• Nenhum resultado encontrado

Será que as medidas de flexibilização da execução realizam de forma

CAPÍTULO III – Os fins das penas e o regime das medidas de flexibilização

3.6. A relação entre as finalidades da pena de prisão e as medidas de

3.6.3. Será que as medidas de flexibilização da execução realizam de forma

É reconhecido que as medidas de suavização da execução da pena são criteriosa e comedidamente concedidas256. As estatísticas confirmam a antecedente

afirmação e já se demonstrou atrás que o regime aberto, sobretudo na vertente de RAE, tem uma expressão quantitativa pouco significativa. Só as licenças de saída é que são moderadamente expressivas. Pese embora essa maior representatividade quantitativa das licenças de saída, as taxas de incumprimento nos últimos três anos sempre foram inferiores a 1%.

Além disso, não tem chegado ao conhecimento público, através dos órgãos de comunicação social, a existência de problemas nas comunidades onde são executadas as medidas de suavização da pena. Qualquer pesquisa que se faça na Internet, através de um motor de busca, não revela casos em que a presença do condenado tenha sido geradora de revolta da comunidade ou que seja susceptível de pôr em causa as expectativas de protecção dos bens jurídicos.

Ao longo dos anos a imprensa apenas tem destacado alguns casos de crimes cometidos durante as medidas de flexibilização. Essas situações são meramente

256

Neste sentido, ROCHA, João Luís Moraes, GOMES, Ana Catarina Sá – Algumas notas sobre Direito

Penitenciário. In Entre a reclusão e a liberdade. Estudos penitenciários, vol. I, Coimbra, Almedina, 2005, págs.

114

episódicas e não merecem relevo quando a actual taxa de incumprimento de licenças de saída é de 0,7% e é dentro desta que se inserem os ditos poucos casos.

No fundo, a parcimónia e a ponderação com que são concedidas têm impedido a verificação de casos de incompatibilidade com a «defesa da ordem e da paz social».

Portanto, é pacífico afirmar-se que as medidas de suavização da pena têm realizado as finalidades de «protecção de bens jurídicos» e de «defesa da sociedade» previstas nos artigos 40.º, n.º 1, 42.º, n.º 1, ambos do Código Penal.

Mais problemática é a questão de saber se a atenuação do regime de execução consegue a «reintegração do agente na sociedade», almejada nos mesmos citados preceitos do Código Penal.

Não se está aqui a abordar esta matéria num plano formal ou ideal, mas ao nível da sua realização prática, na medida em que a «reintegração social do recluso», referida no art. 42.º, n.º 1, do Código Penal, necessariamente que há-de ser aferida, na sua substância, pelo evitamento da reincidência. Esse é o efeito ou resultado prático que se pretende alcançar com a pena.

Não existem elementos suficientemente fundamentados que permitam afirmar a existência de uma inequívoca relação de causa-efeito entre o benefício de medidas de flexibilização e a diminuição da taxa de reincidência. O mais que se tem conseguido afirmar é que a severidade do regime penitenciário é causa de maior reincidência257, ou

seja, quanto mais rígida é a execução da pena, maior é a probabilidade de recondenação. Os reclusos que não beneficiam de licenças de saída, de liberdade condicional ou de programas formativos são mais propensos a regressarem ao sistema prisional do que aqueles que usufruíram dessas medidas.

Todavia, esta matéria é complexa e suscita vários problemas. Por um lado, o eventual contributo da suavização da pena para reintegração do agente é difícil de cindir da questão mais geral de qual seja a eficácia do sistema prisional na reinserção social dos reclusos. Por outro, sendo inequívoco que a melhor forma de aferir a eficácia

257 Estudos de Redondo, Funes e Luque, de 1994 (Justícia penal i reincidència. Barcelona. CEJFE. Colección

Justícia i Societat, n.º 9), e da Central Penitenciaria de Observacíon, de 2001, citados por ROCHA, João Luís Moraes (coordenador) – Entre a reclusão e a liberdade. Estudos penitenciários, vol. I, pág. 39. No mesmo sentido o estudo de BARBERO, Victória Ramos, GONZALEZ, Rodrigo J. Carcedo, Reingresso em prisión de reclusos

drogodependientes excarcelados a una comunidad terapêutica, em función de variables previas al trataminento,

Julho de 2012, revista Adicciones, 2012, vol. 24, n.º 4, págs. 329-338, disponível em http://www.adicciones.es/files/329-338%20Ramos.pdf [consultado a 01.05.2013].

