (perfeita ou defeituosa)” (CASTRO, 2000a).

Para BERTIN (1967a) tudo que é quantitativo é ordenado, mas nem tudo o que é ordenado é quantitativo. Além disso, tudo o que é ordenado é seletivo, mas nem tudo o que é seletivo é ordenado. Por exemplo: número de pessoas residentes em uma cidade (1; 100; 10.000 mil hab.) é quantitativo e ordenado; mas os meses do ano são ordenados e não quantitativos. No nível ordenado, no componente tamanho, o grande é seletivo e ordenado em relação ao médio, mas as cores dos olhos (preta, castanha, azul), componentes seletivos não são ordenadas.

As variáveis visuais, que representam essa relação descrita anteriormente, são apresentadas no Quadro 01 por

(a) Tamanho (pequeno, médio, grande);

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BERTIN, J. A. A Neográfica e o tratamento gráfico de informação. Curitiba: UFPR, 1986. 273 p. ______. Ver ou ler. AGB, Seleção de texto, São Paulo, nº 18, p. 45-62, 1988.

______. O teste de base da representação gráfica. Revista Brasileira de Geografia, Rio de janeiro, v.42, n. 1. p.160-182 jan./mar., 1980.

(b) Valor é o valor visual, a intensidade; vai do claro para o escuro, e expressa a mesma proporção de preto e de branco;

(c) Granulação, textura que varia da mais fina à mais grosseira, sem alterar sua intensidade visual;

(d) Cor, Variação de cor, vermelha, amarela, azul;

(e) Orientação, a figura geométrica pode dispor-se horizontal, vertical ou obliquamente; e

(f) Forma, a figura geométrica pode modular sua forma: passar para um círculo ou para um polígono estrelado.

QUADRO 1 – PROPRIEDADES DOS NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO, MODOS DE IMPLANTAÇÃO E VARIÁVEIS VISUAIS

Variáveis Visuais Tamanho Granulação Valor Intensidade Orientação Cor Forma Propriedades

Nível de Organização Modo de Implantação

Pontual Linear Zonal

Fonte: MOURA (1993b)

A distribuição espacial de uma informação contínua ou discreta é realizada por intermédio das variáveis visuais.

Uma variável contínua

[...] é aquela que teoricamente, pode assumir qualquer valor num intervalo razoável de variação, sendo representadas através de cartogramas isopléticos, já a variável discreta é aquela que pode assumir apenas valores pertencentes a um conjunto enumerável, sendo representadas através de cartogramas coropléticos (CASTRO, 2000a, p. 64).

Os Cartogramas isopléticos, produzidos com variáveis contínuas, são construídos por linhas, ou isarítimas numeradas em função do fenômeno. Neles “... uma brusca

variação do fenômeno, em um pequeno espaço, é dada pela proximidade das linhas, enquanto que os distanciamentos maiores mostram uma suavidade na mudança”

(MANTELLI; SANCHEZ, 1990, p. 56). Um exemplo desse cartograma é o de curvas de nível, as quais podem extrapolar os limites políticos ou referir-se somente a um espaço específico.

Cartogramas coropléticos, produzidos com variáveis discretas “... são construídos

fundamentalmente para mostrar quantidades ou qualquer outro tipo de informação relacionada com a superfície onde elas ocorrem” (MANTELLI; SANCHEZ, 1990,

p.27) e por isso, esse tipo de cartograma limita-se a espaços definidos, como, por exemplo, um município, “devido à distribuição descontínua no espaço a

informação sócio-econômica é discretizada e generalizada ao município” (CASTRO,

2000a).

O cartograma consiste em uma das formas de apresentação das variáveis visuais, que segundo Sanchez (1973, p. 33), significa

um tipo de representação que se preocupa menos com os limites exatos e precisos, bem como das coordenadas geográficas, para se preocupar mais com as informações que serão objeto da distribuição espacial no interior do mapa. Dessas considerações pode-se concluir que o ideal sempre será a elaboração de cartogramas baseados em mapas. Como os mapas resultam de levantamentos precisos, fornecerão o

substratum ideal para o lançamento das informações, das

quais estamos interessados em verificar o comportamento espacial.

