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A anterioridade das leis tributárias MESTRADO EM DIREITO DO ESTADO

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Academic year: 2019

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(1)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO – PUC/SP

Ana Carolina de Paula Leal de Melo

A anterioridade das leis tributárias

MESTRADO EM DIREITO DO ESTADO

(2)

ANA CAROLINA DE PAULA LEAL DE MELO

A ANTERIORIDADE DAS LEIS TRIBUTÁRIAS

Dissertação apresentada à Banca Examinadora como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Direito, Área de Direito do Estado, Subárea Direito Tributário, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP, sob orientação da Professora Doutora Regina Helena Costa.

(3)

Banca Examinadora

_________________________________

_________________________________

(4)

A Deus, que foi, é e sempre será. Para que todos saibam e vejam que sou filha do Deus Vivo!!!!! A Ti toda a honra, glória, poder e majestade!!!!!!

(5)

RESUMO

(6)

levantar debates e reflexões, procurando responder de forma científica, questões que, esperamos, sejam úteis no desenvolvimento do tema na melhor doutrina e nos tribunais pátrios.

TEMA: O REGIME JURÍDICO DA ANTERIORIDADE DAS LEIS TRIBUTÁRIAS

AUTOR: ANA CAROLINA DE PAULA LEAL DE MELO

(7)

ABSTRACT

(8)

resolve in a scientific way questions that, we hope, are useful in the development of the subject following the best teaching methods, and in Brazilian courts.

SUBJECT: THE LEGAL SYSTEM OF ANTERIORTY OF TAX LAWS

AUTHOR: ANA CAROLINA DE PAULA LEAL DE MELO

(9)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...11

I O SISTEMA JURÍDICO...15

I.1 NOÇÃO DE SISTEMA JURÍDICO ...15

I.2 CLASSIFICAÇÃO DOS SISTEMAS...17

I.3 DIFERENCIAÇÃO ENTRE SISTEMA E ORDENAMENTO ...19

I.4 A HIERARQUIA DAS NORMAS NO SISTEMA JURÍDICO...20

I.5 A AUTOPOIESE DO SISTEMA JURÍDICO...23

I.6 NORMAS JURÍDICAS: REGRAS DE ESTRUTURA E DE COMPORTAMENTO ...31

I.7 SISTEMA CONSTITUCIONAL BRASILEIRO ...31

I.8 O SUBSISTEMA CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIO ...35

II OS PRINCÍPIOS E REGRAS CONSTITUCIONAIS NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO...37

II.1 NOÇÃO DE PRINCÍPIO JURÍDICO...37

II.2 DIFERENCIAÇÃO ENTRE PRINCÍPIOS E REGRAS JURÍDICAS...39

II.3 PREVALÊNCIA DOS PRINCÍPIOS E REGRAS CONSTITUCIONAIS ...43

II.4 PRINCÍPIOS JURÍDICOS EXPLÍCITOS E IMPLÍCITOS ...45

III PRINCÍPIOS DA ANTERIORIDADE: ANTERIORIDADE DO EXERCÍCIO, ANTERIORIDADE NONAGESIMAL E ANTERIORIDADE ESPECIAL...47

III.1 PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE: LINHAS GERAIS ...48

III.2 EVOLUÇÃO CONSTITUCIONAL: ORIGEM E DISTINÇÃO DO PRINCÍPIO DA ANUALIDADE...49

III.3 O PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL ...53

III.3.1 O Princípio da Anterioridade e Princípios Correlatos...56

III.3.1.1 O Princípio da Anterioridade e o Princípio da Segurança Jurídica...56

III.3.1.2 O Princípio da Anterioridade e o Princípio da Legalidade ...61

III.3.1.3 O Princípio da Anterioridade e o Princípio da Irretroatividade...64

III.4 AS DIVERSAS ESPÉCIES DO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE ...66

III.4.1 O Princípio da Anterioridade do Exercício...67

(10)

III.4.3 O Princípio da Anterioridade Especial...72 III.5 O PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE E AS CONTRIBUIÇÕES

PREVISTAS NOS ARTIGOS 149, §1° E 149-A; OS EMPRÉSTIMOS COMPULSÓRIOS DO ARTIGO 148, INCISO II E OS IMPOSTOS

RESIDUAIS PREVISTOS NO ARTIGO 154, INCISO I, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL ...77 III.6 A IMPORTÂNCIA DO IMPOSTO SOBRE RENDA PARA A FIXAÇÃO DO

PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE ...82 III.7 AS EXCEÇÕES AO PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE...88 III.7.1 Os Impostos Extrafiscais...91 III.7.2 O Imposto incidente sobre a Renda e Proventos de Qualquer

Natureza...95 III.7.3 O Imposto Extraordinário...96 III.7.4 A Base De Cálculo Dos Impostos Incidentes Sobre A

Propriedade De Veículos Automotores (IPVA) E Sobre

Propriedade Predial E Territorial Urbana (IPTU)...97 III.7.5 Os Tributos Excepcionados Por Emenda Constitucional...100 III.7.5.1 O ICMS Incidente Sobre Combustíveis E Lubrificantes ...103 III.7.5.2 A Contribuição De Intervenção No Domínio Econômico

Incidente Sobre As Atividades De Importação Ou

Comercialização De Petróleo E Seus Derivados, Gás Natural E

Seus Derivados E Álcool Combustível (CIDE-COMBUSTÍVEL) ...106 III.7.5.3 O Empréstimo Compulsório Para Atender A Despesas

Extraordinárias, Decorrentes De Calamidade Pública, De Guerra Externa Ou Sua Iminência ...107 III.8 AS DIVERSAS INTERPRETAÇÕES DOS PRINCÍPIOS DA

ANTERIORIDADE DO EXERCÍCIO, NONAGESIMAL E ESPECIAL ...110 III.9 ALCANCE DOS SIGNOS INSTITUIR E AUMENTAR NA CONSTITUIÇÃO 116 III.10 O ALCANCE DO SIGNO MODIFICADO CONTIDO NO ARTIGO 195,

§6°, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL ...130 III.11 A CIRCULAÇÃO DO VEÍCULO INTRODUTOR COMO REQUISITO

ESSENCIAL PARA O ATENDIMENTO DO PRINCÍPIO DA

(11)

III.12 O PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE ALCANÇA A VALIDADE, A

VIGÊNCIA OU EFICÁCIA DA NORMA JURÍDICA QUE INSTITUI, MAJORA OU MODIFICA O TRIBUTO?...137 III.13 O PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE E AS MEDIDAS PROVISÓRIAS...143 III.13.1 O Regime das Medidas Provisórias...143 III.13.2 Da Impossibilidade de as Medidas Provisórias Instituírem ou

Aumentarem Tributo. Violação aos Princípios da Legalidade, da

Estrita Legalidade, da Segurança Jurídica e da Anterioridade...145 III.13.3 O Alcance do §2°, do Artigo 62, da Constituição Federal...159 III.13.4 A Modificação de Tributos pelas Medidas Provisórias...163 III.13.5 A Instituição de Tributos pelas Medidas Provisórias e a

Posição dos Tribunais Pátrios...165 III.13.6 As Medidas Provisórias e as Exceções ao Princípio da

Anterioridade...169

CONCLUSÃO...171

(12)

INTRODUÇÃO

Nosso interesse pelo tema surgiu com a promulgação da Emenda Constitucional n° 42/2003, que alterou o texto constitucional introduzindo a alínea “c”, ao inciso III, do artigo 150, da Constituição Federal, que instituiu a anterioridade especial.

Pudemos observar, na oportunidade, que foi grande a repercussão da introdução do dispositivo no ordenamento jurídico, em especial na doutrina pátria, porque todos sabiam e viviam o desrespeito ao princípio da segurança jurídico, tendo em vista que constantemente as leis instituidoras ou majoradoras de tributos eram publicadas nos apagares das luzes do exercício financeiro, ou ainda veiculadas por edições extras dos jornais oficiais que somente estavam a disposição de pequena parte da publicação e nos últimos minutos do dia 3 de dezembro, isto quando não circulavam apenas nos primórdios do exercício financeiro seguinte a sua suposta publicação.

Assim, todo o povo ansiava por medidas que pudessem conferir maior efetividade ao primado constitucional da segurança jurídica, que somente poderia ser verdadeiramente cumprido se obedecidos os princípios da anterioridade do exercício e da anterioridade nonagesimal.

Ao estudarmos de forma um pouco mais aprofundada o tema da anterioridade nos defrontamos com diversas minúcias e divergências que nos faziam percorrer caminhos que jamais esperávamos estar presentes.

