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CAPÍTULO II MONTES CLAROS

O SER PROFESSOR/PROFESSORA EM ESCOLA RURAL: MEMÓRIAS E REPRESENTAÇÕES

Contar é muito dificultoso. Não pelos anos que já se passaram. Mas pela astúcia que tem certas coisas passadas de fazer balancê, de se remexerem dos lugares. A lembrança da vida da gente se guarda em trechos diversos, cada um com seu signo e sentimento, uns com os outros acho que não se misturam. Contar seguido, alinhavado, só mesmo sendo as coisas de rasa importância. De cada vivimento real que eu tive, de alegria ou pesar, cada vez daquela hoje vejo que eu era como se fosse diferente pessoa. Sucedido desgovernado. Assim eu acho, assim é que eu conto. O senhor é bondoso de me ouvir. Tem horas antigas que ficaram muito mais perto da gente do que outras, de recente data. O senhor sabe; e se sabe, me entende...

(GUIMARÃES ROSA, 1985, p. 49)

Neste capítulo serão analisadas as memórias e representações que os professores constroem sobre a formação e experiências como docentes na escola rural. Essas representações deram sustentação às práticas cotidianas e revelam as escolhas por eles realizadas quanto às práticas de ensino, às posturas frente ao trabalho realizado, as dificuldades vivenciadas e as relações com os alunos. Nesse sentido, as ações e práticas dos professores foram orientadas por significados a respeito de determinado problema e pelos sentidos sobre as diversas questões colocadas no fazer diário que estão relacionadas com o funcionamento do sistema escolar, com a organização específica das escolas e com as práticas didáticas desenvolvidas no interior das salas de aula (SACRISTÁN, 1995, p. 69).

Processos de formação: resiliência e resistência

Ao iniciar as suas memórias sobre a formação que possuíam no início da carreira todos os professores disseram que era apenas a 4ª série do Ensino Fundamental e associaram a falta de formação à inexistência de escolas na área rural que oferecessem o Ensino de 1º e 2º

Graus84, embora a legislação educacional85 vigente nas décadas de 1960, 1970 e 1980 apontasse a necessidade do professor ser habilitado para o exercício da docência nas séries iniciais do Ensino Fundamental.

Quando comecei a trabalhar em 196286eu não tinha o ginásio completo porque na área rural não existia. Desde que tínhamos a 4ª série primária podíamos trabalhar (Maria de Lourdes de Jesus Ferreira, 2014).

Eu comecei a trabalhar em 1959. Naquela época quem tinha a 4ª série podia ser professora, só não podia ensinar para a 4ª série. Podia ensinar até a 3ª série (Francisca Mendes Gusmão, 2014).

A fala de Francisca revela um critério dos administradores da época em manter um distanciamento entre o grau de escolarização dos professores leigos com a série com que trabalhavam. Esse critério não era aplicado aos professores que possuíam curso de suficiência, ou seja, podiam atuar da 1ª a 4ª série primária.

A presença de professores sem habilitação para a docência era muito comum nas escolas rurais no Brasil. Segundo Gatti (1997, p.32), até 1994 havia aproximadamente 350 mil professores atuando nas escolas rurais no ensino pré-escolar e no 1º grau. No pré-escolar eram 73.380 professores, e no Ensino Fundamental 280.820. Na região sudeste existiam 3.837 professores com Ensino Fundamental incompleto, 2.375 com o Ensino Fundamental completo e 1.077 com habilitação para o magistério incompleto totalizando assim, 7.289 professores sem habilitação para a docência. Esse contingente de professores leigos se justificava pela carência de professores habilitados para exercer o magistério de 1ª a 4ª séries do Ensino Fundamental e a universalização do ensino que contribuiu para o aumento do número de crianças nas escolas.

84 Até a década de 80 o ensino básico era dividido em 2 etapas: a primeira era denominada Ensino de 1º Grau

que, atualmente corresponde ao Ensino Fundamental e a segunda etapa o Ensino de 2º grau que corresponde ao Ensino Médio (Lei 5692/71).

