• Nenhum resultado encontrado

Na Constituição Federal, abrigo do sistema constitucional brasileiro, encontramos as diretrizes para a organização do Estado de Direito.

O sistema constitucional brasileiro, formado tanto pelas regras de estrutura como pelas regras de comportamento, caracteriza-se por sua descrição minuciosa

31 CARVALHO, Paulo de Barros. Op. cit., p. 21. 32 VILANOVA, Lourival. Op. cit, p. 154

dos comportamentos pretendidos, peculiaridade pouco encontrada nos sistemas constitucionais de outros países.

E é esta forma pormenorizada de fixação das normas constitucionais que permite que os doutrinadores classifiquem a Constituição Federal como sendo analítica33.

A característica analítica supramencionada está, no campo tributário, intimamente relacionada à discriminação detalhada das competências tributárias dos entes tributantes, momento em que o constituinte originário objetivou autorizar a tributação de forma específica e expressa para cada um dos entes políticos, não deixando margem a discussões acerca da competência de cada um.

O constituinte originário fixou rol limitado das competências tributárias e, para o fechamento da questão atinente à competência tributária, dispôs no artigo 154, inciso I, que caberá à União a competência para instituir o imposto não previsto na Constituição Federal. Desta forma, entendemos que não há abertura no texto constitucional que permita a tributação pelos entes políticos fora dos parâmetros constitucionais. Daí dizermos ser analítica a Constituição Federal

A Constituição Federal da República Federativa do Brasil desempenha papel fundamental em nosso sistema jurídico, uma vez que “não é mero feixe de leis, igual a qualquer outro corpo de normas. A Constituição, sabiamente, é um corpo de normas qualificado pela posição altaneira, suprema, que ocupa o conjunto normativo. É a lei das Leis. É a lei máxima, à qual todas as demais se subordinam e na qual todas têm seu fundamento de validade. É a lei de mais alta hierarquia. É a matriz última da validade de qualquer ato jurídico”, como nos ensina Celso Antônio Bandeira de Mello34.

33 ALEXANDRE DE MORAES, em sua obra, Direito constitucional, p. 5-6, ao classificar as

Constituições faz diferenciação quanto à estabilidade e à extensão/finalidade das mesmas. Aduz que, quanto à estabilidade, as Constituições podem ser classificadas como constituições imutáveis (que não permitem qualquer modificação), rígidas (permitem modificações, mas que exigem um processo legislativo mais solene e dificultoso do que o existente para a edição das demais espécies legislativas), flexíveis (podem ser alteradas por processo legislativo ordinário) e semi-flexíveis (algumas regras podem ser alteradas por processo legislativo ordinário, enquanto outras somente por um processo legislativo especial e mais dificultoso). Quanto à Constituição Federal Brasileira o autor a classifica como super-rígida, “uma vez que em regra poderá ser alterada por um processo legislativo diferenciado, mas excepcionalmente, em alguns pontos é imutável (CF, art. 60, §4° - cláusulas pétreas)”. E, no que toca a extensão/finalidade, classifica as constituições em analíticas ou dirigentes e sintéticas. As constituições analíticas examinam e regulamentam todos os assuntos que entendam relevantes a formação, destinação e funcionamento do Estado. Já as Constituições sintéticas prevêem somente os princípios e as normas gerais de regência do Estado,organizando-o e limitando seu poder, por meio de estipulação de direitos e garantias fundamentais.

Humberto Bergmann Ávila35 dissertando acerca da unidade jurídica destaca o

voto do Ministro Celso de Mello que, com sábias palavras, resumiu de forma magistral o conjunto normativo, formado pelos preceitos inseridos na Carta Maior chamado por ele de bloco de constitucionalidade. Vejamos detalhadamente o voto proferido na ação direta de inconstitucionalidade, medida cautelar n° 535, relator ministro Celso de Mello, decisão monocrática prolatada em 18.02.02:

não foi por outra razão que o Supremo Tribunal Federal, certa vez, e para além de uma perspectiva meramente reducionista, veio a proclamar – distanciando-se, então, das exigências inerentes ao positivismo jurídico – que a Constituição da República, muito mais do que o conjunto de normas e princípios nela formalmente positivados, há de ser também estendido em função do próprio espírito que a anima, afastando-se desse modo, de uma concepção impregnada de evidente minimalismo conceitual (RTJ 71/289, 292 – RTJ 77/657). É por tal motivo que os tratadistas – consoante observa JORGE XIFRA HERAS (“Curso de Derecho Constitucional”, p. 43) –, em vez de formularem um conceito único de Constituição, costuma referir-se a uma pluralidade de acepções, dando ensejo à elaboração teórica do conceito de bloco de constitucionalidade (ou de parâmetro constitucional), cujo significado – revestido de maior ou de menor abrangência material –

