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A existência do Sistema calicreína-cininas (SCC) foi descrito em 1909 por Abelous and Bardier. Este sistema constitui uma cascata metabólica, que quando ativado promove a liberação de cininas vasoativas. Este complexo sistema é composto por enzimas calicreínas que liberam cininas a partir de precursores cininogênios de alto e baixo peso molecular, que por sua vez exercem suas atividades ligando-se a receptores específicos (Pesquero e Bader, 1998; Moreau, Garbacki et al., 2005) (Figura 4).

As Calicreínas são serino-proteases encontradas em células glandulares, fluídos biológicos e neutrófilos e são divididos em dois grupos principais: calicreína plasmática e tecidual. O dois tipos se diferem de acordo com o peso molecular, a característica imunológica, a especificidade do substrato, o tipo de cinina ativada e a importância funcional (Bhoola, Figueroa et al., 1992). A calicreína plasmática participa da ativação da coagulação do sangue, da regulação do tônus vascular, da fibrinólise e do processo inflamatório. Essa pode circular ainda em um estado inativo, conhecida como pré-calicreína (PK) plasmática ou fator de Fletcher. A PK é uma glicoproteína sintetizada no fígado e está presente no plasma como um complexo ligado ao cininogênio de alto peso molecular (HK). Para formar a calicreína, a PK se torna ativa pelo fator de Hageman ou XIIa (Sharma, Uma et al., 1996).

Os cininogênios são proteínas multifuncionais envolvidas na inflamação, na coagulação e na proteção a danos celulares. Eles são sintetizados no fígado e circulam no plasma e em outros fluídos corporais. Na circulação humana estão presentes em duas formas: alto (HK) e baixo peso molecular (LK), que se diferem pelo tamanho molecular, sensibilidade à calicreína e funções fisiológicas. A calicreína plasmática atua sobre HK para produzir a bradicinina (BK), enquanto que a liberação da calidina depende da ação de ambos cininogênios, LK e HK (Sharma, Uma et al., 1996).

A família das cininas inclui principalmente a BK, a calidina e a metionil-lisil-BK (Sharma, Uma et al., 1996). Estas são peptídeos ativos derivados dos cininogênios pela ação da calicreína e estão envolvidas em uma série de processos biológicos como: vasodilatação, aumento da permeabilidade vascular, contração da musculatura lisa (intestino, útero e árvore

broncopulmonar) e metabolismo da glicose (Bhoola, Figueroa et al., 1992), uma vez que promove aumento na fosforilação do receptor de insulina estimulando a translocação de GLUT4 para a membrana plasmática (Duka, Shenouda et al., 2001; Henriksen e Jacob, 2003).

Para que essas atividades biológicas aconteçam faz-se necessário a ligação com receptores B1 ou B2. Os receptores B1 são pouco expressos em condições normais e

respondem a metabólitos das cininas gerados pela arginina carboxipeptidase (des-Arg9-BK) (Moreau, Garbacki et al., 2005) e são responsáveis por mediar eventos inflamatórios, incluindo a hiperalgesia persistente, estado febril e aumento da permeabilidade vascular e, sob condições patológicas, efeitos contráteis no músculo visceral liso (Pesquero e Bader, 1998; Marcondes e Antunes, 2005). Já os receptores B2 são responsáveis pela maior parte das ações

fisiológicas do SCC, e são amplamente distribuídos em tecidos humanos. Quando ativados, os receptores B2 estimulam a fosfolipase C resultando na formação de trifosfato de inositol (IP3)

e diacilglicerol e consequente aumento de cálcio (Ca+) intra e extracelular. Além disso, há o aumento nos níveis de adenosina 3,5-monofosfato, o AMP cíclico intracelular (Marcondes e Antunes, 2005) e formação de NO resultando na estimulação de guanilato ciclase e acréscimo de guanosina 3,5-monofosfato, o GMP cíclico (cGMP) (Bhoola, Figueroa et al., 1992). Afirmação esta confirmada por Loiola, Reis et al. (2011) que observaram que a ausência do receptor B1 e B2 de cininas em camundongos nocautes gera uma menor biodisponibilidade de

Figura 4: Esquema do Sistema Calicreína-Cininas e formação de óxido nítrico. HK: cininogênio de alto peso molecular; LK: cininogênio de baixo peso molecular; CPM/CPN: carboxipeptidases M ou N; Des- Arg9-BK: arginina carboxipeptidase; ECA: enzima conversora de angiotensina; Ca+: cálcio; NOS: óxido nítrico sintase; NO: óxido nítrico. Adaptado de Sharma, Uma et al., 1996; Marcondes e Antunes, 2005.

