• Nenhum resultado encontrado

5

SENTIDOS

DA

FORMAÇÃO

NAS

NARRATIVAS

DA

PROFESSORA-EDUCADORA-MONITORA

DO

CAMPO

NA

PROFISSIONALIZAÇÃO DOCENTE

Em nossas caminhadas de vida e profissão na Educação do Campo, sobretudo, a partir do trabalho junto ao Movimento de Educação Promocional do Espírito Santo (MEPES), como professora-monitora e como coordenadora dos processos formativos, fomos ao longo desses anos inquietados por muitas interrogações que se presentificavam e ainda se presentificam no dia a dia do trabalho, entre elas, por duas questões reconhecidamente diferentes, mas entrelaçadas: a Formação e a Profissionalização Docente. Movidos por esta inquietação, como expresso no início e ao longo deste estudo, sentimo-nos desafiados a pensar acerca e a empreender um diálogo com nossos pares na perspectiva de refletir o que é a profissão docente no campo e que sentidos são produzidos nos processos formativos na perspectiva da profissionalização. Nessa empreitada, tomamos como narradores de suas histórias de vida uma Professora de escola Multisseriada, uma Monitora de Escola Família Agrícola e uma Educadora de Escola do MST que realizaram a Especialização em Educação do Campo, nos anos de 2009 e 2010, esta compreendida por nós como um significativo processo formativo que foi construído, como vimos no capitulo anterior, a partir dos diferentes coletivos humanos (ARROYO, 2012) e suas especificidades como contribuintes deste processo, traduzindo-se nesta oportunidade de estudo como práticas educativas do campo que em suas singularidades nos revelam a riqueza de seus saberes e fazeres, o que por sua vez nos motivou a buscar nas histórias de vida dos sujeitos esse diálogo. O trabalho com histórias de vida tem se mostrado nos últimos anos como um importante movimento que, segundo Nóvoa (1992, p. 18), coloca-nos perante uma “mutação cultural, que pouco a pouco, faz reaparecer os sujeitos face às

estruturas e aos sistemas, a qualidade face a quantidade, a vivência face ao instituído”. Nesse sentido, nossa proposta aqui é uma tentativa de despir-nos dos aprioris e escutar as histórias de vida e profissão docente no campo como possibilidades de diálogo e reflexão acerca da formação e do trabalho docente. No diálogo proposto, a partir das histórias de vida, a formação e a profissão docente no campo, colocam-se como interlocutoras de um projeto, ou como define Josso (2004) “a serviço de um projeto”. Ou seja, a partir das histórias narradas passa a existir uma interlocução com a perspectiva definida pelo projeto no qual elas se inserem, aqui em especial a formação e a profissionalização docente, sem abarcar a globalidade da vida, em todas as suas dimensões ou aspectos, sejam eles passados ou presentes. O que entra em cena são as histórias de vida e profissão atravessadas, é claro, por outros momentos vividos e com especial sentido e que se entrelaçam neste projeto, fazendo da narrativa uma inscrição de lugares referenciais de sentido que articulam-se com as relações pessoais, sociais, familiares, de pertença e de “busca de si e de nós”, “busca de conhecimento” “busca de sentido” e “busca de felicidade” (JOSSO, 2004).

Destarte, na escuta das narrativas não nos cabe validar ou refutar palavras ou sentidos expressos. A dinâmica ora empreendida encontra fertilidade ao congregar, entrelaçar sentidos diversos, o que por sua vez, nos possibilita interrogar sobre as escolhas do narrado e a serviço do projeto que temos, estabelecer um diálogo que problematize, contribua, suscite outras interrogações e também traga proposições acerca da formação e profissão docente no campo.

Os estudos de Souza (2004) sobre Narrativas do Itinerário Escolar e Formação de Professores, nos trouxe ainda a relevância do trabalho com histórias de vida no processo autoformativo do narrador.

Centrar força na história pessoal, sem ser personalista, fortalece a ideia de que as representações sobre as experiências formadoras e as aprendizagens experienciais revelam-se como fecundas para que o sujeito em formação perceba e relacione suas recordações-referencias com as práticas vividas em suas trajetórias de escolarização (SOUZA, 2004, p. 219).

Nessa perspectiva, portanto, o trabalho com histórias de vida é aqui compreendido também como um movimento para além da pesquisa. Trata-se de um momento autoformativo dos próprios sujeitos que ao narrarem sua vida e profissão aprendem com esse processo dialógico e reflexivo.

Outrossim, buscamos também na escuta das histórias de vida de nossos sujeitos professor-monitor-educador do campo, um diálogo com os sentidos (VIGOTSKI, 1934-2005) produzidos a partir da realização da Especialização em Educação do Campo e de suas interfaces com a Profissão Docente do Campo. Enredado neste debate, indagamos ainda como a formação continuada tem contribuído nas discussões sobre a profissão e conferido a estes espaçostempos formativos possibilidades de uma nova configuração de sua ação docente e de sua profissionalização.

Para tanto, a discussão sobre sentidos, tal como formulada na perspectiva histórico-cultural de Vigotski (1934-2005) chega até nós como um achado significativo que promove um encontro conosco e com as singularidades e pluralidades de pensamentos e palavras dos sujeitos narradores. O que nos interessa nessa história são os sentidos produzidos a partir de suas rememorações e construções deste tempo, suas perspectivas profissionais cunhadas no processo formativo, de trabalho e vida no campo.