projeta-se, tal seja o sentido que se lhe dê, para além da totalidade das regras constitucionais meramente escritas e dos princípios contemplados, explícita ou implicitamente, no corpo normativo da própria Constituição formal, chegando, até mesmo, a compreender normas de caráter

infraconstitucional, desde que vocacionadas a desenvolver, em toda a sua plenitude, a eficácia dos postulados e dos preceitos inscritos na Lei Fundamental viabilizando, desse modo, e em função de perspectivas conceituais mais amplas, a concretização da idéia de ordem constitucional global. Sob tal perspectiva, que acolhe conceitos múltiplos de constituição, pluraliza-se a noção mesma de constitucionalidade/in constitucionalidade, em decorrência de formulações teóricas, matizadas por visões jurídicas e ideológicas distintas, que culminam por determinar – quer elastecendo-as, quer restringindo-as – as próprias referências paradigmáticas conformadoras do significado e do conteúdo material inerentes à Carta Política. Torna-se relevante destacar, neste ponto, por tal razão, o magistério de J.J. GOMES CANOTILHO (“Direito Constitucional e Teoria de Constituição”, p. 811/812, item n. 1, 1998, Almedina), que bem expôs a necessidade de proceder-se à determinação do parâmetro de controle da constitucionalidade, consideradas as posições doutrinárias que se digladiam em torno do tema: “Todos os actos normativos devem estar em conformidade com a Constituição (art. 3°/3). Significa isto que os actos legislativos e restantes actos normativos devem estar subordinados, formal, procedimental e substancialmente, ao parâmetro constitucional. Mas qual é o escalão normativo de acordo com o qual se deve controlar a conformidade dos actos normativos? As respostas a este problema oscilam fundamentalmente entre as duas posições: (1) o parâmetro constitucional equivale à Constituição escrita ou leis com valor constitucional formal, e daí que a conformidade dos actos normativos só possa ser aferida, sob o ponto de vista da sua constitucionalidade ou inconstitucionalidade, segundo as normas e princípios escritos da Constituição (ou de outras leis formalmente constitucionais); (2) o parâmetro constitucional é a ordem constitucional

Revista de direito público 57-58, p. 237.

35 ÁVILA, Humberto Bergmann. Sistema constitucional tributário. 3ª ed. São Paulo, Saraiva, 2008, p.

global, e, por isso, o juízo de legitimidade constitucional dos actos normativos deve fazer-se não apenas segundo as normas e princípios escritos das leis constitucionais, mas também tendo em conta princípios não escritos integrantes da ordem constitucional global. Na perspectiva (1), o

parâmetro da constitucionalidade (= normas de referência, bloco de constitucionalidade) reduz-se às normas e princípios da Constituição e das leis com valor constitucional; para a posição (2), o parâmetro constitucional

é mais vasto do que as normas e princípios constantes das leis constitucionais escritas, devendo alargar-se, pelo menos, aos princípios reclamados pelo ‘espírito’ ou pelos ‘valores’ que informam a ordem constitucional global.(grifos do autor)

Como bloco de constitucionalidade que é, e como prescritor das condutas a serem adotadas pelos sujeitos de direito, o sistema constitucional brasileiro traz em seu bojo alguns temas ou conjunto de normas jurídicas constitucionais que não são passíveis de alteração são as chamadas cláusulas pétreas, constantes no artigo 60, §4° da Constituição Federal, que assim está escrito:

Artigo 60 [...]

§4° Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I – a forma federativa de Estado;

II – o voto direito, secreto, universal e periódico; III – a separação dos Poderes;

IV – os direitos e garantias individuais.

As denominadas cláusulas pétreas pretendem preservar o texto constitucional em seus valores mais preciosos, tais como a federação; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes e, por fim, mas não menos importante, os direitos e as garantias fundamentais.

É importante fixar, como premissa para coerência do presente trabalho, que os direitos e as garantias fundamentais são cláusulas pétreas e que, portanto, nem mesmo por meio de procedimento próprio e específico são passíveis de alterações.

As matérias constantes das cláusulas pétreas são valores que o constituinte originário entendeu que não são passíveis de modificação, tendo em vista serem valores inerentes à manutenção da república e da ordem constitucional por ele fixada. Não se trata de valores escolhidos ao bel-prazer do constituinte, mas sim de valores que contêm o cerne da estrutura constitucional e que, portanto, devem ser preservados.