85 A lei 4024 de 20 de dezembro de 1961, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, no Capítulo IV, Art.

52 fixava que a formação de professores para o ensino primário deveria ser no ensino normal oferecido por escola normal de grau ginasial ou colegial. No grau ginasial o curso era de, no mínimo, quatro séries onde além das disciplinas obrigatórias do curso os alunos tinham as disciplinas pedagógicas e recebiam o diploma de regente de ensino primário. No grau colegial, o curso era de três séries anuais e os alunos recebiam diploma de professor primário. Mesmo abordando a formação do professor para as séries inicias esta lei não fixou a formação mínima para o exercício da docência deixando os sistemas de ensino responsáveis pelos critérios. Alei prevê, também, que a formação de professores, orientadores e supervisores para as escolas rurais primárias poderá ser feita em estabelecimentos que lhes prescrevem a integração no meio. (LDB 4024/1961)

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional- Lei Nº 5.692/71 em seu Cap. V- Dos Professores e Especialistas. Art. 30. cita como formação mínima para o exercício do magistério no ensino de 1º grau, da 1ª à 4ª séries a habilitação específica de 2º grau(BRASIL, 1971).

86 Em 1962 o Prefeito de Montes Claros era Simeão Ribeiro Pires (1959 a 1962) e o Secretário de Educação,

Essa carência de professores habilitados estimulava o recrutamento de professores leigos da própria comunidade, o que facilitava a relação família e escola, pois conheciam a realidade de vida de cada aluno. Essa relação se apresentava como vantagem ao professor leigo rural já que os habilitados, oriundos da zona urbana, possuíam um conhecimento desconectado do meio social e cultural, ou seja, detinham uma formação técnica, porém desconheciam a realidade onde se inseria para trabalhar (VICHI, 2008, p. 52).

No entanto, Arroyo nos alerta para o fato de que a falta de professores com formação para o trabalho no campo está relacionada à inexistência de políticas públicas específicas e que, historicamente, o modelo de sistema escolar implantado nas escolas rurais do Brasil era o modelo urbano. O urbano é compreendido como espaço civilizatório, de convívio, de socialização, de cultura e educação. Por outro lado, o rural corresponde a uma visão negativa, lugar de atraso e do tradicionalismo cultural. Essas representações influenciam as políticas públicas e inspiram a maior parte dos textos legais. Outra possível explicação se refere à ausência de políticas específicas para grupos específicos. “Nosso pensamento e nossa prática supõem que as políticas devam ser universalistas ou generalistas, válidas para todos, sem distinção” (ARROYO, 2007, p. 158).

A dificuldade em recrutar professores habilitados era agravada, também, por outros fatores como a localização das escolas, ausência de moradia, baixos salários, dificuldade de transporte e dificuldade de adaptação dos professores oriundos da área urbana como nos relata a professora Maria de Lourdes:

Eu trabalhava só até quando surgiu a necessidade de dividir a turma porque tinha muitos alunos e precisamos de mais professores de Montes Claros. Para ir para a escola eles desciam do ônibus em São João da Vereda e iam a pé, andavam uns 6 km. Tinha vez que os professores até se perdiam no mato e era preciso mandar alguém para buscá-los. As professoras que iam não adaptavam (Maria de Lourdes de Jesus Ferreira, 2014).

Essa dificuldade também foi citada pelo Secretário Municipal de Educação, João Hamilton Tolentino Trindade, no relatório apresentado ao legislativo em 1986. Nele consta que, a maior dificuldade da S.M.E. era fazer ficar nas escolas muito distantes professores habilitados, mesmo quando havia outro professor.

Diante da falta de professores habilitados para a docência o governo municipal e Estadual ofereceram cursos para a formação pedagógica87como nos relatam Maria de Lourdes e Francisca:

Naquela época, quando era período de férias, os professores sempre tinham um período de reciclagem que chamávamos de capacitação, capacitação de férias. Acontecia sempre nas férias, janeiro e julho, todos os anos. Lembro- me que teve uma formação para professores de 1ª a 4ª série que foi uma turma para Conselheiro Mata e outra para Leopoldina durante 4 meses. Quem financiava os cursos era o Estado. Eu fui para Conselheiro Mata e fiquei 4 meses lá. Foi muito bom. Era uma preparação para os professores para trabalhar com alunos de 1ª a 4ª série. Depois disso ficamos um tempo, sempre participando de capacitação durante as férias. Depois surgiu a lei que quem não tivesse magistério não poderia trabalhar na área de educação. Então nós fomos completar a formação em Montes Claros, porque já tínhamos essas preparações que fazíamos fora, fomos para o CESU88 e lá no CESU completamos o Magistério, nível médio (Maria de Lourdes de Jesus Ferreira, 2014).