115

do tratamento penitenciário é através do critério da reincidência, são várias as dificuldades para avaliar o efeito do tratamento numa futura reincidência, pois são muitos os factores intervenientes e é difícil a demonstração empírica. Basta atentar na existência de factores imprevisíveis do comportamento do sujeito, como o consumo de estupefacientes e as suas aleatórias consequências, que podem pôr em causa um processo de readaptação social aparentemente bem conseguido.

Em todo o caso e em contraposição, também importa salientar que não existe qualquer estudo que demonstre que a flexibilização é totalmente inoperante na prevenção da reincidência dos reclusos.

O próprio conceito de reinserção ou ressocialização não pode ser visto de uma forma unívoca. A reinserção tem uma forte componente de minimização dos efeitos nefastos da encarceração. É hoje predominante a ideia de que se deve, acima de tudo, obstar ao efeito dessocializador da execução da pena de prisão.

Ora, se bem que não se possa afirmar, fora de qualquer dúvida, que a suavização da execução da pena contribui decisivamente para diminuir a possibilidade de reincidência, é indiscutível que essa flexibilização evita a dessocialização. Aliás, vários autores, como Anabela Miranda Rodrigues258, defendem que o essencial a evitar

com o cumprimento da pena de prisão é a dessocialização do recluso, ou seja, as consequências nocivas da privação da liberdade, designadamente em termos de preservação da saúde, de salvaguarda da dignidade, de manutenção ou incremento dos vínculos sociais, de desenvolvimento do sentido das responsabilidades e de dotação de competências necessárias à reintegração.

No apontado sentido, o motor da reinserção traduz-se na ajuda ao recluso para voltar a ocupar o seu lugar na sociedade. Para isso é muito importante a desinstitucionalização, entendida «como um processo segundo o qual, a prisão perde progressivamente as marcas que estabelecem a sua ruptura com a sociedade civil, de tal forma que as condições de vida prisional se aproximem mais daquelas que existem na comunidade envolvente.»259

258

Novo olhar sobre a questão penitenciária, págs. 47 e 191.

259 VIEIRA, Hernâni – Prisões: da intervenção institucional à desinstitucionalização das intervenções, Temas

116

Assim, a promoção da não dessocialização surge indissociável da ressocialização260, enquanto preparação para a vida em liberdade e combate à exclusão.

Daí que o tratamento penitenciário, pelo menos numa fase mais avançada desse processo e relativamente aos reclusos que estejam motivados para reintegração social, exija uma maior aproximação da vida prisional à vida em liberdade, traduzido num movimento do interior para o exterior. A forma de tornar efectivo esse processo é através da flexibilização da pena, pois só assim se atenuam as barreiras que separam o “mundo livre” do “mundo prisional”. A preparação da liberdade faz-se, também, através de uma progressiva aproximação ao meio livre, tal como a criança aprende a andar andando.

Mais do que as licenças de saída, que sobretudo atenuam os efeitos dessocializadores261, o verdadeiro impulso ressocializador pode ser conseguido através

do regime aberto de execução da pena de prisão, sobretudo o RAE.

O problema é que o total de reclusos em RAE representa actualmente, por referência aos últimos dados de 31.12.2012, apenas 0,21% do total da população reclusa, quando seria desejável que representasse, no mínimo, entre 5 a 10% para ter alguma efectiva repercussão ressocializadora. Isto quando existem alguns indícios de que o cumprimento da pena em regime aberto facilita o reingresso do condenado na sociedade262.

Essa pouca representatividade estatística do RAE leva a concluir que a aposta na vertente ressocializadora da execução da pena de prisão tem sido reduzida263.

O que se tem conseguido implementar é, sobretudo, o evitamento da dessocialização. Já é alguma coisa, mas muito pouco face à finalidade primordial da execução da pena, que é «a reintegração social do recluso, preparando-o para conduzir a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes»264.

