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O principal argumento contrário à concretização do princípio da igualdade em sua dimensão positiva e também da utilização das sentenças aditivas reside no discurso de que estaria o Poder Judiciário se imiscuindo em função própria do Poder Legislativo. Acusam de ativismo judicial, situação de hipertrofia das funções judiciais que desrespeita o princípio da separação dos poderes.526

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MENDES, Gilmar Ferreira. Jurisdição Constitucional: o controle abstrato de normas no Brasil e na Alemanha. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 80.

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Entre nós a justificativa da não proteção de direitos fundamentais através do reconhecimento da dimensão positiva por parte do Poder Judiciário sob o argumento da separação de poderes tem como razão a tradição histórica brasileira quanto a limitação do poder que na Constituição de 1824 era de concepção com forte tendência inglesa e francesa, a partir da Constituição de 1891 o Brasil sofre radical alteração desta concepção na medida em que admite a influência do modelo estadunidense de controle de constitucionalidade, o Judicial

158 A separação de poderes em realidade consubstancia-se na divisão de tarefas estatais em relação a determinados órgãos, isso porque o poder é uno e indivisível.527 A ideia contida no princípio da separação dos poderes é ligada ao objetivo de controle ou moderação do poder político528, é mecanismo que se contrapõe à concentração do poder, preocupação já existente na Grécia antiga529 mas que tem sua formulação como postulado já na obra de Locke (1978), na fase histórica do Iluminismo, notabilizando-se na obra de Montesquieu (1995)530, fruto do pensamento e dos pensadores liberais, portanto, dotada de um sentido individualista, ou seja, da liberdade individual contra o poder, importa afirmar, como método de garantia da liberdade do cidadão531, notadamente ligada ao objetivo da segurança do que propriamente de autogoverno ou de soberania popular. Nesta fase embrionária da teorização da separação dos poderes, o Poder Judiciário não detinha a importância significativa ou pelo menos a importância que atualmente a sociedade lhe reserva e isso pode ser explicado pela tradição do pensamento jurídico britânico quanto ao princípio da supremacia do parlamento.532-533 durante a histórica evolutiva do constitucionalismo nacional, desembocando na Constituição de 1988. Nesse sentido v.: HARGER, Marcelo. O Estado de direito brasileiro e a quebra no princípio da tripartição dos poderes. Revista de Direito Constitucional e Internacional. v. 13, n. 50, jan./mar. 2005. p. 110.

527 “Lo que en realidad significa la así llamada ‘separación de poderes’, no es, ni más ni menos, que el

reconocimiento de que por una parte el Estado tiene que cumplir deerminadas funciones... La separación de poderes no es sino la forma clásica de expresar la necesidad de distribuir y controlar respectivamente el ejercicio del poder político. Lo que corrientemente, aunque erróneamente, se suele designar como la separación de los poderes estatales, es en realidad la distribuición de determinadas funciones estatales a diferentes órganos del Estado.” Cf. LOEWSTEIN, Karl. Teoria de la constitución. Barcelona: Ariel, 1982. p. 55.

528 ZIPPELIUS, Reinhold. Teoria do Estado. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1999. p. 401. 529 BOBBIO, Norberto. Teoria das Formas de Governo. Brasília: UnB, 1998. p. 30 – 65.

530 “Apesar das linhas estruturais traçadas por Locke, a clássica tripartição do poder encontra em Montesquieu o

seu alicerce fundamental, sendo reconhecida a sua subdivisão nos denominados Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. Cada um desses poderes deveria exercer, primordialmente, funções similares aos designativos que ostentam, vale dizer, o Poder Legislativo, exercido por um Parlamento de composição bicameral (Corpo dos Nobres e Corpo dos Representantes do Povo), deveria elaborar as leis, alterá-las; o Poder Executivo, além de declarar a guerra e a paz, estaria incumbido de exercer as relações internacionais e executar a `vontade gerar´ consubstanciada na lei; e o Poder Judiciário, que também detinha uma função executiva da lei, deveria julgar os criminosos e os litígios entre particulares. Com exceção do Judiciário, ao qual fora atribuído um papel invisível e neutro – que bem se refletia na célebre frase de que o `juiz não é senão a boca que pronuncia as palavras da lei´,

`não podendo moderar-lhe a força nem o vigor´, - era grande a inter-relação e a colaboração que deveriam existir entre o Executivo e o Legislativo. Com isso, concebia-se um sistema de controle recíproco entre os poderes, bem traduzido na fórmula `le pouvoir arrêtant lê pouvoir´. Cf. GARCIA, Emerson. Princípio da separação dos poderes: os órgãos jurisdicionais e a concreção dos direitos sociais. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, v. 46, n. 02 jul./dez. 2005. p. 963 - 964.