Uma vez liberada na circulação, as cininas são rapidamente inativadas por um grupo de enzimas chamadas cininases, entre elas estão a cininase I e a II. Estão presentes no plasma, células endoteliais, tecidos, urina e fluídos corporais (Sharma, Uma et al., 1996). A cininase I é o nome genérico dado as carboxipeptidases M ou N (CPM e CPN) que transformam a BK no metabólito des-Arg9-BK mais comumente pelos receptores B1 (Mitsui, Nomura et al.,

2004). A cininase II ou enzima conversora de angiotensina (ECA) é a principal enzima responsável pela metabolização de BK em leitos vasculares, produzido no pulmão ela é responsável por inativar a BK no metabólito BK1-5 (Bhoola, Figueroa et al., 1992; Sharma,

Uma et al., 1996).

4.4.1. Óxido Nítrico

O NO é um gás difusível e lipossolúvel, envolvido no processo de regulação do sistema cardiovascular, nervoso e imunológico (Zhou e Zhu, 2009). Foi descrito pela primeira vez como principal mediador da vasodilatação endotélio dependente em 1980 (Furchgott e Zawadzki, 1980; Palmer, Ferrige et al., 1987), sendo posteriormente encontrado como importante regulador de várias funções corporais. Em 1998, Robert F. Furchgott, Louis Ignarro e Ferid Murad foram premiados com o Nobel pela descoberta das propriedades e sinalização do NO (Gao, 2010) .

Esse gás é basicamente gerado pela ação das NOS na L-arginina (Figura 4). Três isoformas da NOS são descritas: NOS neuronal (nNOS), NOS indutível (iNOS) e NOS endotelial (eNOS) (Reid, 1998; Govers e Rabelink, 2001). A nNOS foi identificada primeiramente no cérebro, onde é altamente expressa pelos neurônios, além de ser abundante em fibras musculares IIb e coração, sendo o NO derivado da nNOS responsável pela modulação da função neuromuscular e da contratilidade. No sistema nervoso central (SNC), o NO derivado dessa isoforma atua como neurotransmissor envolvido na plasticidade neuronal (formação da memória) (Melikian, Seddon et al., 2009).

Em contraste, a isoforma indutível, iNOS, é liberada em resposta a inflamação de caráter crônico ou agudo. Embora a regulamentação do iNOS seja realizada pela calmodulina, a sua ativação não é dependente da concentração de Ca+, cuja modulação se dá por citocinas pró-inflamatórias e por endotoxinas (Nussler e Billiar, 1993; Pautz, Art et al., 2010). A sua

produção pode ser importante para os mecanismos de defesa, pois levam à apoptose e/ou necrose de microrganismos. Porém, sua produção crônica e acentuada levam a efeitos patológicos sistêmicos, como por exemplo a resistência à insulina. Shimabukuro, Ohneda et al. (1997) ao investigarem ratos Zucker obesos diabéticos e magros verificaram o papel citotóxico do NO induzido pelo iNOS por AGLs nas ilhotas pancreáticas. Assim, quando administravam inibidores de iNOS, impediam a sua liberação, reduzia a disfunção e destruição das células β do pâncreas e possível hiperglicemia.

A eNOS está localizada nas cavéolas, onde se liga a proteínas denominadas caveolinas, sendo expressa principalmente na vasculatura endotelial do músculo esquelético, coração, pâncreas e tecido adiposo (Patrice e André, 2004). Em qualquer localização ela promove vasodilatação e disponibilidade de substratos. Nas células endoteliais, mediante a um estímulo da BK ou da acetilcolina e aumento do fluxo de Ca+ para o interior da célula, haverá uma ligação da NOS com o Ca+ e com a calmodulina para a ativação da transformação do aminoácido L-arginina em L-citrulina e NO. Ao difundir-se para as células da musculatura lisa, o NO irá estimular a enzima guanilato ciclase solúvel, resultando no aumento da síntese de cGMP. Este acréscimo é responsável pelo relaxamento dessa musculatura e consequente aumento do diâmetro dos vasos sanguíneos e fluxo de sangue (Moncada e Higgs, 1993; Farrell e Blake, 1996). Tanto a eNOS, quanto a nNOS são dependentes da elevação do Ca+ intracelular, que é fortemente regulada pela calmodulina (Pautz, Art et al., 2010).

No entanto, a mensuração do NO torna-se dificultada, por ser uma molécula com meia-vida curta e por reagir rapidamente com o oxigênio livre, hemoglobina, dentre outros. Assim é realizada normalmente através dos produtos finais de NO, como o nitrito (NO2-)

(Moshage, Kok et al., 1995; Guevara, Iwanejko et al., 1998; Calvert, 2011).

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