260 A ressocialização pode ser vista como um fenómeno complexo que integra a promoção da socialização e o

evitamento da dessocialização – neste sentido ROCHA, João Luís Moraes, CONSTANTINO, Sónia Maria Silva –

Reclusão e mudança. In Entre a reclusão e a liberdade. Pensar a reclusão, vol. II, Coimbra, Almedina, 2008, pág.

122.

261 Parece ser essa a conclusão mais consensual da análise dos estudos referidos em 3.5.4.

262 Seria muito interessante apurar qual a taxa de reincidência de ex-reclusos que beneficiaram de RAE, embora

exista a percepção entre os técnicos que acompanham a execução das penas de que tal taxa é substancialmente inferior à dos reclusos que não beneficiaram de tal medida.

263 E para isso tem contribuído o RAI, que em alguns casos não é mais do que uma forma encapotada de RAE. 264 Conforme previsto no art. 42.º, n.º 1, do Código Penal.

117

O caminho a seguir parece ser o que preconiza uma intervenção mais aberta, pelo menos numa fase mais avançada do cumprimento da pena, que esteja em maior consonância com o aludido desiderato legal. Não se podem seguir à letra nem o discurso do garantismo nem o do laxismo. Nem um nem outro são a solução. Não se podem esquecer as necessidades de segurança da sociedade mas, de igual forma, não se deve ignorar que relativamente à maior parte dos reclusos não se colocam relevantes problemas de segurança e, quanto a essa larga parte da população prisional, dificilmente se compreende a falta de investimento em regimes abertos de execução da pena, como forma adequada de estabelecer ou recompor os vínculos com o exterior.

119

4. CONCLUSÕES

Durante o presente estudo percorreu-se o caminho da evolução da pena de prisão em Portugal e tentou-se perceber quando e quais as razões justificativas para o surgimento das medidas de flexibilização da execução daquela pena.

Acompanhou-se a evolução histórica dessas medidas de suavização, desde os primórdios até à actualidade, com a determinação do seu actual regime jurídico.

Procurou-se comparar o seu regime com o que sucede noutros ordenamentos jurídicos, alguns dos quais nos são próximos.

Os pontos fulcrais do presente estudo eram a análise da projecção dos fins das penas nas medidas de flexibilização, bem como a investigação sobre os seus resultados práticos em termos de efectiva reintegração dos reclusos na sociedade, identificando as suas virtualidades e as suas insuficiências.

Atendendo às questões e pontos de estudo enunciados na parte introdutória deste trabalho, destacam-se de seguida algumas notas conclusivas, a partir do exposto nos capítulos antecedentes.

Dividi-las-emos segundo a ordem interna adoptada na dissertação.

Algumas das certezas, descritas em forma de conclusões, não obviam à existência de várias perplexidades não desvanecidas com o presente trabalho.

4.1. O estudo sobre a evolução histórica da pena de prisão em Portugal permite

afirmar que esta só começou a generalizar-se no final do século XVIII, embora formalmente a respectiva consagração legislativa só tenha sido implementada já no século XIX, com o Código Penal de 1852, mas sem esquecer o contributo da Constituição de 1822.

Portanto, as origens da pena de prisão são bastante recentes.

Até então as verdadeiras e próprias penas eram a pena de morte, a mutilação, o desterro, o confisco, enquanto a prisão tinha uma finalidade meramente processual, destinando-se a assegurar a presença do arguido. A prisão era essencialmente o lugar onde o preso aguardava o julgamento ou a execução da pena, por regra corporal ou patrimonial. A prisão, enquanto pena repressiva, tinha pouca consagração normativa e

120

existiam diversos obstáculos à sua utilização mais generalizada, como é o caso das delongas processuais e as limitações de meios na disponibilidade da coroa.

4.2. Antes de a pena de prisão ter sido instituída como pena principal, o que

sucedeu no Código Penal de 1852, a matéria da respectiva flexibilização não se colocava.

Uma vez consagrada, a pena de prisão, durante largo período de tempo, prevaleceu com toda a sua rigidez, acentuada devido à adopção do regime filadelfiano de separação completa dos presos. Pese embora todas as críticas que lhe foram sendo dirigidas, o regime de isolamento contínuo só viria a ser substituído pelo regime progressivo, dito auburniano, pela Lei de 29.01.1913.

