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Sintomas somáticos e a sobrecarga da depressão

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Sintomas somáticos aumentam as já marcantes sobrecarga e incapacidade associadas à depressão. Dados da US National Household Survey (Bao et al., 2003) demonstraram que pacientes com queixas de dores em geral, incluindo dores articulares, dorsalgias e cefaleias de forte intensidade, têm a saúde física e mental consideravelmente comprometida, referindo sofrimento psíquico maior que pacientes sem tais queixas. Ohayon e Schatzberg (2003) concluíram que o sintoma humor depressivo costumava perdurar mais em pacientes com dores em geral, perfazendo uma média de aproximadamente seis meses.

O estudo “World Health Survey” da Organização Mundial de Saúde avaliou 18 medidas do estado de saúde atual e de desfecho clínico5, criadas especialmente para essa investigação, em 245.404 participantes em 60 países de todas as regiões do mundo. Depois de ajustes para os fatores socioeconômicos e condições de saúde, a depressão foi considerada a principal influência na piora dos indicadores de saúde quando comparada com outras condições crônicas como angina, artrite, asma e diabetes (Moussavi et al., 2007).

A sobrecarga dos sintomas somáticos em pacientes com depressão leva a uma maior utilização dos serviços de saúde e ao aumento dos custos econômicos da doença (Bao et al., 2003; Fifer et al., 2003; Greenberg et al., 2003; Luber et al., 2001). O já citado estudo US National Household Survey mostra que pacientes com depressão e dores em geral consultam-se cerca de 20% a mais a cada ano do que pacientes sem dores. Um aspecto que chama a atenção nesse estudo é o fato de esses pacientes terem uma probabilidade 20% menor de serem encaminhados

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Essas medidas de saúde incluíam a autoavaliação do estado de saúde, dificuldade no desempenho do trabalho ou atividades domésticas nos 30 dias anteriores, e 16 questões relacionadas aos seguintes domínios: visão, mobilidade, capacidade de cuidar de si mesmo, relacionamentos interpessoais, cognição, dor e desconforto, sono, energia e afeto.

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a um especialista em saúde mental do que os pacientes que não referem sintomas dolorosos. No estudo conduzido por Luber et al. (2001), a sobrecarga econômica dos sintomas somáticos na depressão elevava os custos médicos em 2,8 vezes entre pacientes deprimidos com dorsalgia, e em quatro vezes nos com enxaqueca.

Alguns estudos demonstraram o impacto que a depressão pode provocar na demanda aos serviços de saúde. Em um estudo de coorte que seguiu 15.186 pacientes durante o período de um ano, pacientes com diagnóstico de depressão tiveram um número significativamente maior de consultas em serviços de Atenção Primária e taxas mais altas de encaminhamento ao especialista e realização de exames radiológicos (Luber, 2000). Ainda no âmbito dos serviços de Atenção Primária, em um estudo realizado por Shvartzman et al. (2005) em Israel, pacientes com diagnóstico de depressão (7,5% da amostra) também apresentaram maiores taxas de utilização dos serviços de saúde, onerando o sistema.

Adler et al. (2006) avaliaram a relação entre a gravidade da depressão e o desempenho profissional entre pacientes atendidos na rede de Atenção Primária e que se encontravam empregados no momento da primeira avaliação. Pacientes com depressão (n=193) foram comparados a pacientes com artrite (n=93) e controles (n=193). O grupo de pacientes com depressão apresentou maiores dificuldades no manejo das situações interpessoais no trabalho, no gerenciamento do tempo e uma menor produtividade; os pacientes com artrite apresentaram maior dificuldade no desempenho de tarefas que exigiam agilidade física. Mesmo os pacientes depressivos que apresentaram melhora clínica com o tratamento continuaram apresentando desempenho pior no trabalho quando comparados ao grupo controle.

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A presença de sintomas somáticos em pacientes deprimidos eleva ainda mais a já conhecida sobrecarga atribuída aos transtornos depressivos. Um estudo com 5.808 pacientes atendidos em serviços de Atenção Primária mostrou que entre os pacientes com depressão (54% da amostra), aqueles que apresentavam dores crônicas associadas tinham um prejuízo significativamente maior em termos de qualidade de vida, maior gravidade dos sintomas somáticos e uma prevalência maior de transtornos relacionados à ingestão de bebidas alcoólicas (Arnow et al., 2006). Em consonância com tais resultados, outro estudo demonstrou que pacientes com depressão e dores crônicas tiveram taxas significativamente mais altas de faltas ao trabalho do que pacientes com dores crônicas, mas sem depressão (Munce et al., 2007)

Emptage et al. (2005) acompanharam durante seis anos um grupo de 9.825 sujeitos com idade entre 50 e 61 anos, objetivando avaliar a relação entre depressão associada a dores em geral com medidas de dificuldades nas seguintes áreas: desempenho de tarefas diárias, problemas em suas atividades profissionais, manutenção ou perda do emprego, dependência de seguros ou benefícios e gastos com saúde. Nas avaliações realizadas no 2º e 6º ano de seguimento, tanto os indivíduos com dores intensas isoladamente como aqueles com depressão e dor tiveram maior probabilidade de apresentarem novas limitações funcionais e custos financeiros mais elevados com a saúde. Os pacientes com depressão e dor sofreram um maior número de demissões do que os pacientes com dor ou depressão isoladamente.

Na Noruega, Mykletun et al. (2006) acompanharam 45.782 sujeitos de um estudo populacional de saúde que no início da pesquisa não estavam recebendo nenhuma pensão por problemas de saúde. Ao final de seis anos de seguimento,

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concluíram que os sintomas de ansiedade e depressão eram os principais preditores de pensões pagas por invalidez. Entre esses aposentados, os sintomas somáticos tiveram mais impacto que qualquer outro diagnóstico médico.

Apontando para uma outra direção, uma análise dos dados do

Sequence Treatment Alternatives to Relieve Depression (STAR*D) por Husain et al.

(2007) não encontrou indícios que a depressão acompanhada por sintomas dolorosos aumente a sobrecarga clínica ou a cronicidade dos quadros depressivos.