531 “Na história constitucional britânica, o princípio da separação dos poderes tem sua gênese na necessidade de

limitação dos poderes reais, permitindo a contenção do arbítrio e o respeito às liberdades individuais. A partir da conquista normanda em 1066, passando pela Magna Carta de 1215, até se alcançar a Glorius Revolution e o Bill

of Rights de 1688, são visíveis as modificações ocorridas no painel político britânico e nas inter-relações entre governante e governados.” Cf. GARCIA, Emerson. Princípio da separação dos poderes: os órgãos jurisdicionais e a concreção dos direitos sociais. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, v. 46, n. 02 jul./dez. 2005. p. 961.

532 ALVES, Joaquim. A separação de poderes como elemento do estado democrático de direito. Revista TRF –

159 Nada obstante, ao posicionamento de boa parte da doutrina nacional e estrangeira em identificar, na obra de Montesquieu, um sentido de inibição da atuação do Poder Judiciário creditando no juiz uma natureza de neutralidade que só se coadunava com o exercício da atividade de mera subsunção do fato à regra jurídica, Coelho (1997) identifica na essência do princípio formulado na obra de Montesquieu uma densificação inversa à concepção clássica e que justificaria a função criadora do juiz justamente porque dá condição do princípio não reservar ou cumular ao mesmo poder diversas matérias.534 Também Canotilho (1995) denuncia o equívoco na repetição dessa leitura do Livro XI da obra Esprit des Lois, ou seja, de que Montesquieu em face da teorização da separação dos poderes proibia qualquer interferência de uma função de poder em relação ao outro.535

533 Ao analisar semelhanças e desemelhanças entre as obras de Locke e Montesquieu, Garcia (2005) identifica a

visão restrita das funções do Poder Judiciário à época: “A exemplo de Locke, também Montesquieu concebera a teoria da separação dos poderes como uma forma de preservação da liberdade contra o arbítrio. Mantendo-se adstritos à linha de evolução histórica do constitucionalismo britânico, conferiram especial ênfase à imperativa separação das funções legislativa e executiva, as quais, acaso concentradas no mesmo corpo, inevitavelmente conduziriam ao arbítrio e à violação da esfera de liberdade inata do cidadão. Montesquieu, no entanto, sustentava a impossibilidade de duas ou três funções serem exercidas pelo mesmo órgão, ressalva a que Locke, com exceção da dicotomia Legislativo-Executivo, parecia indiferente. Em relação ao Poder Judiciário, outra semelhança: tanto Locke sequer concebeu um poder autônomo, integrando a função de julgar num espectro mais amplo: o de executar a lei. Quanto a Montesquieu, apesar de prestigiar a existência de um poder autônomo encarregado da função jurisdicional, apressava-se em realçar a necessidade de que o Poder Judiciário se mantivesse adstrito à “letra da lei”.Cf. GARCIA, Emerson. Princípio da separação dos poderes: os órgãos jurisdicionais e a concreção dos direitos sociais. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, v. 46, n. 02 jul./dez. 2005. p. 964 - 965.

534 “Densificando esse princípio – uma forma que virou substância no processo de construção/ aprimoramento

do Estado de Direito –, Montesquieu chegou a dizer que não existiria liberdade política onde se misturassem as funções próprias de cada órgão da soberania estatal:

“La liberté politique, dans un citoyen, est cette tranquillité d’esprit qui provient de l’opinion que chacun a de sa sûreté; et, pour qu’on ait cette liberté, il faut que le gouvernement soit tel qu’ un citoyen ne puisse pas craindre un autre citoyen.