Portugal foi percursor das medidas de suavização da pena de prisão. A primeira que se conhece foi estabelecida no Regulamento Provisório das Cadeias de 1872 e tinha por objecto as licenças por motivo de doença.

O trabalho no exterior da cadeia foi, desde 1918 até à Reforma Penitenciária de 1979, a principal forma de flexibilização da pena, se bem que em 1936 se tenha instituído a permissão de saída temporária do estabelecimento prisional por motivo justificado.

Só em 1979 se estabeleceu um regime amplo de flexibilização da pena, entretanto aprofundado com a entrada em vigor, a 12.04.2010, do novo Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade.

4.3. Em todos os ordenamentos jurídicos estrangeiros estudados existem

medidas de suavização da execução da pena de prisão. Embora com diferentes formulações, em todos eles se prossegue uma finalidade ressocializadora.

Dessa abordagem resulta a conclusão de que temos uma lei de execução das penas privativas da liberdade com ideias progressistas em matéria de medidas de flexibilização.

Identifica claramente os objectivos que devem ser prosseguidos e revela uma boa técnica legislativa.

121

Em termos comparativos, não temos um problema de má legislação, mas sim de operatoriedade prática, atentas as muitas limitações existentes.

Fica também a ideia – não tanto uma conclusão mas uma opinião reflectida - de que todos os sistemas, uns mais do que outros, se debatem com o problema da elevada reincidência e revelam dificuldades no combate à criminalidade.

4.4. Uma das questões de partida deste trabalho consistia em saber quais são as

finalidades prosseguidas com a aplicação e execução das penas em Portugal. Ou seja, para que servem as penas, em particular a pena de prisão.

O nosso Código Penal tomou expressa posição sobre a questão dos fins que presidem à aplicação e execução das penas, nos seus artigos 40.º, n.º 1 e 42.º, n.º 1.

A finalidade primordial que preside à aplicação e à execução da pena é a reintegração do agente na sociedade - prevenção especial positiva ou de socialização. Mas esta é limitada pela finalidade de protecção dos bens jurídicos, ou seja, pelo sentimento generalizado da comunidade, que vê a pena como a estabilização das suas expectativas, abaladas pelo crime, na vigência da norma violada.

Temos assim que a finalidade de recuperação social do delinquente está limitada, na execução da pena, por exigências mínimas de prevenção geral positiva.

A «reintegração social do recluso» impõe que o Estado crie as condições necessárias – v.g., o tratamento penitenciário – à prevenção da reincidência através de uma opção voluntária do delinquente nesse sentido.

4.5. As medidas de flexibilização da execução da pena, como meio por

excelência de o recluso contactar com o exterior, inserem-se no tratamento penitenciário. São um dos vários instrumentos ou actividades em que se decompõe o tratamento penitenciário.

A concessão das medidas de flexibilização pressupõe uma compatibilização destas com as necessidades globais do tratamento prisional e o estado de evolução do recluso.

122

Essas medidas, podendo ser concedidas se verificados certos pressupostos formais, só o devem ser em função das exigências e evolução do tratamento, e não automaticamente, em função da mera verificação daqueles pressupostos.

O elemento relevante para a sua concessão é o índice de preparação para a vida em liberdade resultante da avaliação da execução da pena. Daí que a mera boa conduta prisional não seja decisiva para a concessão, a qual não constitui uma recompensa da boa adaptação prisional.

Conclui-se assim que as medidas de flexibilização têm natureza instrumental relativamente ao tratamento penitenciário.

4.6. Outra questão colocada neste trabalho, a que agora se deve dar resposta,

respeita aos objectivos que se pretendem alcançar com as medidas de flexibilização da pena.

O presente estudo demonstra que as medidas de flexibilização da pena visam favorecer os contactos com o exterior, a aproximação à comunidade, a manutenção e promoção dos laços familiares e sociais e a preparação para a vida em liberdade.

Esses objectivos estão em consonância com o fim primordial da pena de prisão que é a reintegração do agente na sociedade.

As medidas de flexibilização configuram-se como um instrumento do tratamento prisional imprescindível para uma adequada reinserção social. Além disso, são adequados a reduzir as tensões existentes dentro dos próprios estabelecimentos prisionais.

4.7. Existe uma estreita e indissociável ligação entre os fins das penas, a

execução da pena de prisão e as medidas de flexibilização desta.