Deparamo-nos, inicialmente, com as diversas posições de mestres de peso na doutrina pátria que davam interpretações peculiares a cada um dos princípios da anterioridade, havendo, muitas vezes, diferenças sutis que, se estudadas apressadamente, poderiam nos levar ao engano de que há convergência de posição entre juristas renomados, o que verdadeiramente não ocorre na maioria dos casos.

Foi apresentada ainda, a importância que há da publicação e circulação das normas para o tema da anterioridade para poder aplicar de forma precisa o princípio da anterioridade e conferir se foi efetivamente cumprido.

(13)

criação e majoração de tributos por meio das medidas provisórias. Para tanto, analisaremos o alcance que a norma veiculadora das medidas provisórias tem em confronto com as normas da anterioridade. Veremos, também, o alcance dos conceitos de urgência e necessidade.

O estudo da anterioridade nos possibilitou também conhecer a origem do princípio da anterioridade e sua relação íntima com o princípio da anualidade.

O princípio da anterioridade levou-nos também ao estudo do sistema jurídico tributário e, mais especificamente ao modo como as normas são introduzidas no sistema e como elas se interrelacionam.

Ateremo-nos a importância que os princípios constitucionais têm no ordenamento jurídico e sua diferenciação das regras e postulados. Veremos a influência dos princípios constitucionais nas demais normas do ordenamento jurídico, e, de forma especial focaremos o papel da anterioridade neste contexto.

Cumpre ervar, ainda, que não é comum que o tema seja enfrentado levando-se em conta o texto constitucional primitivo, ou levando-seja, levando-sem as alterações introduzidas por emenda constitucionais e mais, sem muitas vezes ater-se ao fato de que o texto constitucional, ao menos o originário é e deve ser interpretado de forma a harmonizar as normas ali veiculadas.

Importante destacar a questão da análise do texto constitucional originário, uma vez que, como cediço, o legislador constitucional derivado está atrelado aos ditames constitucionais ordinários, em especial àqueles que dizem respeito as denominadas cláusulas pétreas, que protegem o direito a forma federativa de Estado; o voto direito, secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes; e, por fim, mais não menos importante, os direitos e garantias individuais.

É importante a chamada de atenção para o tema em comento, uma vez que estão envolvidos valores caros ao ordenamento jurídico, como a segurança jurídica, a tripartição dos poderes e a forma republicana de Estado.

Neste trabalho, como dito anteriormente, faremos o confronte entre as normas constitucionais que veiculam as três formas do princípio da anterioridade e os limites aos quais o legislador derivado está atrelado, especialmente quando falamos em alterações dos primados constitucionais.

(14)

Para fins didáticos, realizaremos um corte metodológico no direito positivo tributário, para que, desta forma, seja possível voltarmo-nos ao objeto de estudo.

Certos de que o enquadramento que se pretende dependerá das premissas adotadas, peça fundamental da análise objetivada, no decorrer do trabalho estas serão expostas para, ao final, adotarmos os critérios estabelecidos pela própria Constituição Federal, posicionarmo-nos acerca do tema para, ao final, darmos nossa humilde contribuição às indagações e divergências doutrinárias encontradas.

(15)

I O SISTEMA JURÍDICO

I.1 NOÇÃO DE SISTEMA JURÍDICO

Sistema jurídico é expressão ambígua e que, portanto, pode causar equívocos por parte dos utentes do direito. E, como sabemos, a precisão do discurso é fundamental para a elaboração de boa Ciência, porquanto a univocidade da linguagem permite um discurso consistente, sem fragilidades.

Dizemos ser ambígua a expressão sistema jurídico, uma vez que é empregada tanto para designar o sistema do direito positivo, como o sistema da Ciência do Direito.

A caracterização da Ciência do Direito como sistema não é questão que mereça maiores reflexões doutrinárias, visto que é o discurso que pretende descrever a linguagem-objeto (direito positivo), mais especificamente as articulações havidas entre normas válidas de um determinado sistema.

Contudo, há, na doutrina, discussão intensa acerca da possibilidade de ser o direito positivo classificado como sistema. Entendemos, todavia, que o direito positivo pode e deve ser considerado como verdadeiro sistema, porque, como bem

observa Paulo de Barros Carvalho1, “enquanto conjunto de enunciados prescritivos

que se projetam sobre a região das condutas inter-humanas, o direito posto há de ter um mínimo de racionalidade para ser recepcionado pelos sujeitos destinatários, circunstância que lhe garante, desde logo, a condição de sistema”.

Lourival Vilanova2, em análise minuciosa do sistema jurídico positivo

caracterizou e diferenciou, com precisão, ambos os sistemas em referência, deixando transparecer a distinção entre os sistemas (direito positivo e Ciência do Direito). Assim, consignou:

O Direito como experiência, tomado na totalidade integrada de sentido, é um sistema prescritivo que insere dentro dessa experiência a teoria científica dogmática, que também é um sistema. São dois sistemas: um,

1 CARVALHO, Paulo de Barros.

Direito Tributário: fundamentos jurídicos da incidência. São Paulo,

Saraiva, 5ª edição, 2007, p.45.

2 VILANOVA, Lourival.

As estruturas lógicas e o sistema de direito positivo. São Paulo. Noeses, 2005

(16)

cognocitivo; outro, prescritivo. Separáveis por um corte abstrato no dado-da-experiência, o sistema da Ciência-do-Direito incorpora-se ou insere-se no próprio Direito, como fonte material sua.

Sistema, na terminologia de Husserl, é a “forma das formas”.

Tércio Sampaio Ferraz Jr.3 conceitua sistema como sendo um “conjunto de

objetos e seus atributos (repertório do sistema) mais as relações entre eles, conforme certas regras (estrutura do sistema). Os objetos são os componentes do sistema, especificados pelos seus atributos, e as relações dão o sentido de coesão ao sistema”.

Assim, ao falarmos em direito positivo nos vem à mente a idéia de conjunto

de regras.

Classe ou conjunto é a “coleção de todos aqueles e somente aqueles termos

aos quais um certo conceito seja aplicável”4. Já os elementos das classes, como

define Labert Menne5, “são os indivíduos que caem sob o predicado correspondente

à classe.” Desta forma, podemos dizer que há uma relação de pertinência entre a classe e os elementos desta classe e, entre os elementos da classe, existem relações recíprocas de subordinação e coordenação.

A pertinencialidade dos elementos às suas respectivas classes possibilitou que Kelsen propusesse o conhecido modelo dos sistemas estáticos e dinâmicos.

Conhecer o sistema jurídico em sua forma estática permite ao jurista construir os conceitos de validade, vigência, eficácia, relação jurídica, bem como o de obrigatório, permitido e proibido, entre outros. O jurista, ao analisar o sistema jurídico na visão estática procede como se ele o fotografasse em um determinado espaço e tempo.

Já a visão dinâmica do sistema jurídico permite que sejam fixados alguns conceitos como norma fundamental, hierarquia das normas, fontes do direito. O dinamismo do sistema jurídico demonstra ainda que o direito positivo está sujeito aos conceitos de expansão, contração e revisão.

3 FERRAZ JR., Tércio Sampaio.

Teoria da norma jurídica: ensaio de pragmática da comunicação normativa. Rio de Janeiro. Forense. 2006, p. 140.

4 LANGER, Suzanne K.

An introdution to symbolic logic. 3. ed. New York: Dover, 1967, p.116. 5 MENNE, Albert.

Introducción a la lógica. 3. ed. Tradução de Leopoldo-Eulogio Palácios. Madrid:

(17)

Daniel Mendonca6, para sustentar a tese que pretende diferençar sistema de

ordenamento jurídico, como adiante faremos, conceitua expansão, contração e revisão dos sistemas.

Existe expansão de um conjunto de normas quando se agrega (pelo menos) uma norma a esse conjunto; existe contração de um conjunto de normas quando se elimina (pelo menos) uma norma a esse conjunto, existe revisão quando se expande uma contração, é dizer, quando se elimina (pelo menos) uma norma desse conjunto e se agrega a ele outra norma, incompatível com a eliminada. Claro está que se um sistema normativo é definido como um conjunto de normas, qualquer mudança nesse conjunto nos leva a outro sistema distinto do anterior.

Assim, quando houver um conjunto de elementos relacionados entre si (subordinação e coordenação) e aglutinados de acordo com uma referência determinada (norma fundamental), teremos a noção de sistema.