Nós tivemos a oportunidade, em 1963, de fazer um curso em Leopoldina. A gente foi adquirindo conhecimentos e de lá veio material, dicionários, o jeito mais fácil de trabalhar com as crianças. Era curso de férias. Lá nós tínhamos todas as matérias e cada matéria seu professor Nós fizemos esse curso (Francisca Mendes Gusmão 2014).

O curso que Maria de Lourdes e Francisca se refere foi desenvolvido pela Campanha de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino Secundário (CADES). A CADES, criada pelo Decreto nº 34. 638 de 17 de novembro de 1953, no último governo de Vargas (1951-1954), tinha como metas promover cursos de capacitação para professores, técnicos e administradores; financiar bolsas de estudos para professores se aperfeiçoarem no país ou no estrangeiro; dar assistência e assessoria técnica a instituições; promover estudos de programa, material e livros didáticos; divulgar serviços de orientação educacional; contribuir para a instalação de prédios, oficinas, laboratórios, equipamentos e mobiliários; promover intercâmbios entre escolas e educadores nacionais e estrangeiros (VEIGA, 2007, p.293).

87 Normalmente se utiliza o conceito formação continuada ou formação em serviço para as atividades de

formação do professor posterior à sua formação inicial, que neste caso seria a habilitação para a docência nas séries iniciais do Ensino Fundamental. A formação em serviço tem a escola como lócus de formação e são construídas por grupos de professores. Como os professores eram leigos optamos pelo termo formação pedagógica.

88 CESU: Centro de Ensino Supletivo criado a partir da LDB n º 5692/71, Cap. IV, que trata do Ensino

No período de 1975 a 1982, o município também oferecia cursos de férias e reuniões mensais89 para os professores das escolas rurais. Nas reuniões eram apresentadas orientações sobre programas de ensino, planejamentos, tempo escolar, material didático e aspectos administrativos como preenchimento de diários de classes e situação funcional do professor.

Em ata90 de reunião realizada no dia 27 de junho de 1980, presidida pela Chefe da Divisão de Ensino, Cleonice Alves Proença, com a presença de 192 professores, rurais e urbanos, consta que foram dadas instruções sobre curso de atualização de professores que seria realizado no período de 14 a 18 de julho em horário de tempo integral. Neste curso seriam abordados os seguintes conteúdos: Comunicação e Expressão: aspectos gramaticais, ortografia, pontuação, regência e crase. Em Matemática: sistema numérico, sistema de medidas e frações. Em Educação física: atividades para lazer e recreação.

No ano seguinte, 1981, a Chefe da Divisão de Ensino, Cleonice Alves Proença, em reunião com 142 professores relata que a “Divisão de Ensino planejou um curso de férias que será realizado pela Delegacia de Ensino, no mês de julho, para os professores que não tem o 1º e o 2º graus completos”. Nesta mesma reunião foi apresentado o programa de Comunicação e Expressão para a 1ª, 2ª e 3ª séries.

Em outra ata do mesmo ano, 1981, consta o convite da Chefe da Divisão de Ensino, Cleonice Alves Proença, para os professores participarem do Logos II91 que encontrava-se com inscrições abertas. Não é possível saber se os professores manifestaram interesse pelo curso porque na ata, como nas outras, só consta as falas das representantes do OME ou da 12ª DRE.

Os documentos indicam, também, que havia certa cumplicidade das coordenadoras da Rede de Ensino Municipal com os professores das escolas rurais. Em ata de reunião realizada

89Como a maioria dos professores residia na área rural, as reuniões eram realizadas no dia do vencimento dos

salários o que acontecia normalmente na última 5ª feira de cada mês. Nas atas analisadas as reuniões foram realizadas no auditório do Centro de Extensão Cultural Dr. Hermes de Paula das 9 h às 12h.

90MONTES CLAROS. Secretaria Municipal de Educação. Livro Ata das reuniões da Rede de Ensino Municipal.

Montes Claros 1980-1982. Arquivo da Secretaria Municipal de Educação.