“Lorsque dans la même personne ou dans le même corps de magistrature la puissance législative est réunie à la puissance exécutrice, il n’y a point de liberté, parcequ’on peut craindre que le meme monarque ou le même sénat ne fasse de lois tyranniques pour les exécuter tyranniquement.

“Il n’y a point encore de liberté si la puissance de juger n’est pas séparée de la puissance législative et de l’exécutrice. Si elle étoit jointe à la puissance législative, le pouvoir sur la vie et la liberté des citoyens seroit arbitraire; car le juge seroit législateur. Si elle étoit jointe à la puissance exécutrice, le juge pourroit avoir la force d’un oppresseur.

“Tout seroit perdu se le même homme, ou le même corps des principaux, ou des nobles, ou du peuple, exerçoient ces trios pouvoirs: celui de faire les lois, celui d’exécuter les résolutions publiques, etcelui de juger les crimes ou les différends des particuliers”. Cf. COELHO, Inocêncio Mártires. A criação judicial do direito em face do cânone hermenêutico da autonomia do objeto e do princípio constitucional da separação dos poderes. Revista de Informação Legislativa. Brasília a. 34 n. 134 abr./jun. 1997. p. 103 - 104.

535 “Hoje, tende a considerar-se que a teoria da separação dos poderes engendrou um mito. Consistiria este mito

na atribuição a Montesquieu de um modelo teórico reconduzível à teoria dos três poderes rigorosamente separados: o executivo (o rei e os seus ministros), o legislativo (1.a câmara e 2.a câmara, câmara baixa e câmara alta) e o judicial (corpo de magistrados). Cada poder recobriria uma função própria sem qualquer interferência dos outros. Foi demonstrado por Eisenmann que esta teoria nunca existiu em Montesquieu: por um lado, reconhecia-se ao executivo o direito de interferir-no legislativo porque o rei gozava de direito de veto; em segundo lugar, porque o legislativo exerce vigilância sobre o executivo na medida em que controla as leis que votou, podendo exigir aos ministros conta de sua administração; finalmente, o legislativo interfere sobre o judicial quando se trata de julgar os nobres pela Camara dos Pares, na concessão de amnistias e nos processos

160 Hauriou (2003) identifica na obra de Montesquieu que este partiu da ideia de um juiz com poder político536, seja como for, o que surge com unanimidade, atualmente, é que a concepção clássica da separação de poderes do Estado de forma estanque, ou seja, desprovida da interferência de uma função de poder sobre a outra, não mais se coaduna com a atual fase do constitucionalismo e a premente necessidade do cidadão de ver seus direitos fundamentais, em suas várias dimensões, serem protegidos efetivamente e não só apenas previstos nos sistemas jurídicos positivados.537 Tal acepção do postulado da separação dos poderes surge no movimento constitucional, tendo como expressão mais significativa o Art. 16538 da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, da Revolução Francesa. O princípio da supremacia da vontade popular corporificado na constituição, exige a subordinação dos três poderes à vontade constitucional, cabendo ao Poder Judiciário o controle, mas não porque é um poder maior ou hipertrofiado e sim porque está submetido, políticos que deviam ser apreciados pela Camara Alta sob acusação da Camara Baixa.” Cf. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 6.ed. Coimbra: Livraria Almedina, 1995. p. 260. Observa Ângela Cristina Pelicioli que o conceito de separação dos poderes defendido por Montesquieu acentuo mais o equilíbrio do que a separação dos poderes sendo que o poder é uno e indivisível, já o exercício era conveniente dividir em termos de competência para cada órgão do Estado, sendo que tal concepção foi esquecida no tempo. Cf. PELICIOLI, Ângela Cristina. A atualidade da reflexão sobre a separação dos poderes. Boletim de Direito Administrativo – BDA, vol. 24, n. 01. Jan. 2008. p. 56.