I.2 CLASSIFICAÇÃO DOS SISTEMAS

Antes de adentrarmos na classificação dos sistemas, cumpre destacar que classificar é agrupar objetos distintos, tendo em vista as semelhanças apresentadas

entre estes. O professor Paulo de Barros Carvalho7, nos dá a exata noção do que

seja classificar e especifica que, para classificar, é necessário que sejam selecionados determinados atributos ou caracteres que unem ou agrupam elementos, permitindo, desta forma, a formação de classes distintas. Vejamos suas palavras:

Classificar é distribuir em classes; é dividir os termos segundo a ordem da extensão ou, para dizer de modo mais preciso, é separar os objetos em classes de acordo com as semelhanças que entre eles existam, mantendo-os em pmantendo-osições fixas e exatamente determinadmantendo-os com relação às demais classes. Os diversos grupos de uma classificação recebem o nome de espécies e de gêneros, sendo que espécies designam os grupos contidos em um grupo mais extenso, enquanto gênero é o grupo mais extenso que contém as espécies. A presença de atributos ou caracteres que distinguem determinada espécie de todas as demais espécies de um mesmo gênero denomina-se “diferença”, ao passo que “diferença específica” é o nome que se dá ao conjunto das qualidades que se acrescentam ao gênero para a

6 MENDONCA, Daniel.

Las claves del derecho. Barcelona: Gedisa, 2000, p. 140. 7 CARVALHO, Paulo de Barros,

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determinação da espécie, de tal modo que é lícito enunciar: a espécie é igual ao gênero mais a diferença específica [...].

[...] O gênero compreende a espécie. Disto decorre que o gênero denota mais que a espécie ou é predicado de um número maior de indivíduos. Em contraponto, a espécie deve conotar mais que o gênero, pois além de conotar todos os atributos que o gênero conota, apresenta um plus de

conotação que é, justamente, a diferença específica. Daí porque estabelecer o significado de diferença como aquilo que deve ser adicionado à conotação do gênero, para completar a conotação da espécie.8

Note-se que os elementos adotados, além de terem, obrigatoriamente, que se pautarem no direito posto, não podem ser utilizados de forma indiscriminada, sob pena de serem tantas as espécies que alcançarão a individualidade de cada objeto, não servindo, portanto, para a classificação pretendida que, como vimos, deve reunir vários objetos sob o manto de uma espécie, que, por sua vez, pertence a um gênero.

Devidamente alinhavado o que significa classificar, podemos adentrar na classificação dos sistemas.

Marcelo Neves9 propôs uma classificação muito interessante para os

sistemas, dividindo-os em reais ou empíricos e proposicionais.

Os sistemas reais são constituídos por objetos extralinguísticos do mundo físico e social, portanto, sujeitos à intuição do sujeito cognoscente.

Os sistemas proposicionais, por sua vez, são constituídos por proposições, pressupondo, portanto, linguagem. Subdividem-se em sistemas proposicionais nomológicos e nomoempíricos, e este último, em descritivos e prescritivos.

Os sistemas proposicionais nomológicos, ora denominados sistemas nomológicos diferenciam-se dos sistemas proposicionais nomoempíricos, uma vez que os primeiros (sistemas nomológicos) são meramente formais e as partes que os compõem são entidades ideais, como é o caso da Matemática ou da Lógica. Utiliza-se do método inferencial-dedutivo, ou Utiliza-seja, partem de axiomas e deUtiliza-senvolvem-Utiliza-se mediante operações lógico-dedutivas. Já os sistemas nomoempíricos são formados por proposições empíricas, portanto, passíveis de comprovação de sua verdade/falsidade (sistemas nomoempíricos descritivos) ou de sua validade e não-validade (sistemas nomoempíricos prescritivos).

8 CARVALHO, Paulo de Barros,

Comentários sobre as Regras Gerais de Interpretação a Tabela NBM/SH (TIPI/TAB), Revista Dialética de Direito Tributário, nº 12, p. 42 e ss.

9 NEVES, Marcelo.

(19)

Contudo, devemos salientar que não é possível acatar de forma integral a classificação proposta por Marcelo Neves, visto que para nós não há conhecimento sem linguagem, não consideramos a possibilidade de haver sistemas reais.

Gustavo Bernardo Krause, ao prefaciar a obra de Vilém Flusser, Língua e

Realidade, expõe o núcleo central de seu pensamento: a língua é, forma, cria e

propaga realidade10.

A linguagem permite que se tenha acesso aos fatos e às coisas do mundo real, porque a linguagem, como já mencionado, é, cria e forma a realidade.

I.3 DIFERENCIAÇÃO ENTRE SISTEMA E ORDENAMENTO

O tempo é de fundamental importância para o Direito, uma vez que, como já dito, a visão estática ou dinâmica do sistema permite ao jurista a análise sistêmica de modos diversos e, assim, que ele chegue a conclusões e conceitos que só diante de um ou outro panorama se tornam possíveis.

A sucessão de normas no tempo permitiu que Alchourrón e Bulygin11

distinguissem os conceitos de sistema de direito e ordenamento jurídico.

O sistema jurídico, na concepção desses autores, é o conjunto de normas estaticamente consideradas, ao passo que o conceito de ordenamento jurídico é usado no sentido dinâmico de “seqüência de normas”, ou seja, “uma ordem jurídica é, de acordo com esta convenção, uma seqüência de sistemas normativos”.

O ordenamento jurídico é seqüência temporal dos vários sistemas jurídicos alterados por meio da expansão, contração ou da revisão sistêmica.

Há que ressaltar, ainda que os vários sistemas jurídicos devem, obrigatoriamente, ter ao menos um elemento em comum, sob pena de se ter novo ordenamento jurídico, diverso do anteriormente constituído.

Desta forma, verifica-se que a diferenciação dos conceitos de sistema jurídico e ordenamento jurídico deve-se à estatização ou ao dinamismo sistêmico.

10 FLUSSER, Vilém.

Língua e realidade. 3ª ed., São Paulo. Annablume, 2007, p. 17.

11 ALCHOURRÓN, Carlos E.; BULYGIN, Eugenio. Sobre o concepto de orden

jurídico.In:______.Análisis lógico y derecho. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1991,

(20)

I.4 A HIERARQUIA DAS NORMAS NO SISTEMA JURÍDICO

A hierarquia das normas no sistema jurídico, também chamada de “estrutura escalonada do direito” foi objeto de estudo de Adolf Julius Merke, seguido de Kelsen e Verdross.

A teoria do escalonamento das normas jurídicas está diretamente relacionada

com a questão do fundamento de validade, que, segundo Kelsen12, advém do

critério de legalidade, como podemos observar no trecho de sua obra:

Como dado o caráter dinâmico do direito uma norma somente é válida porque e na medida em que foi produzida por uma determinada maneira, isto é, pela maneira determinada por uma outra norma, esta outra norma representa o fundamento imediato de validade daquela. A relação entre a norma que regulamenta a produção de outra e a norma assim regularmente produzida pode ser figurada pela imagem espacial da supra-infra-ordenação. A norma que regulamenta produção é a norma superior, a norma produzida segundo as determinações daquela é a norma inferior.

Diante desta passagem, podemos perceber que para Kelsen não basta apenas que haja uma norma superior que dê fundamento de validade para as demais normas inferiores, é necessário que esteja em conformidade com o sistema jurídico. Assim, para o autor, a hierarquia das normas é determinada pelo próprio sistema.

Kelsen, para dar fechamento estrutural e, consequentemente, sustentar a tese por ele desenvolvida, cria a chamada “norma fundamental” que tem a pretensão de dar fechamento operativo ao sistema, uma vez que o sistema jurídico necessita de um fundamento de validade último, que as demais normas jurídicas deverão observar e obedecer.

A norma fundamental é norma pressuposta, é axioma do sistema jurídico. Entendemos que não existe problema em firmar axioma pressuposto para dar fechamento ao sistema, visto que toda e qualquer Ciência tem que partir de axioma, que não pode ser posto à prova.

É a norma fundamental que confere unidade à pluralidade de normas pertencentes ao sistema jurídico, porque representa o fundamento e a fonte de validade de todas as normas pertencentes a essa ordem normativa.

12 KELSEN, Hans.

Teoria pura do direito. 7ª ed. Trad. João Baptista Machado, São Paulo, Martins

(21)

A função da norma fundamental é validar de forma objetiva uma ordem jurídica positiva, isto é, as normas postas por atos de vontades humanas, de uma ordem coercitiva, globalmente eficaz.