91 O Logos II, implantado em 1976 pelo Governo Federal, gerenciado pelo Centro de Ensino Técnico de Brasília

(CETEB) visava à qualificação de professores em nível de 2º grau via ensino supletivo, mediante o uso de módulos instrucionais. O logos II foi precedido de uma fase experimental, o Logus I que buscou a viabilidade da metodologia tendo em vista a heterogeneidade da clientela, os diferentes níveis de escolarização e as limitações orçamentarias e de recursos humanos. Os módulos, num total de 204, eram organizados em séries correspondentes a disciplinas que deviam ser concluídas num prazo de 28 a 30 meses. Além dos estudos das disciplinas os cursistas precisavam realizar 500 horas de estágio supervisionado que envolvesse sessões e treinamento de microensino e encontros pedagógicos. As sessões de microensino envolvia grupos de 5 a 12 cursistas para o treinamento de 5 habilidades: fazer perguntas; dar exemplos; aumentar a participação; variar a situação estímulo e reforçar a aprendizagem. Nessas sessões cada cursista observava e avalia as micro aulas dos colegas, bem como apresentava sua micro aula que também era observada e avaliada pelo grupo. Quando o resultado não era satisfatório, a habilidade deveria ser replanejada e apresentada novamente como reensino (ANDRE, CANDAU, 1984, p.23).

no dia 04 de maio de 1982 a inspetora de ensino, Anita Batista Pinto, chama a atenção das coordenadoras que realizavam reuniões em suas próprias residências e que não registravam as ausências dos professores que não compareciam às reuniões mensais do O. M. E. Destaca que alguns professores não eram assíduos na escola e estavam “trocando as matérias e conteúdos de ensino” previstos no currículo para as escolas rurais. Na análise da inspetora as coordenadoras eram conscientes dos problemas e apoiavam os professores.

Nota-se que os cursos oferecidos pela CADES e os oferecidos pelo município desempenharam papel importante na preparação e formação desses docentes, pois tais cursos possibilitaram aos professores a oportunidade de socializar suas dificuldades com os pares e equipe técnica, ou seja, apoiavam-se tanto em momentos informais como em momentos organizados de interação profissional de grupos, de especialistas, de análise sobre a qualidade e avaliação do trabalho. Porém, a organização administrativa e política dos cursos oferecidos demonstram desrespeito e exploração do trabalho do professor, pois eram oferecidos nos períodos de férias quando deveriam desfrutar de momentos de laser e descanso.

Mesmo reconhecendo a importância dos cursos de formação pedagógica para a atuação em sala de aula com as crianças para Maria de Lourdes eles eram uma preparação para o professor, mas não eram de acordo com as necessidades das crianças da área rural, ou seja, o modelo de escola implantado era urbanocêntrica, voltada aos conteúdos construídos no “processo de urbanização e industrialização em que o ponto de partida e de chegada do conhecimento é a cidade, apresentada como superior e moderna” (ALMEIDA; GUERRA, 2009, p. 36).

A Professora Maria de Lourdes descreve, também, os planejamentos semanais que eram elaborados pela equipe da Secretaria Municipal de Educação para os professores das escolas rurais bem como a dificuldade dos professores em executá-los.

Teve uma época que tínhamos dificuldades nas sugestões da Secretaria Municipal de Educação de como trabalhar. Até pelo rádio a gente ouvia orientações e nessa época não tinha tantos meios de comunicação na zona rural. A gente tinha que ficar procurando onde tinha uma família que tivesse rádio. Eu precisei comprar um rádio para ouvir. A Secretaria transmitia, dava orientações do que deveria ser trabalhado por semana, era o planejamento, de segunda a sexta. A gente tinha que ficar esperta para anotar os dados (Maria de Lourdes de Jesus Ferreira, 2014).

O esforço em acompanhar e executar os planejamentos elaborados pela Secretaria de Educação revela o compromisso da professora com a comunidade escolar bem como a pressão da Secretaria Municipal de Educação, ao estabelecer planejamentos padronizados das

disciplinas, dos conteúdos e atividades como forma de garantir que os professores tivessem os conhecimentos científicos e práticos necessários para desempenhar suas atribuições (LIMA E ASSIS, 2013). No entanto, revela também, a tentativa dos gestores, em especial das inspetoras de ensino que elaboraram o programa radiofônico, em promover a mediação pedagógica com os professores das escolas rurais utilizando a educação à distância através da tecnologia do rádio92 como meio de comunicação já que esta, além de alcançar ao mesmo tempo um maior número de professores em diversas comunidades rurais, era a mais acessível principalmente nas décadas de 1960 e 1970.