536 “En su teoría de la separación de poderes, Montesquieu partió de la idea de que el juez tenía un poder

político, e hizo así figurar el poder judicial al lado de los otros dos poderes políticos – el legislativo y ejecutivo -; por eso supuso investido al poder judicial de la faculdad d’empécher, es decir, de contener a los otros poderes.” Cf. HAURIOU, Maurice. Princípios de Derecho Público y Constitucional. Trad. Carlos Ruiz Del Castillo. Granada: Editorial Comares, S.L., 2003. p. 370. Convém o registro de que Hauriou (2003) no decorrer de seu trabalho irá defender uma maior restrição da atuação do juiz, limitando seu domínio ao contencioso. Tal idéia deriva naturalmente da tradição do pensamento francês de um regime de controle de natureza administrativa, justificando o acerto deste regime administrativo de controle de constitucionalidade das leis apto a impedir que ocorra ou precipite-se em um governo político de juízes. Não é demais lembrar que o modelo francês é distinto do adotado no Brasil, de natureza mista, combinando o modelo europeu-continental e o Judicial Review estadunidense, também não é demais observar como o próprio Hauriou observa que a Constituição francesa “actual es extraordinariamente breve, y no contiene más que las reglas esenciales relativas a la organización y a las relaciones de los poderes públicos; como hemos observado, no menciona siquiera los princípios de las liberdades individuales.” (op. cit., p. 361), portanto, a realidade brasileira é mais próxima da estadunidense onde em nossa tradição constitucional se esperar uma melhor atuação dos juízes na promoção do direitos fundamentais inseridos na constituição.

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Vale aqui registro de Bonifácio (2008) ao defender um visão da idéia de limitação de poderes própria do princípio da separação dos poderes consentânea com o Estado Social e Democrático, falando propriamente em uma situação de cooperação e harmonia com o objetivo de concretizar os valores sociais já que o fundamento de validade mesmo do princípio é a soberania popular: “O princípio da separação dos poderes assumiria um conteúdo finalístico consolidado nas funções do Estado, nos objetivos deste, nas suas atividades e na integração de seus órgãos, tendo em vista os seus fins. Neste sentido a troca da expressão `poder do estado´ por `função do estado´ tem a sua justificativa: extrapolando a visão tradicional do princípio da separação, a unidade do poder político especializa-se em funções, movimentando-se todos os órgãos do aparelho estatal à execução das atividades necessárias segundo os fins do Estado.” Cf. BONIFÁCIO, Artur Cortez. O direito constitucional internacional e a proteção dos direitos fundamentais. São Paulo: Método, 2008. p. 155 - 156.

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“Art. 16 − A sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos nem estabelecida a separação

dos poderes não tem Constituição.” Consulta realizada no site:

161 também, à vontade constitucional, que lhe dá, ao Poder Judiciário, a tarefa de defender a Constituição e de proteger os direitos fundamentais que esta prescreve.539

Justamente porque a teorização da separação dos poderes dá-se no período de surgimento da primeira geração dos direitos fundamentais, preocupada em moderar o poder soberano e garantir liberdades individuais de forte concepção liberal540, lógico que tal concepção não pode ser adotada atualmente541, máxime após o surgimento de outros direitos fundamentais (de segunda, terceira, quarta gerações bem como o próprio desenvolvimento conteudístico dos direitos de primeira geração) e propriamente com o fenômeno do constitucionalismo moderno em que o princípio da separação dos poderes é entendido como “[...] garantia orgânica contra os abusos dos poderes estaduais”542, conforme diz Garcia (2005) ao defender a constituição como elemento polarizador da separação dos poderes, graças à forte correlação com o poder político é que a constituição não está “distante ou indiferente às estrutura ideológicas presentes na ordem social”543, ao contrário é fruto do influxo de diferentes poderes inseridos nas sociedades pluralistas, e nota-se uma convergência de teorias individuais, de origem liberal, como também teoria social de origem marxistas e leninistas; a previsão tanto de direitos negativos quanto positivos, de modo a falar-se de uma constituição compromissória, de um pacto firmando entre essas diferentes forças sociais, em que o manuseio, aplicação e interpretação da constituição não se faz sem a observância dessas ideologias, sendo redundante dizer que essa deve ser a vontade a ser realizada pelo Estado e aquele que deve fiscalizar e zelar pelas diversas ideologias inseridas no Texto Maior é o Poder Judiciário.544 Garcia (2005) observa ainda que o isolamento da norma constitucional não se sustenta e para que se tenha efetiva a ordem constitucional é inerente a realização de uma interpretação da norma constitucional que sopese os influxos ideológicos contextuais,

539 ALVES, Joaquim. A separação de poderes como elemento do estado democrático de direito. Revista TRF –

3a Região. Vol. 84, jul. Ago./2007. p. 32.