A norma fundamental não é uma norma querida, é apenas uma norma pensada, mas logicamente indispensável para a fundamentação da validade objetiva das normas jurídicas positivas.

Kelsen conclui que dado o caráter dinâmico do direito, uma norma somente é válida, porque foi produzida de uma determinada maneira, isto é, da maneira determinada por uma outra norma (norma fundamental), portanto, originária. Esta outra norma representa o fundamento imediato de validade daquela outra.

Assim, podemos afirmar que a ordem jurídica é uma construção escalonada de diferentes camadas ou níveis de normas jurídicas. A sua unidade é produto da relação de dependência que resulta do fato da validade de uma norma, que foi produzida de acordo com outra norma, até chegar à norma fundamental pressuposta – fundamento último. Dessa forma, Kelsen infere que o sistema é escalonado e piramidal, privilegiando uma visão de unicidade das normas jurídicas.

Devidamente registrada a importância da hierarquia das normas podemos concluir que a Constituição Federal é hierarquicamente superior aos demais veículos introdutores de enunciados-enunciados porque regula a forma (hierarquia sintática) e o conteúdo (hierarquia semântica) dos demais atos normativos.

Humberto Bergmann Ávila13 define com maestria o conceito de hierarquia

sintática e de hierarquia semântica. Aduz que a hierarquia sintática “diz respeito à

relação lógica entre as normas”, ao passo que a hierarquia semântica é subdividida

em formal e material. A hierarquia semântica formal “diz respeito a pressupostos

formais que uma norma institui para a edição de outra. A hierarquia semântica material focaliza os pressupostos de conteúdo que uma norma estabelece para a edição de outra”.

E, como muito bem colocado por Tárek Moysés Moussallem14, a felicidade

dos atos de fala é conferida pela Constituição Federal que possui força

ilocucionária15 maior que as demais normas do sistema jurídico:

13 ÁVILA, Humberto.

Sistema constitucional tributário. 3ª ed. São Paulo, Saraiva, 2008, p. 29. 14 MOUSSALLEM, Tárek Moysés.

Revogação em matéria tributária. São Paulo, Ed. Noeses, 2007, p.

159.

(22)

De acordo com a teoria dos atos de fala, poder-se-ia dizer que a Constituição Federal confere todos os requisitos de felicidade para a expedição dos demais atos de fala deônticos do sistema normativo”

[...]

Todavia, o jurista deve estar atento para o seguinte fato: a Constituição Federal estipula condições de felicidade para a expedição de um ato de fala deôntico. Validade ou não é predicado do ato de fala produzido, ou seja, da enunciação-enunciado. Feliz ou não se qualifica a enunciação. Juridicamente, não há obstáculos para que de uma enunciação infeliz advenha enunciado válido. Isso não retira o caráter hierárquico do sistema do direito positivo, antes, ao contrário, reforça-o, uma vez que, para expulsar enunciado válido oriundo de enunciação infeliz, deve-se, inexoravelmente, movimentar o sistema para realização de nova enunciação e, consequentemente, produção de novo enunciado para constituir a perda de validade daquele outro (originário da enunciação feliz).

[...]

Vista pelo espectro dos performativos, a hierarquia do sistema normativo é dada pela força ilocucionária do ato de fala.

[...]

Dessarte, a força ilocucionária da Constituição Federal é maior do que a força ilocucionária da lei ordinária, que, por sua vez, é maior do que a de uma sentença. (destaques do autor)

Contudo, cumpre destacar que a hierarquia das normas no sistema jurídico e seu escalonamento são conceitos insuficientes para delimitar o sistema jurídico. É preciso saber, ainda, como ocorre a relação entre as normas jurídicas e entre estas e os demais subsistemas sociais, dentro os quais está inserido o sistema jurídico.

Ricardo Guibourg16 faz severa crítica à tese kelseniana da estruturação

hierárquica das normas por entender ser referido critério insuficiente para descrever o sistema jurídico, uma vez que existem enunciados-enunciados que, apesar de serem introduzidos por enunciação-enunciado pelo constituinte originário, podem ser alterados por enunciados-enunciados inseridos por emenda constitucional.

Vejamos, então, o porquê da possibilidade de alteração dos enunciados-enunciados introduzidos por enunciação-enunciado pelo constituinte originário, poderem ser alterados por enunciados-enunciados inseridos por emenda constitucional.

16 GUIBOURG, Ricardo.

(23)

I.5 A AUTOPOIESE DO SISTEMA JURÍDICO

Após verificarmos que o sistema jurídico é estruturado de forma hierárquica, cabe agora analisarmos como ocorre a troca de informações das normas jurídicas pertencentes ao subsistema jurídico, bem como das informações advindas de outros subsistemas.

Etimologicamente, a palavra autopoiesis deriva do grego “autos” (por si

próprio) e “poiesis” (criação, produção). Significa inicialmente que o sistema é estruturado pelos componentes que ele próprio constrói.

O conceito de autopoiesis teve origem na teoria biológica de Maturana e

Varela, porém, Luhmann, em sua obra “El Derecho de la sociedad” ao fixar o

conceito de autopoiese, afasta-se do modelo biológico de Maturana, na medida em que, no desenvolvimento de sua teoria, procura distinguir os sistemas constituintes de sentido (psíquicos e sociais) dos sistemas não constituintes de sentido (orgânicos e neurofisiológicos).

Luhmann entende que um sistema processa e responde às demandas do

ambiente17 com suas estruturas internas, ou seja, de modo operativamente fechado.

Isto é comprovado pela afirmação de que o sistema produz operações próprias, antecipando e recorrendo a operações próprias e, desta maneira, determina aquilo

que pertence ao sistema e aquilo que pertence ao ambiente 18.

Assim sendo, importa saber que tipo de operação interna capacita um sistema a formar uma rede que auto-reproduz seus elementos, mediante operações com os seus respectivos códigos binários internos. Cada um dos sistemas sociais possuem códigos e programas que lhe são próprios, que lhe conferem fechamento operativo e forma específica de abertura cognitiva.

O sistema jurídico opera com o código lícito/ilícito ou, como preferem alguns,

conforme ou desconforme o direito. O código permite que o sistema jurídico seja

identificado, e que proceda à seleção das comunicações que o integrarão.

17 Luhmann vê a sociedade como um todo, como um grande sistema social e, no interior deste

sistema social, enxerga ou distingue diversos sistemas parciais, como é o caso dos sistemas jurídico, político, econômico, educacional, familiar, científico e religioso.

18 LUHMANN, Niklas.

El Derecho de la sociedad. México, Universidad Iberoamericana, 2002, p.

(24)

Já o programa determina de que maneira o código deve ser utilizado,

estabelecendo em que hipóteses a comunicação jurídica qualificará como lícito um

fato social qualquer e em que situações o identificará como ilícito, regulando a

alocação dos valores do código binário segundo a relação implicacional “se... então” (programa condicional).

O processamento dos elementos exteriores por meio de códigos próprios,

bem como a autoprodução de seus elementos caracterizam o sistema como autopoiético, ou seja, ele próprio cria sua realidade de acordo com suas operações.

Para Luhmann, a unidade do sistema jurídico decorre da operação da comunicação que caracteriza o sistema. Os sistemas autopoiéticos são formados

por comunicações “que se reproducen com base em otras comunicaciones

reproduciendo de esta manera la unidade del sistema, mientras no se presenten comunicaciones fuera de um sistema social”19.

Segundo Luhmann, os problemas de abertura e fechamento do sistema não podem ser respondidos em termos causais ou a partir do esquema “input/output”, conforme descrito por Parsons. A clássica contraposição entre sistema abertos e fechados perde sentido nesse contexto.

Daí porque o professor Celso Fernandes Campilongo20 afirma que, para

Luhmann, “fechamento operacional não é sinônimo de irrelevância do ambiente ou de isolamento causal. Por isso, paradoxalmente, o fechamento operativo de um

sistema é condição para sua própria abertura.”É dizer, porque o sistema é fechado

operacionalmente, que é aberto cognitivamente ao ambiente.

Assim, operação é a reprodução de um elemento do sistema fechado a partir dos elementos que compõem esse mesmo sistema.

Luhmann coloca o homem como ambiente da sociedade. Ao contrário do que imaginam os críticos mais apressados dessa tese, isso não comporta, de modo algum, desvalorização do homem frente à sociedade.

Primeiramente, diga-se que a diferença sistema/ambiente atribui ao ambiente uma importância tão grande quanto aquela do sistema. Luhmann considera o ambiente sempre mais complexo e rico de possibilidades do que o sistema, isto é, o sistema não pode determinar o ambiente.