Desde logo, os fins da pena de prisão são perceptíveis no concreto regime legal das medidas de flexibilização. Pode-se afirmar que essas finalidades se projectam tanto na execução da pena como na forma como esta é mitigada.

Depois, a consideração das finalidades da pena de prisão influencia a decisão sobre a concessão de medidas de flexibilização da sua execução. Por um lado, a finalidade de reintegração do condenado na sociedade enforma as medidas de

123

suavização da execução da pena de prisão. Por outro, as necessidades de prevenção geral de integração impedem a concessão de medidas de flexibilização, quando estas atentarem contra a defesa da ordem e da paz social ou forem susceptíveis de gerar na sociedade uma ideia de desprotecção dos bens jurídicos.

4.8. Quanto à questão de saber se as medidas de flexibilização da execução

realizam de forma efectiva as finalidades da pena, importa distinguir entre as finalidades socializadoras e as de protecção da sociedade.

A parcimónia e a ponderação com que são concedidas têm impedido a verificação de casos de incompatibilidade com a «defesa da ordem e da paz social».

Por isso, pode afirmar-se que as medidas de suavização da pena têm realizado a finalidade de «protecção de bens jurídicos» e de «defesa da sociedade» previstas nos artigos 40.º, n.º 1, 42.º, n.º 1, ambos do Código Penal.

Já sobre se a atenuação do regime de execução permite realizar a «reintegração do agente na sociedade», a resposta não é linear.

Se aferirmos a resposta unicamente pelo evitamento da reincidência, diremos que não existe qualquer evidência de que o benefício de medidas de flexibilização da pena, sobretudo quando o RAE é estatisticamente inexpressivo, tenha efeitos directos significativos na diminuição da reincidência. Poder-se-á dizer que existem indícios de que essas medidas, com o alcance limitado com que são aplicadas, têm uma relevância diminuta na prevenção da reincidência dos indivíduos que delas beneficiam.

Porém, em contraposição, tem-se conseguido afirmar que a severidade do regime penitenciário é causa de maior reincidência, ou seja, quanto mais rígida é a execução da pena, maior é a probabilidade de recondenação. Os reclusos que não beneficiam de licenças de saída, de liberdade condicional ou de programas formativos são mais propensos a regressarem ao sistema prisional do que aqueles que usufruíram dessas medidas.

A referida questão insere-se numa outra mais geral que é a da eficácia do sistema prisional na reinserção social dos reclusos, que é uniformente considerada como estando muito abaixo das expectativas, por isso se falando em crise da pena de prisão.

124

Os estudos que têm sido realizados sugerem que as medidas de flexibilização da pena de prisão permitem evitar, pelo menos, a dessocialização dos reclusos, ou seja, as consequências nocivas da privação da liberdade, designadamente em termos de preservação da saúde, de salvaguarda da dignidade, de manutenção ou incremento dos vínculos sociais, de desenvolvimento do sentido das responsabilidades e de dotação de competências necessárias à reintegração. A sua relevância é indiscutível numa perspectiva humanitária, enquanto meio de mitigar os efeitos negativos do encarceramento, em particular do de longa duração.

Em qualquer caso, a promoção da não dessocialização surge indissociável da ressocialização, entendida esta como um fenómeno complexo que integra a promoção da socialização e o evitamento da dessocialização.

O principal instrumento da ressocialização, que deveria ser a execução da pena de prisão em regime aberto no exterior numa fase apropriada do tratamento penitenciário, tem sido utilizado de forma quase esporádica (29 reclusos em 31.12.2012, num universo de cerca de 14.000). A colocação em RAE tem de ser frequente para que produza um efeito corrector significativo na taxa de reincidência.

4.9. O diminuto efeito das medidas de flexibilização na redução da taxa de

reincidência pode ser explicado à luz das concretas condicionantes do tratamento penitenciário e, em consequência, da reinserção social.

O sistema penitenciário debate-se com inúmeros problemas, tais como a sobrepopulação prisional, as insuficiências do parque penitenciário, a crónica omissão de uma política criminal coerente e integrada, a falta de meios humanos, a insuficiência dos programas laborais, escolares, profissionais e de tratamento.

Não são problemas novos mas atingiram agora uma dimensão sem