De uma forma complementar Mantelli; Sanchez (1990, p. 27) assim definiram cartogramas:

representações de itens geográficos mensuráveis qualitativa ou quantitativamente, que têm, sobre as outras espécies de representações gráficas, a vantagem de informar sobre o local de ocorrência dos dados e informações trabalhadas.

Cada parte da informação pode ser chamada de componente. De acordo com Bertin (1967a, p.44), citado por Le Sann (1983, p. 9),

A informação transmitida por um componente pode se referir a uma localização precisa, a um limite ou percurso, ou ainda a uma superfície. Essas três maneiras de colocar a informação no plano da folha de papel representam três modos de implantação, o pontual, o linear e o zonal.

O componente tem características, como comprimento (o número de suas subdivisões) e extensão, que é a relação entre o número maior e o menor da série quantitativa considerada. Segundo Cardoso (1984, p.40), quando “... constrói-se um

gráfico, representam-se os componentes, que são elementos variáveis da informação”.

Essas informações (FIGURA 09), de acordo com Castro (2000b, p. 63),

possuem referências bidimensionais no espaço (x,y), com localizações sistematizadas segundo pares de coordenadas geográficas (lat./long.) ou sistemas de coordenadas planas (UTM, por exemplo); a informação ou o tema (z) constitui a variação da terceira dimensão.

FIGURA 9 – REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DAS INFORMAÇÕES ESPACIAIS

Tema representado por: Ponto Linha Zona Variáveis Visuais: Tamanho Forma Valor Granulação Cor Orientação

Onde ? (X,Y), Carta Topográfic a O que ? (Qualitativo)

Em que ordem ? (Ordenado) Quanto ? (Quantitativo) Lo ng itu d e X Z Y La titud e Fonte: CASTRO (1996)

As informações (Z) podem ser representadas, no plano geográfico, por meio de quatro tipos de escalas: nominal, ordinal, intervalar e razão, culminando na transcrição dos componentes através dos símbolos cartográficos. O QUADRO 02 representa as informações geográficas e trata das relações fundamentais da informação espacial, das variáveis visuais, do tema e do modo de implantação.

QUADRO 2 – ESCALAS DE MENSURAÇÃO E OS SÍMBOLOS DE REPRESENTAÇÃO ESCALAS DE MENSURAÇÃO SÍMBOLOS CARTOGRÁFICOS PONTO NOMINAL ORDINAL INTERVALO RAZÃO LINHA ÁREA Pequena -

- cidadepopulação - - riosrodovias

-

- rede de drenegemrede viária

-

- temperatura médiaponto cotado

- - isoietasfluxos

- aglomerações

- zonas climáticas

- ano de implantação da soja

- hipsometria - latitude/longitude - área proporcional de população - uso do solo Média Grande Rodovia sem pavimentação Rodovia pavimentada Autoestrada fria temperada quente A A B B 20 21 1970 1980 1999 1990 22 23 21 D D C C 2040 60

Fonte: CASTRO (2000a. p. 66)

A escala nominal é uma mensuração essencialmente qualitativa e usada muitas vezes como simples processo classificatório (SANCHEZ, 1973). Segundo Gerardi; Silva (1981, p.22), “... ela é simplesmente um recurso para se classificar e rotular ou

dar nomes a objetos ou conjuntos de objetos ao invés de uma forma específica de medir atributos de objetos”.

A escala ordinal é utilizada quando os fenômenos ou observações são passíveis de serem arranjados segundo uma ordenação, isto é, segundo algum critério, tal como grandeza, preferência, importância ou distância. A escala de intervalo refere-se a

um nível de mensuração em que a escala tem todas as características de uma escala ordinal, mas os intervalos entre os valores são conhecidos exatamente e assim cada observação pode receber um valor numérico preciso. A escala de razão é a mais precisa de todas e refere-se a um nível de mensuração em que a escala tem todas as características de uma escala de intervalo, acrescendo que o ponto zero é uma origem verdadeira, ou seja, o zero indica a ausência do fenômeno ou atributo (GERARDI; SILVA, 1981, p. 25,26).