19 CORSI Giancarlo; ESPÓSITO, Elena; BARALDI, Claudio.

Glosario sobre la teoria social de Niklas Luhmann, p. 32.

20 CAMPILONGO, Celso Fernandes.

Política, Sistema Jurídico e Decisão Judicial. São Paulo, Ed.

(25)

Ora, desse modo, à margem de liberdade, imprevisibilidade e autonomia conferida ao homem é ainda maior do que aquela conferida ao sistema ou a eventual inclusão dos homens no sistema social.

Afirma Luhmann que a operação que confere unidade ao sistema social é a comunicação. A comunicação, portanto, é a operação específica do sistema social, isto é, operação interna do sistema social. Não existe comunicação entre o sistema e o ambiente.

Toda comunicação sintetiza três seleções: emissão ou ato de comunicar, informação, e compreensão. O conjunto ou o processo de sucessivas comunicações forma uma rede recursiva que define a unidade do sistema social. Os sistemas sociais usam a comunicação como seu ato de reprodução. Vista como uma operação, a comunicação não pode estar fora da sociedade. Desse modelo resulta o conceito de sociedade como um sistema fechado de comunicações conectadas que reproduzem comunicação por meio de comunicação.

O sistema será fechado a partir do momento que ele (sistema) seja auto-referencial, se ele mesmo constitui, como unidades funcionais, os elementos de que é composto.

Trata-se primariamente de reprodução unitária dos elementos construtores do sistema e, simultaneamente, por ele constituídos, não da auto-organização ou da manutenção estrutural do sistema.

Nesse sentido, a unidade do sistema apresenta-se, em primeiro lugar, como unidade dos elementos básicos de que ele é composto e dos processos nos quais esses elementos reúnem-se operacionalmente.

Nesta perspectiva, um sistema autopoiético é constituído dos elementos que compõem o sistema e constitui novos elementos por meio dos elementos que já existem no sistema, por meio de uma operação circular, fechada e redundante ou reflexiva, utilizando para tanto o ambiente interno de seu sistema parcial.

Contudo, a realização da autopoiese não se limita apenas à produção de operações mediante operações. Faz-se necessário, ademais disso, a condensação e a confirmação de estruturas mediante operações que se orientam a tais estruturas.

Sob esse ponto de vista Luhmann21 vê o sistema do direito como um sistema que se

determina a si mesmo.

(26)

Com efeito, um sistema operativamente fechado pode ser assim descrito:

como un sistema autorreferencial. En este lenguaje, la referencia debe ser entendida, en el contexto de una distinción, como descripción: cada distinción dispone de un outro lado (siempre capaz de referencia). En esta medida la autorreferencia implica heterorreferencia, y al revés. El sistema que se alza a sí mismo mediante una discriminación operativa (y com esto se hace observable), se describe a sí mismo como algo distinto del entorno y com esto se incluye – como se puede claramente ver –, em la observación”. Nesse contexto, Luhmann advente que, “la observación misma permanece como uma operación del sistema (de outra manera se trataria de uma observación externa), que en el momento de su realización solo discrimina en la medida en que utiliza ésta y no outra distinción.22

Por essa razão, Luhmann explica que “El sistema del derecho es un sistema cuya operación esta ligada a la autoobservación, um sistema que observa la diferencia entre sistema y entorno y que la reproduce mediante su operación y que la vuelve a introducir en ele sistema com la ayuda da la distinción entre sistema (autorreferencia) y entorno (heterorreferencia). Cada observación externa y descripción de este sistema debe observar que el sistema mismo dispone de la

diferencia entre autorreferencia y heterorreferencia.” 23

Assim, segundo Luhmann, a diferenciação de um sistema jurídico operativamente fechado se leva a efeito por meio da referência recursiva de operações jurídicas com operações jurídicas. O sistema opera, como todo sistema autopoiético, em contínuo contato consigo mesmo de modo que, para qualificar as

operações próprias como jurídicas, o sistema tem que encontrar o seu código.24

Luhmann, portanto, concebe o direito como um sistema de operações que se rege e se desenvolve por esquemas próprios. O sistema jurídico utiliza constantemente a auto-referência para trabalhar e reproduzir-se, caracterizando-se, destarte, não pelas normas, e sim, pela diferença com seu ambiente (ao qual o homem pertence) e pelas operações internas de auto-reprodução de seus elementos.

E, “Por ‘sistema’ no entendemos nosotros, como lo hacen muchos teóricos del

derecho, um entramado congruente de reglas, sino um entramado de operaciones

fácticas que, como operaciones sociales, deben ser comunicaciones —

22 LUHMANN, Niklas. op. cit., p. 107. 23 LUHMANN, Niklas. op. cit., p. 108.

24 Os códigos são distinções com as quais um sistema observa as próprias operações e define sua

(27)

independientemente de lo que estas comunicaciones afirmem respecto al derecho. Esto significa entonces que el punto de partida no lo buscamos em la norma ni em uma tipologia de los valores, sino em la distinción sistema/entorno.”25

Cumpre salientar, ainda, que a autopoiese não se limita à auto-referência, mas também se refere à reflexividade e à reflexão em outros dois momentos do fechamento operativo.

A reflexividade é a referência de um processo a si mesmo, ou melhor, a processos sistêmicos da mesma espécie.

Nesse passo, Luhmann define a reflexividade como a auto-referência processual, ou seja, é o reingresso do processo com os meios do processo. Reflexividade como um mecanismo no interior de um sistema autopoiético implica que o processo referente e o processo referido são estruturados pelo mesmo código binário e que, em conexão com os critérios e os programas do primeiro, reaparecem em parte no segundo.

Na reflexão é o próprio sistema como um todo que atribui a operação auto-referencial e não apenas os elementos ou processos sistêmicos. Definida também como autodescrição, denota a exposição da unidade no sistema, a elaboração conceitual da identidade do sistema em oposição ao ambiente.

Enfatiza, ainda, que, dentre os sistemas, o mais abrangente é a sociedade. Assim como os demais, porém, também é constituído sobre a base de uma conexão unitária (auto-referencial) de comunicações. Nesse sentido, as unidades elementares da sociedade, as comunicações, que ela constitui mediante síntese de informação, mensagem e compreensão, somente estão presentes no seu interior, não em seu ambiente. Por essa razão, diz Luhmann, ela pode ser caracterizada como um sistema “real-necessariamente fechado”.

No entanto, embora a reprodução de comunicações só se realize dentro da sociedade (fechamento auto-referencial), existem necessariamente comunicações sobre o seu ambiente psíquico, orgânico e químico-físico (abertura).

O caráter autopoiético dos sistemas parciais da sociedade não pode, porém, ser esclarecido desse mesmo modo, pois a comunicação é a unidade elementar de todos os sistemas sociais.

Desse modo, somente quando um sistema social dispõe de um específico código-diferença binário é que ele pode ser caracterizado como auto-referencial e

(28)

fechado (e, portanto, aberto ao ambiente). Por meio de um código sistêmico próprio, estruturado binariamente entre um valor negativo (em desconformidade com o direito/ilícito) e um valor positivo específico (conforme o direito/lícito), as unidades elementares do sistema são reproduzidas internamente e distinguidas claramente das comunicações exteriores.

Nesse sentido, a autopoiesis importa uma combinação entre “codificação” e “programação”, possibilitando-se assim a simultaneidade de fechamento e abertura.

Cabe esclarecer que o código (lícito/ilícito ou conforme o direito/não conforme o direito) não pode subsistir isoladamente, pois não é capaz de escolher qual dos valores deve ser escolhido em cada operação.

Por isso Luhmann afirma que o sistema necessita e complementa-se com a existência de um programa que sirva de ponto de referência e indica como os valores do código binário devem ser aplicados.

Vale dizer, as relações dos sistemas com ambiente são programadas pelo próprio sistema. Para isso os sistemas possuem estruturas que estabelecem quais das informações do ambiente devem ser selecionadas e de que maneira essas informações devem ser processadas internamente.

Importa destacar que o ambiente não pode contribuir com nenhuma operação de reprodução do sistema. O sistema, obviamente, também não pode operar no seu ambiente. Consequentemente, o sistema não pode utilizar suas próprias operações para estabelecer contato com o seu ambiente.

Nesse contexto, pode-se afirmar que os sistemas autopoiéticos caracterizam-se pelo caracterizam-seu modo de atuar, que é operacionalmente fechado.