Embora Maria de Lourdes tenha destacado a dificuldade em acompanhar as orientações através do rádio, na avaliação das inspetoras de ensino o programa teve ótima aceitação entre os professores o que justificava o investimento.

Essa tentativa de uniformização dos planejamentos também foi relatada por Gabriel Osmar que revela como conseguiu superar essa dificuldade através do diálogo:

Nos anos 80 a Prefeitura mandava o planejamento pronto. Tinha a apostila com o que deveria ser ensinado no mês. Depois começamos a discutir, porque nós não podíamos mudar, tinha que ser só aquilo. Começamos a fazer reuniões e mostrar que aquilo ali tinha que ser uma orientação, uma maneira de encaminhar a gente, mas que deveriam deixar a gente trabalhar da maneira que dava mais certo. Depois foi melhorando, a gente dava só uns toques ali, aqui, e a apostila era só um suporte. Era Emília Ferreiro, era não sei o que, vinha um livro, lançava outro, vinha outro, ai começou a bagunçar também. Nós falamos que não ia dar certo, tinha que conseguir uma trilha que desse certo. Se colocar muita coisa na cabeça, acaba complicando tudo (Gabriel Osmar da Fonseca, 2014).

92A utilização do rádio como meio de transmissão de informações para os professores de Montes Claros iniciou-

se em 1963, através de um Projeto do Serviço de Inspetoria que atendia as escolas rurais. Não foi possível precisar o ano em que o programa foi extinto.

A primeira tecnologia que permitiu a educação a distância foi a escrita. O rádio está disponível desde o início da década de 20, quando a KDKA de Pittsburg PA tornou-se a primeira emissora de rádio comercial a operar (PEREIRA, Eva; MORAES, MOARES, R. 2009 p. 68). No Brasil a 1ª transmissão radiofônica oficial foi realizada no Rio de Janeiro no dia 7 de setembro de 1922 como parte das comemorações do centenário da independência. Naquele ano existiam 80 aparelhos de rádio distribuídos pela cidade. Em 1933, Anísio Teixeira cria a Radio Escola Municipal do Distrito Federal, que permitiu o desenvolvimento de uma didática especial para o ensino radiofônico. Em 1935 o presidente Getúlio Vargas inaugurou o programa oficial “A voz do Brasil” que é transmitido até os dias atuais. Mais recentemente, na década de 60, o Movimento de Educação de Base (MEB) fundado por Dom Eugênio Salles utilizou o rádio para a alfabetização escolar e educação de base no trabalho com as comunidades no Norte, Nordeste e Centro Oeste. Em 1970 foi criado o Projeto Minerva para atender aos objetivos do governo militar em resposta ao movimento da educação popular criado pela igreja em programas de ensino à distancia. Como era regime militar, todas as emissoras radiofônicas eram obrigadas a transmitir o programa que tinha a duração de30 minutos e era de cunho informativo e cultural (ROLDÃO, 2006 p.7). Neste período a transmissão radiofônica também foi utilizada pelo Estado no programa Madureza Ginasial e Colegial que objetivava preparar os jovens e adultos para obtenção da certificação.

A reação do Professor Gabriel Osmar ao que era prescrito pela Secretaria de Educação não invalidou a importância dessa formação para sua prática, pois entende que, por ser leigo,

o conhecimento a mais que tinha era das reciclagens que aconteciam mensalmente. Essa compreensão demonstra uma atitude reflexiva, pautada nas suas próprias iniciativas em função das suas experiências, dos seus alunos, do campo, das parcerias e cooperações, dos recursos e das suas próprias limitações (PERRENOUD, 1999, p. 5-21).

Na análise de Nóvoa (1991, p.07), o desenvolvimento das ciências da educação tem contribuído para desvalorizar os saberes da experiência e as práticas dos professores“[...]os esforços de racionalização do ensino não se concretizam a partir de uma valorização dos saberes de que os professores são portadores, mas sim, através de um esforço para impor novos saberes ditos científicos”. Também podemos utilizar para compreender a prática do professor Gabriel Osmar a noção de cultura empírica ou cultura efectual defendida por Escolano (2011, p.19) “(…) que no es la de los discursos académicos ni la de las normas