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FREIRE JÚNIOR. Américo Bedê. A separação dos poderes (funções) nos dias atuais. Revista de Direito Administrativo – n. 238, out./ dez. 2004. p. 38.

541 BONAVIDES, Paulo. Do estado liberal ao estado social. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1980. p. 48. 542 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 6

ed. Coimbra: Livraria Almedina, 1995. p. 62 - 63.

543 GARCIA, Emerson. Princípio da separação dos poderes: os órgãos jurisdicionais e a concreção dos direitos

sociais. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, v. 46, n. 02 jul./dez. 2005. p. 967.

544 “Além de presentes em sua formação, as diferentes ideologias sociais também se refletirão na interpretação

da Constituição, pois, tendo ela uma estrutura que congrega normas de natureza preceitual e principiológica, os valores sociais que corporificam o conteúdo de seus princípios e direcionam a aplicação de suas regras lhe conferem uma textura eminentemente aberta, possibilitando uma contínua adequação às forças políticas e sociais.” Cf. GARCIA, Emerson. Princípio da separação dos poderes: os órgãos jurisdicionais e a concreção dos direitos sociais. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, v. 46, n. 02 jul./dez. 2005. p. 967.

162 compatibilizando-os. Preserva-se, assim, a essência da constituição compromissória, “[...] evitando que o pluralismo de forças termine por ser desvirtuado e anulado, bem como assegura-se a manutenção da harmonia entre elas, prestigiando as opções fundamentais do Constituinte e o princípio da unidade constitucional [...]”545, a interpretação do princípio da separação dos poderes não pode figurar a parte, posto que

Se é certo que a preservação das liberdades individuais, em linhas gerais, pressupõe uma atitude abstencionista do Poder Público, o que direciona a atuação dos órgãos jurisdicionais a essa ótica de análise, não menos certo é que os direitos sociais normalmente pressupõem um atuar positivo, o que, em sendo necessário, exigirá uma atuação diferenciada dos referidos órgãos.546

Via de regra os juízes reservam-se a exercer o controle sobre a ações ou omissões atentatórias aos direitos fundamentais em função da dicotomia entre ato político e ato administrativo. O primeiro é conceituado como “atos de conteúdo não-normativo da função política, regidos pela Constituição e que só podem ser corretamente entendidos na perspectiva do sistema de governo e das relações entre os seus respectivos órgãos”547, nessa espécie de ato que é de manifestação do poder político, o controle é mais restrito, nada obstante, estão eles inseridos no controle de ordem política a ser exercitado pelo legislativo, pelo todo e também pelo judiciário, isso porque,

A liberdade característica dos atos de governo, por estarem inseridas num sistema unitário e teleologicamente voltado à consecução do bem comum, recebe temperamentos da ordem constitucional, que limita e condiciona o seu exercício. Nesse particular, merecem especial realce as normas consagradoras de direitos, liberdades e garantias, que surgem como parâmetros de controle do poder discricionário da Administração, com a conseqüente invalidade dos atos que deles destoem.548

Já Miranda (2005) labora classificação diversa em que identifica os atos jurídico- públicos549 dos quais fazem parte os atos jurídicos-constitucionais, espécies do gênero, concebendo-os:

545 GARCIA, Emerson. Princípio da separação dos poderes: os órgãos jurisdicionais e a concreção dos direitos

sociais. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, v. 46, n. 02 jul./dez. 2005. p. 968.

546 GARCIA, Emerson. Princípio da separação dos poderes: os órgãos jurisdicionais e a concreção dos direitos

sociais. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, v. 46, n. 02 jul./dez. 2005. p. 968.

547 GARCIA, Emerson. Princípio da separação dos poderes: os órgãos jurisdicionais e a concreção dos direitos

sociais. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, v. 46, n. 02 jul./dez. 2005. p. 974. Já os

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