Luhmann entende que o fechamento operativo do sistema deve-se ao fato de que as operações que irão processar-se devem levar em conta os elementos que foram internalizados pelo sistema nas operações anteriores, sendo estes elementos pressupostos para as operações ulteriores.

Desta forma, podemos dizer que a clausura operativa do sistema é a base da

autonomia do sistema e permite distingui-lo do seu ambiente26.

E, ainda, que a clausura operativa é condição para o processamento e manutenção da complexidade social, ou seja, para o processamento de respostas às demandas do ambiente, com suas estruturas internas.

26 CORSI Giancarlo; ESPÓSITO, Elena; BARALDI, Claudio,

(29)

A teoria dos sistemas operativamente fechados, prossegue Luhmann, “es

uma teoría de la distinción entre sistema y entorno.” 27 Essa teoria faz uma abstração

das relações causais entre sistema e ambiente, não atribuindo relevância a elas na definição de seu objeto. Com efeito, por operativamente fechados, entende-se uqe os sistemas, para a produção de suas próprias operações, se remetam à rede de suas próprias operações e, nesse sentido, se reproduzem a si mesmos.

Nesse contexto, Luhmann entende que o sistema produz operações próprias antecipando e recorrendo a operações próprias. Prossegue dizendo que o próprio sistema, por conseguinte, “determina qué és lo que pertence al sistema y qué al entorno”.

Saliente-se, ainda que a reprodução autopoiética das operações gera ao mesmo tempo (i) a unidade dos elementos, (ii) a unidade do sistema ao qual

pertencem e o limite entre o próprio sistema e o ambiente28.

Daí porque afirmamos que não há comunicação entre o ambiente e o sistema. Através do conceito de autopoiese, podemos dizer que a unidade de um sistema está constituída exclusivamente pela conexão recursiva das comunicações, de modo que o mesmo “se produz e se reproduz únicamente por meio del sistema mismo y no por médio de factores situados em el entorno. Esto es válido tanto para

el sistema de la sociedad como para su sistema parcial del derecho”29.

Luhmann explica que a unidade do sistema jurídico se leva a efeito, em primeiro lugar, em forma de sequências operativas que reproduzem o sistema autopoieticamente. As operações podem observar sua pertinencialidade ao sistema, o que quer dizer que as operações têm capacidade de distinguir entre sistema e ambiente. Essa distinção atualiza a auto-referência, ou seja, atualiza uma demonstração por meio da qual o sistema designa a si mesmo a diferença de todos

os demais30.

Dizer que o sistema é autopoiético não interfere na premissa anteriormente firmada de que o sistema jurídico é estruturado de forma escalonada, porque entendemos que o sistema responde e reage por meio de seu código e

27 LUHMANN, Niklas. op. cit., p. 99.

28 CORSI Giancarlo; ESPÓSITO, Elena; BARALDI, Claudio.

Glosario sobre la teoria social de Niklas Luhmann, p. 33.

(30)

programações que lhe são próprios, tanto no que diz respeito às normas internas, assim como às informações advindas de sistemas externos.

São os códigos e a programação do sistema que possibilitam que as normas sejam escalonadas da forma e modo previstos pelo próprio sistema.

A integração da estruturação hierárquica e da autopoiese do sistema jurídico é imprescindível para a visualização do sistema jurídico em sua completude.

Após a análise detalhada da importância da autopoiese no sistema jurídico devemos regressar à questão que pretendemos responder no item I.4, qual seja, por que é possível a alteração dos enunciados-enunciados introduzidos por enunciação-enunciado pelo constituinte originário por enunciação-enunciados-enunciação-enunciados inseridos por emenda constitucional?

O direito, como demonstrado, é sistema autopoiético que, portanto, produz seus componentes a partir dos próprios elementos que o integram, por meio de operações internas. Desta forma, é o próprio sistema que estabelece quais fatos são jurídicos e quais não o são, de acordo com os códigos e os programas por ele (sistema) fixados.

Assim, a resposta à questão formulada é simples: os enunciados-enunciados introduzidos por enunciação-enunciado pelo constituinte originário podem ser alterados por enunciados-enunciados inseridos por emenda constitucional porque o

programa do sistema jurídico estabelece/prescreve situações em que será lícita

referida alteração.

No sistema jurídico brasileiro o programa existente permite que quase todos os enunciados-enunciados inseridos no texto constitucional pelo constituinte originário possam ser alterados por enunciado-enunciado introduzido pelo

constituinte derivado, com exceção das chamadas cláusulas pétreas, que serão

(31)

I.6 NORMAS JURÍDICAS: REGRAS DE ESTRUTURA E DE COMPORTAMENTO

A norma jurídica é, nos dizeres de Paulo de Barros Carvalho31, “unidade

mínima e irredutível de significação do deôntico”, o que quer significar que são os juízos hipotéticos condicionais que o intérprete do direito poderá extrair dos enunciados prescritivos, mas, para tanto, devem ser completos, ou seja, devem reunir os elementos mínimos para expressar o mandamento que a autoridade legislativa pretende seja obedecido.

Certo é que podemos verificar, no corpo da Constituição Federal e dos demais preceitos normativos, duas modalidades de regras: as regras de estrutura e as regras de comportamento.

As denominadas regras de comportamento voltam-se diretamente para a conduta das pessoas e suas relações de intersubjetividade.

Já as denominadas regras de estrutura não dizem respeito aos preceitos normativos que regulam condutas de pessoas, mas aquelas estas dirigidas ao modo de produção de outras normas jurídicas.

As regras de estruturas necessitam de outras normas que têm por conteúdo a disciplina da competência. São as regras de estruturas que possibilitam a verificação da validade ou não validade de uma norma jurídica no sistema, porque, como

mencionado por Lourival Vilanova32, as regras de estrutura estão no interior do

sistema.

I.7 SISTEMA CONSTITUCIONAL BRASILEIRO

Na Constituição Federal, abrigo do sistema constitucional brasileiro, encontramos as diretrizes para a organização do Estado de Direito.

O sistema constitucional brasileiro, formado tanto pelas regras de estrutura como pelas regras de comportamento, caracteriza-se por sua descrição minuciosa

(32)

dos comportamentos pretendidos, peculiaridade pouco encontrada nos sistemas constitucionais de outros países.

E é esta forma pormenorizada de fixação das normas constitucionais que permite que os doutrinadores classifiquem a Constituição Federal como sendo

analítica33.

A característica analítica supramencionada está, no campo tributário, intimamente relacionada à discriminação detalhada das competências tributárias dos entes tributantes, momento em que o constituinte originário objetivou autorizar a tributação de forma específica e expressa para cada um dos entes políticos, não deixando margem a discussões acerca da competência de cada um.

O constituinte originário fixou rol limitado das competências tributárias e, para o fechamento da questão atinente à competência tributária, dispôs no artigo 154, inciso I, que caberá à União a competência para instituir o imposto não previsto na Constituição Federal. Desta forma, entendemos que não há abertura no texto constitucional que permita a tributação pelos entes políticos fora dos parâmetros constitucionais. Daí dizermos ser analítica a Constituição Federal

A Constituição Federal da República Federativa do Brasil desempenha papel fundamental em nosso sistema jurídico, uma vez que “não é mero feixe de leis, igual a qualquer outro corpo de normas. A Constituição, sabiamente, é um corpo de normas qualificado pela posição altaneira, suprema, que ocupa o conjunto normativo. É a lei das Leis. É a lei máxima, à qual todas as demais se subordinam e na qual todas têm seu fundamento de validade. É a lei de mais alta hierarquia. É a matriz última da validade de qualquer ato jurídico”, como nos ensina Celso Antônio

Bandeira de Mello34.

33 ALEXANDRE DE MORAES, em sua obra,

Direito constitucional, p. 5-6, ao classificar as

Constituições faz diferenciação quanto à estabilidade e à extensão/finalidade das mesmas. Aduz que, quanto à estabilidade, as Constituições podem ser classificadas como constituições imutáveis (que não permitem qualquer modificação), rígidas (permitem modificações, mas que exigem um processo legislativo mais solene e dificultoso do que o existente para a edição das demais espécies legislativas), flexíveis (podem ser alteradas por processo legislativo ordinário) e semi-flexíveis (algumas regras podem ser alteradas por processo legislativo ordinário, enquanto outras somente por um processo legislativo especial e mais dificultoso). Quanto à Constituição Federal Brasileira o autor a classifica como super-rígida, “uma vez que em regra poderá ser alterada por um processo

legislativo diferenciado, mas excepcionalmente, em alguns pontos é imutável (CF, art. 60, §4° - cláusulas pétreas)”. E, no que toca a extensão/finalidade, classifica as constituições em analíticas ou dirigentes e sintéticas. As constituições analíticas examinam e regulamentam todos os assuntos que entendam relevantes a formação, destinação e funcionamento do Estado. Já as Constituições sintéticas prevêem somente os princípios e as normas gerais de regência do Estado,organizando-o e limitando seu poder, por meio de estipulação de direitos e garantias fundamentais.