À luz de Vigotski (1934-2005), em suas formulações sobre Pensamento e Palavra, um dos seus últimos escritos, passamos a conhecer as distinções possíveis entre os conceitos de Significado e Sentido, essas por sua vez, foram importantes em nossas interlocuções e na produção de nossos próprios sentidos e compreensões acerca da profissão docente no campo. Destarte, o sentido se produz nas práticas sociais, não é único, se faz nas relações objetivas e subjetivas, admitindo assim múltiplas construções. Já o significado ao contrário, é, segundo Vigotski (1934-2005), um ponto imóvel e imutável que permanece estável em todas as mudanças de sentido da palavra em diferentes contextos. O sujeito ao nascer encontra pronto um sistema de significação, elaborado e acordado historicamente. O significado, portanto, constitui-se num entendimento estável, acordado.

O sentido de uma palavra é a soma de todos os fatos psicológicos que ela desperta em nossa consciência. Assim, o sentido é sempre uma formação dinâmica, fluida, complexa, que tem várias zonas de estabilidade variada. O significado é apenas uma dessas zonas do sentido que a palavra adquire no contexto de algum discurso e, ademais, uma zona mais estável, uniforme, exata (VIGOTSKI, 1934-2005).

Não obstante, com a conceituação de significado e sentido na perspectiva histórico cultural temos a possibilidade de múltiplas construções de sentidos, entendidas como composições singularizadas, porém socialmente constituídas e com caráter polissêmico, integrado às dimensões cognitivas e afetivas, aos processos individuais e coletivos vividos pelos sujeitos.

Essa compreensão é extremamente interessante porque promove um encontro não com palavras vazias e nem tampouco com uma realidade a ser interpretada por nós pesquisadores, mas com palavras enriquecidas de acontecimentos particulares, formulados a partir dos sentidos produzidos histórico e culturalmente, situados nos contextos das relações e das práticas sociais.

Esse enriquecimento das palavras que o sentido lhes confere a partir do contexto é a lei fundamental da dinâmica do significado das palavras. A palavra incorpora, absorve de todo o contexto com que está entrelaçada os conteúdos intelectuais e afetivos e começa a significar mais e menos do que contém o seu significado quando a tomamos isoladamente e fora do contexto: mais, porque o círculo dos seus significados se amplia, adquirindo adicionalmente toda uma variedade de zonas preenchidas por um novo conteúdo; menos, porque o significado abstrato da palavra se limita e se restringe àquilo que ela significa apenas em um determinado contexto (VIGOTSKI, 1934-2005, p. ).

Nas narrativas com as quais dialogamos, nos encontramos então com vozes expressas em palavras que carregam compreensões e sentimentos enredados nos contextos, pois ainda nessa perspectiva, a produção de sentido está relacionada às condições materiais de existência do sujeito, como afirma Smolka (2004):

Os sentidos podem ser sempre vários, mas dadas certas condições de produção, não podem ser quaisquer uns. Eles vão se produzindo nos entremeios, nas articulações das múltiplas sensibilidades, sensações, emoções e sentimentos dos sujeitos que se constituem como tais nas interações; vão

se produzindo no jogo das condições, das experiências, das posições, das posturas e decisões desses sujeitos; vão se produzindo numa certa lógica de produção, coletivamente orientada, a partir de múltiplos sentidos já estabilizados, mas de outros que também vão se tornando possíveis (SMOLKA, 2004, p.45).

Compreendemos assim, que no diálogo com a produção de sentidos dos professores-monitores-educadores do campo entra em cena a tentativa de reconhecimento das condições materiais de produção destes sentidos. Ou seja, os sentidos não se produzem aleatoriamente, eles são culturalmente situados, embora singulares, eles se produzem em meio a suas experiências, decisões, condições de trabalho e de vida.

É nessa perspectiva, portanto, que nos enveredamos. Buscamos não como determinação, mas como possibilidade, nas histórias de vida dos sujeitos narradores desse estudo um diálogo com os sentidos da formação na profissão docente no campo. Nessa escrita não abandonamos a dimensão do diálogo polifônico (BAKHTIN, 2008), emergem, portanto, os sentidos anunciados pelos narradores, que se formam também a partir de outras vozes e os sentidos produzidos por nós em diálogo também com nossos interlocutores teóricos, o que a partir da perspectiva trazida até aqui, se faz tanto no processo de narrar e escutar, pois uma narrativa nunca é algo solitário (BENJAMIN, 1994) quanto no processo de produção dos sentidos, que na subjetividade dos sujeitos em diálogo se formam (VIGOTSKI, 1934-2005).

5.1 DIÁLOGOS NO CAMPO DE LARANJA DA TERRA: COM A

VOZ A PROFESSORA MÔNICA

O Tempo!

O tempo não dá para pegar. Ele foge sem parar. O tempo não dá para contar. É só pegar um relógio e olhar. Más, isto não é o tempo, é só o tempo a passar. O tempo passa o tempo todo, passa sem parar. O tempo sempre vai a algum lugar. O tempo vai para o passado. O tempo é um bicho danado! O tempo da gente é agora. É o tempo presente, é a gente que sente! O tempo presente vira passado. O tempo do depois é o futuro. O

Documentos relacionados