34 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio.

(33)

Humberto Bergmann Ávila35 dissertando acerca da unidade jurídica destaca o

voto do Ministro Celso de Mello que, com sábias palavras, resumiu de forma magistral o conjunto normativo, formado pelos preceitos inseridos na Carta Maior

chamado por ele de bloco de constitucionalidade. Vejamos detalhadamente o voto

proferido na ação direta de inconstitucionalidade, medida cautelar n° 535, relator ministro Celso de Mello, decisão monocrática prolatada em 18.02.02:

não foi por outra razão que o Supremo Tribunal Federal, certa vez, e para além de uma perspectiva meramente reducionista, veio a proclamar – distanciando-se, então, das exigências inerentes ao positivismo jurídico – que a Constituição da República, muito mais do que o conjunto de normas e princípios nela formalmente positivados, há de ser também estendido em função do próprio espírito que a anima, afastando-se desse modo, de uma concepção impregnada de evidente minimalismo conceitual (RTJ 71/289, 292 – RTJ 77/657). É por tal motivo que os tratadistas – consoante observa JORGE XIFRA HERAS (“Curso de Derecho Constitucional”, p. 43) –, em vez de formularem um conceito único de Constituição, costuma referir-se a uma pluralidade de acepções, dando ensejo à elaboração teórica do conceito de bloco de constitucionalidade (ou de parâmetro constitucional), cujo significado – revestido de maior ou de menor abrangência material – projeta-se, tal seja o sentido que se lhe dê, para além da totalidade das regras constitucionais meramente escritas e dos princípios contemplados, explícita ou implicitamente, no corpo normativo da própria Constituição formal, chegando, até mesmo, a compreender normas de caráter

infraconstitucional, desde que vocacionadas a desenvolver, em toda a sua plenitude, a eficácia dos postulados e dos preceitos inscritos na Lei Fundamental viabilizando, desse modo, e em função de perspectivas conceituais mais amplas, a concretização da idéia de ordem constitucional global. Sob tal perspectiva, que acolhe conceitos múltiplos de constituição, pluraliza-se a noção mesma de constitucionalidade/in constitucionalidade, em decorrência de formulações teóricas, matizadas por visões jurídicas e ideológicas distintas, que culminam por determinar – quer elastecendo-as, quer restringindo-as – as próprias referências paradigmáticas conformadoras do significado e do conteúdo material inerentes à Carta Política. Torna-se relevante destacar, neste ponto, por tal razão, o magistério de J.J. GOMES CANOTILHO (“Direito Constitucional e Teoria de Constituição”, p. 811/812, item n. 1, 1998, Almedina), que bem expôs a necessidade de proceder-se à determinação do parâmetro de controle da constitucionalidade, consideradas as posições doutrinárias que se digladiam em torno do tema: “Todos os actos normativos devem estar em conformidade com a Constituição (art. 3°/3). Significa isto que os actos legislativos e restantes actos normativos devem estar subordinados, formal, procedimental e substancialmente, ao parâmetro constitucional. Mas qual é o escalão normativo de acordo com o qual se deve controlar a conformidade dos actos normativos? As respostas a este problema oscilam fundamentalmente entre as duas posições: (1) o parâmetro constitucional equivale à Constituição escrita ou leis com valor constitucional formal, e daí que a conformidade dos actos normativos só possa ser aferida, sob o ponto de vista da sua constitucionalidade ou inconstitucionalidade, segundo as normas e princípios escritos da Constituição (ou de outras leis formalmente constitucionais); (2) o parâmetro constitucional é a ordem constitucional

Revista de direito público 57-58, p. 237.

35 ÁVILA, Humberto Bergmann.

Sistema constitucional tributário. 3ª ed. São Paulo, Saraiva, 2008, p.

(34)

global, e, por isso, o juízo de legitimidade constitucional dos actos normativos deve fazer-se não apenas segundo as normas e princípios escritos das leis constitucionais, mas também tendo em conta princípios não escritos integrantes da ordem constitucional global. Na perspectiva (1), o

parâmetro da constitucionalidade (= normas de referência, bloco de constitucionalidade) reduz-se às normas e princípios da Constituição e das leis com valor constitucional; para a posição (2), o parâmetro constitucional é mais vasto do que as normas e princípios constantes das leis constitucionais escritas, devendo alargar-se, pelo menos, aos princípios reclamados pelo ‘espírito’ ou pelos ‘valores’ que informam a ordem constitucional global.(grifos do autor)

Como bloco de constitucionalidade que é, e como prescritor das condutas a serem adotadas pelos sujeitos de direito, o sistema constitucional brasileiro traz em seu bojo alguns temas ou conjunto de normas jurídicas constitucionais que não são passíveis de alteração são as chamadas cláusulas pétreas, constantes no artigo 60, §4° da Constituição Federal, que assim está escrito:

Artigo 60 [...]

§4° Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I – a forma federativa de Estado;

II – o voto direito, secreto, universal e periódico; III – a separação dos Poderes;

IV – os direitos e garantias individuais.

As denominadas cláusulas pétreas pretendem preservar o texto constitucional

em seus valores mais preciosos, tais como a federação; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes e, por fim, mas não menos importante, os direitos e as garantias fundamentais.

É importante fixar, como premissa para coerência do presente trabalho, que os direitos e as garantias fundamentais são cláusulas pétreas e que, portanto, nem mesmo por meio de procedimento próprio e específico são passíveis de alterações.

(35)

I.8 O SUBSISTEMA CONSTITUCIONAL TRIBUTÁRIO

O constituinte originário, seguindo a linha desenvolvida para a elaboração da Constituição Federal, qual seja, a adoção de discriminação pormenorizada dos deveres e direitos veiculados, elaborou, da mesma forma, o subsistema constitucional tributário.

No que toca ao sistema constitucional tributário, o legislador entendeu por bem, como já informado, estabelecer de forma discriminada a competência de cada um dos entes tributantes, bem como fixar os limites ao poder de tributar, que incluem os princípios constitucionais, assim como as imunidades.

As limitações ao poder de tributar encontram-se em “Título VI – Da Tributação e do Orçamento”, mais especificamente na “Seção II – Das limitações ao poder de tributar”, mas não apenas nesta seção.

Ao fixar as limitações ao poder de tributar, o legislador originário, ao inserir a expressão “sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte”, quis deixar claro, ao nosso sentir, que não apenas estas, mas há outras garantias individuais no texto constitucional que asseguram o direito do contribuinte.

Luciano Amaro36 disserta sobre a existência das limitações ao poder de

tributar, bem como dos direitos e garantias individuais em todo o texto constitucional:

[...] os limites do poder de tributar definidos pela Constituição não se esgotam nos enunciados aí contidos. Várias imunidades tributárias

encontram-se dispostas fora da seção das “Limitações ao Poder de

Tributar”. Requisitos formais ou materiais, limites quantitativos, características específicas deste ou daquele tributo permeiam todo o capítulo do Sistema Tributário Nacional, sendo ainda pinçáveis aqui ou ali, em normas esparsas de outros capítulos da constituição, como o dos direitos e garantias individuais, da seguridade social e da ordem econômica.

A principal função das limitações ao poder de tributar é a delimitação e a fixação de fronteiras dirigidas ao legislador infraconstitucional e, principalmente, aos entes tributantes.

Luciano Amaro37 destaca, em sua obra Direito Tributário Brasileiro, que “as

chamadas “limitações ao poder de tributar” integram o conjunto de traços que

demarcam o campo, o modo, a forma e a intensidade de atuação do poder de

36 AMARO, Luciano.

(36)

tributar (ou seja, do poder, que emana da Constituição, de os entes políticos criarem

tributos)”.

E prossegue dizendo:

O que fazem, pois, essas limitações é demarcar, fixar fronteiras ou limites

ao exercício do poder de tributar. São, por conseguinte, instrumentos

definidores (ou demarcadores) da competência tributária dos entes políticos

no sentido de que concorrem para fixar o que pode ser tributado e como pode sê-lo, não devendo, portanto, ser encaradas como “obstáculos” ou ”vedações” ao exercício da competência tributária, ou “supressão” dessa competência, consoante, a propósito das imunidades tributárias, já observou Paulo de Barros Carvalho. (destaques do autor)

A doutrina também é pacífica no sentido de afirmar as limitações ao poder de

tributar, entre elas a anterioridade, constituem cláusulas pétreas, uma vez que são

verdadeiros direitos e garantias individuais, protegidos, portanto, pela prescrição contida no artigo 60, §4°, da Constituição Federal.

Misabel Abreu Machado Derzi38, em nota de atualização para a magistral obra

de Aliomar Baleeiro, é incisiva quanto a esta questão. Vejamos suas palavras:

A grande massa das imunidades e dos princípios consagrados na Constituição de 1988, dos quais decorrem limitações ao poder de tributar, são meras especializações ou explicitações dos direitos e garantias individuais (legalidade, irretroatividade, igualdade, generalidade, capacidade econômica de contribuir etc.), ou de outros grandes princípios estruturais, como forma federal de estado (imunidade recíproca dos entes públicos estatais). São, portanto, imodificáveis por emenda, ou mesmo por revisão, já que fazem parte daquele núcleo de normas irredutível, a que se refere o artigo 60, §4°, da Constituição. (destaques nossos)

Assim, podemos concluir que o subsistema constitucional tributário e mais especificamente seus princípios estabelecem limitações ao poder de tributar e, como cláusulas pétreas são imodificáveis, nem mesmo por emenda constitucional.

38 DERZI, Misabel Abreu Machado, notas de atualização de BALEEIRO, Aliomar,

(37)

II OS PRINCÍPIOS E REGRAS CONSTITUCIONAIS NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO

Após verificarmos a estrutura e o modo como opera o sistema jurídico brasileiro, a fim de dar maior consistência ao tema objeto do presente estudo, passaremos a analisar o papel dos princípios constitucionais, observando e dissecando, para tanto, o significado do vocábulo “princípio”, assim como sua função no sistema jurídico.

A questão relativa ao papel dos princípios e regras no sistema jurídico, ganhou relevo com a introdução na ciência do direito da discussão referente à diferenciação entre princípios e regras, tão disseminada e debatida na doutrina pátria.

Humberto Bergmann Ávila tem chamado a atenção para a importância da discussão acadêmica sobre a diferenciação dos princípios e regras jurídicas, a respeito do qual trataremos ainda neste capítulo.

A análise das regras e princípios constitucionais tem, como principal finalidade, trazer maior objetividade ao tema, delimitando-o.

II.1 NOÇÃO DE PRINCÍPIO JURÍDICO

“Princípio”, do Latim principium, principii, significa “começo”, “origem”, “base”.

É o alicerce sobre o qual se constrói o sistema jurídico. É a pedra angular de qualquer sistema.

O signo “princípio” é polissêmico, ensejador de diversas acepções. Genero

Carrió39 conseguiu captar sete na linguagem ordinária, as quais têm relevância para

o campo do direito. Vejamos cada uma das acepções perfiladas pelo jurista:

I – con las ideas de ‘parte o ingrediente importante de algo’, ‘propiedad fundamental’, ‘núcleo básico’, ‘ característica central’; II – con las ideas de ‘regla, guía, orientación o indicación generales’; III – con las ideas de ‘fuente generadora’, ‘causa’, ‘origen’; IV – con las ideas de ‘finalidad’, ‘objetivo’,

39 CARRIÓ, Genero.

Principios jurídicos y positivismo jurídico. Buenos Aires. Abeledo Perrot. 1970,

(38)

‘propósito’ o ‘meta’; V – con las ideas de ‘premisa’, ‘inalterable punto de partida para el razonamiento’, ‘axioma’, verdad teórica postulada como evidente’, ‘esencia’, ‘propiedad definitoria’; VI – con las ideas de ‘regla práctica de contenido evidente’, ‘verdad ética incuestionable’; VII – con las ideas de ‘máxima’, ‘aforismo’, “proverbio’.

Os cientistas do direito, debruçando-se sobre o tema, conceituam princípios, de modo geral, como as vigas mestras do sistema jurídico e que, portanto, direcionam tanto a aplicação das normas jurídicas, quanto sua elaboração.

Paulo de Barros Carvalho40 verificou que este signo é utilizado de quatro

formas distintas, a saber: a) como norma jurídica de posição privilegiada e portadora de valor expressivo, b) como norma jurídica de posição privilegiada que estipula limites objetivos, c) como os valores insertos em regras jurídicas de posição privilegiada, mas considerados independentemente das estruturas normativas e d) como limite objetivo estipulado em regra de forte hierarquia, tomado, porém, sem levar em conta a estrutura da norma.

No seu artigo intitulado “O princípio da segurança jurídica em matéria tributária”, o jurista aduz que “princípio é uma regra portadora de núcleos significativos de grande magnitude, influenciando visivelmente a orientação de cadeias normativas, às quais outorga caráter de unidade relativa, servindo de fator

de agregação para outras regras do sistema positivo” 41.

Ressalta, entretanto, que os valores a que alude sempre serão indicados pelo legislador, consciente ou inconscientemente, na linguagem do direito posto.

Já para Roque Antonio Carrazza42 “princípio jurídico é um enunciado lógico,

implícito ou explícito, que, por sua grande generalidade, ocupa posição de preeminência nos vastos quadrantes do Direito e, por isso mesmo, vincula, de modo inexorável, o entendimento e a aplicação das normas jurídicas que com ele se conectam”.

Geraldo Ataliba43 entende que os “princípios são linhas mestras, os grandes

nortes, as diretrizes magnas do sistema jurídico. Apontam os rumos a serem seguidos por toda a sociedade e obrigatoriamente perseguidos pelos órgãos do

40 CARVALHO, Paulo de Barros.

Curso de direito tributário. 14ª edição. São Paulo. Saraiva. 2007, p.

159.

41 CARVALHO, Paulo de Barros.

O princípio da segurança jurídica em matéria tributária, Questões

controvertidas em matéria tributária: uma homenagem ao Professor Paulo de Barros Carvalho. Aristóteles Moreira Lima e Marcelo Jatobá Lobo (Coord.). Belo Horizonte: Fórum. 2004, p. 41.

42 CARRAZZA, Roque Antonio.

Curso de direito constitucional tributário. 23ª ed. Malheiros editores.

2007, p.39.

43 ATALIBA, Geraldo.

(39)

governo (poderes constituídos). Eles expressam a substância última do querer popular, seus objetivos e desígnios, as linhas mestras da legislação, da administração e da jurisdição. Por estas não podem ser contrariados, têm que ser prestigiados até as últimas conseqüências”.

Assim, diante dos conceitos formulados pela doutrina mais autorizada, podemos dizer que os princípios são normas jurídicas que visam direcionar e informar a atividade legiferante e a atividade cognoscitiva dos aplicadores do direito, uma vez que contêm valores e limites caros ao sistema jurídico.

Os princípios, como dito, representam aquilo que o sistema jurídico tem de mais precioso e caro, e sua violação representa, nos dizeres de Celso Antônio

Bandeira de Mello44 “transgressão do próprio sistema no qual ele se insere”.

José Souto Maior Borges45, meditando sobre a importância dos princípios

constitucionais, verifica que “a violação de um princípio constitucional importa em ruptura da própria Constituição, representando por isso mesmo uma inconstitucionalidade de conseqüências muito mais graves do que a violação de uma simples norma, mesmo que constitucional”.

Contudo, mesmo sabendo da relevância que os princípios jurídicos têm no campo doutrinário, é chegada a hora de diferençar princípios de regras jurídicas, bem como apontar a importância desta diferenciação para o Direito Tributário.

II.2 DIFERENCIAÇÃO ENTRE PRINCÍPIOS E REGRAS JURÍDICAS

A teoria jurídica contemporânea vem difundindo e consolidando a distinção entre princípios e regras.

A discussão sobre os princípios jurídicos surgiu em 1967 com o famoso artigo escrito por Ronald Dworkin, intitulado “O Direito é um sistema de regras?”, que pretendeu impugnar a teoria desenvolvida por Herbert L. A. Hart.

Atualmente, dois são os grandes grupos de autores que diferenciam os princípios de regras jurídicas. No primeiro grupo encontram-se os autores que

44 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio.

Curso de direito administrativo. 14ª ed. São Paulo.

Malheiros Editores. 2002, p. 808.

45 BORGES, José Souto Maior.

Lei complementar tributária. São Paulo, Revista dos Tribunais-EDUC,

Referências

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